“Presunção relativa": quando a narrativa policial é colocada à prova nos processos de tráfico de drogas

Autores

DOI:

https://doi.org/10.1590/s0102-6992-20254001e50823

Palavras-chave:

testemunho policial, justiça criminal, tráfico de drogas, desclassificação, absolvição

Resumo

O presente artigo faz uma análise qualitativa de 36 decisões de desclassificação ou absolvição em relação a casos envolvendo condutas criminalizadas pela Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas) publicadas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo nos anos de 2010, 2011 e 2017. O objetivo é compreender como são tratadas as narrativas policiais nos casos em que tais testemunhos não parecem ser centrais para a decisão, pois, ao analisar os encaminhamentos dados pelo sistema de justiça criminal brasileiro, a literatura aponta a hegemonia de condenações feitas com base nos testemunhos policiais. Contudo, alguns casos não resultam em tal desfecho, sendo a sentença ou a desclassificação da conduta para a de porte para uso, ou até a absolvição, o que, a princípio, contraria a narrativa policial. A investigação reflete, nesse sentido, sobre os principais tipos de argumentos encontrados em tais casos e as possibilidades já existentes de eventuais "pontos de fuga" da atuação majoritária do judiciário.

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Biografia do Autor

Maria Gorete Marques de Jesus, Universidade de São Paulo (USP)

Pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP). Professora do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), SP, Brasil.

Mariana Amaral, Universidade de São Paulo (USP)

Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade de São Paulo (USP). Graduada em Direito pela mesma universidade. Integra o grupo de pesquisa "Teoria dos Sistemas e Crítica Social" (CNPq). Também colabora em pesquisas do Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (LAUT). Em 2022, foi monitora do Programa de Leitura e Escrita Acadêmica (PLEA), vinculado à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, na frente de ciências sociais. Já atuou como pesquisadora no projeto JustiçaSemMuros, do Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e foi estagiária de pesquisa no Núcleo de Estudos Sobre o Crime e a Pena (FGV-SP). Tem interesse nas áreas de sociologia do direito e da punição, política de drogas, políticas de saúde mental e marcadores sociais da diferença.

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Publicado

17-06-2025

Como Citar

Jesus, M. G. M. de, & Amaral, M. (2025). “Presunção relativa": quando a narrativa policial é colocada à prova nos processos de tráfico de drogas. Sociedade E Estado, 40(01), e50823. https://doi.org/10.1590/s0102-6992-20254001e50823