Silenciamento e resistência: Lélia Gonzalez e o apagamento epistemológico de intelectuais negras no pensamento social brasileiro

Autores

  • Izabele Canário Universidade Federal sa Bahia

Palavras-chave:

Lélia Gonzalez, Amefricanidade, Democracia Racial, Interseccionalidade, Pensamento social negro

Resumo

Este artigo propõe uma análise crítica da ideia de Brasil a partir da obra de Lélia Gonzalez, intelectual negra cuja contribuição teórica permanece marginalizada nos cânones das Ciências Sociais. Movido por um incômodo político-epistêmico, o estudo mobiliza os conceitos de epistemicídio (Carneiro, 2005), racismo epistêmico (Grosfoguel, 2016) e a categoria de amefricanidade (Gonzalez, 1988), com o intuito de tensionar os limites da teoria social dominante. A pesquisa, de caráter qualitativo, articula a análise de conteúdo das obras da autora com a leitura crítica de textos que denunciam a colonialidade do saber. Mais do que evidenciar silenciamentos, o artigo enfatiza a resistência e o legado de Gonzalez, propondo, como contribuição original, a noção de democracia social de base amefricana, que desloca a ideia de democracia dos marcos liberais e institucionais para práticas enraizadas na ancestralidade, nas redes de cuidado e na centralidade da mulher negra como sujeito político. O objetivo é reivindicar Gonzalez como autora clássica do pensamento social brasileiro e afirmar a urgência de epistemologias negras, situadas e insurgentes, comprometidas com a reconstrução do país desde as margens.

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Publicado

12/15/2025 — Atualizado em 12/22/2025

Versões

Como Citar

CANÁRIO, Izabele. Silenciamento e resistência: Lélia Gonzalez e o apagamento epistemológico de intelectuais negras no pensamento social brasileiro. Pós - Revista Brasiliense de Pós-Graduação em Ciências Sociais, [S. l.], v. 20, n. 2, p. 41–53, 2025. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/revistapos/article/view/58374. Acesso em: 25 dez. 2025.