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Percepção de Pais/Mães Separados(as) Sobre Guarda e Convivência Durante a Pandemia

Divorced Parents’ Perceptions of Child Custody and Contacts During the Pandemic

Resumo

A pandemia de Covid-19 impactou as formas de interação em diversos contextos sociais. Qual terá sido o seu impacto sobre os regimes de guarda e convivência dos(as) filhos(as) de pais/mães separados(as)? Este estudo qualitativo-exploratório investigou, por meio de uma análise temática, como 119 pais e mães separados(as) perceberam esse impacto durante a primeira onda da pandemia em 2020. Observaram-se alterações nas dinâmicas de comunicação e inter-relação coparentais. Os resultados também indicam que a capacidade dos pais e mães separados(as) para se adaptarem às limitações da pandemia e suas consequências estiveram bastante ligadas às dinâmicas de funcionamento coparental preexistentes à pandemia. Além disso, observou-se também que os principais impactos (i.e., na convivência e cuidados com os(as) filhos(as) parecem ter afetado mais as mães do que os pais.

Palavras-chaves:
Covid-19; Pandemia; Custódia da criança; Divórcio; Análise temática

Abstract

The pandemic has impacted the ways in which people interact. Which impacts the pandemic might have brought about in regards to child custody and contacts arrangements? Through a thematic analysis, this qualitative and exploratory study investigated how 119 separated parents perceived this impact. Results address the impacts of the pandemic on child custody and contacts arrangements, especially regarding coparental communication. They also outline that the separated parents’ ability to adapt themselves to the pandemic restrictions, and their consequences. This ability was very linked to pre-existing coparental dynamics. Also, this paper discusses how the main impacts (i.e., maintaining contacts and caring for children) seemed to impact mothers more than fathers.

Keywords:
COVID-19; Pandemic; Child Custody; Divorced parents; Thematic analysis

A pandemia de Covid-19 atinge todo o mundo há mais de dois anos. No Brasil, ela começou a se instaurar a partir de fevereiro de 2020. Com o avanço da pandemia, os cuidados sanitários e a necessidade de isolamento e distanciamento sociais passaram a impactar de forma significativa todas as áreas da nossa vida (Silva et al., 2020Silva, I. M. D., Schmidt, B., Lordello, S. R., Noal, D. D. S., Crepaldi, M. A., & Wagner, A. (2020). As relações familiares diante da COVID-19: recursos, riscos e implicações para a prática da terapia de casal e família.Pensando familias,24(1), 12-28.). Entre as questões de mais difícil manejo durante os tempos de pandemia está a garantia dos melhores interesses da criança/adolescente, em especial na atuação dos serviços de proteção (Toros & Falch-Eriksen, 2020Toros, K., & Falch-Eriksen, A. (2020). A child’s right to protection during the COVID-19 crisis: an exploratory study of the child protective services of Estonia.Children and Youth Services Review,119, 1-10. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2020.105568
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). A garantia desses interesses parece ser ainda mais desafiadora quando se pensa nos regimes de guarda e convivência dos(as) filhos(as) de pais/mães separados(as).

A manutenção dos regimes de guarda e convivência atende tanto aos direitos parentais quanto aos direitos dos(as) filhos(as). O artigo 1.634 do Código Civil Brasileiro estabelece o ‘poder familiar’ e concede aos(às) genitores(as) a premissa de guarda e convivência com os seus filhos. Já o artigo 227 da Constituição Federal garante o direito à convivência familiar e comunitária às crianças/adolescentes. Esses direitos fundamentais também são vistos, tanto por profissionais jurídicos quanto psicossociais, como um elemento basilar para o desenvolvimento biopsicossocial congruente das crianças/adolescentes (Machado & Cerutti, 2020Cerutti, E., & Machado, R. M. S. M. (2020). A convivência familiar como pressuposto inadiável para o desenvolvimento saudável dos filhos - o estado da arte brasileiro e as decisões judiciais em tempos de pandemia.Sociedad e Infancias, (4), 263-266.; Mendes & Ormerod, 2019Mendes, J. A. A., & Ormerod, T. (2019). O princípio dos melhores interesses da criança: uma revisão integrativa de literatura em Inglês e Português. Interação em Psicologia, 24, 1-22. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v24i0.45021
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; Mendes et al., 2020Mendes, J. A. A., Lordello, S. R., & Ormerod, T. (2020). Uma proposta de compreensão bioecológica do princípio dos melhores interesses da criança/adolescente nos casos de disputa de guarda. In: J. A. A. Mendes, & J. S. N. F. Bucher-Maluschke (Eds.), Perspectiva Sistêmica e Práticas em Psicologia: temas e campos de atuação (pp. 53-78). Editora CRV: Curitiba.; Nahas & Antunes, 2020). Contudo, a manutenção da guarda e convivência entre pais/mães separados(as) e seus/suas filhos(as) é atravessada pelas limitações e restrições sanitárias impostas, mas também pelas dinâmicas familiares disfuncionais que já existiam antes mesmo da pandemia e que acabaram se intensificando, em alguns casos.

As famílias com pais/mães separados(as) passaram por adaptações para que a convivência com os filhos pudesse ser mantida durante a pandemia. As principais adaptações que as famílias com pais/mães separados(as) tiveram que estabelecer para que a convivência com os filhos pudesse ser mantida foram: a) utilização de tecnologias (redes sociais e videochamadas); e b) novos arranjos para a divisão do tempo e dos cuidados com os filhos (McBratney, 2020McBratney, M. (2020). How to stay-at-home when you have two homes: COVID-19’s effect on co-parenting and child custody.J. Am. Acad. Matrimonial Law.,33(1), 225-248. https://heinonline.org/HOL/P?h=hein.journals/jaaml33&i=237
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; Marzagão, 2020Marzagão, S. (2020). Direito de família e pandemia: tempo de reflexão e transformação. AASP, 17 abril 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.aasp.org.br/em-pauta/direito-de-familia-e-pandemia/ . Acesso em: 5 agosto 2021.
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; Menezes & Amorim, 2020Menezes, J. B., & Amorim, A. M. A. (2020). Os impactos do COVID-19 no direito de família e a fratura do diálogo e da empatia. Civilistica, 9(2), 1-35.; Moura & Colombo, 2020Moura, Li. C., & Colombo, M. B. S. (2020). Exercício do direito à convivência familiar em situações extremas: princípio do melhor interesse da criança e colisão de direitos fundamentais. In: A. L. M. Nevares , M. P. Xavier , & S. F. Marzagão (Eds.), Coronavírus: impactos no direito de família e sucessões (pp. 201-211). Editora Foco. ; Smyth et al., 2020Smyth, B. M., Moloney, L. J., Brady, J. M., Harman, J. J., & Esler, M. (2020). COVID‐19 in Australia: impacts on separated families, family law professionals, and family courts.Family Court Review,58(4), 1022-1039. https://doi.org/10.1111/fcre.12533
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). Porém, a forma e a medida dessas adaptações ainda não é consenso entre os operados do Direito e nem entre os profissionais psicossociais. Isso se deve ao fato de que a pandemia e o estudo sistematizado das suas consequências jurídicas e psicossociais ainda estão em devir.

A escassa literatura disponível parece assumir uma posição dicotômica em relação às alterações nos regimes de guarda e convivência durante a pandemia. De um lado, alguns defendem que o bem-estar biofisiológico da criança/adolescente deve ser preservado tanto quanto a manutenção dos contatos com ambos os genitores, especialmente o não residente ou não guardião (Marzagão, 2020Marzagão, S. (2020). Direito de família e pandemia: tempo de reflexão e transformação. AASP, 17 abril 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.aasp.org.br/em-pauta/direito-de-familia-e-pandemia/ . Acesso em: 5 agosto 2021.
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; Menezes & Amorim, 2020Menezes, J. B., & Amorim, A. M. A. (2020). Os impactos do COVID-19 no direito de família e a fratura do diálogo e da empatia. Civilistica, 9(2), 1-35.; Moura & Colombo, 2020Moura, Li. C., & Colombo, M. B. S. (2020). Exercício do direito à convivência familiar em situações extremas: princípio do melhor interesse da criança e colisão de direitos fundamentais. In: A. L. M. Nevares , M. P. Xavier , & S. F. Marzagão (Eds.), Coronavírus: impactos no direito de família e sucessões (pp. 201-211). Editora Foco. ). Já outros defendem que, tendo como foco os melhores interesses da criança/adolescente, qualquer deslocamento e/ou interação que possa colocar a criança/adolescente em risco devem ser evitados, ainda que isso afete os direitos parentais de um(a) dos(as) genitores(as) (Simão, 2020Simão, J. F. Direito de família em tempos de pandemia: hora de escolhas trágicas. IBDFAM, 7 abr. 2020. Disponível em: Disponível em: https://ibdfam.org.br/artigos/1405/Direito+de+fam%c3%adlia+em+t%20empos+de+pandemia:+hora+de+escolhas+tr%c3%a1gicas.+Uma+reflex%c3%a3o+de+7+de+abril+%20de+2020%22 . Acesso em: 5 agosto 2021.
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). Em alinhamento com essa segunda posição, a Senadora Soraya Thronicke (PSL/MS) propôs o projeto de lei nº 1.627 de 2020, o qual estabelece, entre outras coisas, parâmetros para a manutenção dos regimes de guarda e convivência - o projeto foi retirado de pauta para que possa ser melhor discutido. Como visto, essa questão ainda não é pacífica nos meios político e jurídico - para discussões mais aprofundadas a este respeito, vide Oliveira (2020Oliveira, M. R. H. (2020). Medidas de exceção na pandemia para causas permanentes da família e suas repercussões no futuro.Revista Brasileira de Direito Civil-RBDCivil,24(2), 227-239.).

