Os Kagwahiva da margem de lá
histórias, territórios e paisagens Katawixi e Juma no interflúvio dos rios Madeira - Purus (AM)
DOI:
https://doi.org/10.26512/rbla.v14i1.46447Palavras-chave:
Arqueologia Amazônica, História Indígena, Povos Tupi-Guarani, Kagwahiva, Indígenas Isolados e de Recente ContatoResumo
A presença de grupos Tupi Kagwahiva no interflúvio entre os rios Madeira e Purus remonta pelo menos ao início do período colonial, durante o qual diversos processos de genocídio, epidemias e tentativas forçadas de conversão religiosa foram conduzidos. Os povos Juma e Katawixi, respectivamente classificados como grupos recém contatados e isolados pelo Estado, são “ilhas” que outrora integraram redes de relações dentro de um extenso território Tupi-Guarani no Sul do Amazonas, que possui raízes pré-coloniais. Reunimos aqui narrativas arqueológicas, históricas e orais acerca deste contexto, buscando avaliar os descaminhos que conduziram a um drástico decréscimo populacional Juma durante o século XX, e à escolha pelo isolamento por parte dos Katawixi na década de 1980. A partir dos vestígios e monumentos vegetais presentes em suas florestas, especialmente ligados às castanheiras, buscamos compreender de que modo é possível entrever as resistências Kagwahiva nas e através das matas, em que ficam marcadas sua presença e seus afetos. Este artigo pretende ser uma contribuição à pesquisa interdisciplinar sobre os povos indígenas Tupi, e apresentar um contexto de longa duração que envolveu diversas formas de interação com não-indígenas, até culminar no isolamento ou no seu quase completo apagamento. Uma visão histórica é fundamental para compreender o isolamento como fruto do genocídio, e aponta para a necessidade de políticas de longo prazo de proteção e monitoramento dos povos isolados.
Downloads
Referências
Almeida, F. O. de, & Garcia, L. G. (2008). Aspectos do Espaço Tupinambá no Leste Amazônico. Revista de Arqueologia, 21(2), 97–119.
Almeida, F. (2016). A Arqueologia dos Tupi-Guarani no Baixo Amazonas (p. 12).
Almeida, F. (2017). A arqueologia do rio Jamari e a possível relação com os grupos Tupi-Arikém – Alto Madeira (RO). 17, 63–91.
Almeida, F., Lopes, R., Tamanaha, E., & Kater, T. (2018). The occupational dynamics of the Polychrome Tradition producers in Amazonia.
Almeida, F., & Moraes, C. (2016). A Cerâmica Polícroma do Rio Madeira (pp. 402–413).
Almeida, F., & Neves, E. (2015). Evidências arqueológicas para a origem dos tupi-guarani no leste da Amazônia. Mana, 21, 499–525. https://doi.org/10.1590/0104-93132015v21n3p499
Almeida, F. O. (2013). A Tradição Polícroma no Alto Rio Madeira.
Amorim, F. 2016. “Povos indígenas isolados no Brasil e a política indigenista desenvolvida para efetivação de seus direitos: avanços, caminhos e ameaças”. Revista Brasileira de Linguística Antropológica, 8(2), UnB.
Andrade, V., Flores, B., Levis, C., Clement, C., Roberts, P., & Schöngart, J. (2019). Growth rings of Brazil nut trees (Bertholletia excelsa) as a living record of historical human disturbance in Central Amazonia. PLoS ONE, 14, e0214128. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0214128
Araújo, J. do N. (2021). Ymyã-hu Nhandywa – o tempo do castanhal: temporalidades na vida Kagwahiva Tenharin. Tellus, 21(45), 143–170.
Balée, W. (2008). Sobre a Indigeneidade das Paisagens. Revista de Arqueologia, 21, 9–23. files/6/Balée - 2008 - Sobre a Indigeneidade das Paisagens.pdf
Balée, W., Schaan, D., Whitaker, J., & Holanda, R. (2014). Florestas Antrópicas no Acre: inventário florestal no geloglifo Três Vertentes, Acrelândia. Amazônica, Revista de Antropologia, 6(1). https://doi.org/http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v6i1.1752.
Barreto, C., & Oliveira, E. (2016). Para além de Potes e Panelas: cerâmica e ritual na Amazônia antiga. Habitus, 14(1), 51–72. https://doi.org/http://dx.doi.org/10.18224/hab.v14.1.2016.51-72
Belletti, J. (2015). Arqueologia do Lago Tefé e a expansão polícroma.
