Artigo

Redução da carga horária de Artes, Filosofia e Sociologia: Paraná, 2021

Reducción de la carga horaria de Artes, Filosofía y Sociología: Paraná, 2021

Reduction of the workload of Arts, Philosophy and Sociology: Paraná, 2021


Fábio Antonio Gabriel[i]

Universidade Estadual do Norte do Paraná

Jacarezinho, PR, Brasil

fabioantoniogabriel@gmail.com

https://orcid.org/0000-0002-4990-4102

Ana Lúcia Pereira[ii]

Universidade Estadual de Ponta Grossa

Ponta Grossa, PR, Brasil

anabaccon@uepg.br

https://orcid.org/0000-0003-0970-260X

Ana Cássia Gabriel[iii]

Secretaria de Educação do Paraná

Joaquim Távora, PR, Brasil

anacgabriel.ag@gmail.com

https://orcid.org/0000-0002-0118-7423

Contribuição na elaboração do texto: autor 1 - autor da introdução e da revisão de literatura e revisão final; autora 2 - preparação do questionário, revisão do projeto da pesquisa, análise dos dados, consolidação do texto; autora 3 - aplicação dos questionários, caracterização dos sujeitos de pesquisa, análise prévia dos dados, contribuição na apresentação dos resultados.

Recebido em: 23/04/2022

Aceito em: 21/07/2022

Publicado em: 08/08/2022

Linhas Críticas | Periódico científico da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, Brasil

ISSN: 1516-4896 | e-ISSN: 1981-0431

Volume 28, 2022 (jan-dez).

http://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas

Referência completa (APA):

Gabriel, F. A., Pereira, A. L., & Gabriel, A. C. (2022). Redução da carga horária de Artes, Filosofia e Sociologia: Paraná, 2021. Linhas Críticas, 28, e43033. https://doi.org/10.26512/lc28202243033

Link alternativo:

https://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas/article/view/43033

Licença Creative Commons CC BY 4.0.


Resumo: Este artigo resulta de pesquisa empírica com 31 professores de Artes, Filosofia e Sociologia do Estado do Paraná. Objetivou-se analisar os impactos da redução da carga horária dessas disciplinas, sobre a aprendizagem dos alunos, a apenas uma aula. A pesquisa é de natureza qualitativa e os dados foram analisados por meio da Análise Textual Discursiva. Evidenciou-se um possível aumento de diferenças no processo educacional em relação às classes sociais menos favorecidas; além disso, há grande defasagem na aprendizagem dos alunos diante da situação da redução da carga horária dessas disciplinas, as quais contribuem para a formação intelectual e cidadã das futuras gerações.

Palavras-chave: Novo Ensino Médio. Artes, Filosofia e Sociologia. Redução de carga horária.

Resumen: Este artículo resulta de una investigación empírica con 31 profesores de Artes, Filosofía y Sociología del Estado de Paraná. El objetivo fue analizar los impactos de la reducción de la carga horaria de estas asignaturas, sobre el aprendizaje de los alumnos en una sola clase. La investigación es de naturaleza cualitativa y los datos fueron analizados por medio del Análisis Textual Discursivo. Se evidenció un posible aumento de diferencias en el proceso educativo en relación con las clases sociales menos favorecidas; además, hay un gran rezago en el aprendizaje de los alumnos ante la reducción de la carga horaria de estas asignaturas, que contribuyen a la formación intelectual y cívica de las generaciones futuras.

Palabras clave: Nueva Enseñanza Secundaria. Artes, Filosofía y Sociología. Reducción de carga horaria.

Abstract: This paper results from empirical research with 31 teachers of Arts, Philosophy and Sociology from the State of Paraná, Brazil. The objective was to analyze the impacts of reducing the workload of these disciplines, in relation to student learning, to just one lesson. The research is qualitative, and the data were analyzed through the Discursive Textual Analysis. A possible increase in differences in the educational process in relation to the less favored social classes is highlighted; in addition, there is great lag in student learning in view of the situation of reducing the workload of these disciplines, which contribute to the intellectual and citizenship education of future generations.

Keywords: New High School. Arts, Philosophy and Sociology. Reduction of workload.




Introdução

O presente artigo versa sobre a mudança curricular que o Ministério da Educação (MEC) aprovou para o Ensino Médio e os impactos que tais medidas provocam na aprendizagem dos estudantes no que concerne às disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia no Estado do Paraná, resultante da redução, já em 2021, da carga horária dessas referidas disciplinas. Trata-se de uma antecipação realizada no Estado do Paraná em relação ao novo programa para o Ensino Médio. Uma análise de conjuntura possibilita perceber que, embora não trate especificamente a respeito da reforma do Ensino Médio, neste artigo, faz-se fundamental entender a questão com base na lógica vigente na sociedade neoliberal que privilegia o acúmulo de capital das grandes corporações capitalistas. O advento da reforma do Ensino Médio gerará profundos impactos na educação da população mais pobre, que terá reduzida a sua capacidade de contato com conteúdos capazes de oferecer-lhes uma formação crítica da realidade social.