Outro fator dificultador para a manutenção efetiva dos contatos entre pais/mães separados(as) e seus/suas filhos(as) durante a pandemia é o fato de algumas famílias ainda manterem uma dinâmica conflitiva e litigiosa mesmo depois de uma decisão judicial. A literatura aponta que a manutenção dos conflitos, mesmo após a separação e com repetidas ações judiciais, pode indicar a dificuldade de a família superar a separação conjugal. Assim, a manutenção desses conflitos serviria como uma forma de bloqueio emocional para evitar o enfrentamento da crise desenvolvimental que a separação conjugal representa (Antunes et al., 2010Antunes, A. L. M. P., Magalhães, A. S., & Féres-Carneiro, T. (2010). Litígios intermináveis: uma perpetuação do vínculo conjugal?.Aletheia, (31), 199-211.; Barbosa et al., 2021Barbosa, L. P. G; Mendes, J. A. A., & Juras, M. M. (2021). Dinâmicas disfuncionais em casos de disputa de guarda e alegações de alienação parental na Justiça: uma compreensão sistêmica. Nova Perspectiva Sistêmica, 30(69), 78-95. https://doi.org/10.38034/nps.v30i69.612
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; Maciel et al., 2021Maciel, S. B.; Mendes, J. A. A.; & Barbosa, L. P. G. (2021). Visão sistêmica e sobre os pressupostos de alienação parental na prática clínica individual e familiar. Nova Perspectiva Sistêmica, 30(69), 62-77. https://www.doi.org/10.38034/nps.v30i69.611
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; Mendes & Bucher-Maluschke, 2017Mendes, J. A. A. , & Bucher-Maluschke, J. S. N. F. (2017). Destructive divorce in the family life cycle and its implications: criticisms of parental alienation. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 33(2), 1-8. https://doi.org/10.1590/0102.3772e33423
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). Essa dinâmica pode ser intensificada pela situação da pandemia, levando a prejuízo para os melhores interesses da criança/do adolescente (Silva & Dias, 2020Silva, I. L. D. O., & Dias, J. E. C. (2020). Direito à convivência familiar na pandemia do Coronavírus (SARS-CoV-2).Brazilian Journal of Development, 6(12), 98777-98786. https://doi.org/10.34117/bjdv6n12-387
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).

Passados mais de dois anos de pandemia, todas essas questões ainda impõem um desafio para a prática dos operadores do Direito e para os profissionais psicossociais, mas principalmente para os(as) pais/mães separados(as) e seus/suas filhos(as). Diante desse cenário, este estudo objetivou explorar como esses pais/mães perceberam os impactos da pandemia de Covid-19 nos contatos coparentais e nos regimes de guarda e convivência com os(as) filhos(as). Mais especificamente, buscou-se explorar: a) como os pais/mães separados(as) mantiveram os arranjos de guarda e convivência com os seus filhos(as) durante a pandemia; e b) se aspectos da dinâmica ex-conjugal e da coparental estiveram envolvidos no processo de manutenção dos regimes de guarda e convivência durante a pandemia. Este artigo apresenta a parte qualitativa de uma pesquisa de método misto (com coleta concomitante de dados quantitativos e qualitativos), realizada por meio de survey online. Para acessar os resultados quantitativos da pesquisa, vide Mendes et al. (2022Mendes, J. A. A., Fukuda, C., & Hernandez, J. A. E. (2022). O impacto da pandemia nos regimes de guarda e convivência dos filhos de pais/mães separados(as) [manuscrito não publicado] School of Psychology, University of Sussex.).

Método

O delineamento deste estudo foi exploratório, descritivo e qualitativo. Esse tipo de delineamento é adequado para o estudo de temas novos e/ou negligenciados pela literatura (Hunter et al., 2019Hunter, D., McCallum, J., & Howes, D. (2019). Defining Exploratory-Descriptive Qualitative (EDQ) research and considering its application to healthcare.Journal of Nursing and Health Care, 4(1). https://doi.org/10.5176/2345-7198_4.1.202
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), como é o caso dos impactos psicossociais da pandemia de Covid-19. Participaram deste estudo 119 pais e mães separados(as) e residentes no Brasil. Para a participação no estudo, era preciso ser pai/mãe separado(a) e com algum regime de guarda e convivência estabelecido.

Caracterização dos(as) Participantes

Declararam-se como ‘mulher’ 73% (n = 81) dos(as) participantes. A média de idade foi de 38 anos (DP = 6). A média de idade do último filho gerado na relação conjugal desfeita foi de 7,5 anos (DP = 4,5). Os(as) filhos(as) adolescentes (i.e., entre 12 e 18 anos de idade) figuraram em 16% (n = 19) dos casos. Os estados de residência dos participantes foram: Distrito Federal (n = 56; 47%), São Paulo (n = 22; 18%), Goiás (n = 14; 12%), Rio Grande do Sul (n = 7; 6%), Pará e Pernambuco (n = 5; 4% cada), Rio de Janeiro (n = 4; 3%), Bahia e Santa Catarina (n = 2; 2% cada), Minas Gerais e Paraíba (n = 1; 1% cada). A Tabela 1 apresenta outros dados socioeconômicos relevantes que indicam as características dos(as) participantes deste estudo:

Tabela 1.
Dados Socioecômicos dos(as) Participantes do Estudo

Instrumentos, Procedimentos e Coleta de Dados

Os dados textuais utilizados para a produção dos resultados apresentados neste estudo foram obtidos a partir de respostas geradas por meio de perguntas abertas, que fizeram parte de um survey transversal online e gerado no Google Forms. A aplicação ocorreu entre maio e junho de 2020, durante a primeira onda de Covid-19 no Brasil. As perguntas abertas foram: a) de modo geral, como você acha que a situação da pandemia e isolamento social impactaram o arranjo de guarda e convivência com o(a) seu filho(a)?; b) se você respondeu que a dinâmica dos contatos com o(a) outro(a) genitor(a) - por exemplo, conversas, troca de mensagens, comunicação em geral - “mudou pouco” ou “mudou bastante” após a pandemia, por favor, explique; c) se você respondeu que o regime de guarda e convivência com o(a) seu/sua filho(a) (por exemplo, regras, horários, divisão do tempo, etc.) “mudou pouco” ou “mudou bastante” após a pandemia, por favor, explique; 4) se você respondeu que os seus direitos parentais relativos à guarda ou à convivência com o(a) seu/sua filho(a) “foram um pouco” ou “bastante afetados” após a pandemia, por favor, explique; e d) se você respondeu que “Sim”, houve um impacto financeiro na “pensão alimentícia” do(a) seu/sua filho(a), por favor, explique.

A aplicação do survey foi online. Os participantes tiveram acesso a um link que foi compartilhado nas redes sociais (WhatsApp e Facebook). Ao acessar o link, os participantes obtiveram informações mais detalhadas sobre o estudo, os objetivos e critérios de inclusão. Após conhecerem os objetivos do estudo e obterem mais informações sobre a pesquisa e suas implicações, os participantes consentiram a participação na pesquisa e responderam ao questionário. Todo o processo de coleta e análise de dados seguiu os princípios éticos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

Análise dos Dados

Os dados coletados foram analisados por meio de uma análise temática. De modo geral, esse método de análise dedica-se à busca por padrões presentes nos dados textuais, o que leva a um processo de análise destinado a identificar, organizar e interpretar esses padrões por meio da criação de ‘temas’ (Boyatzis, 1998Boyatzis, R. E. (1998).Transforming qualitative information: Thematic analysis and code development. Sage.; Braun & Clarke, 2006Braun, V., & Clarke, V. (2006). Using thematic analysis in psychology. Qualitative Research in Psychology, 3(2), 77-101. https://doi.org/10.1191/1478088706qp063oa
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, 2013Braun, V., & Clarke, V. (2013).Successful qualitative research: A practical guide for beginners. Sage.). Esse é um processo dinâmico e recursivo, que se utiliza de coding (atribuição de palavras ou frases curtas, i.e., codes1 1 Optou-se pela manutenção do termo original em Inglês, pois entendemos que a palavra “categoria” remete à um nível de análise mais elaborado, mais sofisticado e, portanto, mais próximo à ideia de ‘tema’ - o que um code não é. A tradução literal seria ‘código’, mas ela também não faz jus à ideia do termo original. , que categorizam segmentos de dados textuais) para capturar esses padrões que podem surgir tanto da construção de significados (conteúdo manifesto; indução) quanto de sentidos (conteúdo latente; abdução). Um tema “captura algo importante sobre os dados textuais que está relacionado à pergunta de pesquisa, e apresenta algum nível de resposta padrão ou significado/sentido presente entre os dados textuais” (Braun & Clarke, 2006Braun, V., & Clarke, V. (2006). Using thematic analysis in psychology. Qualitative Research in Psychology, 3(2), 77-101. https://doi.org/10.1191/1478088706qp063oa
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, p. 82). Assim, um tema é como um ‘muro’ composto por vários ‘tijolos’ (codes) conectados por um forte ‘cimento’ (significados e sentidos) (Mendes, 2022Mendes, J. A. A. (2022). The decision-making process in child custody cases after parental separation: a cross-cultural study between Brazil and England [Unpublished doctoral thesis]. University of Sussex.).