Bertolin, G. G. (2014). Entre Outros: uma Análise da Transformação Ritual entre os Kagwahiva [Dissertação de Mestrado]. UFSCAR.
Cardozo, Ivaneide B., do Vale Jr., Israel C., Ribeiro, Tamyres M (2002). Terra Indígena Juma. Diagnóstico Ambiental Participativo. Etnozoneamento e Plano de Gestão em Terras Indígenas, vol. 8. Porto Velho, ECAM.
Carneiro da Cunha, M., Magalhães, S. B., & Adams, C. (2021). Povos tradicionais e biodiversidade no Brasil – Contribuições dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais para a biodiversidade, políticas e ameaças. Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPCISBN: 978-65-89883-04-3.
Clement, C. R., Denevan, W. M., Heckenberger, M. J., Junqueira, A. B., Neves, E. G., Teixeira, W., Woods, W. I., Texeira, W. G., & Woods, W. I. (2015). The domestication of Amazonia before European conquest. Proceedings B of the Royal Society, 282, 9. https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1098/rspb.2015.0813
Correa, Celso Lourenço Moreira (1988). Relatório do GT 272/87. Ministério do Interior. Manaus, Fundação Nacional do Índio, 5ª Superintendência Executiva Nacional.
Costa, A., Gomes, D. (2018). A multifuncionalidade das vasilhas cerâmicas do Alto Rio Madeira (séculos X-XII d.C). Comensalidade cotidiana e ritual. Revista De Antropologia, 61(3), 52-85. https://doi.org/10.11606/2179-0892.ra.2018.152040
de Souza, J. A. (2021). Manoel Urbano da Encarnação. O explorador do Purus.
DeBoer, W. (1981). Buffer Zones in the Cultural Ecology of Aboriginal Amazonia: An Ethnohistorical Approach. American Antiquity, 46(2), 364–377.
dos Santos, E., da Silva, A., Ewerton, P., Takeshita, L., & Maia, M. (2015). Origins and demographic dynamics of Tupí expansion: a genetic tale. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Ciênc. Hum., 10(2). https://doi.org/https://doi.org/10.1590/1981-81222015000200003
Fundação Nacional do Índio (1987). I Encontro de Sertanistas. Brasília.
Furquim, L. P., Watling, J., Hilbert, L. M., Shock, M. P., Prestes-Carneiro, G., Calo, C. M., Py-Daniel, A. R., Brandão, K., Pugliese, F., Zimpel, C. A., da Silva, C. A., & Neves, E. G. (2021). Facing Change through Diversity: Resilience and Diversification of Plant Management Strategies during the Mid to Late Holocene Transition at the Monte Castelo Shellmound, SW Amazonia. In Quaternary (Vol. 4, Issue 1). https://doi.org/10.3390/quat4010008
Gallois, Dominique Tilkin. 1992. “De arredio a isolado: perspectivas de autonomia para os povos indígenas isolados”. In: L. D. B Grupioni (Coord.), Índios do Brasil, São Paulo, SMC/PMSP, (2 edição MEC, 1994).
Hornborg, A. (2005). Ethnogenesis, Regional Integration, and Ecology in Prehistoric Amazonia: Toward a System Perspective. Current Anthropology - CURR ANTHROPOL, 46, 589–620. https://doi.org/10.1086/431530
Kater, T., Almeida, F., Mongeló, G., Watling, J., & Neves, E. (2020). Variabilidade estratigráfica e espacial dos contextos cerâmicos no Sítio Teotônio. Revista de Arqueologia, 33, 198–220. https://doi.org/10.24885/sab.v33i1.685
Lins, Joaquin Gondim de Albuquerque. A pacificação dos Patintintins. Manaus : s.ed., 1925. 68 p.
Levis, C., Costa, F. R. C., Bongers, F., Peña-Claros, M., Clement, C. R., Junqueira, A. B., Neves, E. G., Tamanaha, E. K., Figueiredo, F. O. G., Salomão, R. P., Castilho, C. v, Magnusson, W. E., Phillips, O. L., Guevara, J. E., Sabatier, D., Molino, J.-F., López, D. C., Mendoza, A. M., Pitman, N. C. A., … ter Steege, H. (2017). Persistent effects of pre-Columbian plant domestication on Amazonian forest composition. Science, 355(6328), 925. https://doi.org/10.1126/science.aal0157
Link, R. S. (2021). Vivendo na terra do meio: o mito apurinã revelando a realidade histórica. Topoi (Rio de Janeiro), 22(46), 249–267. https://doi.org/10.1590/2237-101x02204612
Lopes, R. (2018). A Tradição Polícroma da Amazônia no contexto do Médio Rio Solimões, AM.