Nesse contexto, corre-se o risco de gerar uma escola desigual: uma para os mais favorecidos socialmente, que disporão de uma formação mais ampla e seguirão para os estudos universitários; e outra formação, em nível de segundo grau, para a camada menos privilegiada, encaminhada já no Ensino Médio para uma formação técnica, que será colocada diretamente no mercado de trabalho. Preliminarmente, não podemos condenar a preparação para o mercado de trabalho, mas, em uma sociedade democrática, também deveria ser democratizado o acesso ao ensino público superior. No caso do Brasil, quando analisamos o texto da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), podemos perceber que, em muitos aspectos, retrocedemos à Lei No 5.692, de 11 de agosto de 1971, que dispôs sobre a questão da primazia da formação de profissionais aptos para o mercado de trabalho (Brasil, 1971). Na prática, pensa-se em uma Educação Básica para os pobres, voltada ao mercado de trabalho, e uma para aqueles de melhores condições, voltada à formação ampla com vistas ao ingresso na universidade.

Neste texto, faremos, inicialmente, por meio da revisão de literatura, reflexões sobre a reforma do Ensino Médio. Posteriormente, adentraremos o contexto da pesquisa de campo, que contou com 31 professores de Artes/Filosofia/Sociologia que aceitaram participar da pesquisa. Os dados foram organizados e analisados com base na Análise Textual Discursiva, por meio da qual emergiram quatro categorias que dizem respeito à redução da carga horária de Artes/Filosofia/Sociologia: necessidade de selecionar conteúdos/aprendizagem defasada; a exiguidade de horas/aula para o desenvolvimento da capacidade crítica dos estudantes; perda da essência da disciplina. Em suma, o tempo de aula reduzido impacta na aprendizagem dos estudantes.

 

Revisão de literatura

Neste artigo, enfatizamos os impactos na aprendizagem dos alunos com a redução da carga horária das disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia e, também, no desenvolvimento profissional docente dos professores das referidas disciplinas. Day (2001) destaca que, quando as condições de trabalho não são satisfatórias, o estresse compromete a saúde e o desenvolvimento profissional dos docentes. Nessa perspectiva, o autor esclarece que “[…] os professores que revelam ‘mal-estar’ transmitem significativamente menos informação e menos reforços positivos aos alunos” (Day, 2001, p. 39). Como pode manter a motivação no trabalho um profissional que tem de assumir 30 turmas? (No caso do Estado do Paraná, professores das referidas disciplinas tiveram de assumir essa carga horária). Day (2001, p. 43) esclarece que “[…] o que os alunos sentem em relação ao ambiente em que estudam e sua relação de ensino afecta o seu interesse, motivação e os resultados”.

O que não ficou evidenciado durante o processo da discussão da BNCC (Brasil, 2018) é o motivo pelo qual algumas disciplinas foram consideradas centrais e outras periféricas (muito embora, textualmente, a BNCC não explicite essa hierarquização entre as disciplinas, mas apenas Língua Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna e Matemática são consideradas obrigatórias), a ponto de o Estado do Paraná, já em 2021, ter reduzido para uma aula semanal as disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia. Ainda sobre a relação entre concepções de trabalho, o desenvolvimento profissional e a aprendizagem dos alunos, Day (2001, p. 43) aponta que:

[…] o desenvolvimento profissional dos professores tem de ser construído com base na vocação apaixonada’ do professor, estimulando e mantendo a sua motivação e entusiasmo, não só para ser um profissional, mas para agir como um profissional ao longo de toda a carreira.

Nessa perspectiva, é fundamental que o estado ofereça aos professores condições estruturais de trabalho, preservando a sanidade dos profissionais da educação. Reduzir a carga horária das disciplinas de Artes/ Filosofia/Sociologia acabou por afetar professores e alunos no processo de aprendizagem e, mais ainda, dificultou e comprometeu o desenvolvimento profissional e a saúde dos docentes. Em 2021, as três disciplinas foram as únicas que sofreram a redução da carga horária no contexto do Paraná.

Segundo Koepsel et al. (2020), a construção da Lei Nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017 (Brasil, 2017), da BNCC (Brasil, 2018) e das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (Brasil, 1998), não ocorreu de forma democrática, com um debate amplo com a sociedade em busca de aprofundar reflexões acerca da pertinência de uma reforma que hierarquizasse os saberes disciplinares. As autoras criticam a defesa do protagonismo juvenil, porque os jovens não foram sequer ouvidos, e todo o processo de que se fala que os jovens optarão pelos itinerários formativos é demagógico, pois, de acordo com Koepsel et al. (2020, p. 4), “[…] o sonho e a vontade de cada sujeito, conforme proclamado, só poderão ser cultivados a partir de condições determinadas”.

Jolandek et al. (2021), em pesquisa com 106 professores de Matemática, apontam no sentido da necessidade de uma atualização dos currículos quem nem sempre é fácil de realizar-se. A pesquisa evidenciou que aproximadamente um em cada três professores não percebeu os desafios da implementação da BNCC, mas grande parte dos educadores respondentes entenderam que parece haver um alinhamento da BNCC com os conteúdos exigidos nas avaliações em larga escala. Os pesquisadores puderam constatar situações de insegurança por parte dos educadores, tendo em vista o processo impositivo da BNCC, sem um debate amplo com a comunidade escolar, haja vista a implementação da BNCC ter ocorrido mediante Medida Provisória. Na visão de Jolandek et al. (2021), mesmo em relação aos conteúdos de Matemática, haveria necessidade de um debate mais amplo, muito diálogo e reflexões no momento de fixação dos conteúdos básicos definidos pela BNCC.