Os dados foram analisados por meio de uma Análise Temática Integrativa Baseada nos Dados (ATIBAD), conforme proposto por Mendes (2022Mendes, J. A. A. (2022). The decision-making process in child custody cases after parental separation: a cross-cultural study between Brazil and England [Unpublished doctoral thesis]. University of Sussex.). ATIBAD integra os níveis de análise indutiva e abdutiva, tendo como referência os dados, mas também inputs teóricos a partir do processo interpretativo do pesquisador. Os principais pressupostos teóricos da ATIBAD assumem que: (a) nem os dados nem os significados/sentidos que emergem deles existem a priori. Eles precisam ser discriminados por um observador; (b) o processo de análise dos dados é perpassado pela subjetividade do pesquisador e pela intersubjetividade da díade pesquisador-participante; e (c) o processo de pesquisa qualitativa envolve a organização, a interpretação e o desvelo de significados/sentidos que emergem dos dados a partir de uma dinâmica recursiva. Tudo isso faz com que a ATIBAD seja uma análise temática do tipo reflexiva, pois assume e destaca o papel ativo do pesquisador no processo de construção dos resultados que expressam os significados/sentidos derivados a partir da observação e compreensão de um determinado fenômeno (Braun et al., 2019Braun, V., Clarke, V., Hayfield, N., & Terry, G. (2019). Thematic analysis. In P. Liamputtong (Ed), Handbook of research methods in health social sciences (pp. 843-860). Springer.). A ATIBAD aplicada neste estudo seguiu as fases propostas por Mendes (2022Mendes, J. A. A. (2022). The decision-making process in child custody cases after parental separation: a cross-cultural study between Brazil and England [Unpublished doctoral thesis]. University of Sussex.):

Fase I - Familiarização: antes de iniciar o processo de coding, o primeiro autor fez a leitura de todos os dados textuais coletados, com o intuito de vislumbrar a profundidade e amplitude dos dados. Esse processo foi importante para a construção de um olhar holístico e integrador diante dos dados e dos significados/sentidos que emergiram deles;

Fase II - Primeiro Nível de Análise: open coding (análise aberta): com base nas noções de ‘open coding’ de Urquhart (2013Urquhart, C. (2013).Grounded theory for qualitative research: A practical guide. Sage) e ‘initial coding’ de Charmaz (2014Charmaz, K. (2014).Constructing grounded theory. Sage.), esta fase constituiu-se em um processo que organizou, descreveu, classificou e sintetizou os dados textuais de forma ‘aberta’ e sem restrições2 2 Toda análise qualitativa deve estabelecer qual será a sua unidade de coding, ou seja, qual será o tipo de segmento de dado textual que será considerado para a criação de um code. Essa ‘unidade de coding’ nada mais é do que o nível de análise escolhida para o processo inicial da análise dos dados. Esses níveis de análise podem ser: a) linha-por-linha (considerando-se como uma unidade de análise cada linha do texto); b) sentença-por-sentença (considerando-se como unidade de análise cada sentença/período do texto); c) parágrafo-por-parágrafo (considerando-se como unidade de análise cada parágrafo do texto); d) incidente-por-incidente (considerando-se como unidade de análise cada incidente (ou caso) identificado no texto). Cada pesquisador escolhe a unidade de coding conforme os objetivos dos seu estudo e/ou as características dos dados coletados. Neste estudo, a unidade de coding empregada foi a de ‘sentença-por-sentença’. . Esse processo foi auxiliado pelo software de análise de dados qualitativos NVivo 12 para Mac OS (M1). 10 codes foram gerados nesta fase;

Fase III - Segundo Nível de Análise: buscando por temas: envolveu a análise dos codes gerados na Fase II e a criação de temas intermediários e suas características. Nesta fase, 10 temas intermediários e 20 características foram gerados.

Fase IV - Revisando & Estabelecendo os Temas: definições e relações: envolveu o refinamento dos temas intermediários e suas características visando a construção de temas mais amplos e mais significativos, além do estabelecimento de conexões entre eles. Nesta fase, 7 temas finais e 14 características foram estabelecidos;

Fase V - Ancoragem dos Temas & Mapa Temático: o processo de ancoragem envolveu a atribuição dos temas (e características finais) aos segmentos de dado (i.e., as falas dos participantes) nos quais eles foram baseados. Um dos produtos dessa fase foi a elaboração de uma tabela para evidenciar quais participantes tiveram as suas falas como base para a criação daquele tema/característica (vide Tabela 2). Esse processo visou a promoção dos princípios de credibilidade e dependabilidade conforme Creswell, Poth (2017Creswell, J. W., & Poth, C. N. (2017).Qualitative inquiry and research design: Choosing among five approaches. Sage publications.), Moreira (2018Moreira, H. (2018). Critérios e estratégias para garantir o rigor na pesquisa qualitativa. Revista Brasileira de Ensino da Ciência e Tecnologia, 11(1), 405-424. https://doi.org/10.3895/rbect.v11n1.6977
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) e Nowell et al. (2017Nowell, L. S., Norris, J. M., White, D. E., & Moules, N. J. (2017). Thematic analysis: striving to meet the trustworthiness criteria.International Journal of Qualitative Methods,16(1), 1-13. https://doi.org/10.1177/1609406917733847
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). Em seguida, foi gerado um mapa temático para ilustrar as inter-relações entre os temas (vide Figura 2).

Tabela 2.
Temas e Características Gerados pela Análise Temática

Entre as fases I, II, III foi utilizado o memoing. Essa técnica envolve o registro escrito de ideias, insights e interpretações que surgiram durante o processo de análise. Isso foi importante para identificar as inter-relações e os padrões de significados e sentidos que geraram os temas apresentados a seguir.

A Figura 1 sintetiza o processo de análise dos dados:

Figura 1.
Processo de Análise dos Dados

Resultados

Os resultados serão apresentados em duas partes. A primeira apresentará os sete temas e suas características. Por fim, será apresentado o mapa temático que ilustra como todos os temas estão conectados entre si, dando ao leitor uma noção geral de como a pandemia impactou os regimes de guarda e convivência dos filhos(as) de pais/mães separados(as).

Apresentação dos Temas

Os temas e seus conteúdos estão circunscritos a partir dos sentidos gerais que eles abarcam. Em alguns casos, os temas também apresentam certas características que têm a função de destacar elementos de significado e sentido importantes para a compreensão daquele tema, obedecendo a seguinte ordem hierárquica: ‘Tema’ (conteúdo significativo, imbuído de sentidos/significados gerados a partir dos dados coletados e que levaram à construção de um tema) ⇒ ‘Característica’ (aspectos relevantes que desvelam características importantes do seu Tema).

A Tabela 2 apresenta os temas produzidos nesta análise temática e suas características, bem como quais participantes contribuíram para a construção daquele determinado tema/característica. Visando a preservação do anonimato dos(as) participantes, eles(as) receberam rótulos aleatórios, iniciados com a letra “P” mais o número do caso deles no banco de dados.

Tema 1: Impactos da Pandemia sobre os Regimes de Guarda e Convivência

Este tema captura os relatos dos(as) participantes quanto às modificações ocorridas nos regimes de guarda e convivência em função da pandemia. Em alguns casos, houve mudanças drásticas no regime de guarda e convivência com os(as) filhos(as); é o que destaca a característica ‘“Não haverá pernoite ou visitas”: mudanças no regime de guarda e convivência’ (1.1):

“Decidimos, em comum acordo, que não haverá pernoite ou visitas durante esse período de isolamento social.” P107

“Mudou bastante [a convivência], pois desde de quando começou [a pandemia] ela não foi mais visitar o seu pai e avôs paternos.” P7

“Tenho visto menos a minha filha. Falado menos. Conversado menos. Não a vejo todos os dias como fazia ao levar ou pegar na escola.” P49

“Desde o isolamento, eu fiquei com minha filha apenas 3 dias. A última vez que a vi foi quando fui dar o dinheiro da pensão, onde vi ela apenas no carro.” P43

Além de alterações significativas nas formas de convivência, a pandemia também produziu alterações nos arranjos de guarda:

“Interrompemos a guarda compartilhada porque o pai da minha filha mora com o pai dele, que é do grupo de risco.” P11

“Tinha contato toda semana, com pernoite com o pai. Agora [ele] está pegando [a filha] de 15/15 dias.” P16

“Como eu estou em teletrabalho, fico com minha filha todos os dias úteis e o pai [fica com ela] aos finais de semana.” P93

“Como o pai mora em outro estado, a pandemia, com as aulas online, possibilitou que as crianças passassem mais tempo com ele, pois estão com aulas remotas e o pai também pode trabalhar remotamente.” P4

Alguns(mas) genitores(as) fizeram esforços para manter a regularidade dos regimes de guarda e convivência que existiam antes da pandemia. A característica ‘“Passamos por readequações”: adaptando os contatos parento-filiais à pandemia’ (1.2) destaca esses esforços. Por exemplo, mudanças na quantidade de tempo que cada genitor fica com a criança ou até mesmo a suspensão dos contatos físicos:

“Passamos por readequação, tendo em vista que a mãe contraiu coronavírus. Então, a criança passou o dobro do tempo comigo. Até que fosse seguro retornar ao modelo acordado previamente.” P97

“O contato ficou muito limitado. Reduzidos [a convivência] a conversas de 30 minutos sem contato físico.” P12

Para alguns(mas) genitores(as), a limitação dos contatos físicos foi uma importante adequação para a manutenção da convivência entre pais/mães separados(as) e seus filhos(as):

“Ele [o pai] a vê [a filha] na porta de casa e conversa um pouco. Ambos de máscara e sem se tocar.” P72

“[houve a] diminuição das visitas pra diminuir a chance de pegar o vírus. A criança não foi mais na casa do genitor para evitar pegar o vírus também.” P71

Outras adaptações mantiveram os contatos físicos, mas ainda com adaptações importantes:

“Adaptamos alguns dias e horários (por exemplo, deixamos de dividir o fim de semana), porém mantendo a quantidade de tempo em cada casa.” P100

“Continuamos com as visitações, porém o pai vem na minha casa e passa o tempo necessário para me ajudar com a nossa filha.” P73

“Evitamos saídas; [há] apenas visitas na residência.” P71

De modo geral, é possível observar que houve adaptações relativas à quantidade de tempo e à forma como os(as) genitores(as) conviviam com os(as) filhos(as), muitas vezes, bem diferentes do arranjo vigente antes da pandemia. Outras adaptações também envolveram a adoção de estratégias para a manutenção dos contatos entre os(as) genitores(as) não residentes e as crianças:

“[a convivência está] restrita somente a mensagens pelo WhatsApp.” P26

“Fizemos um acordo e ela não visita o pai. Conversa com ele por vídeos todos os dias.” P72

“Mudou bastante porque como [o pai] não a vê mais. Ele passou a ligar quase todos os dias por vídeo.” P77

“Prejudicou o contato físico e aumentaram as chamadas de vídeo” P107

“O pai não a vê mais presencialmente há 3 meses. Só se falam pelo telefone.” P113

Como visto, a tecnologia e os aplicativos foram muito importantes para a manutenção dos contatos entre genitores(as) não residentes e seus/seus filhos(as). Os resultados também mostram que as limitações da pandemia parecem ter afetado mais especialmente os regimes de guarda e convivência daqueles(as) genitores(as) que trabalham na linha de frente de combate à pandemia. A característica ‘Impacto da pandemia para pais/mães trabalhadores(as) da área da Saúde’ (1.3) destaca o como esses(as) genitores(as) foram afetados:

“[houve a] redução das visitas, pois o outro genitor trabalha em hospital, que é local de risco.” P42

“[a pandemia] comprometeu bastante o convívio, pois sou trabalhador da Saúde e continuei em atividade. Só vejo meu filho à distância, via WhatsApp. Quando vou a casa dele, mantenho distância e sem contato físico. Desde o início da pandemia, não o levo para minha casa.” P50

“Não posso ter contato algum (apenas telefônico) com minha filha por ela ser do grupo de risco (ter doença respiratória) e por eu trabalhar na linha de frente do Covid (hospital).” P8

A característica ‘“Eles estão meio perdidos”: impacto para os(as) filhos(as)’ (1.4) mostra que a pandemia também parece ter afetados os filhos(as):

“[os(as) filhos(as)] estão meio perdidos. Querem agradar a mãe e o pai e, então, não sabem se ficam lá ou aqui. Perdem a noção também do que é certo ou errado.” P110

“Ela não vê o pai desde quando começou a pandemia. Ela está sentindo muita falta dele e se preocupa bastante com ele.” P7

“Devido a difícil comunicação com o pai, não conseguimos entrar em acordo sobre como proceder. E diante dessa desorganização nossa, minha filha não sabe o que fazer. Não quer ficar longe de nenhum dos dois.” P8

Esses relatos indicam que o impacto sobre os(as) filhos(as) parece estar ligado à mudanças comportamentais referentes às interações com os(as) genitores(as), a conflitos de lealdades e à sobrecarga emocional por preocupação com os(as) pais/mães.

Tema 2: Impactos da Pandemia na Comunicação Coparental

Este tema captura a percepção dos(as) participantes quanto aos impactos da pandemia sobre a dinâmica de comunicação entre os(as) genitores(as). A característica ‘“Agora temos maior negociação e contato”: impactos positivos’ (2.1) destaca como a pandemia melhorou a comunicação coparental:

“[durante a pandemia, houve] maior negociação e contato, melhor dinâmica de relacionamento [entre os(as) genitores(as)].” P24

“[os contatos coparentais] estão mais frequentes e mais amigáveis” P107

“Estamos sempre em diálogo e procurando saber o que é melhor em logística pra nós pais, sempre levando em consideração o que nossa filha sente e quer.” P73

“Ficamos mais flexíveis no sentido de não ter tantas regras, porque o momento é muito difícil já! Deixamos-a mais à vontade para transitar entre nossas casas.” P69

“Nos separamos na véspera da pandemia, com muita dificuldade de comunicação. A necessidade de estabelecermos regras justas para os cuidados com a nossa filha melhoraram a comunicação.” P26

Essas falas indicam que, para alguns pais/mães separados(as), a pandemia levou à maior frequência de contatos e negociações entre os(as) genitores(as). Houve também maior flexibilidade para colocar os interesses dos(as) filhos(as) em primeiro lugar. Importante destacar que, entre os(as) participantes que ensejaram a criação desta característica, 78% tinham guarda compartilhada, 89% declararam não ter percebido prejuízo aos seus direitos parentais de guarda e convivência e todos(as) declararam ter uma comunicação coparental ‘funcional’ [i.e., com poucos desentendimentos e com espaço para dialogar e negociar as demandas e necessidades em relação à guarda e convivência com o(a) filho(a)]. Dessa forma, aspectos como arranjo de guarda mais igualitário, percepção positiva de preservação de direitos parentais e comunicação coparental assertiva parecem ser elementos importantes para que haja negociações e adaptações adequadas à situação de pandemia.

Contudo, para outros(as) genitores(as), a situação das restrições durante a pandemia pareceu dificultar a comunicação entre os(as) genitores(as), é o que destaca a característica ‘“O diálogo piorou muito”: impactos negativos’ (2.2):

“A condição de diálogo piorou muito, não existe condição para diálogo, apenas pela via judicial.” P76

“Temos nos falado menos. Eu peço pra ela [a mãe] falar comigo sobre as visitações. Ela pouco responde e tem se mantido difícil a comunicação tanto com ela quanto com minha filha.” P43

“Eu bloqueei ele há 3 anos [no WhatsApp]. Assim, as discussões diminuíram entre nós. Falo com ele somente quando eu acho necessário tratar algum assunto sobre o nosso filho.” P48

“Ela[mãe] me bloqueou no WhatsApp, único meio de comunicação que eu tinha para poder me comunicar com nossa filha, já que a minha filha sempre quer falar comigo por videochamada.” P18

Essas falas indicam que as dificuldades na comunicação coparental parecem que já existiam e pioraram com a situação da pandemia. Destaca-se a total impossibilidade de diálogo entre alguns/algumas genitores(as) ao ponto de necessitarem de intervenção judicial e até mesmo bloquear totalmente a comunicação com o(a) outro(a) genitor(a). Entre os(as) participantes que ensejaram esta característica, 64% tiveram uma separação do tipo problemática [ou seja, com constantes desacordos e comunicação disfuncional no diálogo e negociação das demandas e necessidades de cada um em relação à guarda e convivência com os(as) filhos(as)]. Ademais, 82% também informaram que tiveram comunicação coparental não funcional durante a pandemia (ou seja, com frequentes e significativos desentendimentos, sem espaço para dialogar e negociar as demandas e necessidades em relação à guarda e convivência).