Lopes, R. de A. (2021). Crônicas amazônicas e trocas indígenas: caminhos para uma arqueologia documental do Médio Solimões nos séculos XVI e XVII. Revista Do Museu de Arqueologia e Etnologia, 36, 162–188. https://doi.org/10.11606/issn.2448-1750.revmae.2021.163764
Mendes dos Santos, G. (2016). Plantas e parentelas. Notas sobre a história da agricultura no Médio Purus. In Redes Arawa: ensaios de etnologia do médio Purus. EDUA.
Mendes dos Santos, G., Cangussu, D., Furquim, L., Watling, J., & Neves, E. (2021). Pão-de-índio e biomassas vegetais: elos entre o passado e o presente na Amazônia Indígena. Boletim Do Museu Paraense Emilio Goeldi Ciências Humanas, 16(1), 1–20.
Menéndez, M. (1981). Uma contribuição para a etno-história da área Tapajós-Madeira. Revista Do Museu Paulista, 28, 289–389.
Menéndez, M. (1989). A presenca do branco na mitologia Kawahiwa: história e identidade de um povo Tupi. Revista de Antropologia, 30(32), 331–353.
Miller, E. (2012). A cultura cerâmica do Tronco Tupi no Alto Ji-Paraná, Rondônia, Brasil: algumas reflexões teóricas, hipotéticas e conclusivas. Revista Brasileira de Linguística Antropológica, 1(1): 35-146.
Neves, E., Almeida, F., & Watling, J. (2020). A arqueologia do alto Madeira no contexto arqueológico da Amazônia. Boletimdo Museu Paraense Emilio Goeldi:Ciencias Humanas. https://doi.org/10.1590/2178-2547-BGOELDI-2019-0081
Neves, E., Furquim, L., Zimpel, C., Pugliese, F., & Shock, M. (2016). Pesquisa e Formação nos sítios Espinhara e Sol de Campinas do Acre. IPHAN.
Noelli, F. S. (2008). The Tupi expansions. In H. Silverman & W. H. Isbell (Eds.), Handbook of South American Archaeology (1st ed., pp. 200–212). Springer.
Oliveira, E. (2016). A Serpente de várias faces: estilo e iconografia da cerâmica Guarita. In Cerâmicas Arqueológicas da Amazônia. Rumo a uma nova síntese. Museu Paraense Emilio Goeldi. files/164/Oliveira - 2016 - A Serpente de várias faces estilo e iconografia d.pdf
Octavio, Conrado Rodrigo; Azanha, Gilberto. 2009. “Isolados - Algumas questões para reflexão”. Centro de Trabalho Indigenista. Disponível em: https://biblioteca.trabalhoindigenista.org.br/.
Ozorio de Almeida, F., de Almeida Lopes, R., & Stampanoni Bassi, F. (2021). The Cosmopolitan Misfits of Mainstream Amazonia (pp. 383–409). https://doi.org/10.1007/978-3-030-73998-0_15
Pärssinen, M., Ferreira, E., Virtanen, P. K., Ranzi, A., Parssinen, M., Ferreira, E., Virtanen, P. K., & Ranzi, A. (2020). Domestication in Motion: Macrofossils of Pre-Colonial Brazilian Nuts, Palms and Other Amazonian Planted Tree Species Found in the Upper Purus. Environmental Archaeology, 0(0), 1–14. https://doi.org/10.1080/14614103.2020.1765295
Peggion, E. A. (2003). Aliancas e faccoes. A organizagcao política dos Kagwahiva da Amazonia. Estudios Latinoamericanos, 23, 109–120. https://doi.org/10.36447/Estudios2003.v23.art6
Pessoa, C., & Costa, A. (2014). UM QUADRO HISTÓRICO DAS POPULAÇÕES INDÍGENAS NO ALTO RIO MADEIRA DURANTE O SÉCULO XVIII. Amazônica - Revista de Antropologia, 6, 110. https://doi.org/10.18542/amazonica.v6i1.1751
Ribeiro, Fabio; Aparicio, Miguel; and Matos, Beatriz de Almeida (2022). “Isolamento Como Declaração de Recusa: Políticas Indígenas Contra A Violência do Estado Brasileiro” in Difficulties in the Enforcement of Territorial Rights, Brazil, Tipití: Journal of the Society for the Anthropology of Lowland South America: Vol. 18: Iss. 1, Article 13, 148-152.