Adrião e Peroni (2018, p. 50) questionam de forma sistematizada a interferência de instituições financeiras privadas na definição de políticas públicas educacionais e afirmam que tais políticas se materializam “[…] em estratégias de privatização do ensino público”. Vale ressaltarmos que muitos defendem a parceria entre instituições públicas e instituições privadas no âmbito educacional. Na realidade, do mesmo modo que há grandes redes de empresas gerenciando o Ensino Superior, há também grande interesse de que o Estado financie a Educação Básica e que esta deixe o âmbito das instituições públicas. É a educação sendo avaliada como mercadoria. Trata-se do avanço do neoliberalismo em que o capital passa a defender seus interesses no âmbito educacional, dizimando a educação pública.

Lotta et al. (2021) realizaram uma análise sobre a reforma do Ensino Médio no Brasil e perceberam que, em vez de anseios por mudanças surgirem dos estados, a mudança é provocada no Brasil pela Medida Provisória No 746, de 22 de setembro de 2016 (Brasil, 2016), do Governo Temer (é importante considerar que a BNCC começou a ser implementada no governo Dilma, mas havia, ainda, consulta aos profissionais da Educação). Nos dizeres de Lotta et al. (2021, p. 405): “De um lado, a reforma levou o contexto da política a um alto conflito, na medida em que foi aprovada e estabelecida por um governo não legitimado por uma parcela da sociedade”.

Nesse sentido, o clima de conflito na implementação do Novo Ensino Médio já era previsto, mas não encontramos na literatura reflexões que contribuam para avaliar o motivo da hierarquização das disciplinas, a não ser pensar na questão das considerações externas que focam no aprendizado de Língua Portuguesa e Matemática. Realizadas essas considerações iniciais de discussões teóricas sobre o Novo Ensino Médio e seus impactos na formação das futuras gerações, passamos a destacar a pesquisa que realizamos, iniciando por sua caracterização como pesquisa de natureza qualitativa.

De acordo com a BNCC, o foco da educação deve estar no desenvolvimento de competências, definidas “[…] como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho” (Brasil, 2018, p. 8). As competências, de forma sintética, são: 1. Conhecimento; 2. Pensamento científico, crítico e criativo; 3. Repertório cultural; 4. Comunicação; 5. Cultura Digital; 6. Trabalho e projeto de vida; 7. Argumentação; 8. Autoconhecimento e autocuidado; 9. Empatia e cooperação; 10. Responsabilidade e cidadania.

Em relação aos marcos legais que embasam a BNCC, encontramos o Art. 205 da Constituição Federal de 1988, no qual consta que, para cumprir sua tarefa, a nação brasileira deve fixar conteúdos mínimos para a formação da Educação Básica (Brasil, 1988). Fundamenta também a BNCC o Art. 9º, inciso IV, da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) – Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 –, o qual dispõe que, embora os currículos sejam diversos, as competências e as diretrizes devem ser comuns (Brasil, 1996). A LDB orienta, também, que as aprendizagens essenciais sejam respeitadas em todo o território nacional (Brasil, 1996).

O conceito de competência, amplamente explorado mundialmente no que tange ao desenvolvimento de habilidades a serem desenvolvidas nos educandos, é adotado pela BNCC. Os alunos, segundo a BNCC, devem “saber” e também devem “saber fazer” (Brasil, 2018). Nesse sentido, “[…] a explicação das competências oferece referências para o fortalecimento das ações que assegurem as aprendizagens essenciais definidas na BNCC” (Brasil, 2018, p. 13).

Rompendo com visões reducionistas, a BNCC afirma seu compromisso com a educação integral, promovendo uma formação ampla e favorecendo a democracia e a superação de todo e qualquer preconceito. Diante da pluralidade de ideias e culturas existentes no Brasil, a BNCC trabalha com conteúdos básicos e competências que visem a garantir uma formação mínima e igual a todos os alunos de uma determinada federação. Ao mesmo tempo, respeita as diversidades e as especificidades de cada região. Assim, para cumprir com seus objetivos pedagógicos, a BNCC objetiva, entre outros elementos: contextualização dos conhecimentos; decisão sobre a importância da interdisciplinaridade; avaliação formativa que leve em conta os contextos de aprendizagem; processos permanentes de formação de professores.

Contudo, dentre as críticas à BNCC, Silva (2020) aponta para os conceitos de neoprodutivismo, neoescolanovismo e neoconstrutivismo, que são uma expressão dos impactos neoliberais na educação. Assim, a autora apresenta de que maneira o cenário neoliberal impacta diretamente a reestruturação da educação e retoma ideais tecnicistas da Lei n.º 5.692/1971. A partir de Gramsci, Silva (2020) entende a importância de evitar uma escola dual que seja diferente para ricos e pobres. Nessa perspectiva, temos uma das abordagens de críticos da BNCC e do Novo Ensino Médio, os quais apontam que as escolas particulares continuarão ensinando de forma enfática os conteúdos que são cobrados no vestibular. Nesse sentido, urge ressaltarmos as diferenças e as desigualdades entre aqueles que saem de escolas públicas e os que são egressos do ensino particular.

