Práticas de racioletramento na experiência escolar de crianças haitianas na educação básica brasileira

Autores

DOI:

https://doi.org/10.26512/les.v26i1.58204

Palavras-chave:

colonialidade, educação básica, ideologias raciolinguísticas, migração haitiana, racioletramento

Resumo

O sistema-mundo moderno colonial produz hierarquias sociais que atuam na qualificação de corpos, línguas, culturas e saberes (Quijano, 2009). Tais hierarquias estruturam as relações na modernidade e se reproduzem em instituições sociais; uma delas é a escola, onde a colonialidade se ramifica por meio de ideologias raciolinguísticas (Flores; Rosa, 2015; Rosa, 2019). Neste trabalho, trago para o centro do debate ideologias de linguagem, racialização e letramento a partir dos relatos de uma docente e das experiências compartilhadas com duas crianças haitianas em contexto de recepção escolar de migrantes. Alinhada a uma visão crítica e emancipatória da Linguística Aplicada (Fabrício, 2006; Moita Lopes, 2006; Santos; Jung; Silva, 2019), objetivo problematizar como propostas pedagógicas podem ser pautadas em ideologias raciolinguísticas em contexto de escolarização de migrantes, o que resulta em práticas de letramento orientadas pela dimensão racial da leitura e da escrita, definidas como racioletramento (Rodrigues, 2023). Também nesse cenário, com base em princípios de interculturalidade (Maher, 2007) e translinguagem Ubuntu (Makalela; Silva, 2023), apresento caminhos possíveis para propor práticas de racioletramento intercultural, que oportunizem a valorização dos repertórios das crianças haitianas, a validação da translinguagem e a construção relações menos hierárquicas na educação básica brasileira.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Caroline Vieira Rodrigues, UFSC

Doutora em Linguística (2023) pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e mestra em Letras (2019) pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Pedagoga e professora na rede municipal de educação em Pinhais/PR. Foi revisora e produtora de material didático de língua inglesa de ensino fundamental para mídias impressas (Grupo Expoente/2018-2019), também de material didático para ensino de português como língua de acolhimento (2021, 2023). E-mail: vrodrigues.ca@gmail.com

Referências

ALMEIDA, Cristóvão Domingos; SANT’ANA, Vitória Ayala. Violência contra haitianos e a repercussão na mídia brasileira. In: Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 40., 2017, Caxias do Sul. Anais [...]. São Paulo: Intercom, 2017.

ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. São Paulo: Jandaíra, 2019.

ASSUMPÇÃO, Adriana Maria; AZEVEDO AGUIAR, Gabriela de. “Você precisa falar português com seu filho”: Desafios para o processo de inclusão de crianças imigrantes em escolas do Rio de Janeiro. Revista Iberoamericana de Educación, v. 81, n. 1, p. 167-188, 2019.

BLOMMAERT, Jan; BACKUS, Ad. Superdiverse repertoires and the individual. In: SAINT-GEORGES, Ingrid de; WEBER, Jean-Jacques (org.). Multilingualism and multimodality: current challenges for educational studies. Leiden: Brill, 2013. p. 9-32.

BRASIL. Lei n. 13.445, de 24 de maio de 2017. Dispõe sobre os direitos e os deveres do migrante e do visitante, regula a sua entrada e estada no país e estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas para o emigrante. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 25 maio 2017, p. 1.

BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução n. 01, de 13 de novembro de 2020. Dispõe sobre o direito de matrícula de crianças e adolescentes migrantes, refugiados, apátridas e solicitantes de refúgio no sistema público de ensino brasileiro. Brasília, DF, 2020.

CARDOSO, Lara Andréia Sant'Ana. Análise da escolarização e inclusão social de estudantes migrantes venezuelanos(as) na escola pública do Distrito Federal. 2022. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Brasília, Brasília, 2022.

CAVALCANTI, Marilda. O pós-ápice da migração haitiana no país em notícia recortada em portal de notícias: algumas notas sobre escolhas epistemológicas. DELTA: Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada, v. 35, n. 1, 2019.

DINIZ, Leandro Rodrigues Alves; NEVES, Amélia de Oliveira. Políticas linguísticas de (in)visibilização de estudantes imigrantes e refugiados no ensino básico brasileiro. Revista X, v. 13, n. 1, p. 87-110, 2018.

FABRÍCIO, Branca Falabella. Linguística aplicada como espaço de desaprendizagem: redescrições em curso. In: MOITA LOPES, Luiz Paulo da (org.). Por uma linguística aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola, 2006. p. 45-65.

FANON, Frantz. Racismo e cultura [1956]. In: FANON, Frantz. Em defesa da revolução africana. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2011.

FARACO, Carlos Alberto. História sociopolítica da língua portuguesa. 1. ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2016.

FLORES, Nelson; ROSA, Jonathan. Undoing appropriateness: Raciolinguistic ideologies and language diversity in education. Harvard Educational Review, v. 85, n. 2, p. 149-171, 2015.

