Traduzindo tolo:

“eu canto o que ela cantou que ele disse que...” ou “quando cantamos somos todas hipermulheres”

Autores

  • Bruna Franchetto Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

DOI:

https://doi.org/10.1590/2316-4018532

Resumo

Entre os Karib alto-xinguanos, povo ameríndio incluído no Alto Xingu, sistema regional multilíngue da periferia da Amazônia meridional, tolo é a festa, a dança e os cantos executados exclusivamente por mulheres. Os cantos tolo formam um complexo ritual e musical em contraste/complementaridade com as flautas kagutu, domínio masculino e interditas às mulheres. Os tolo são curtos poemas cantados, em que, no lugar do nome de um itseke (“hiperser”), chamado ou nomeado pela flauta kagutu, é cantado o nome de um amante/amado humano. Os tolo são, assim, versões musicais profanas das peças kagutu. Neste artigo, são retomados trabalhos anteriores, agora focando a estrutura paralelística e recursiva desses cantos, cujos “textos”, em língua karib alto-xinguana, são pinceladas narrativas de eventos, sentimentos e paixões que perpassam a vida cotidiana das mulheres (e dos homens) numa aldeia da Amazônia meridional. Exemplos retirados de um vasto repertório, internamente complexo, coletado entre os Kuikuro, de quase 400 cantos ilustram o trabalho de transcrição e de tradução possível, embora árduo, desta arte vocal ameríndia.

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Publicado

12/27/2017

Como Citar

Franchetto, B. (2017). Traduzindo tolo:: “eu canto o que ela cantou que ele disse que.” ou “quando cantamos somos todas hipermulheres”. Estudos De Literatura Brasileira Contemporânea, (53), 23–43. https://doi.org/10.1590/2316-4018532