Editorial / Dossier temático
DOI:
https://doi.org/10.26512/vozcen.v2i02.41227Palabras clave:
Editorial, Dossier temáticoResumen
Editorial / Dossiê Temático
por Ana Wegner, Charles Feitosa, Daiane Dordete e Tiago Mundim
O presente Dossiê apresenta trabalhos com foco nos atravessamentos entre vozes e objetos tecnológicos na relação com a cena e o público. A noção de tecnologia adotada se inscreve tanto no campo dos instrumentos como das próteses, abrangendo desde gambiarras diversas que, acopladas aos corpos de atores e atrizes, transformam o som da voz até aparatos digitais de ponta capazes de sintetizar, alterar e amplificar a voz nos palcos e nos espaços de ensaio.
Se o uso cada vez mais frequente de tecnologias digitais da imagem e do som no panorama da cena contemporânea já impunha a necessidade em abarcar aspectos pedagógicos, criativos e estéticos da voz mediada nas Artes Cênicas, o contexto de isolamento que atravessamos, devido à pandemia de COVID-19, acentuou tal urgência. Entre “apocalípticos” e “integrados”, recursos digitais foram sendo apropriados por artistas no objetivo primeiro de guardar o vínculo com o público. O uso remoto da voz e da palavra está progressivamente gerando novas poéticas, desde o uso do microfone como objeto de conexão até à integração de distorções sonoras, voluntárias e involuntárias, que engrenam novos regimes de escuta e trazem novas perspectivas de reflexão sobre as tangências das esferas vocais e digitais. A multiplicação de formas cênicas adaptadas ou criadas para o modo remoto, síncrono ou assíncrono, propiciaram modos de recepção intermídia inéditos. O espectador passa, ele também, a estar aparelhado, prolongando experiências - como o uso de fones de ouvido por espectadores - que já vinham sendo exploradas nos palcos em peças como The encounter (Inglaterra, 2016) da companhia Complicité ou Grande Sertão: Veredas (Brasil, 2018) encenada por Bia Lessa.
Privados do acontecimento cênico hic et nunc os pesquisadores e pesquisadoras inventam novas metodologias de análise de espetáculos que se reflete no presente Dossiê, especialmente nos artigos Vozes que não têm boca mediadas por objetos técnicos em De Perto Uma Pedra, de Guilherme Mayer e César Lignelli, e Vaga Carne: Voz e Dramaturgia de um “Corpo Cenário”, de Flávia Andresa Oliveira de Menezes e André Luiz Antunes Netto Carreira, que partem de uma relação remota entre as obras e o espectador. Os espetáculos motes dos dois artigos são pertinentes para pensar a tecnologia digital sonora na cena contemporânea para além de seu modo de recepção à distancia, assim como os artigos Voicing the Self, Performing Collectives: Testimonio in Contemporary Argentine Theater, de Nahuel Telleria, e Formas de presencia del cuerpo físico y virtual en el teatro a partir del análisis de la obra Futureland de Lola Arias, de Denise Cobello.
O isolamento social engendra igualmente novas metodologias de ensino e de processos de criação, aspecto tratado na entrevista com os formadores do curso de sonoplastia da SP Escola de Teatro, conduzida por Ana Wegner e Rafaella Uhiara, e no artigo Corpolítico: narrativas corpo-vocais em projeção - relato de laboratório criativo remoto, de Luciana de Lucena, que retratam como artistas e pedagogos adaptam seu métodos de trabalho. Tais possibilidades foram facilitadas por iniciativas de inclusão de recursos digitais em práticas artísticas e pedagógicas que precederam a pandemia, cujos artigos Voz em movimento: um estudo de metaperspectiva sonoro-motora que reúne dança contemporânea, música e tecnologia, de Andréia Nhur, e Análise Acústica como uma contribuição para o estudo do grito cênico: relato de experiência nas vozes de atrizes, de Jane Celeste Guberfain, Mariana Baltar e Lidia Becker, são dois exemplos emblemáticos. O relato do projeto Voz Feminina, proposto por Eleonora Montenegro, Mayra Montenegro de Souza, Glênia Maria da Silva Freitas e Samara Batista dos Santos, integra o fluxo contínuo da revista, mas se conclui igualmente pelo testemunho da adaptação do processo à forma remota.
Se os contornos impostos pelo distanciamento tornaram preponderantes neste número a presença de tecnologias digitais, o Dossiê visou abarcar a voz mediada por tecnologias igualmente em perspectivas históricas, interessando-se pela intermediação de dispositivos mecânicos e analógicos. A instalação cênica O Naufrágio, de Sulian Vieira, Silvia Davini e César Lignelli, já em 2010 explorava o agenciamento entre artesania e tecnologias digitais de som e imagem. Pensar a gambiarra como objeto técnico no registro audiovisual Objeto técnico # 1: Gambiarra, composto por Edith de Camargo, Ana Wegner, Charles Feitosa e Shadiyah Venturi Becker, é também uma maneira de expandir a noção de tecnologia.
A discussão não se encerra no aspecto material, já que as relações entre tecnologias e voz também engendram reflexões éticas e políticas, como as trazidas no livro de Freya Jarman-Ivens Queer Voices: Technologies, Vocalities and the Musical Flaw - resenhado para este Dossiê Temático por Daiane Dordete, Mayra Montenegro, Alexandra de Melo, Cae Beck, Leonardo Manschein e Luiza Gutierrez - e no registro audiovisual Objeto técnico # 2: Microfone - de Luciana de Lucena, Kaíke Barto e Luzia Rohr Balaj -, que leva em conta a dimensão simbólica do microfone. A maioria dos textos do Dossiê abrem perspectivas que podem contribuir para pesquisa igualmente no campo interdisciplinar emergente das humanidades digitais.
Por fim, a Conversa com Wladimir Pinheiro sobre as muitas possibilidades do Teatro Musical conduzida por Leticia Carvalho e o artigo Investigação de um processo de ensino e aprendizagem de Atuação Através da Canção no ensino superior brasileiro, de Tiago Mundim, que compõem o fluxo contínuo da revista, exploram as diferentes fronteiras entre teatro e música.
Desejamos a todas e todos uma ótima leitura!
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Revista Voz e Cena - v. 02, n.º 02: Dossiê Temático "Vozes e Tecnologias" - Voz e Cena (jul-dez/2021).
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