Limaverde (2015) também denuncia uma falsa promessa de que há um currículo mínimo, composto a partir de perspectivas neoliberais e que “[…] seria o principal catalisador para a promessa de qualificação equitativa para o mercado de trabalho” (Limaverde, 2015, p. 85). A autora, em suas conclusões, apresenta que minorias não foram atendidas, como os quilombolas, os indígenas e outros grupos minoritários na construção da BNCC. A autora critica a matematização do currículo e dos índices das avaliações externas, que não contribuem para a melhoria da educação pública.

Laval (2004, p. 12) destaca que, a partir de 1980, “[…] aparece uma concepção ao mesmo tempo mais individualista e mais mercantil da escola”. Podemos defender, assim, que o advento da BNCC é uma das facetas do predomínio do capital sobre a esfera educacional na medida em que grandes conglomerados capitalistas passam a intervir diretamente na educação. Laval (2004) relata que, a partir de 1950, surgiu, nos Estados Unidos, as universidade-empresa que têm o lucro como meta usando como marketing a “eficiência científica”. Segundo Laval (2004), temos no cenário internacional um “mercado mundial da educação” que defende a todos a ideia de que as escolas são empresas, de que os alunos são clientes e de que o objetivo da instituição escolar e universitária se resume a preparar para o mercado de trabalho.

Realizamos essas considerações críticas em relação à BNCC e as considerações de Laval (2004) para contextualizar conceitualmente o que ocorreu no Paraná com a diminuição das disciplinas de Artes/ Filosofia/Sociologia tem a ver com um processo de instalação de um pragmatismo na seleção de conteúdos a partir do contexto da reforma do Ensino Médio. Tal pragmatismo decorre de uma visão equivocada que considera as instituições escolares como empresas. Nesse sentido, afinal, qual seria a utilidade das disciplinas de Artes/ Filosofia/Sociologia no currículo? Em uma perspectiva neoliberal, nenhuma. Reduz-se a apenas uma aula semanal justamente para fazer que o ensino dessas disciplinas fique comprometido e expanda-se a ideia de que essas disciplinas deveriam desaparecer do currículo.

 

Natureza qualitativa da pesquisa

Esteban (2010), em suas reflexões epistemológicas, entende a dificuldade para estabelecer-se uma definição sobre a natureza da pesquisa qualitativa. Se fizermos uma revisão de literatura acerca dos termos, encontramos entendimentos que implicam um número amplo de abordagens que se intitulam “qualitativas”. Contudo, apesar dessa multifacetada compreensão sobre o que poderia ser entendido como pesquisa qualitativa, Esteban (2010, p. 127) esclarece que:

A pesquisa qualitativa é uma atividade sistemática orientada à compreensão em profundidade de fenômenos educativos e sociais, à transformação de práticas e cenários socioeducativos, à tomada de decisões e também ao desdobramento e desenvolvimento de um corpo organizado de conhecimentos.

Algumas definições de Bogdan e Biklen (1994) sobre as características da pesquisa qualitativa são: na investigação qualitativa a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento principal; a investigação qualitativa é descritiva – os dados recolhidos são em forma de palavras ou imagens e não de números; os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produtos (Bogdan & Biklen, 1994).

A pesquisa foi realizada por meio de um questionário inserido no Google Docs e enviado para aproximadamente 150 professores de Artes/Filosofia/Sociologia, o qual foi respondido por 31 professores. A pesquisa ficou aberta para acolhimento de respostas durante dois meses no segundo semestre de 2021. A coleta dos e-mails dos participantes deu-se pela interação no grupo “Humanidades Paraná” do WhatsApp.

Os critérios de inclusão de participantes da pesquisa efetivaram-se por meio de ser docente, seja concursado ou contratado da Rede Estadual do Paraná, em exercício e em sala de aula durante o ano de 2021. Além das perguntas de caracterização dos sujeitos de pesquisa, as demais questões do questionário foram: 1. Quais os impactos da redução da carga horária da disciplina de Filosofia ou Sociologia ou Artes para a sua atuação docente? 2. Você precisou assumir disciplinas de atuação diversas da sua? Como foi essa experiência? 3. Houve algum diálogo da mantenedora antes da redução da carga horária da disciplina seja Artes/ Filosofia/Sociologia? 4. Quais os impactos na aprendizagem dos alunos nas respectivas disciplinas? 5. Qual é a sua opinião em relação à implementação do Novo Ensino Médio? 6. Qual é sua percepção sobre esse contexto de mudanças no Estado do Paraná?

Após a coleta de dados, a metodologia de análise seguiu a Análise Textual Discursiva (ATD). A categorização dos dados foi mediada pelo software Atlas Ti com a ajuda do qual conseguimos separar os dados em categorias para posterior análise e discussão com a corrente teórica que fundamenta nossa pesquisa. Moraes e Galiazzi (2011, p. 7) propõem uma metodologia discursiva para a análise dos dados que visa a “[…] produzir novas compreensões sobre os fenômenos e discursos”. Procedimentalmente, conforme a metodologia apresentada, temos três momentos: desmontagem dos textos, estabelecimento de relações e captar o novo emergente. Nossa análise foi pautada a partir da divisão dos dados em quatro categorias emergentes, a saber:

·         Categoria 1: Necessidade de selecionar conteúdos/aprendizagem defasada.

·         Categoria 2: Diminuição da capacidade crítica dos estudantes.

·         Categoria 3: Perda da essência da disciplina.

·         Categoria 4: Tempo de aula reduzido impacta na aprendizagem dos estudantes.

 

Caracterização dos sujeitos de pesquisa

Em se tratando da caracterização dos sujeitos de pesquisa, evidenciamos, nas tabelas que seguem, os aspectos da disciplina de atuação, regime de trabalho, tempo que atua como professor e especialização na área em que atua. A Tabela 1 sintetiza a área de atuação dos respondentes da pesquisa.

Tabela 1

Disciplina de atuação dos docentes

Disciplina de atuação

Respondentes

Porcentagem

Sociologia

12

38,7%

Filosofia

11

35,5%

Artes

8

25,8%

Fonte: elaborada pelos autores.

Quanto ao regime de trabalho, prevaleceu o vínculo de concursado, como mostra a Tabela 2.

Tabela 2

Regime de trabalho dos docentes

Regime de trabalho

Respondentes

Porcentagem

Concursado

24

77,4%

Contratado

7

22,6%

Fonte: elaborada pelos autores.

O tempo que atua como professor foi outro elemento questionado aos professores respondentes. Nenhum docente afirmou período inferior a cinco anos; os demais, em ordem decrescente de respondentes, afirmaram do modo como mostra a Tabela 3.

Tabela 3

Tempo de atuação dos docentes

Tempo que atua

Respondentes

Porcentagem

Entre 5 e 10 anos

12

38,7%

Entre 10 e 15 anos

9

29%

Entre 15 e 20 anos

4

12,9%

Mais de 25 anos

4

12,9%

Entre 20 e 25 anos

2

6,5%

Fonte: elaborada pelos autores.

Um elemento importante evidenciado na caracterização dos sujeitos da pesquisa é que a totalidade dos professores possui Licenciatura na disciplina em que está atuando, o que exemplifica a relevância do curso para a respectiva docência. No cenário da Filosofia e da Sociologia, quando do seu retorno à grade curricular, constataram-se, inicialmente, poucos professores habilitados para atuar na disciplina, assim, diante de tal cenário, verifica-se melhora do quadro no âmbito da formação na própria disciplina. Por um lado, é notório que os docentes atuam nas áreas de sua formação específica, sendo um aspecto positivo da educação no Paraná; por outro lado, a redução drástica da disciplina de Artes/Filosofia/Sociologia desmotiva os docentes no seu processo de desenvolvimento profissional.

Quanto à questão de ser licenciado e especialista na área em que atua, 26 participantes responderam que sim (83,9%), e cinco participantes responderam que não (16,1%). Percebemos, assim, que, além de serem licenciados nas respectivas áreas de atuação, os professores possuem, em sua grande maioria, especialização.

 

Apresentação de resultados

Emergiram da análise dos dados quatro categorias, como apontamos anteriormente. Trataremos inicialmente da primeira categoria: Necessidade de selecionar conteúdos/aprendizagem defasada. Nessa categoria, veremos a percepção dos professores de Artes/Filosofia/Sociologia que avaliam como extremamente negativa a diminuição da carga horária das referidas disciplinas, não apenas tendo em vista a questão do próprio desenvolvimento profissional docente, como também os resultados negativos na aprendizagem dos alunos. Segundo os professores, no contexto de apenas uma aula por disciplina semanal, fica muito difícil dar continuidade aos estudos. Com base nos dizeres a seguir, a decisão sem consulta à comunidade escolar de reduzir as aulas das disciplinas citadas acabou impactando diretamente a qualidade da aprendizagem dos alunos.

P1: Com apenas uma aula semanal e associado à própria pandemia fica muito difícil dar conta de todas as demandas curriculares. Assim, me vejo tendo que selecionar” alguns conteúdos em detrimento de outros.

P4: Aprendizagem fragmentada, superficial.

P5: Formação prejudicada. Aulas menos interativas e dialogadas… mais rasas. Maior descaso com a disciplina.

P6: A aprendizagem ficará defasada. E isso gerará um impacto na formação do aluno enquanto ser, enquanto cidadão.

P8: Os alunos não terão acesso e/ou o aprofundamento em diversos conteúdos de Artes e/ou técnicas artísticas.

P10: A redução das disciplinas afetou muito o processo de aprendizagem, pois criou uma barreira ao envolvimento dos estudantes às situações de aprendizagem propostas. A aprendizagem requer tempo, então, quando isso lhe é retirado, os impactos são imensos.

Percebemos, pelos dizeres dos professores, a inviabilização da aprendizagem das disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia com essa atitude da mantenedora durante o ano de 2021. Conforme nos diz P10, os impactos são imensos e a aprendizagem ficará comprometida. Nesse sentido, ressaltamos a contribuição dessas disciplinas na formação do pensamento crítico das futuras gerações.

Koepsel et al. (2020) criticam a hierarquização das disciplinas sem uma fundamentação epistemológica das justificativas para se priorizar algumas disciplinas em detrimento de outras. A ênfase em formar para o mercado de trabalho constitui um forte indício de que há a possibilidade de uma escola média dual em que se forme para o mercado de trabalho, de forma imediata, os mais pobres, na escola pública; e, na rede particular, se formem as futuras gerações para estudar nas universidades. O sistema neoliberal cria constantes situações de desigualdade para os mais pobres, e, com o falso slogan do protagonismo juvenil, será atribuído aos alunos “[…] as consequências perversas dessa tendência que estariam debitadas ao próprio sujeito jovem ‘pela escolha’ equivocada de determinado ‘projeto de vida’” (Koepsel et al., 2020, p. 11). Esclarecemos que, com a implementação do Novo Ensino Médio, as disciplinas de Artes/ Filosofia/Sociologia continuarão com uma carga horária inferior em relação a que tinham antes da proposto do Novo Ensino Médio: de seis aulas que tinham no Ensino Médio na atual conjuntura do Paraná, em 2022, há apenas duas obrigatórias – uma redução considerável.

Em se tratando da segunda categoria, a qual versa sobre a diminuição da capacidade crítica dos estudantes, percebemos a importância das disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia na contribuição a todas as outras disciplinas para formar cidadãos críticos que tenham condições de olhar para o mundo de forma que vá além do senso comum. Vale ressaltarmos que todas as disciplinas do currículo possuem o potencial de despertar o jovem para a consciência crítica, mas, de modo específico, as disciplinas em referência nesta pesquisa têm uma contribuição toda particular na formação do espírito crítico das futuras gerações. A grande pergunta que fica é a seguinte: Por que apenas elas tiveram sua carga reduzida? Os dizeres dos professores sobre essa categoria foram:

P2: Diminuição de capacidade de argumentação e senso crítico.

P12: […] especialmente nesta conjuntura política, os alunos perdem a oportunidade de aprimorarem seu olhar crítico sobre a realidade.

P13: Baixa reflexão por parte dos alunos que passam a ter menos tempo de aulas provocativas ao pensamento.

P15: Na concepção da minha área, temos estudantes atualmente com medo de falar em público, visão estética prejudicada sem saber como lidar, e com corpos bem mais atrofiados com relação ao movimento.

P18: Desconsideração e redução do tempo implica a redução do conteúdo e da formação crítica também. O impacto é negativo porque diminui o acesso à disciplina.

P20: Menos conhecimento… menos capacidade reflexiva… mais afastamento científico.

P22: A parte cognitiva e crítica fica prejudicada por essa redução.

P27: Eu penso na Sociologia como um espaço de reflexão de questões do mundo. É muito mais do que repasse de conceitos. Muitos de meus colegas utilizam esse espaço da sala de aula dessa maneira. Nesse sentido, a maior perda é esse espaço reflexivo, maior que conteudismo. No ano anterior ao corte dessas disciplinas, já colocaram apenas uma aula por semana no classroom. E rendeu, deram conta de todo o conteúdo. Mas com aquela interação remota, não tinha espaço para projetos, para debates, para entender a realidade que os estudantes trazem, não tinha ambições de rever o espaço, de transformações. Isso que perde mais. Esse ano mesmo, eles chegaram a selecionar nomes para o Projeto de Equipe Multidisciplinar, o projeto na escola que trata de uma formação contínua para os professores sobre o ensino da história das populações pretas e indígenas. Eles só chamaram, mas não fizeram nada, nem testes para preencher online, nada de nada. É um esvaziamento completo do espaço escolar interativo e reflexivo.

Pelos dizeres dos professores dessa categoria, percebemos o quão negativa foi a redução da carga horária de Artes/Filosofia/Sociologia, sobretudo no sentido do quanto essas disciplinas contribuem para o aprimoramento crítico dos estudantes do Ensino Médio. Corremos riscos de um novo totalitarismo (tendo em vista a escolha da razão instrumental em detrimento da crítica) no mundo, e essas disciplinas, tão relevantes quanto as outras do currículo, são um antídoto para que os alunos se formem como sujeitos alienados e que contribuam para uma análise crítica da sociedade, evitando formas de pensar totalitaristas e de desrespeito à dignidade da pessoa humana.

Jolandek et al. (2021) apresentam que, mesmo em relação à implementação da BNCC no que se refere à disciplina de Matemática, há grandes desafios a serem superados. Se essa pesquisa revelou discrepâncias na adaptação dos conteúdos de Matemática, que é uma disciplina obrigatória na BNCC, podemos imaginar o quão arbitrário foi em relação às disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia, cuja redução ocorreu já antecipadamente no Paraná no ano de 2021. Os pesquisadores citam o fato de que os conteúdos disciplinares de Matemática foram alinhados àquilo que é cobrado nas avaliações de larga escala. Talvez esse seja também o motivo pelo qual as três disciplinas, cujas presenças no currículo estamos discutindo, foram reduzidas drasticamente sem nenhuma reflexão com a comunidade escolar no Paraná durante 2021.

Na sequência, sobre a terceira categoria, que diz respeito à perda da essência da disciplina, os professores de Artes/Filosofia/Sociologia tiveram, em 2021, um mínimo de aulas em que deveriam, ainda, realizar duas avaliações e recuperações durante o trimestre. Evidenciamos, assim, que as referidas disciplinas dispõem de tempo exíguo para o desenvolvimento do conteúdo, sendo muito prejudicadas, perdendo sua essência como saber. Não é nosso foco apenas defender essas disciplinas de forma isolada, mas expressar que o conjunto do currículo com os diversos saberes que precisam ser preservados para que predomine o respeito pela formação integral dos estudantes. A seguir, os dizeres dos professores cujas falas foram integradas à terceira categoria:

P3: A arte, em muitos momentos, em que fez parte do currículo, esteve na sala de aula como momento de criação e expressão, e isso era o seu diferencial em comparação a outras disciplinas. Sem esses momentos, perde-se a essência da arte.

P7: Ficaram frustrados porque, quando o assunto da aula engrena e se torna interessante, a aula acaba. É tudo muito corrido e sentem falta do calor das discussões acerca dos conteúdos. Certamente estão aprendendo menos, mas é difícil comprovar com dados, já que estamos numa pandemia e somos praticamente forçados a dar aula.

P11: […] uma defasagem cognitiva intelectual relacionada aos problemas sociais, morais etc.

P23: É grande, pois os conteúdos têm que ser repassados de uma forma muito reduzida. Isso diminui a capacidade de absorção por parte dos alunos.

P26: Diminuiu o contato do aluno com os professores de Artes, os conteúdos precisam ser trabalhados de forma superficial, pois o tempo que antes tínhamos em sala de aula foi reduzido.

Observamos, nessa categoria, a percepção dos professores quanto à defasagem na aprendizagem por parte dos estudantes nas disciplinas de Artes/Filosofia/Sociologia em decorrência da redução da carga horária em 2021 no Paraná. Os conteúdos acabaram sendo repassados de forma reduzida. Os docentes não conseguiram trabalhar todos os conteúdos previstos para cada série, tendo em vista que a jornada de trabalho foi reduzida em 50%. Além disso, vale ressaltarmos o desgaste dos professores (embora não seja objeto deste artigo essa questão) em poderem atender às demandas de 30 turmas com aulas de Filosofia. Considerando 40 alunos por turma, cada professor, para assumir 40 horas de aula, fica responsável por 1.200 alunos. É condição que desumaniza e é, pedagogicamente, inviável.

Assim sendo, como entender tais mudanças no cenário do currículo na educação pública do Paraná? Adrião e Peroni (2018) afirmam que tais mudanças estão pautadas pelos interesses do neoliberalismo e dos diversos institutos privados que argumentam estar defendendo os interesses educacionais, mas, na realidade, defendem os interesses do capitalismo neoliberal. Há diversos grupos educacionais que tratam a educação como uma mercadoria, que já estão presentes no Ensino Superior e que têm interesse em atuar também na Educação Básica. É comum em diversas reportagens sobre o Novo Ensino Médio, na TV, representantes de institutos defendendo-o. Assim sendo, faz-se necessário, por parte dos professores da rede pública, uma resistência a esse movimento que busca apropriar-se da educação pública para interesses corporativos.

A partir das reflexões realizadas por Adrião e Peroni (2018), percebemos que é de suma importância uma visão crítica ao analisarmos os motivos da redução da carga horária de Artes/Filosofia/Sociologia, porque são disciplinas, juntamente a outras, que provocam o pensamento e instigam o pensamento crítico sobre a sociedade. Gostaríamos de ressaltar que entendemos a relevância de todas as disciplinas contribuírem para o desenvolvimento crítico do futuro cidadão, porém compreendemos que Artes/Filosofia/Sociologia, por sua própria trajetória, são disciplinas que, uma vez reduzidas no currículo, acabam por impactar diretamente no conjunto de saberes de todas as disciplinas com vistas à formação de cidadãos críticos e comprometidos com a transformação social.

Na quarta categoria, agrupamos as falas dos participantes no sentido de um entendimento prático de que a redução do tempo de aula acabou impactando a aprendizagem dos estudantes, tendo em vista a carga horária reduzida e os conteúdos, atropelados.

P9: Principalmente no Ensino Médio, o tempo de aula é extremamente reduzido. Contando o período de fazer chamada, organizar a sala, semanas de provas, o tempo para o desenvolvimento de práticas e para ministrar conteúdos foi imenso. Impossível dar conta do currículo proposto pelo estado e os alunos, consequentemente, aprendem menos e, também, se envolvem menos com as respectivas disciplinas e suas práticas. Tempo é fundamental para a aprendizagem. Os alunos especiais têm ainda mais dificuldade quanto a isso tudo.

P14: Eles não têm tempo de qualidade com o professor e para desenvolver trabalhos aprofundados nas disciplinas.

P16: Muito complicado uma aula por semana, não dá para fazer nada.

P17: Total, impossível trabalhar o mínimo dos conteúdos numa aula de 50 minutos quando a metade dela também fica na burocracia.

P19: Comprometeu muito a aprendizagem. Os debates que costumava fazer foram suspensos.

P21: Redução de conteúdos, dificuldade de aproximação com os alunos, não sobra tempo para trabalhar os conteúdos, já que são cinco aulas por trimestre só para avaliar; o que sobra mal gera tempo pra conteúdos, aprofundar discussões, gerar debates ou fazer trabalhos que desenvolvam habilidades diversas, como comunicação, produção, criatividade. Com a quantidade absurda de alunos, não dá pra fazer atividades discursivas ou dialogadas. Avaliações passam a ser apenas objetivas.