Available at: https://digitalcommons.trinity.edu/tipiti/vol18/iss1/13
Ricardo, F., & Gongora, M. (2019). Cercos e resistências: povos indígenas isolados na Amazônia Brasileira. Instituto Socioambiental.
Rocha, H. (2016). Coronel Labre (1a ed., Vol. 1). Scienza.
Rodrigues, A. (1964). A classificação do tronco lingüístico Tupí. Revista de Antropologia, 12(1/2), 99–104.
Rodrigues, A., & Cabral, A. (2012). Tupían. In The Indigenous Languages of South America (1a ed., Vol. 2, pp. 495–574). Mouton de Gruyter.
Rodrigues, A. D., & Silva, J. G. de G. da. (2018). Línguas Tupí em Rondônia e na Bolívia Oriental. Revista Brasileira de Linguística Antropológica, 10(1), 121–132. https://doi.org/10.26512/rbla.v10i1.19060
Safier, N. (2009). Como era ardiloso o meu francês: Charles-Marie de la Condamine a Amazônia das Luzes. Dossiê “O Brasil Visto de Fora”, Revista Brasileira de História vol. 29 (57).
Sampaio, P. M. (2011). “Aleivosos e rebeldes”: Lideranças indígenas no Rio Negro, século XVIII. . . SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – ANPUH, 26. 2011, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: ANPUH.
Saunaluoma, S., & Neves, E. (n.d.). Patterned Village Scapes and Road Networks in Ancient Southwestern Amazonia. Latin American Antiquity.
Shepard, G., & Ramirez, H. (2011). “Made in Brazil”: Human Dispersal of the Brazil Nut (Bertholletia excelsa, Lecythidaceae) in Ancient Amazonia 1. Economic Botany, 65, 44–65. https://doi.org/10.1007/s12231-011-9151-6
Shiratori, K. (2019). O homem que falava cantando: um panorama da presença de povos indígenas kagwahiva em isolamento na bacia do rio madeira. In F. P. RICARDO & M. F. GONGORA (Eds.), Cercos e resistências: povos indígenas isolados na Amazônia brasileira. Instituto Sociambiental.
Stampanoni, F. (2016). A Maloca Saracá: uma fronteira cultural no Médio Amazonas pré-colonial, vista da perspectiva de uma casa.
Tamanaha, E. (2018). Um panorama comparativo da Amazônia no ano 1000.
Tamanaha, E., & Neves, E. (2014). 800 anos de ocupação da Tradição Polícroma da Amazônia: um panorama histórico no Baixo Rio Solimões. Anuário Antropológico, 39, 45–67. https://doi.org/10.4000/aa.1255
ter Steege, H., Pitman, N. C. a, Sabatier, D., Baraloto, C., Salomão, R. P., Guevara, J. E., Phillips, O. L., Castilho, C. v, Magnusson, W. E., Molino, J.-F., Monteagudo, A., Núñez Vargas, P., Montero, J. C., Feldpausch, T. R., Coronado, E. N. H., Killeen, T. J., Mostacedo, B., Vasquez, R., Assis, R. L., … Silman, M. R. (2013). Hyperdominance in the Amazonian Tree Flora. Science, 342(6156), 1243092. https://doi.org/10.1126/science.1243092
Vaz, Antenor. 2011. Isolados no Brasil. Política de Estado: Da tutela para a política de direitos - uma questão resolvida? Informe IWGIA, 10.
Zimpel, C. (2008) Na direção das periferias amazônicas: arqueologia na Bacia do Rio Jiparaná, Rondônia. Dissertação de Mestrado (Arqueologia). São Paulo, Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo.
Zuse, S., Costa, A., Pessoa, C., & Kipnis, R. (2020). Tecnologias cerâmicas no alto rio Madeira: síntese, cronologia e perspectivas. Boletim Do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 15. https://doi.org/10.1590/2178-2547-bgoeldi-2019-0082
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2022 Revista Brasileira de Linguística Antropológica
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Autores que publicam na RBLA concordam com os seguintes termos:
a) Autores mantêm os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, sendo o trabalho simultaneamente licenciado sob a Creative Commons Attribution License, o que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria do trabalho e publicação inicial nesta revista.
b) Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista.
c) Autores têm permissão e são estimulados a divulgar seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado.