Famigerado, de João Guimarães Rosa

Autores

  • Gustavo Javier Figliolo Universidade Estadual de Londrina

DOI:

https://doi.org/10.26512/caleidoscopio.v1i1.7135

Palavras-chave:

Tradução espanhol, Guimarães Rosa

Resumo

Traduzir a Guimarães Rosa é uma tarefa destinada ao desapontamento, desde o início. Quem leia Rosa no original em português e se depare com a colossal experimentação linguística que o escritor faz, em termos de transposição e deturpação sintática, em termos de estiramento e flexibilização da língua (das palavras, das frases), em termos de uma constante e por vezes alucinada invenção neologística, em termos de uma pontuação arbitrária, excêntrica e caprichosa, saberá, então, que é impossível (e faço a afirmação mesmo correndo o risco de ser imodesto) pôr todo esse cabedal em outra língua sem deturpar de maneira fatal o espírito da narrativa.

Pensei, no entanto, que de alguma maneira poderia colaborar, acrescentando a outras traduções feitas ao espanhol de sua obra, neste caso um dos seus contos, uma tradução de “Famigerado”, principalmente pelo prazer que sabia iria experimentar mastigando e saboreando palavra a palavra e linha a linha da cadência prosística de Rosa e, quem sabe, surpreender-me com o resultado.

Os problemas de tradução em si, como é óbvio no caso de traduzir Guimarães Rosa, se dão por palavra, por letras muitas vezes, quando não por frases em seu conjunto. De todos, destaco o do terceiro parágrafo [1] (pág.11) e o seguinte trecho:

- “Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: famisgerado... faz-me-gerado... falmisgeraldo... famílhas-gerado...?

Como se aprecia, o jagunço não sabe o significado da palavra ‘famigerado’, e nem consegue pronunciá-la corretamente, quando acode ao médico para uma explicação.

Como traduzir ‘famigerado’, uma palavra que não existe na língua espanhola? Pois bem, o sentido mais próximo que me pareceu encontrar foi a palavra ‘insigne’, e que acaba sendo também o título do conto. Isto por duas razões: a primeira é semântica, uma vez que ‘insigne’ significa basicamente o que ‘famigerado’ significa em português: célebre, notável, por boa ou má fama; em espanhol seria também famoso por chamar a atenção pela singularidade e extravagância; a segunda razão, e talvez a mais importante, é que a palavra ‘famigerado’ tem, na linguagem coloquial, uma conotação negativa, e ‘insigne’, da mesma forma em espanhol, pode ser associada a ‘insignificante’, o que despertaria a ira de nosso jagunço. Consequentemente, as palavras em negrito do jagunço, vaciladas e hesitadas, foram traduzidas por um titubeio similar em espanhol: insigne… in-significante… in-señalado… señal-signado…?, derivado de uma “família de palavras” da original ‘insigne’.

João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo, Minas Gerais, em 27 de junho de 1908 e faleceu no Rio de Janeiro, em 19 de novembro de 1967. Um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos, foi também médico e diplomata. Sua obra se compõe basicamente de contos e o por muitos considerado mais importante romance brasileiro já escrito: “Grande Sertão: Veredas”.

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Biografia do Autor

Gustavo Javier Figliolo, Universidade Estadual de Londrina

Professor de Língua e Literaturas Hispânicas do Departamento de Letras Estrangeiras Modernas da Universidade Estadual de Londrina e Coordenador do Curso de Especialização em Espanhol: Língua, Literatura e Metodologia. Tem traduzido diversos artigos acadêmicos de variadas áreas, como a filosofia, a história, a literatura, a psicologia, além de inúmeros resumos de trabalhos acadêmicos. Atualmente está trabalhando na tradução da obra Primeiras Estórias, também do escritor brasileiro João Guimarães Rosa.

Referências

[1] A tradução foi feita de ROSA, João Guimarães. Primeiras Estórias. Rio de Janeiro: José Olympo, 1972.

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Publicado

2017-06-09

Como Citar

Figliolo, G. J. (2017). Famigerado, de João Guimarães Rosa. caleidoscópio: Literatura E tradução, 1(1), 133–142. https://doi.org/10.26512/caleidoscopio.v1i1.7135