P24: Tudo está muito corrido, por isso os alunos não possuem tempo para absorver o conteúdo proposto.

P25: Dificuldade em organizar aulas que melhorem o processo educativo por falta de tempo.

P28: […] superficialidade dos conteúdos.

P29: Além dos impactos causados pela pandemia, é notória a defasagem de conteúdos, pois os estudantes que estavam no segundo ano, por exemplo, tinham em sua grade a perspectiva de duas aulas no terceiro ano, o que ocasiona em adaptações tacanhas para tentar cumprir o que foi programado. Os primeiros anos acabam começando em defasagem, o que demonstra que, em médio prazo, há um prejuízo de conteúdos, e, em longo, na formação desses indivíduos.

P30: Novamente uma aprendizagem fraca.

P31: […] eles estão reclamando de ser apenas uma aula semanal.

Os dizeres dos professores dessa categoria apontam no sentido da importância de se perceber que se despende tempo em sala com a chamada e outras organizações burocráticas. Assim sendo, o tempo de aula acaba ficando bastante reduzido. Além disso, com a redução de duas aulas para uma aula semanal, a carga horária de Artes/Filosofia/Sociologia acabou impactando diretamente a aprendizagem artística, filosófica e sociológica. Nesse contexto, a partir do referencial teórico apresentado, constatamos o quanto a redução da carga horária de algumas disciplinas em detrimento do aumento de outras deixou o currículo empobrecido devido à desvalorização das Ciências Humanas no ano de 2021 no Estado do Paraná e, por consequência, o desenvolvimento crítico dos estudantes.

Lotta et al. (2021) apresentam-nos considerações importantes na perspectiva de que a implementação da reforma do Ensino Médio que está em curso não procedeu da vontade popular, mas, sim, de uma medida provisória do Governo Temer. A quem interessaria uma redução na carga horária de disciplinas que estimulam a criatividade e o senso crítico? Embasado em quais fundamentos teóricos, propôs-se o que já comentamos sobre a hierarquização das disciplinas? As respostas a essas perguntas não encontramos na literatura recente da divulgação do Novo Ensino Médio.

 

Considerações finais

Com este estudo, constatamos que os encaminhamentos da implementação do Novo Ensino Médio no Paraná que vêm sendo realizados são extremamente impositivos, sem diálogo com a comunidade escolar. Todas as disciplinas são importantes, inclusive Artes/Filosofia/Sociologia. Nesse sentido, a partir dos dados da pesquisa, apontamos que a redução da carga horária dessas disciplinas proporciona grandes problemas futuros na formação das futuras gerações. Conforme os resultados da pesquisa empírica respondida por 31 professores, discutida neste artigo, percebemos que já são sentidos os resultados de tal redução que impactam diretamente na formação crítica das futuras gerações. A BNCC é um documento com força legal, normatizador, existindo uma margem de flexibilidade para cada estado da Federação atuar no momento da aplicação no seu respectivo sistema de ensino. No caso do Paraná, em 2021, tivemos a redução da carga horária de Artes/Filosofia/Sociologia para apenas uma aula semanal. Os impactos na aprendizagem foram evidenciados nos resultados da presente pesquisa, tendo em vista que apenas com uma aula semanal no Ensino Médio a aprendizagem dessas disciplinas fica totalmente comprometida.

Consideramos Matemática e Língua Portuguesa centrais e importantes na formação das futuras gerações, mas também não podemos, de forma alguma, desvalorizar as outras disciplinas. O currículo, em seu conjunto, possui uma importância peculiar; assim, não podemos valorizar algumas disciplinas em relação a outras. No contexto do atual neoliberalismo em que vivemos, com o avanço da voracidade do capitalismo, temos uma situação em que se evidencia que alguns nasceram para estudar apenas para atender às demandas do mercado de trabalho, e outros nasceram com situação financeira melhor, os quais terão a oportunidade de uma formação mais ampla para poderem continuar seus estudos em universidade. Por conseguinte, defendemos, em uma sociedade democrática, a superação de qualquer dualismo estudantil e, assim, as condições de igualdade de oportunidade.

Enfim, acompanhamos os desdobramentos dos impactos da implementação da BNCC nas diversas unidades da Federação com a perspectiva de uma análise crítica, tendo em vista o que aqui ficou evidenciado de uma hierarquização das disciplinas que compromete a integralidade do currículo. Todas as disciplinas possuem um caráter crítico, mas, de modo especial, a Artes/Filosofia/Sociologia, uma vez reduzidas drasticamente no Ensino Médio, acabam por colocar em risco a própria formação integral de sujeitos críticos.

 

Referências

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[i] Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (2019). Professor da Rede Estadual de Filosofia no Estado do Paraná da Universidade Estadual do Norte do Paraná - campus Jacarezinho.

[ii] Doutora em Ensino de Ciências e Educação Matemática pela Universidade Estadual de Londrina (2011). Professora do Departamento de Matemática e Estatística da Universidade Estadual de Ponta Grossa.

[iii] Bacharel em Direito pelas Faculdades Integradas de Ourinhos (2014). Professora virtual da UNEAC Cursos e da Rede Estadual do Paraná.