As lições do mel e as transformações entre modos de vida

Autores

  • Renata Otto Diniz
  • Daniel Cangussu

DOI:

https://doi.org/10.26512/rbla.v15i1.51950

Palavras-chave:

Anti-neolítico, Regressão agrícola, Perda vantajosa, Agricultura, Povos indígenas isolados, tupi

Resumo

Partindo das conotações e agências atribuídas ao mel, nas Mitológicas de Lévi-Strauss, tentamos conectar alguns pontos que propiciam a transformação na imagem conceito, amplamente consolidado na etnologia, de “regressão agrícola”. Sugerimos a contra imagem da “perda vantajosa” para ressignificar aquele movimento entre os modos de subsistência historicamente adotados pelas sociedades ameríndias, do mais agricultor ao mais forrageador. Chamamos atenção, em primeiro lugar, para a natureza não categórica da diferença entre tais modos e, em segundo lugar, mobilizamos argumentos que reivindicam a perspectiva nativa da história, para deslocar qualquer tipo de determinismo sobre a cultura ou a sociedade indígena. Seguimos Lévi-Strauss, quando ele afirma que o mel proporciona ocasião para especular sobre uma notável reviravolta: ele é o motivo de uma rotação de perspectiva segundo a qual os humanos passam a advogar em favor de uma economia de coleta, atribuindo-lhe as virtudes de variedade, abundância e longa preservação, que a perspectiva inversa atribuía à adoção da agricultura. Sugerimos que o mel faz papel de avatar da coleta ou do modo de vida forrageiro, corporificando os valores nativos. Tendo isso em mente, comparamos situações entre coletivos tupi-guarani, alguns deles descritos como “objetos” daquela “regressão agrícola”, para melhor compreender a rotação e testamos alguma generalidade.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

Almeida, Fernando Ozorio de. “A arqueologia dos fermentados: a etílica história dos Tupi-Guarani”. Estudos Avançados, v. 29, n. 83. 2015.

Aparício, Miguel. C. Lévi-Strauss: O conceito de Primitividade. Amazônica: Revista de Antropologia (online), v.12. 2020. (Texto originalmente publicado em Lévi-Strauss, C. 1968. The concept of primitiveness, in Man the Hunter, editado por Richard B. Lee e Irven DeVore, pp. 349-352. New York: Aldine De Gruyter).

Aparício, M. “Itinerários vegetais, ou da inconstância da aldeia banawá”. Maloca: Revista de Estudos Indígenas, Campinas, SP, v. 3, n. 00. 2020b.

Balée, William. “Biodiversidade e os índios amazônicos”. In: Carneiro da Cunha, Manuela; Viveiros de Castro, Eduardo. Amazônia Etnologia e História Indígena. São Paulo: NHII, USP. 1993.

Balée, William. Footprints of the Forest: Ka’apor Ethnobotany—the Historical Ecology of Plant Utilization by an Amazonian People. New York: Columbia University Press. 1994.

Balée, William. “O povo da capoeira velha: caçadores-coletores das terras baixas da América do Sul”. IN: C. Pavan (coord.). Uma estratégia latinoamericana para a Amazônia (vol. 1). São Paulo: Memorial. 1996.

Balée, William L. Cultural forests of the Amazon: a historical ecology of people and their landscapes. Tuscaloosa: University of Alabama Press. 2013.

Berto, Flavia de Freitas; Cardoso, Guilherme Ramos; awá-guajá, Hajkaramuky et al. “O finado dono do jabuti queria transar com o finado dono do jaguar”. Linguística (UFRJ), v. 15, n.1. 2019.

Braga, Leonardo Viana. Panem. Sobre seu viés de gênero entre os Zo’é. Mana, v. 27, n. 2. 2021.

Braga, Leonardo Viana. Eremi’u rupa. Abrindo roças. 1 ed. São Paulo: Iepé, FPEC/Funai & Fundo de Artesanato Zo’é/FAZ, Série Saberes Zo’é, v. 2, 189pp. 2021a.Braga, Leonardo Viana. “Panem. Sobre seu viés de gênero entre os Zo’é”. Mana [online]. 2021, v. 27, n. 2. 2021b.Cangussu, D. Manual Indigenista Mateiro. Princípios de botânica e arqueologia aplicados ao monitoramento de povos indígenas isolados (refugiados) na Amazônia brasileira. Dissertação de Mestrado. Instituto de Pesquisas da Amazônia, Manaus, Amazonas. 2021

Cangussu, D. Relatório da expedição de monitoramento na Terra Indígena Arariboia, Equipe “C”. Ministério da Justiça e Segurança Pública, Lábrea, AM. 2017.

Cangussu, D., Franciscato, R., Machado, L., Rocha, D. A., Miguel, E., & Drumond, M. A. Monitorando as “tiradas de mel”: metodologias de proteção e conservação dos territórios dos povos indígenas isolados da Amazônia. V Simposio brasileiro de biologia da conservação. 2019.

Cardoso, Guilherme Ramos. “ARIKU KARAI PYRY: O ‘ficar no meio dos brancos’ para os Awa do Pindaré, MA”. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social. UNICAMP. Campinas: 2019.

Carneiro da cunha, Manuela. “Traditional People, Collectors of Diversity”. In: Brightman M.; Lewis J. (Org.). The Anthropology of Sustainability. 1ed. New York: Palgrave Macmillan, v. 1. 2017.

Carneiro da cunha, Manuela. “Antidomestication in the Amazon. Swidden and its foes”. In: HAU: Journal of Ethnographic Theory, 9 (1). 2019.

Clastres, Pierre. A Sociedade contra o Estado: pesquisas de antropologia política. São Paulo, Cocac & Naify, 2003.

Clastres, Pierre. Crônica dos Índios Guayaki: o que sabem os Aché, caçadores nômades do Paraguai. Rio de Janeiro: Editora 34. 1995. Coelho, Elizabeth Maria Beserra; hernando, Almudena (orgs.) Estudos sobre os Awá: caçadores-coletores em transição. São Luís: Ed. EDUFMA. 2013.

Coelho de souza, Marcela Stockler. “O traço e o círculo: O conceito de parentesco entre os jê e seus antropólogos”. Tese de doutoramento em Antropologia Social. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2002.

Cormier, Loretta. Kinship with monkeys: the Guajá foragers of eastern Amazonia. New York: Columbia University Press. 2003.

Costa, Luiz. “Worthless Movement: Agricultural Regression and Mobility,” Tipití: Journal of the Society for the Anthropology of Lowland South America: Vol. 7: Iss. 2, Article 2. 2009.

Costa, Luiz & Fausto, Carlos. “The Enemy, the Unwilling Guest and the Jaguar Host”. L’Homme, 231-232 (3-4). 2019.

Descola, Philippe. La Selva Culta. Simbolismo y Práxis em la Ecologia de los Achuar, Instituto Francés de Estudios Andinos – IFEA y Ediciones Abya-Yala (Quito, Ecuador). 1996.

Emperaire, Laure. “Dissonâncias vegetais: entre roças e tratados”. In: Oliveira, Joana Cabral de et al. (orgs.). Vozes Vegetais – Diversidade, resistências e histórias das florestas. São Paulo: UBU. 2020.

Fausto, Carlos. Inimigos Fiéis: História, Guerra e Xamanismo na Amazônia. São Paulo: EDUSP. 2001.

Fausto, C., & Neves, E. “Was there ever a Neolithic in the Neotropics? Plant familiarisation and biodiversity in the Amazon”. Antiquity, 92(366). 2018.Forline, Louis Carlos. “The persistence and cultural transformation of the Guajá Indians: foragers of Maranhão state, Brazil”. Dissertation. Universityof Florida, Gainesville. 1997.

Franciscato, R., & Cangussu, D. Relatório da expedição “Serra do Opianes” - BAPE Bananeiras. Ministério da Justiça. Fundação Nacional do Índio, Seringueiras, RO. 2013.

Gallois. D & Havt, N, “Relatório de Identificação da Terra Indígena Zo’é”. Mimeo. 1998.

Garcia, Uirá Felippe. Karawara: a caça e o mundo dos Awá-Guajá. Tese (Doutorado em Antropologia Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2010.

Gomes, Mércio Pereira. “O povo Guajá e as condições reais para sua sobrevivência” In: Povos indígenas no Brasil 1987/88/89/90. São Paulo: Centro Ecumênico de Documentação e Informação.