Tema 3: Dificuldades Interacionais entre Pais/Mães Separados(as) Durante a Pandemia

Este tema captura os relatos dos(as) participantes quanto às dinâmicas relacionais dos(as) genitores(as) que foram impactadas pela a pandemia. A característica ‘“Nunca nos relacionamos bem desde que eu exigi a separação”: a historicidade relacional do ex-casal’ (3.1) destaca questões ligadas à extinta relação conjugal, mas que ainda impactam a coparentalidade, especialmente durante a pandemia:

“Nunca nos relacionamos bem desde que eu exigi a separação. Agora [na pandemia] está um pouco pior.” P103

“A separação aconteceu junto com a pandemia. Então, nós deixamos de ter uma comunicação mais pela separação do que pela pandemia.” P52

“Por causa da nossa relação conflituosa, e ainda estarmos em processo judicial, ele cessou contato e eu também não faço nenhum. Assim, ele e o filho não têm nenhum contato há mais de 4 meses.” P61

“Ele quer que eu o trate como se fosse um exemplo de homem. Mas não é. O trato na altura da sua mesquinhez. Por isso, nossa relação é uma merda.” P103

“Só piorou [os contatos coparentais]. Ele não aceita que eu me relacione com mulher e me deixa muito tempo sem ver ou falar com nossos filhos.” P119

Para alguns/algumas genitores(as), aspectos cismáticos herdados da extinta relação conjugal já atravessavam a coparentalidade antes mesmo do surgimento da pandemia. Para outros(as), houve a conjunção entre a difícil etapa de separação conjugal e o surgimento da pandemia. Em ambos os casos, as restrições de isolamento e distanciamento sociais parecem ter servido como um catalisador das disfuncionalidades relacionais dos(as) genitores(as). Entre os(as) participantes que ensejaram esta característica, todos(as) declararam ter tido uma separação do tipo problemática e três quartos deles precisaram recorrer à Justiça para o estabelecimento de um acordo sobre a guarda e a convivência com os(as) filhos(as) e todos(as) informaram que a comunicação coparental durante a pandemia foi do tipo não funcional.

Outro aspecto dificultador das interações coparentais parece ter sido as diferentes concepções sobre as orientações sanitárias de combate à Covid-19, conforme mostra a característica ‘“Ele(a) não respeita as regras”: desacordos sobre as regras de distanciamento e isolamento sociais’ (3.2):

“O pai não tem bom senso, não faz quarentena. Enfim, não respeita as regras [de isolamento e distanciamento sociais]” P106

“O pai pensa diferente em relação ao isolamento, e acha que não tem necessidade de ficar totalmente em casa. Levando o filho na casa da avó, dizendo que eles estão se cuidando. Sendo que ela já é idosa e nosso filho é asmático.” P86

“A guarda não foi alterada pela pandemia, mas acordos que propus em termos de segurança e cuidado com as crianças não foram seguidos pelo pai.” P23

“Diante da não aceitação do isolamento e até distanciamento social [por parte do outro genitor], após conversar com algumas pessoas, entendi que deveria evitar o contato físico, o que causou muito transtorno e até ameaças.” P29

Entre os(as) participantes que ensejaram esta característica, dois terços deles declararam ter tido uma separação do tipo problemática e todos(as) informaram ter uma comunicação coparental não funcional. Com base nisso, é possível suspeitar que, tais quais as dinâmicas observadas na característica anterior, essas dificuldades de entendimento e negociação também podem ser expressões de disfuncionalidades relacionais preexistentes à pandemia e suas restrições.

Um dos desdobramentos da cronificação dessas disfuncionalidades relacionais exacerbadas pela pandemia é justamente o aumento dos desentendimentos entre os(as) genitores(as). A característica ‘“Ela está tirando proveito para afastar a criança de mim”: intensificação do litígio coparental’ (3.3) destaca aspectos ligados a elementos e dinâmicas que informam sobre o aumento do litígio entre os(as) genitores(as) durante a pandemia, a partir da perspectiva dos homens:

“A genitora viajou para área de risco esse ano e mentiu quando foi questionada, e agora tenta se fazer de boa cuidadora e colocar toda responsabilidade de risco de contágio em mim.” P18

“Sempre tive muito cuidado com a saúde da nossa filha. Agora, nesse momento de pandemia ainda mais, mas percebe-se que a genitora está querendo tirar proveito do atual momento para afastar ainda mais nossa filha de mim e das irmãs mais velhas.” P18

“A mãe não permite que eu vá buscar [a minha filha] com a desculpa do isolamento social.” P96

“Fui cortado da vida do meu filho... fui alienado!” P105

Essas falas indicam a intensificação dos conflitos parentais durante a pandemia, mas também a disposição para assumir uma postura de adversariedade com a mãe a partir de uma posição que não é capaz de reconhecer as corresponsabilidades de qualquer relação. Assim, ora se descredibiliza as alegações levantadas (e.g., risco de contaminação), ora acusa-se a mãe de tentar romper os laços entre pai e filho(a) (e.g., alienação parental). Entre os(as) participantes que ensejaram esta característica, quatro quintos deles declararam ter tido uma separação do tipo problemática e todos(as) informaram ter uma comunicação coparental não funcional durante a pandemia.

Tema 4: “Ele já não participava... agora tem uma desculpa formal para isso”: Cronificação das Dificuldades de Convivência entre Pai e filho(a)

Este tema captura a percepção das mães separadas quanto à cronificação das dificuldades parento-filiais, em especial aquelas relativas à convivência dos pais com os(as) filhos(as):

“Ele já não participava. Agora tem uma desculpa formal para isso.” P114

“Pra mim, [a pandemia] não impactou muito porque o pai da minha filha não se esforça muito para vê-la.” P119

“Não mudou em nada [a convivência entre pai e filho]. Ele não cumpre a sentença judicial, não liga, não aparece...ou seja, a pandemia, não trouxe impacto nenhum nesse sentido.” P67

“O genitor optou pelo isolamento completo e não faz contato com a criança há cerca de 40 dias. Nem mesmo por telefone ou videochamada. Acredito que utiliza desta situação para justificar e reforçar o distanciamento que já estava sendo praticado anteriormente - inclusive para se eximir de qualquer responsabilidade em relação ao filho.” P57

Essas falas indicam a cronificação da ausência paterna. Algumas mães indicaram que a situação da pandemia apenas exacerbou um padrão de relação parento-filial que já existia. Entre as participantes que ensejaram essa característica, três quartos delas declararam ter tido uma separação conjugal do tipo problemática.

Tema 5: “Está bem difícil para mim”: Sobrecargas Financeira, Física e Emocional Durante a Pandemia

Este tema captura a percepção das mães, em sua maioria, quanto à sobrecarga dos deveres e cuidados parentais durante a pandemia, tanto em função das mudanças e adaptações quanto da concentração dos cuidados em apenas um dos genitores. A característica ‘“Estou assumindo todas as despesas”: sobrecarga financeira’ (5.1) destaca alguns dos impactos financeiros que a pandemia gerou:

“Estou assumindo todas as despesas da minha filha, pois a renda do pai dela está praticamente nula.” P11

“O pai está desempregado, logo as despesas têm corrido exclusivamente por minha conta.” P54

“Tem 6 meses que o pai não trabalha, ou seja, não paga nada de pensão.” P67

Além dos impactos financeiros, a pandemia também provocou uma sobrecarga em relação aos cuidados com a criança para apenas um dos genitores (as mães), conforme destaca a característica ‘“Ele fica com a criança quando quer”: concentração dos cuidados parentais nas mães’ (5.2):

“Ele passou a exigir ficar mais tempo [com a criança]. O que cedi. Funcionou durante 4 semanas. Agora ele já não se mostra mais tão interessado em ficar com ela [a filha]. Fica quando quer.” P103

“Estou mais sozinha para resolver tudo.” P114

“[na pandemia,] me vi cuidando sozinha das crianças e eles em situação de abandono da figura paterna.” P52

“Eu e minha filha estamos há mais de 80 dias em casa isoladas. Compras, só pela internet, pois não tem quem ajude, estou em home office tentando conciliar tudo. Nem sempre é fácil.” P107

O isolamento e a sobrecarga indicados nas características anteriores podem ter impactos na saúde mental de alguns/mas genitores(as), como destaca a característica ‘“A solidão está terrível para mim”: impactos emocionais da pandemia’ (5.3):

“[está] bem difícil para mim porque não os vejo [os filhos] há mais de 40 dias porque tiraram férias da escola e foram para a casa do pai e, após isso, uma funcionária minha pegou COVID e o pai deles não os deixou eles voltarem. A solidão está terrível para mim.” P110

“Tenho que cuidar do meu psicológico para que eu continue firme nos meus propósitos e consiga dar um suporte para as minhas três filhas e minha esposa que está grávida de 7 meses.” P18

Tema 6: Impactos Financeiros e Pensão Alimentícia

Este tema captura a percepção dos(as) pais/mães separados(as) quanto aos impactos financeiros da pandemia, em especial sobre o pagamento da “pensão alimentícia”3 3 Entre aspas, pois o termo jurídico correto é ‘alimentos’ e se refere à provisão financeira dedicada à manutenção das necessidades de alimentação, saúde, vestimenta, moradia, educação e lazer da criança/adolescente após a separação conjugal. . A característica ‘Redução do repasse e dos gastos’ (6.1) destaca impactos que levaram à redução da “pensão alimentícia” e suas consequências:

“[houve a] redução de repasse e, consequentemente, redução dos gastos.” P1

“Como o salário do pai diminuiu 30%, essa diminuição foi repassada para a pensão.” P4

“No mês de abril, não consegui pagar o valor integral [da pensão alimentícia]. Sou comerciante e ficamos 31 dias fechados e com muitos acúmulos de dívidas.” P18

A característica ‘O não pagamento de pensão como forma de retaliação’ (6.2) destaca a percepção de alguns/mas genitores(as) de que o não pagamento de pensão era uma forma de represália diante da impossibilidade de ver o(a) filho(a) durante a pandemia:

“Desde antes da pandemia, o pai já não estava depositando a pensão como forma de represália por eu não aceitar o acordo que ele desejava.” P104

“Esse mês, o pai do meu filho não pagou, porque, no período de lockdown, não deixei o bebê sair.” P38

As falas associadas a este tema indicam que, em geral, os impactos financeiros da pandemia levaram à redução do valor pago. É possível que esses desacordos financeiros sejam mais uma dinâmica disfuncional que também está ligada a questões da extinta relação conjugal, pois todos(as) os(as) participantes que ensejaram esta característica declararam ter tido uma separação do tipo problemática e uma comunicação coparental não funcional durante a pandemia.

