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Fabulações e cenas especulativas
A proposta deste dossiê temático é estimular artigos que analisem fabulações e cenas especulativas atentas às histórias alternativas aos arquivos oficiais. Afrofuturismo e ficções científicas, perspectivismos ameríndios e multinaturalismos, realidades mais-que-humanas, narrativas não-humanas, viradas animais e cosmologias decoloniais receberão uma atenção especial para esta edição. Trata-se de um paradigma emergente, em consolidação, que revisa criticamente modos mais oficiais, realistas e canônicos de narrativa nas artes e na literatura. Se, segundo Sadya Hartman, os arquivos de vigilância são incapazes de abarcar a história da pulsão das vidas rebeldes dos guetos negros, a ficção especulativa revela-se como uma fonte, uma forma de escrita histórica que não se conforma com a violência e a violação das narrativas hegemônicas. Mundos futuros, mundos em ruínas e lacunares ensejam, portanto, narrativas que propõem outros mundos. Serão bem-vindas obras de caráter comparatista, que situam suas análises nas fronteiras ou fricção de linguagens, como o cinema, a literatura, a artes dramáticas, a cultura pop, as séries de TV e as artes visuais.
Literatura negra e indígena no Brasil
A literatura oral nunca fez parte do cânone, que sempre privilegiou a escrita, legitimada pela branquitude, pela colonialidade e pelo Império. São séculos de apagamento, silenciamento, invisibilidade, epistemicídio e desumanização. Temos uma dívida impagável com os ancestrais desse país que fundaram a nação e ficaram fora dela, subalternizados e apagados da história. Este dossiê é uma forma de reparação, uma tentativa de dar visibilidade à luta dos povos originários e negros deste país. Este número da Revista Cerrados aceitará artigos que contribuam para fomentar a discussão sobre a literatura negra e indígena feita no Brasil, na perspectiva da oralidade, da ancestralidade e das resistências.
Literatura e teoria de autoria negra no Atlântico Sul
Com intuito de dar visibilidade à produção da crítica contemporânea negra, esta chamada propõe um volume de ensaios e artigos orientados pela interseção entre literatura e teoria de autoria negra no atlântico sul. Desde o início da escravização transatlântica até a diáspora negra do presente, a negritude tem sido uma forma de contestar e subverter o racismo estrutural. Junto com a ação coletiva, definidora de comunidades negras e as relações interraciais, sempre existiu a reflexão, o pensamento e a expressão de autores/autoras, artistas e intelectuais negros e negras. Convidamos, para compor esse dossiê, trabalhos de pesquisa que refletem sobre essas formas de expressão, especialmente literárias, mas também em outros meios artísticos da palavra, e sua conexão e potência para gerar uma política engajada com novas formas de pensar a raça, a negritude, o privilégio branco e a ação coletiva. Desejamos reunir reflexões sobre a imensa e rica produção atual da crítica brasileira em uma dimensão internacional. De que forma as teorias e arte de Abdias de Nascimento, Beatriz Nascimento, Lélia Gonzalez, Denise Ferreira da Silva e Conceição Evaristo, dentre outras/outros, podem dialogar criticamente com autores/autoras negros/negras de outras regiões diaspóricas? Qual é a recepção e influência desses e outras/outros teóricas/os afro-brasileiras/os dentro e fora do Brasil? Qual é o diálogo que no Brasil se produziu com os pensadores negros/negras diaspóricos desde W. E. B. DuBois até Fred Moten? Se o espaço do Atlântico Sul foi uma região de intercâmbio específico, de que forma a produção Luso-Africana, assim como de pensadores/as africanos/as, influencia ou diverge da crítica brasileira? De que forma as religiões de matriz africana, as noções de “ancestralidade” e relações entre o quilombismo e o indigenismo têm marcado a arte e literatura negra brasileira? Há movimentos políticos (Black Lives Matters e movimentos anti-carcerários) e artísticos (afro-futurismo) que tem ultrapassado fronteiras, gerando nova força política nas suas interseções globais? Qual é a potência de interseccionalidade de gênero, de sexualidade e de outras divergências do poder normativo, assim como políticas de aliança não-negra? Com particular interesse, então, com base nessas indagações, serão aceitos trabalhos que considerem: as consequências e potência de conceitos artísticos e políticos desenvolvidos pela crítica negra na dimensão histórica e atual: a “dupla consciência” de W. E. B. DuBois e a teoria de Frantz Fanon; o pan-africanismo e suas versões luso-africanas; o “quilombismo” de Abdias de Nascimento e de Beatriz de Nascimento, as relações com marxismo e a psicanálise de Lélia Gonzales a Neusa Santos Souza, levando em consideração as diferenças entre as perspectivas críticas e teóricas e as noções de comunidade que essas referências geram; a definição de descolonização como “a restauração total do valor expropriado do labor e terra negra e indígena” (Denise Ferreira da Silva); a escrevivência (Conceição Evaristo) como teoria da expressão negra; o afropessimismo (Wilderson) e a ancestralidade (Pinho) como base de política negra; as reparações históricas coletivas e individuais e o afrofuturismo como horizonte imaginário do futuro.
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