Gow, P. “Me deixa em paz!”. Um relato etnográfico preliminar sobre o isolamento voluntário dos Mashco. Revista de Antropologia, [S. l.], v. 54, n. 1. 2011.

Graeber, D. & David Wengrow. O Despertar de Tudo: Uma Nova História da Humanidade. São Paulo: Cia das Letras. 2022.

Haraway, Donna. “Antropoceno, Capitaloceno, Plantationoceno, Chthuluceno: fazendo parentes” (trad. de Susana Dias, Mara Verônica e Ana Godoy). Climacom. “Vunerabilidade”. 3(5). 2016.

Hartt, Charles Frederick. Os Mitos Amazônicos da Tatraruga. Traducão e Notas de Câmara Cascudo. Recife: Arquivo Público Estadual. 1952.

Heckenberger MJ, Russell JC, Fausto C, Toney JR, Schmidt MJ, Pereira E, Franchetto B, Kuikuro A. “Pre-Columbian urbanism, anthropogenic landscapes, and the future of the Amazon”. Science 321. 2008.

Lathrap, D.W. “Our Father the Cayman, Our Mother the Gourd: Spinden Revisited, or a Unitary Model for the Emergence of Agriculture in the New World”, In Origins of Agriculture, edited by C. A. Reed. 1977.

Lima, Ana Gabriela Morim de. “A cultura Batata-doce: cultivo, parentesco e ritual entre os Krahô”. Mana v. 23, n. 2. 2017.Lima, Ana Gabriela Morim de. “Etnografias Jê e as plantas cultivadas: contribuições para o debate sobre sistemas agrícolas tradicionais”. Revista de Antropologia da UFSCar, 11(2). 2019.

Lévi-strauss, Claude. “O uso das plantas silvestres da América do Sultropical”. In: Suma Etnológica Brasileira Vol. 1: Etnobiologia. Ribeiro, Darcy (ed.);Ribeiro, Berta G. (coord.), Petrópolis: Vozes, Finep. 1986. Lévi-strauss, Claude. “A Noção de arcaísmo em etnologia” In: Antropologia Estrutural. São Paulo: Cosac e Naify. 2013[1952]

Lévi-strauss, Claude. O Cru e o Cozido. São Paulo: Cosac e Naify. 2004.

Lévi-strauss, Claude. Do Mel às Cinzas. São Paulo: Cosac e Naify. 2004b.

Lévi-strauss, Claude. Origem dos Modos à Mesa. Mitológicas III. São Paulo: Cosac Naify. 2006.

Lévi-strauss, Claude. História de Lince. Trad. Beatriz Perrone-Moisés. São Paulo: Companhia das Letras. 1993.

Maizza, Fabiana. “Sobre as crianças-planta: o cuidar e o seduzir no parentesco Jarawara”. Mana, v. 20, n. 3. 2014.

Neves, E. G. “O Velho e o Novo na Arqueologia Amazônica”. Revista USP, (44). 2000.

Neves, E.G. “El Formativo que nunca terminó: la larga historia de estabilidad en las ocupaciones humanas de la Amazonía central”. Boletín De Arqueología PUCP, (11). 2007.

Neves, E.G. “Não existe neolítico ao sul do Equador: as primeiras cerâmicas amazônicas e sua falta de relação com a agricultura”. In Cerâmicas arqueológicas da Amazônia: rumo a uma nova síntese. Belém: IPHAN. 2016.

Neves, E.G. Sob os Tempos do Equinócio: oito mil anos de história na Amazônia Central. 1. Ed. São Paulo: Ubu/Edusp, 2022.

Neves, E. G. Heckenberger, Michael J. “The Call of the Wild: Rethinking Food Production in Ancient Amazonia”. Annual Review of Anthropology. 2019.O’dwyer, E. C. Laudo antropológico sobre a Área Indígena Awá. 5a Vara Federal da Seção Judiciária do Maranhão, processo no 95.353-8, 2002.Oliveira, Joana Cabral de; Amoroso, Marta; Lima, Ana Gabriela Morim de; Shiratori, Karen; Marras, Stelio; Emperaire, Laure (Orgs.) Vozes Vegetais: diversidade, resistências e histórias da floresta. São Paulo: Ubu Editora. 2020.