GARCEZ, P. M.; SCHULZ, L. Olhares circunstanciados: etnografia da linguagem e pesquisa em Linguística Aplicada no Brasil. DELTA: Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada, v. 31, especial, 2015.

GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. 1. ed. 13. reimpr. Rio de Janeiro: LTC, 2008.

IRVINE, Judith Temkin; GAL, Susan. Language ideology and linguistic differentiation. In: KROSKRITY, Paul V. (org.). Regimes of language: ideologies, polities and identities. Santa Fe: School of American Research Press, 2000. p. 34-84.

LABOV, William. Academic Ignorance and Black Intelligence. The Atlantic, 1972. Disponível em: https://www.theatlantic.com/past/docs/issues/95sep/ets/labo.htm. Acesso em: 12 abr. 2025.

LAGARES, Xoan. Qual política linguística? Desafios glotopolíticos contemporâneos. 1. ed. São Paulo: Parábola, 2018.

LIBERATO, Débora; IOKOI, Zilda Márcia Grícoli. Crianças bolivianas nas fronteiras da educação brasileira. Políticas Educativas, v. 7, n. 2, p. 155-163, 2014.

MAHER, Terezinha Machado. A educação do entorno para a interculturalidade e o plurilinguismo. In: Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas: Mercado de Letras, 2007. p. 255-270.

MAKALELA, Leketi; APARECIDO DA SILVA, Kleber. Translanguaging Ubuntu: uma proposta decolonial para o multilinguismo no sul global. Revista Linguagem & Ensino, v. 26, n. 1, p. 84-97, 2023.

MELO, Glenda Cristina Valim de; MOITA LOPES, Luiz Paulo da. Teorias queer e raça. In: MOITA LOPES, Luiz Paulo da et al. Estudos queer em linguística aplicada indisciplinar: gênero, sexualidade, raça e classe. São Paulo: Parábola, 2022. p. 94-100.

MOITA LOPES, Luiz Paulo da (org.). Por uma linguística aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola, 2006.

MIYAHIRA, Elbio. Cultura e socialização de bolivianos em duas escolas públicas estaduais na cidade de São Paulo. 2022. Tese (Doutorado em Educação: História, Política, Sociedade) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022.

MUNANGA, Kabengele. As ambiguidades do racismo à brasileira. In: KON, Noemi Moritz; ABUD, Cristiane Curi; DA SILVA, Maria Lucia (org.). O racismo e o negro no Brasil: questões para a psicanálise. São Paulo: Perspectiva, 2017. p. 33-44.

MUNANGA, Kabengele; GOMES, Nilma Lino. O negro no Brasil de hoje. São Paulo: Global, 2016.

NASCIMENTO, Gabriel. Racismo linguístico: os subterrâneos da linguagem e do racismo. Belo Horizonte: Editora Letramento, 2019.

NOGUEIRA, David Juglierme Alves. Exclusão-inclusão de migrantes bolivianos em contextos educacionais. 2022. Tese (Doutorado em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência) – Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, 2022.

PINTO, Joana Plaza; DIAS, Ana Luiza Krüger. Barreiras ou pontos de inspeção? Ideologias linguísticas sobre migração e o modelo de comunicação moderno-colonial. Gragoatá, Niterói, v. 28, n. 60, e53275, jan.-abr. 2023. Disponível em: https://doi.org/10.22409/gragoata.v28i60.53275.pt. Acesso em: 12 abr. 2025.

PIRES-SANTOS, Maria Elena et al. "Vendo o que não se enxergava": condições epistemológicas para construção de conhecimento coletivo e reflexivo da língua(gem) em contexto escolar. DELTA: Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada, v. 31, especial, p. 35-65, 2015.

ROSA, Jonathan. Looking like a language, sounding like a race. Oxford: Oxford Studies in Anthropology of Language, 2019.

QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder e classificação social. In: SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (org.). Epistemologias do Sul. Coimbra: Almedina, 2009.

RODRIGUES, Caroline Vieira. Racioletramento nos processos de escolarização de crianças haitianas na educação básica: entre práticas de inferiorização e interculturalidade. 2023. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2023.

SALGADO, Daniel. Panorama atual da imigração boliviana. O estrangeiro, 2013. Disponível em: https://bit.ly/2lDvDnq. Acesso em: 12 abr. 2025.

SHOHAMY, Elana. Language policy: hidden agendas and new approaches. London: Routledge, 2006.

SOUZA, Jessé. Como o racismo criou o Brasil. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2021.

STREET, Brian. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.

TEIXEIRA, Silvia Katherine Pacheco. Haitianos em Manaus: pertencimento e processos de sociabilidade a partir da escola municipal Professor Waldir Garcia. 2021. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2021

Downloads

Publicado

2025-07-01

Como Citar

Vieira Rodrigues, C. (2025). Práticas de racioletramento na experiência escolar de crianças haitianas na educação básica brasileira. Cadernos De Linguagem E Sociedade, 26(1), 118–139. https://doi.org/10.26512/les.v26i1.58204