Tema 7: Percepções sobre a Atuação do Judiciário Durante a Pandemia

Este tema captura a percepção dos(as) pais/mães separados(as) quanto à atuação do judiciário nos casos de guarda e convivência durante a pandemia. Um dos aspectos apontados foi a falta de eficiência da Justiça, tanto para agilizar os casos durante a pandemia quanto para apenas dar respaldo durante situações críticas:

“Muitas incertezas perante as petições na Vara da Família para que eu não busque minha filha e a demora na Justiça para decidir tais pedidos é o pior.” P18

“Só no período de lockdown tive respaldo [legal] para impedir meu filho de sair de casa, o que pra mim é horrível, pois tenho pessoas do grupo de risco em casa” P39

Outro aspecto destacado foi a discordância e insatisfação com as decisões arbitradas pelo sistema de Justiça:

“O juiz proibiu as visitas presenciais até que a pandemia deixe de ser uma ameaça. Um absurdo! Estou [há] 2 meses afastado do meu filho. O que faz com que a mãe seja um risco menor do que o pai?” P117

“A mãe cortou todo e qualquer contato de minha filha comigo. Com defensoria e judiciário parados, não tem quem faça valer a sentença judicial.” P91

Mapa Temático e as Inter-relações entre os Temas

A Figura 2 apresenta um mapa temático que demonstra como todos os sete temas estão conectados entre si:

Figura 2.
Mapa Temático

O mapa temático possibilita observar que os impactos da pandemia (Tema 1) tendem a levar a sobrecargas dos(as) genitores(as) (Tema 5) e também a implicações econômicas, como dificuldades para o pagamento da “pensão alimentícia” (Tema 6). Observa-se também que esses impactos podem ser amenizados ou intensificados a partir das dificuldades interacionais dos(a) genitores(as) (Tema 3) e o estilo de comunicação coparental adotado durante a pandemia (Tema 2). Essas dificuldades e o estilo de comunicação também podem impactar a convivência entre os(as) filhos(as) e os(as) genitores(as) não residentes (Tema 4). Por fim, observa-se que as percepções dos(as) pais/mães separados(as) sobre a atuação do Judiciário durante a pandemia (Tema 7) estão tanto relacionadas às dificuldades interacionais dos(as) próprios(as) genitores(as) (Característica 3.2) quanto às acomodações feitas pela família durante a pandemia (Característica 1.2) e a forma como o Judiciário intermediou esses processos.

Discussão

As questões relativas às mudanças nos arranjos de guarda e convivência ocorridas por conta da pandemia orbitaram os impactos sobre os regimes de guarda e convivência (Tema 1) e sobre a comunicação coparental (Tema 2). Por sua vez, essas questões levaram a dificuldades coparentais (Tema 3) e desdobramentos que cronificaram cismas entre pais e filhos (Tema 4) e também aspectos financeiros (Temas 5 e 6).

De modo geral, para os(as) pais/mães separados(as), os impactos da pandemia sobre os regimes de guarda e convivência estiveram mais ligados à diminuição dos contatos parento-filiais e dos contatos das crianças/adolescentes com a família extensa e/ou sua rede social (Característica 1.1). À primeira vista, isso é preocupante, pois o desenvolvimento da criança/adolescente e a garantia dos seus melhores interesses estão intimamente ligados à manutenção dos seus laços familiares e outras relações significativas, além da percepção de estabilidade e segurança (Mendes & Ormerod, 2019Mendes, J. A. A., & Ormerod, T. (2019). O princípio dos melhores interesses da criança: uma revisão integrativa de literatura em Inglês e Português. Interação em Psicologia, 24, 1-22. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v24i0.45021
https://doi.org/10.4025/psicolestud.v24i...
; Mendes et al., 2020Mendes, J. A. A., Lordello, S. R., & Ormerod, T. (2020). Uma proposta de compreensão bioecológica do princípio dos melhores interesses da criança/adolescente nos casos de disputa de guarda. In: J. A. A. Mendes, & J. S. N. F. Bucher-Maluschke (Eds.), Perspectiva Sistêmica e Práticas em Psicologia: temas e campos de atuação (pp. 53-78). Editora CRV: Curitiba.). Contudo, a evidência científica disponível sugere que, de modo geral, crianças/adolescentes e as suas famílias têm um grande potencial para adaptar-se a situações de estresse - as diferenças entre a boa e a má adaptação estão relacionadas aos recursos disponíveis no ambiente, à forma como a pessoa interage com esses recursos e às suas próprias características individuais (Abramovay et al., 2002Abramovay, M., Castro, M. J., Pinheiro, L. C., Lima, F. S., & Matinelli, C. C. (2002) Juventude, violência e vulnerabilidade social na América Latina: desafios para políticas públicas. UNESCO, BID.; Russo & Fallon, 2015Russo, T. J., & Fallon, M. A. (2015). Coping with stress: supporting the needs of military families and their children.Early Childhood Education Journal,43(5), 407-416. https://doi-org.ezproxy.sussex.ac.uk/10.1007/s10643-014-0665-2
https://doi-org.ezproxy.sussex.ac.uk/10....
). Neste estudo, observou-se que a capacidade dos(as) genitores(as) para se adaptar às limitações da pandemia e suas consequências estiveram ligadas a dinâmicas de funcionamento coparental preexistentes à instauração da pandemia.

Ainda sobre a manutenção dos arranjos de guarda e convivência, também se observou a presença de conflitos entre alguns pais/mães separados(as) quanto à manutenção integral desses arranjos ou quanto às adaptações realizadas. Parece que genitores(as) e judiciário tendem a ver um conflito entre o direito à convivência familiar e comunitária e o direito à saúde e proteção integral da criança/adolescente em contexto extremos como o da pandemia. Isso ocorreria, pois, ao garantir a convivência, a criança/adolescente poderia ser colocada em risco; de igual modo, alijar a criança do convívio familiar pleno também poderia trazer-lhe prejuízos (McBratney, 2020McBratney, M. (2020). How to stay-at-home when you have two homes: COVID-19’s effect on co-parenting and child custody.J. Am. Acad. Matrimonial Law.,33(1), 225-248. https://heinonline.org/HOL/P?h=hein.journals/jaaml33&i=237
https://heinonline.org/HOL/P?h=hein.jour...
; Smyth et al., 2020Smyth, B. M., Moloney, L. J., Brady, J. M., Harman, J. J., & Esler, M. (2020). COVID‐19 in Australia: impacts on separated families, family law professionals, and family courts.Family Court Review,58(4), 1022-1039. https://doi.org/10.1111/fcre.12533
https://doi.org/10.1111/fcre.12533...
). Entende-se que, qualquer que seja a posição, o mais importante é que tanto o judiciário quanto os(as) genitores(as) possam propiciar às crianças/aos adolescentes uma percepção mínima de segurança e estabilidade (Mendes et al., 2020Mendes, J. A. A., Lordello, S. R., & Ormerod, T. (2020). Uma proposta de compreensão bioecológica do princípio dos melhores interesses da criança/adolescente nos casos de disputa de guarda. In: J. A. A. Mendes, & J. S. N. F. Bucher-Maluschke (Eds.), Perspectiva Sistêmica e Práticas em Psicologia: temas e campos de atuação (pp. 53-78). Editora CRV: Curitiba.). Assim, os processos de continuidade e descontinuidade gerados pela pandemia devem ser triangulados por ações e acomodações que levem em consideração essa necessidade desenvolvimental, especialmente em casos com crianças mais novas.

As questões relativas ao processo de comunicação entre os(as) genitores(as) também se dividiram em dois polos. Para genitores(as) com uma interação coparental mais funcional (e.g., sem grandes conflitos e com comunicação não violenta, flexibilidade, capacidade de negociação), a pandemia mostrou-se como uma oportunidade para consolidar uma coparentalidade mais assertiva e que levou a adaptações necessárias (Característica 1.2) e contatos coparentais mais potencializados e focados nos interesses dos(as) filhos(as) (Característica 2.1). Essas dinâmicas são as que mais garantem os melhores interesses dos(as) filhos(as), tanto na pandemia quanto fora dela (Mendes & Ormerod, 2019Mendes, J. A. A., & Ormerod, T. (2019). O princípio dos melhores interesses da criança: uma revisão integrativa de literatura em Inglês e Português. Interação em Psicologia, 24, 1-22. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v24i0.45021
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). Em contraste, os(as) genitores(as) com significativas dificuldades coparentais (e.g., desentendimentos constantes, comunicação não-assertiva, rigidez, adversariedade) tenderam a cronificar suas dinâmicas disfuncionais durante a pandemia (Tema 4; Características 2.2, 3.2, 3.3, 5.2, 6.2). Como visto, essas dinâmicas disfuncionais entre os(as) genitores(as) tendem a gerar impactos nos(as) filhos(as), levando a mudanças comportamentais e sobrecarga emocional (ansiedade e estresse) (Característica 1.4). A literatura aponta que o conflito entre os(as) genitores(as) é um dos principais fatores que causam estresse nos(as) filhos(as) de pais/mães separados(as) e, por isso, é o que mais dificulta a adaptação deles(as) às reacomodações familiares e relacionais necessárias após o divórcio (Greene et al., 2012Greene, S. M., Anderson, E. R., Forgatch, M. S., DeGarmo, D. S., & Hetherington, E. M. (2012). Risk and resilience after divorce. In F. Walsh (Ed.), Normal family processes: Growing diversity and complexity (pp. 102-127). The Guilford Press.; Roseiro, 2020Roseiro, C. P., Paula, K. M. P. D., & Mancini, C. N. (2020). Estresse e enfrentamento infantil no contexto do divórcio parental.Arquivos Brasileiros de Psicologia,72(1), 55-71. http://dx.doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP2020v72i2p.55-71
http://dx.doi.org/10.36482/1809-5267.ARB...
). Esse aspecto torna ainda mais necessária a garantia da percepção de segurança e estabilidade citada acima.

As disfuncionalidades coparentais indicadas pelos(as) participantes pareceram estar ligadas a questões herdadas da extinta relação conjugal (Característica 3.1). No estudo quantitativo com os(as) mesmos(as) participantes, o teste de qui-quadrado de independência indicou uma relação estatisticamente significativa entre as variáveis ‘tipo de separação’ e o ‘tipo de comunicação coparental’ durante a pandemia, χ² (4, 119) = 36,00, p <0,001 (Mendes et al., 2022Mendes, J. A. A., Fukuda, C., & Hernandez, J. A. E. (2022). O impacto da pandemia nos regimes de guarda e convivência dos filhos de pais/mães separados(as) [manuscrito não publicado] School of Psychology, University of Sussex.). Essa associação foi considerada forte (V = 0,39) (Cohen, 1988Cohen, J. (1988). Statistical Power Analysis for the Behavioral Sciences. Erlbaum.): 72% dos(as) genitores(as) que perceberam a comunicação coparental como ‘gravemente disfuncional’ declararam ter tido uma separação conjugal do tipo ‘problemática’.

A tensão entre conjugalidade e parentalidade é extensamente abordada pela literatura e se mostra como uma importante tarefa para o desenvolvimento funcional da família, mesmo antes do divórcio (Hameister et al., 2015Hameister, B. R., Barbosa, P. V., & Wagner, A. (2015). Conjugalidade e parentalidade: uma revisão sistemática do efeito spillover.Arquivos Brasileiros de Psicologia,67(2), 140-155. ; Juras & Costa, 2017Juras, M. M., & Costa, L. F. (2017). Não foi bom pai, nem bom marido: Conjugalidade e parentalidade em famílias separadas de baixa renda. Psicologia: Teoria e pesquisa, 32(Spe). https://doi.org/10.1590/0102-3772e32ne215
https://doi.org/10.1590/0102-3772e32ne21...
; Ponciano & Féres-Carneiro, 2017Ponciano, E. L. T., & Féres-Carneiro, T. (2017). Conjugalidade, parentalidade e separação: repercussões no relacionamento pais e filhos(as).Psicologia em estudo,22(2), 277-287. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i2.32808
https://doi.org/10.4025/psicolestud.v22i...
). Em situações de pós-divórcio e disputa de guarda, essa tarefa pode mostrar-se ainda mais desafiadora, em especial para aquelas famílias nas quais os(as) genitores(as) tendem a focar no conflito e manter uma postura de adversariedade coparental (Antunes et al., 2010Antunes, A. L. M. P., Magalhães, A. S., & Féres-Carneiro, T. (2010). Litígios intermináveis: uma perpetuação do vínculo conjugal?.Aletheia, (31), 199-211.; Barbosa et al., 2021Barbosa, L. P. G; Mendes, J. A. A., & Juras, M. M. (2021). Dinâmicas disfuncionais em casos de disputa de guarda e alegações de alienação parental na Justiça: uma compreensão sistêmica. Nova Perspectiva Sistêmica, 30(69), 78-95. https://doi.org/10.38034/nps.v30i69.612
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; Maciel et al., 2021Maciel, S. B.; Mendes, J. A. A.; & Barbosa, L. P. G. (2021). Visão sistêmica e sobre os pressupostos de alienação parental na prática clínica individual e familiar. Nova Perspectiva Sistêmica, 30(69), 62-77. https://www.doi.org/10.38034/nps.v30i69.611
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; Mendes & Bucher-Maluschke, 2017Mendes, J. A. A. , & Bucher-Maluschke, J. S. N. F. (2017). Destructive divorce in the family life cycle and its implications: criticisms of parental alienation. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 33(2), 1-8. https://doi.org/10.1590/0102.3772e33423
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). Assim, as dificuldades relacionais encontradas na relação coparental, apesar de estarem mais explícitas durante uma situação de crise (como a da pandemia), guardam relação íntima com o acúmulo relacional que os genitores(as) mantêm desde o início da conjugalidade extinta, ou seja, com a historicidade da relação entre os genitores.

É importante salientar que, por mais que a pandemia seja um momento de crise, seu potencial não é apenas para gerar consequências negativas para a relação coparental e o convívio com os(as) filhos(as) (Característica 2.1). Como em toda situação de crise, a pandemia representa ‘risco’ e ‘oportunidade’ para o desenvolvimento e bem-estar dos indivíduos e das famílias. Trilhar um caminho ou outro depende de determinantes individuais, sociais e culturais que circundam aquela determinada família.

Destaca-se a importância de compreender o papel desses fatores preexistentes na instauração e cronificação dos conflitos entre pais/mães separados(as), pois as dinâmicas descritas no Tema 3 [especialmente a característica ‘“Ela está tirando proveito para afastar a criança de mim”: intensificação do litígio coparental’ (3.3)] poderiam ser facilmente associadas por alguns à alienação parental. Os autores entendem que esse rótulo designa uma compreensão equivocada a respeito do funcionamento de um sistema familiar após a separação conjugal. Diversas publicações têm indicado que o rótulo ‘alienação parental’ apresenta uma compreensão simplista, maniqueísta e despontencializada dos fenômenos do pós-divórcio, já que os patologiza, criminaliza e pune (Barbosa et al., 2021Barbosa, L. P. G; Mendes, J. A. A., & Juras, M. M. (2021). Dinâmicas disfuncionais em casos de disputa de guarda e alegações de alienação parental na Justiça: uma compreensão sistêmica. Nova Perspectiva Sistêmica, 30(69), 78-95. https://doi.org/10.38034/nps.v30i69.612
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; Coelho & Morais, 2014Coelho, M. I. S. D. M., & Morais, N. A. D. (2014). Contribuições da Teoria Sistêmica acerca da alienação parental.Contextos Clínicos, 7(2), 168-181.; Meier & Dickson, 2017Meier, J. S., & Dickson, S. (2017). Mapping gender: Shedding empirical light on family courts' treatment of cases involving abuse and alienation.Law & Ineq.,35, 311-334. http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2999906
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; Meier, 2020Meier, J. S. (2020). US child custody outcomes in cases involving parental alienation and abuse allegations: what do the data show?.Journal of social welfare and family law,42(1), 92-105. https://doi.org/10.1080/09649069.2020.1701941
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; Maciel et al., 2021; Mendes & Bucher-Maluschke, 2017Mendes, J. A. A. , & Bucher-Maluschke, J. S. N. F. (2017). Destructive divorce in the family life cycle and its implications: criticisms of parental alienation. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 33(2), 1-8. https://doi.org/10.1590/0102.3772e33423
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; Mendes & Ormerod, 2022Mendes, J. A. A., & Ormerod, T. (2022). Making sense out of uncertainty: cognitive strategies in child custody decision-making process [manuscrito não publicado] School of Psychology, University of Sussex.; Oliveira, 2019Oliveira, C. F. C. (2019). Patologizando condutas, judicializando conflitos e medicalizando existências: considerações sobre a (síndrome de) alienação parental. In I. Silva (Ed.), Debatendo alienação parental: Diferentes perspectivas (pp. 36-49). Conselho Federal de Psicologia.; Pepiton et al., 2012Pepiton, M. B., Alvis, L. J., Allen, K., & Logid, G. (2012). Is parental alienation disorder a valid concept? Not according to scientific evidence. A review of parental alienation, DSM-5 and ICD-11 by William Bernet.Journal of Child Sexual Abuse,21(2), 244-253.; Sousa, 2019Sousa, A. M. (2019). A (re)produção do dispositivo [síndrome da] alienação parental no Brasil. In I. Silva (Ed.), Debatendo alienação parental: Diferentes perspectivas (pp. 81-96). Conselho Federal de Psicologia.; Sousa & Brito, 2011Sousa, A. M. D., & Brito, L. M. T. D. (2011). Síndrome de alienação parental: da teoria Norte-Americana à nova lei brasileira.Psicologia: ciência e profissão,31, 268-283.). Além disso, esse rótulo também tem um forte viés misógino (Mendes & Oliveira-Silva, 2022Mendes, J. A. A., & Oliveira-Silva, L. C. (2022). As alegações de ‘alienação parental’ e os vieses de gênero e misoginia em processos de guarda e convivência. In E. F. Bastos , J. Gianchin , L. V. Carvalho , L. Copetti , & M. M. F. Lemos (Ed.), Direito das famílias, vulnerabilidades e questões de gênero (pp. 44-65). Instituto Brasileiro de Direito de Família.) e tende a dificultar o processo de tomada de decisão focado nos melhores interesses dos(as) filhos(as), podendo aumentar, inclusive, o nível de beligerância entre os(as) genitores(as) (Mendes & Ormerod, 2022Mendes, J. A. A., & Ormerod, T. (2022). Making sense out of uncertainty: cognitive strategies in child custody decision-making process [manuscrito não publicado] School of Psychology, University of Sussex.).

Os resultados também apontaram uma sobrecarga maior para as mães do que para os pais. Isso confirma o que já foi constatado por Castro et al. (2020Castro, T. C. M., Bottega, C. G., Detoni, P. P., & Tittoni, J. (2020). Em tempos de coronavírus: home office e o trabalho feminino.Novos Rumos Sociológicos, 8(14), 40-64. https://doi.org/10.15210/norus.v8i14.20017
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), Moreira et al. (2020Moreira, L. E., Alves, J. S., Oliveira, R. G. D., & Natividade, C. (2020). Mulheres em tempos de pandemia: um ensaio teórico-político sobre a casa e a guerra.Psicol. Soc., Belo Horizonte,32, e020014. https://doi.org/10.1590/1807-0310/2020v32240246
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) e Santos (2020Santos, B. S. (2020). A cruel pedagogia do vírus. Almedina.): os impactos da pandemia tendem a atingir mais as mulheres. Neste estudo, observou-se que a sobrecarga financeira (5.1) e a sobrecarga dos cuidados com os(as) filhos(as) (5.2) foram reportados por 100% e 82%, respectivamente, das mulheres. Entre o número total de participantes homens (n = 32), apenas 5,3% reportaram algum tipo de sobrecarga. Se comparadas aos homens, entre o número total de mulheres, os relatos de sobrecarga foram quase cinco vezes maior (n = 19; 23,5%). Isso parece indicar que, de modo geral, as sobrecargas provocadas pela pandemia tendem a impactar mais as mães do que os pais. Assim, a situação de pandemia tende a acentuar as desigualdades de gênero, fazendo recair sobre a mulher os maiores impactos, especialmente aqueles relacionados à vida doméstica e ao cuidado com os(as) filhos(as) (Castro et al., 2020Castro, T. C. M., Bottega, C. G., Detoni, P. P., & Tittoni, J. (2020). Em tempos de coronavírus: home office e o trabalho feminino.Novos Rumos Sociológicos, 8(14), 40-64. https://doi.org/10.15210/norus.v8i14.20017
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; Moreira et al., 2020Moreira, L. E., Alves, J. S., Oliveira, R. G. D., & Natividade, C. (2020). Mulheres em tempos de pandemia: um ensaio teórico-político sobre a casa e a guerra.Psicol. Soc., Belo Horizonte,32, e020014. https://doi.org/10.1590/1807-0310/2020v32240246
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). Isso é preocupante, visto que as mulheres, mesmo antes da pandemia, já sofriam com vieses e desigualdade de gênero dentro do sistema de Justiça e, em especial, nos casos de disputa de guarda e convivência (Mendes & Oliveira-Silva, 2022Mendes, J. A. A., Fukuda, C., & Hernandez, J. A. E. (2022). O impacto da pandemia nos regimes de guarda e convivência dos filhos de pais/mães separados(as) [manuscrito não publicado] School of Psychology, University of Sussex.).

Por fim, salienta-se que a transferibilidade dos resultados apresentados neste estudo está limitada às idiossincrasias dos(as) participantes: 97,5% deles(as) eram heterossexuais; 73% eram mulheres; 57,1% possuíam pós-graduação; mais de um terço pertencia à classe B e C (classes média-alta e média-intermediária)4 4 Considerando-se as classificações por faixa salarial do IBGE e Instituto DataFolha: mais de 6 salários mínimos. . Mais pesquisas são necessárias para que se possa compreender o impacto de uma pandemia para pais/mães LGBTQIA+ separados(as) e famílias com baixa escolaridade e renda, por exemplo.

Considerações finais

Um dos objetivos deste estudo foi observar como pais/mães separados(as) se adaptaram para manter os arranjos de guarda e convivência durante a pandemia. Os resultados indicaram que as adaptações envolveram a utilização de tecnologias (para dar continuidade aos contatos entre genitores(as) e filhos) e o rebalanceamento de tempo e dos cuidados com os filhos. Outro objetivo foi compreender se as dinâmicas coparentais poderiam interferir nesse processo de adaptação das famílias. Os resultados indicaram que pais/mães que já tinham uma relação coparental mais cordial tenderam a potencializar esse ativo e, assim, estabelecer ajustes e mudanças conforme as necessidades dos filhos. Por outro lado, aqueles(as) genitores(as) que já possuíam uma relação coparental disfuncional mesmo antes da pandemia, tenderam a cronifinicar os conflitos e, assim, ampliar os prejuízos causados pelas pandemia, especialmente para os filhos.

Em relação às adaptações nos arranjos de guarda e convivência durante a pandemia, os resultados indicaram que, para os homens, isso significou ter nenhum contato ou contatos restritos, seja pela alteração do tempo ou pela forma de convivência. Já para as mulheres, isso significou sobrecarga física, financeira e emocional, por conta da acentuação das desigualdades de gênero.

Esses resultados ilustram a necessidade de uma mudança paradigmática, tanto das famílias quanto do Judiciário, em relação às dinâmicas coparentais após a separação conjugal, em especial aquelas que concernem as crianças. Essa mudança está em tirar o foco do litígio e das questões da extinta conjugalidade e colocá-lo nos melhores interesses dos(as) filhos(as). Ou seja, diante de situações desafiadoras como divórcio e pandemia, é preciso se perguntar: o que é possível fazer para que os(as) filhos(as) se sintam menos impactados(as)? Como garantir que eles(as) mantenham a convivência com ambos os(as) genitores(as), considerando as necessidades dos filhos? Como dirimir fatores que prejudiquem a percepção de segurança e estabilidade dos(as) filhos(as)? As respostas e ações para esses questionamentos devem passar, invariavelmente, pela “revisitação” da visão que a sociedade (e pais/mães) tem sobre as crianças/adolescentes, sobre os direitos e o protagonismo deles(as), mas também sobre o papel das crianças/adolescentes nas relações familiares e sociais. Isso se faz necessário, pois a conserva cultural que subjaz em toda ação parental e/ou judicial que impossibilita o atendimento ao exercício daqueles questionamentos concebe e trata crianças/adolescentes como seres abjetos, como corpos-sem-vontades-e-desejos que podem e devem ser controlados indistintamente pela família e pelo Judiciário. Não é e jamais será possível vislumbrar qualquer prática familiar e/ou judicial que preze pelos melhores interesses das crianças/adolescentes, sem que haja antes o reconhecimento deles(as) como sujeitos de direitos e protagonistas sociais.

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  • Urquhart, C. (2013).Grounded theory for qualitative research: A practical guide Sage
  • 1
    Optou-se pela manutenção do termo original em Inglês, pois entendemos que a palavra “categoria” remete à um nível de análise mais elaborado, mais sofisticado e, portanto, mais próximo à ideia de ‘tema’ - o que um code não é. A tradução literal seria ‘código’, mas ela também não faz jus à ideia do termo original.
  • 2
    Toda análise qualitativa deve estabelecer qual será a sua unidade de coding, ou seja, qual será o tipo de segmento de dado textual que será considerado para a criação de um code. Essa ‘unidade de coding’ nada mais é do que o nível de análise escolhida para o processo inicial da análise dos dados. Esses níveis de análise podem ser: a) linha-por-linha (considerando-se como uma unidade de análise cada linha do texto); b) sentença-por-sentença (considerando-se como unidade de análise cada sentença/período do texto); c) parágrafo-por-parágrafo (considerando-se como unidade de análise cada parágrafo do texto); d) incidente-por-incidente (considerando-se como unidade de análise cada incidente (ou caso) identificado no texto). Cada pesquisador escolhe a unidade de coding conforme os objetivos dos seu estudo e/ou as características dos dados coletados. Neste estudo, a unidade de coding empregada foi a de ‘sentença-por-sentença’.
  • 3
    Entre aspas, pois o termo jurídico correto é ‘alimentos’ e se refere à provisão financeira dedicada à manutenção das necessidades de alimentação, saúde, vestimenta, moradia, educação e lazer da criança/adolescente após a separação conjugal.
  • 4
    Considerando-se as classificações por faixa salarial do IBGE e Instituto DataFolha: mais de 6 salários mínimos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    11 Abr 2021
  • Aceito
    26 Ago 2021
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