Oliveira, Joana Cabral de. “Agricultura Contra o Estado”. In: Oliveira, Joana Cabral de et al. (orgs.). Vozes Vegetais – Diversidade, resistências e histórias das florestas. São Paulo: UBU. 2020. Oliveira, Joana Cabral de. “Mundos de roças e florestas”. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Cienc. Hum., Belém, v. 11, n. 1. 2016.

Otto, R. “Outra vez, me deixa em paz!: crônicas de um desencontro tupi-guarani no Maranhão”. Revista de Antropologia da UFSCar, 9(1), jan./jun. 2017.

Otto, R. “A Besta Árida: uma perspectiva ‘anti-neolítica entre os Awá-Guajá, Tupi no Maranhão”. Revista Teoria & Sociedade – FAFICH/UFMG, V.24 N.2, 2016.

Ozorio de almeida, Fernando y KATER, Thiago. “As cachoeiras como bolsões de histórias dos grupos indígenas das terras baixas sul-americanas.” Revista Brasileira de História, Vol. 37, núm.75. 2017.

Perrone-Moisés, Beatriz. Festa e Guerra. Tese de livre docência. Universidade de São Paulo. 2015.

Rival, Laura. “Amazonian historical ecologies”. In: Journal of the Royal Anthropological Institute. J. Roy. Anthrop. Inst. (N.S.), S79-S94. 2006.

Rival, Laura. “Domesticating the landscape, producing crops, and reproducing society in Amazonia”. In David Parkin and Stan Ulijaszek (eds), Convergence and emergence: towards a new holistic anthropology. Oxford: Berghahn Books. 2007.Rival, Laura. “Domestication of peach palm (Bactris Gasipaes Kunth): the roles of human mobility and migration”. In The ethnobiology of mobility, displacement and migration in indigenous lowland South America (ed.) Miguel Alexiades. Oxford: Berghahn Books. 2009.

Rodrigues, Patrícia de M. “Os Avá-Canoeiro do Araguaia e o tempo do cativeiro”. Anuário Antropológico, v.38 n.1. 2013.

Sahlins, Marshall. “A Sociedade afluente original”. In: Cultura na prática. Editora UFRJ. 2004.

Sautchuk, Carlos Emanuel. “Os antropólogos e a domesticação. Derivações de ressurgências de um conceito”. In Políticas etnográficas no campo da ciência e das tecnologias da vida. Porto Alegre: UFRGS. 2018.

Scott, James C. Against the Grain: A Deep History of the Earliest States. Yale University Press, 2017.Shiratori, Karen. “O olhar envenenado: a perspectiva das plantas e o xamanismo vegetal jamamadi (médio Purus, AM)”. Mana, v. 25, n. 1. 2019.

Tsing, Anna. Viver nas ruínas: paisagens multiespécies no Antropoceno. Brasília: IEB Mil Folhas, 2019.

Viveiros de Castro, Eduardo. Araweté: Os Deuses Canibais. Rio de Janeiro: Zahar/ ANPOCS. 1986.

Viveiros de Castro, Eduardo. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac Naify. 2002.

Viveiros de Castro, Eduardo. Metafísicas Canibais. Cosac e Naify: São Paulo. 2015.Viveiros de Castro, Eduardo. “Nenhum povo é uma ilha”. In: Fany Ricardo e Majoi Gangorra (orgs) Cercos e Resistência-Povos Indígenas Isolados. São Paulo: ISA. 2019.Yokoi, Marcelo. “Na terra, no céu: os Awá-Guajá e os Outros”. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia. São Carlos: UFSCar. 2014.Wengrow, David & Graeber, David. “Many Seasons Ago”: Slavery and Its Rejection among Foragers on the Pacific Coast of North America. AMERICAN ANTHROPOLOGIST, Vol. 120, No. 2. 2018.

Downloads

Publicado

2023-12-19

Como Citar

Otto Diniz, R., & Cangussu, D. (2023). As lições do mel e as transformações entre modos de vida. Revista Brasileira De Linguística Antropológica, 15(1). https://doi.org/10.26512/rbla.v15i1.51950

Edição

Seção

Dossiê

Artigos mais lidos pelo mesmo(s) autor(es)