O “mito” da destruição total de documentos: um estudo dos arquivos relacionados à Guerrilha do Araguaia à luz de princípios e noções arquivísticas
Palavras-chave:
arquivos, história, Brasil, documentos arquivísticosResumo
A partir de 2004, a imprensa brasileira intensificou a produção de reportagens a respeito da possível existência de documentos arquivísticos relacionados à guerrilha do Araguaia (1972-1975), movimento armado promovido pelo Partido Comunista do Brasil contra o Regime Militar (1964-1985), contrariando o discurso oficial então esposado, segundo o qual todos os documentos teriam sido destruídos há tempos: trata-se da tese da destruição total. No presente trabalho, essa tese será examinada à luz de princípios e noções arquivísticas, especialmente os de fundo e de proveniência. O exame da questão, com base nesses princípios e noções, revelou a existência de noção arquivística, “a ramificação”, definição preliminar que será proposta ao longo deste trabalho. Na perspectiva referencial de Muller, Feith e Fruin; Jenkinson; Casanova; Schellenberg; Duchein; Lodolini; Nesmith; Cook e Duranti, as seguintes indagações foram postuladas para nortear a presente pesquisa: Os conceitos de fundo e de proveniência contribuiriam para o entendimento do fluxo, logo para o mapeamento, dos documentos de arquivo relacionados à Guerrilha do Araguaia? A tese da destruição total dos documentos arquivísticos relacionados a determinado evento histórico é sustentável? Se a resposta for negativa, por que é insustentável? A noção arquivística de ramificação dos documentos de arquivo poderia explicar a insustentabilidade de tal tese? A pesquisa realizada foi qualitativa, descritiva e explicativa. Os procedimentos metodológicos adotados foram o levantamento bibliográfico e o documental. Foi verificado o conteúdo dos documentos arquivísticos localizados nos fundos das instituições visitadas e dos questionários respondidos por seus funcionários. A identificação de bibliografias, cujos temas centrais focalizavam a Guerrilha do Araguaia, possibilitou o mapeamento das instituições participantes da eliminação daquele movimento. Foram aí incluídas muitas daquelas tradicionalmente consideradas alheias ao universo das instituições de repressão, conjunto esse ampliado a partir das reflexões do Grupo de Trabalho da Unesco sobre os arquivos de regimes repressivos. Esse mapeamento contribuiu para desvelar a complexa teia de relações inter e transinstitucionais desenvolvidas sob a tutela de missão única e abrangente: o desmantelamento da Guerrilha do Araguaia. Atrelados a essa missão, os fundos das instituições de Estado passavam a comunicar-se entre si (embora não se misturassem), estabelecendo um elo entre eles aqui denominado de ramificação. Essa noção de ramificação serviu de apoio para demonstrar a impossibilidade de destruição, de maneira completa e absoluta, de todos os documentos arquivísticos relacionados a um evento histórico ”“ neste caso, os documentos arquivísticos da Guerrilha do Araguaia. Os resultados ora apresentados, portanto, contrariam as afirmações de que inexistem, nos dias de hoje, documentos arquivísticos relacionados àquele evento histórico. A pesquisa realizada aponta, igualmente, para a necessidade de redefinir o próprio conceito de arquivos de repressão e de realizar mudanças na legislação de acesso às informações a fim de regular as persistentes práticas de sigilo, bem como rever a tradição de opacidade informacional do Estado brasileiro.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2016 Shirley do Prado Carvalhêdo
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Notas de direitos autorais
Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos: Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Creative Commons Attribution License 4.0, permitindo o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria do trabalho e publicação inicial nesta revista. Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: distribuir em repositório institucional ou publicar como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista. Autores têm permissão e são estimulados a distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado.