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Percepção de familiares de pessoas com transtornos alimentares acerca do tratamento: uma metassíntese da literatura

Resumo

Relações familiares parecem ter uma contribuição relevante na etiopatogenia dos transtornos alimentares (TAs), o que faz com que as diretrizes internacionais de tratamento recomendem a participação da família. Esta metassíntese teve como objetivo sintetizar e reinterpretar os resultados de estudos qualitativos primários sobre a percepção de familiares de pessoas com TAs acerca do tratamento. A estratégia de busca foi organizada utilizando-se a ferramenta SPIDER e as análises foram realizadas por dois revisores independentes. A partir de 1.115 estudos originariamente recuperados de 6 bases de dados (CINAHL, LILACS, PsycINFO, PubMed, Scopus e Web of Science), foram selecionados 19 artigos. Os resultados convergem para o reconhecimento de que a família é parte do processo saúde-doença e precisa ser considerada como destinatária de cuidados, não apenas como coadjuvante/acompanhante no cuidado à pessoa acometida. Como a dinâmica familiar tem contribuição relevante no desenvolvimento e na manutenção dos TAs, é necessário investir na transformação das relações familiares para que se possam obter ganhos mais efetivos e duradouros no tratamento.

Palavras-chave:
distúrbios do ato de comer; anorexia nervosa; bulimia; família; tratamento

Abstract

Family relationships seem to have a relevant contribution to the etiopathogenesis of eating disorders (EDs), which makes the international treatment guidelines recommend family participation. This study aimed to synthesize and reinterpret the findings of primary qualitative studies about the perception of family of people with EDs about treatment. The search strategy was organized using the SPIDER tool, and the analyzes were carried out by two independent reviewers. From 1115 studies originally retrieved from six databases (CINAHL, LILACS, PsycINFO, PubMed, Scopus and Web of Science), 19 articles were selected. The results converge to the recognition that the family is part of the process and also needs to be considered as a care recipient, not just as a coadjuvant/companion for the patient. Since family dynamics have a relevant contribution in the development and maintenance of EDs, it is necessary to invest in the transformation of family relationships so that more effective and lasting gains in treatment can be obtained.

Keywords:
eating disorders; anorexia nervosa; bulimia; family, treatment

Transtornos Alimentares (TAs) são quadros psicopatológicos que se caracterizam por um padrão persistente de perturbações do comportamento alimentar, que cursam com diversas alterações comportamentais e fisiológicas (World Health Organization [WHO], 2018World Health Organization (2018). International classification of diseases, 11th revision (ICD-11). WHO. https://icd.who.int/en.
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). O DSM-5 descreve seis tipos de TAs: anorexia nervosa (AN), bulimia nervosa (BN), transtorno da compulsão alimentar (TCA), pica, transtorno de ruminação e transtorno alimentar evitativo. Os sintomas mais comuns desse tipo de psicopatologia são: medo intenso de ganhar peso ou de tornar-se obeso; emissão de comportamentos inadequados para evitar esse acontecimento, como restrição da ingestão calórica e adoção de comportamentos purgativos; perturbação da vivência do próprio peso ou forma corporal, caracterizada por uma autoimagem distorcida (American Psychiatric Association [APA], 2014American Psychiatric Association [APA] (2014). DSM: Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (5ª ed.) (M. I. C. Nascimento, Trad. ). Artmed. ).

Entre os fatores considerados desencadeantes e/ou mantenedores dos sintomas, destacam-se características de personalidade, meio sociocultural - em função da pressão social por um corpo magro - e dinâmica familiar (Fava & Peres, 2011Fava, M. V., & Peres, R. S. (2011). Do vazio mental ao vazio corporal: Um olhar psicanalítico sobre as comunidades virtuais pró-anorexia. Paidéia (Ribeirão Preto), 21(50), 353-361. https://doi.org/10.1590/S0103-863X2011000300008
https://doi.org/10.1590/S0103-863X201100...
; Moraes, Santos, & Leonidas, 2021Moraes, R. B., Santos, M. A., & Leonidas, C. (2021). Repercussões do acesso às redes sociais em pessoas com diagnóstico de anorexia nervosa.Estudos e Pesquisas em Psicologia, 21(3), 1178-1199.https://doi.org/10.12957/epp.2021.62734
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). Na literatura, já existe um razoável corpo de evidências que sugere que, nas famílias de pessoas com TAs, os pais geralmente apresentam comportamento superprotetor e exercem estrito controle sobre o comportamento dos filhos, dificultando ou até mesmo inibindo o desenvolvimento de suas habilidades sociais e seus esquemas de autonomia (Canetti et al., 2008Canetti, L., Kanyas, K., Lerer, B., Latzer, Y., & Bachar, E. (2008). Anorexia nervosa and parental bonding: The contribution of parent-grandparent relationships to eating disorder psychopathology. Journal of Clinical Psychology, 64(6), 703-716. https://doi.org/10.1002/jclp.20482
https://doi.org/10.1002/jclp.20482...
; Ferreira et al., 2021Ferreira, I. M. S., Souza, A. P. L., Azevedo, L. D. S., Leonidas, C., Santos, M. A., & Pessa, R. P. (2021). The influence of mothers on the development of their daughter’s eating disorders: An integrative review. Archives of Clinical Psychiatry, 48(2), 168-177. http://doi.org/110.15761/0101-60830000000300
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; Jauregui-Lobera et al., 2011Jauregui-Lobera, I., Bolanos-Rios, P., & Garrido-Casals, O. (2011). Parenting styles and eating disorders. Journal of Psychiatric and Mental Health Nursing, 18(8), 728-735. https://doi.org/10.1111/j.1365-2850.2011.01723.x
https://doi.org/10.1111/j.1365-2850.2011...
; Leonidas & Santos, 2015aLeonidas, C., & Santos, M. A. (2015a). Family relations in eating disorders: The genogram as instrument of assessment. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1435-1447. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.07802014
https://doi.org/10.1590/1413-81232015205...
, 2015bLeonidas, C., & Santos, M. A. (2015b). Relacionamentos afetivo-familiares em mulheres com anorexia e bulimia. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 31(2), 181-191. https://doi.org/10.1590/0102-37722015021711181191
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; Oliveira & Santos, 2006Oliveira, E. A., & Santos, M. A. (2006). Perfil psicológico de pacientes com anorexia e bulimia nervosas: A ótica do psicodiagnóstico. Medicina (Ribeirão Preto), 39(3), 353-360. https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v39i3p353-360
https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262....
; Santos et al., 2016Santos, M. A., Leonidas, C., & Costa, L. R. S. (2016). Grupo multifamiliar no contexto dos transtornos alimentares: A experiência compartilhada. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 68(3), 43-58.; Simões & Santos, 2021Simões, M., & Santos, M. A. (2021). Paternity and parenting in the context of eating disorders: An integrative literature review. Psicologia: Teoria e Pesquisa , 37, e37459. https://doi.org/10.1590/0102.3772e37459
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).

Os relacionamentos familiares costumam ser instáveis e marcados por conflitos, tensões e insatisfações, com fronteiras mal definidas ou borradas entre os indivíduos (Attili et al., 2018Attili, G., Di Pentima, L., Toni, A., & Roazzi, A. (2018). High anxiety attachment in eating disorders: Intergenerational transmission by mothers and fathers. Paidéia (Ribeirão Preto), 28, e2813. http://doi.org/10.1590/1982-4327e2813
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; Souza & Pessa, 2016Souza, A. P. L., & Pessa, R. P. (2016). Tratamento dos transtornos alimentares: Fatores associados ao abandono. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 65(1), 60-67. https://doi.org/10.1590/0047-2085000000104
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; Treasure et al., 2015Treasure, J., Zipfel, S., Micali, N., Wade, T., Stice, E., Claudino, A. … Wentz, E. (2015). Anorexia nervosa. National Review, 1, 1-21. https://doi.org/10.1038/nrdp.2015.74
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). Os vínculos frequentemente oscilam entre o emaranhamento emocional e o distanciamento afetivo, o que oferece um substrato psicológico e relacional propício para o aparecimento dos sintomas (Ferreira et al., 2021Ferreira, I. M. S., Souza, A. P. L., Azevedo, L. D. S., Leonidas, C., Santos, M. A., & Pessa, R. P. (2021). The influence of mothers on the development of their daughter’s eating disorders: An integrative review. Archives of Clinical Psychiatry, 48(2), 168-177. http://doi.org/110.15761/0101-60830000000300
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; Leonidas & Santos, 2015aLeonidas, C., & Santos, M. A. (2015a). Family relations in eating disorders: The genogram as instrument of assessment. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1435-1447. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.07802014
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, 2015bLeonidas, C., & Santos, M. A. (2015b). Relacionamentos afetivo-familiares em mulheres com anorexia e bulimia. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 31(2), 181-191. https://doi.org/10.1590/0102-37722015021711181191
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; Santos et al., 2016Santos, M. A., Leonidas, C., & Costa, L. R. S. (2016). Grupo multifamiliar no contexto dos transtornos alimentares: A experiência compartilhada. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 68(3), 43-58.). Uma vez que se reconhece a natureza multifatorial da etiopatogenia dos TAs (Siqueira et al., 2020Siqueira, A. B. R., Santos, M. A., & Leonidas, C. (2020). Confluências das relações familiares e transtornos alimentares: Revisão integrativa da literatura. Psicologia Clínica, 32(1), 123-149. https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v0032n01A06
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), o plano terapêutico deve priorizar o formato multiprofissional e focar na reabilitação integral da pessoa adoecida, considerando suas necessidades nos aspectos clínicos, nutricionais, psicológicos, psiquiátricos, familiares e socioculturais envolvidos (American Psychiatric Association [APA], 2006American Psychiatric Association [APA] (2006). Practice guideline for the treatment of patients with eating disorders. American Psychiatric Association.).

O plano terapêutico envolve ações sustentadas e coordenadas por equipe interdisciplinar de saúde, cuja organização básica é constituída por psicólogo, nutricionista, psiquiatra e clínico geral ou nutrólogo. Este é o formato mínimo reconhecido como mais adequado para acompanhamento dos TAs na atualidade (Pinheiro et al., 2010Pinheiro, A. P., Raney, T. J., Thornton, L. M., Fichter, M. M., Berrettini, W. H., Goldman, D., Halmi, K. A., Kaplan, A. S., Strober, M., Treasure, J., Woodside, D. B., Kaye, W. H., & Bulik, C. M. (2010). Sexual functioning in women with eating disorders. International Journal of Eating Disorders, 43(2), 123-129. https://doi.org/10.1002/eat.20671
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; Scorsolini-Comin & Santos, 2012Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2012). Psicoterapia como estratégia de tratamento dos transtornos alimentares: Análise crítica do conhecimento produzido. Estudos de Psicologia (Campinas), 29(Suplemento), 851-863. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2012000500021
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; Sicchieri et al., 2006Sicchieri, J. M. F., Bighetti, F., Borges, N. J. B. G., Santos. J. E., & Ribeiro, R. P. P. (2006). Manejo nutricional dos transtornos alimentares. Medicina (Ribeirão Preto), 39(3), 371-374. https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v39i3p371-374
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). Os serviços especializados no tratamento estão alocados em diferentes equipamentos de saúde, como hospitais e ambulatórios, em unidades de clínica médica, pediátrica e psiquiátrica. Variam em função do tipo de assistência oferecida, como atendimento ambulatorial, hospital-dia e internação integral. A modalidade a ser indicada dependerá das condições clínicas, emocionais, psiquiátricas e do suporte sociofamiliar de cada paciente (Cabrera, 2006Cabrera, C. C. (2006). Estratégias de intervenção interdisciplinar no cuidado com o paciente com transtorno alimentar: O tratamento farmacológico. Medicina (Ribeirão Preto ), 39(3), 375-380. https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v39i3p375-380
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; Leonidas & Santos, 2020Leonidas, C., & Santos, M. A. (2020). Percepção do apoio social e configuração sintomática na Anorexia Nervosa. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-14. https://doi.org/10.1590/1982-3703003207693
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).

No Brasil, as pessoas com diagnóstico de TAs que são acompanhadas na rede pública de saúde seguem a lógica de organização da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Instituída pela Portaria 3.088/2011 (2011) do Ministério da Saúde, a RAPS concretiza a Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas e os princípios da Reforma Psiquiátrica, movimento que ganhou força no país na década de 1970, com objetivo de rearticular o sistema de tratamento clínico das questões de saúde mental (Portaria nº 3.088, 2011Portaria nº 3.088, 23 de dezembro de 2011 (2011). Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União.; Silva et al., 2019Silva, M. N. R. M. O., Abbad, G. S., & Montezano, L. (2019). Practices and therapeutic strategies of the psychosocial care centers alcohol and drugs. Paidéia (Ribeirão Preto ), 29, e2903. http://doi.org/10.1590/1982-4327e2903
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). A RAPS é constituída por componentes que visam a garantir a atenção integral e os direitos à saúde das pessoas com psicopatologias (Ramos & Pedrão, 2013Ramos, T. M. B., & Pedrão, L. J. (2013). Acolhimento e vínculo em um serviço de assistência a portadores de transtornos alimentares. Paidéia (Ribeirão Preto), 23(54), 113-120. https://doi.org/10.1590/1982-43272354201313
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).

A literatura indica que, se o tratamento de um TA não for iniciado precocemente, o curso da doença tende a ser prolongado, produzindo graves prejuízos físicos e psicológicos, além de apresentar taxa de mortalidade elevada, especialmente em pacientes com AN (Scorsolini-Comin & Santos, 2012Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2012). Psicoterapia como estratégia de tratamento dos transtornos alimentares: Análise crítica do conhecimento produzido. Estudos de Psicologia (Campinas), 29(Suplemento), 851-863. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2012000500021
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; Treasure et al., 2015Treasure, J., Zipfel, S., Micali, N., Wade, T., Stice, E., Claudino, A. … Wentz, E. (2015). Anorexia nervosa. National Review, 1, 1-21. https://doi.org/10.1038/nrdp.2015.74
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). Apesar de se reconhecer a importância do acompanhamento multiprofissional para pacientes com TAs, sabe-se que esses transtornos apresentam elevado índice de cronicidade e que as taxas de abandono do tratamento por parte da população acometida são elevadas, chegando a 73%, dependendo da modalidade de seguimento e da unidade de saúde que oferece a assistência especializada (Fassino et al., 2009Fassino, S., Pierò, A., Tomba, E., & Abbate-Daga, G. (2009). Factors associated with dropout from treatment for eating disorders: A comprehensive literature review. BMC Psychiatry, 9, article number: 67. https://doi.org/10.1186/1471-244X-9-67
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; Souza & Pessa, 2016Souza, A. P. L., & Pessa, R. P. (2016). Tratamento dos transtornos alimentares: Fatores associados ao abandono. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 65(1), 60-67. https://doi.org/10.1590/0047-2085000000104
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). No entanto, ainda pouco se sabe sobre os fatores e variáveis intervenientes nesse fenômeno, o que faz da adesão ao tratamento um ponto crítico na continuidade da linha de cuidados (Souza et al., 2019Souza, A. P. L., Valdanha-Ornelas, E. D., Santos, M. A., & Pessa, R. P. (2019). Significados do abandono do tratamento para pacientes com transtornos alimentares. Psicologia: Ciência e Profissão, 39, e188749. https://doi.org/10.1590/1982-3703003188749
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).

A literatura tem documentado as repercussões sistêmicas dos TAs. Familiares de pessoas acometidas também são afetados pelo impacto da doença (Leonidas & Santos, 2020Leonidas, C., & Santos, M. A. (2020). Percepção do apoio social e configuração sintomática na Anorexia Nervosa. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-14. https://doi.org/10.1590/1982-3703003207693
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; Souza & Santos, 2009Souza, L. V., & Santos, M. A. (2009). A construção social de um grupo multifamiliar no tratamento dos transtornos alimentares. Psicologia: Reflexão e Crítica, 22(3), 483-492. http://doi.org/10.1590/S0102-79722009000300020
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, 2012Souza, L. V., & Santos, M. A. (2012). Familiares de pessoas diagnosticadas com transtornos alimentares: Participação em atendimento grupal.Psicologia: Teoria e Pesquisa,28(3), 325-334.http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v28n3.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v2...
). O convívio cotidiano com esses agravos tem sido associado a problemas de saúde física e mental, bem como à depreciação na qualidade de vida. Estudos mostram que pais de pessoas com TAs vivenciam prejuízos de natureza pessoal, social, ocupacional e econômica, e que os níveis de estresse e burnout associados ao cuidado são similares aos observados na assistência a indivíduos com transtorno psicótico (Hillege et al., 2006Hillege, S., Beale, B., & McMaster, R. (2006). Impact of eating disorders on family life: Individual parents’ stories. Journal of Clinical Nursing, 15(8), 1016-1022. https://doi.org/10.1111/j.1365-2702.2006.01367.x
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; Zabala et al., 2009Zabala, M. J., MacDonald, P., & Treasure, J. (2009). Appraisal of caregiving burden, expressed emotion and psychological distress in families of people with eating disorders: A systematic review. European Eating Disorders Review, 17(5), 338-349.https://doi.org/10.1002/erv.925
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).

Diante desse cenário, é compreensível que as diretrizes internacionais para o tratamento dos TAs recomendem a participação familiar para obtenção de melhores resultados terapêuticos (APA, 2006American Psychiatric Association [APA] (2006). Practice guideline for the treatment of patients with eating disorders. American Psychiatric Association.). Trabalhar a ansiedade dos pais e os recursos de enfrentamento necessários para lidar com os sintomas dos filhos pode ser crucial para que consigam compreender a natureza do sofrimento psicológico e oferecer maior autonomia aos pacientes. A inclusão da família como unidade de cuidado pode aumentar as chances de sucesso do tratamento a longo prazo (Leonidas et al., 2019Leonidas, C., Nazar, B. P., Munguía, L., & Santos, M. A. (2019). How do we target the factors that maintain anorexia nervosa? A behaviour change taxonomical analysis. International Review of Psychiatry, 31(4), 403-410.https://doi.org/10.1080/09540261.2019.1624509
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; Scorsolini-Comin & Santos, 2012Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2012). Psicoterapia como estratégia de tratamento dos transtornos alimentares: Análise crítica do conhecimento produzido. Estudos de Psicologia (Campinas), 29(Suplemento), 851-863. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2012000500021
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; Sibeoni et al., 2017Sibeoni, J., Orri, M., Valentin, M., Podlipski, M. A., Colin, S., Pradere, J., & Revah-Levy, A. (2017). Metasynthesis of the views about treatment of anorexia nervosa in adolescents: Perspectives of adolescents, parents, and professionals. PLOS ONE, 12(1), 1-21. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0169493
https://doi.org/10.1371/journal.pone.016...
; Simões & Santos, 2021Simões, M., & Santos, M. A. (2021). Paternity and parenting in the context of eating disorders: An integrative literature review. Psicologia: Teoria e Pesquisa , 37, e37459. https://doi.org/10.1590/0102.3772e37459
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). As diretrizes reconhecem a relevância da escuta e do acolhimento desses familiares, que via de regra não dispõem de tanto espaço nos serviços quanto aquele que é reservado aos pacientes (Souza & Santos, 2009Souza, L. V., & Santos, M. A. (2009). A construção social de um grupo multifamiliar no tratamento dos transtornos alimentares. Psicologia: Reflexão e Crítica, 22(3), 483-492. http://doi.org/10.1590/S0102-79722009000300020
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). O apoio à família de pessoas com TAs comumente se resume a orientações pontuais, carecendo de um suporte contínuo e prolongado, como geralmente é oferecido aos indivíduos acometidos (McFarlane, 2016McFarlane, W. R. (2016). Family interventions for schizophrenia and the psychoses: A review. Family Process, 55(3), 460-482. https://doi.org/10.1111/famp.12235
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; Vall & Wade, 2015Vall, E., & Wade, T. D. (2015). Predictors of treatment outcome in individuals with eating disorders: A systematic review and meta-analysis. International Journal of Eating Disorders, 48(7), 946-971. https://doi.org/10.1002/eat.22411
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). Contrapondo-se ao que se observa na realidade da maior parte dos serviços, na percepção dos profissionais de saúde a inclusão dos familiares no tratamento de seus entes adoecidos pode resultar em benefícios, tanto para si próprios como para os pacientes (Souza & Santos, 2012Souza, L. V., & Santos, M. A. (2012). Familiares de pessoas diagnosticadas com transtornos alimentares: Participação em atendimento grupal.Psicologia: Teoria e Pesquisa,28(3), 325-334.http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v28n3.pdf
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).

A participação familiar no tratamento para TAs não deve ser justificada apenas como decorrência do impacto emocional do convívio cotidiano com uma pessoa acometida. O engajamento é fundamental, sobretudo porque o nível de envolvimento da família nesse processo guarda relação com o prognóstico do paciente, devido à influência da dinâmica familiar no desenvolvimento e manutenção dos sintomas (Leonidas & Santos, 2020Leonidas, C., & Santos, M. A. (2020). Percepção do apoio social e configuração sintomática na Anorexia Nervosa. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-14. https://doi.org/10.1590/1982-3703003207693
https://doi.org/10.1590/1982-37030032076...
; Siqueira et al., 2020Siqueira, A. B. R., Santos, M. A., & Leonidas, C. (2020). Confluências das relações familiares e transtornos alimentares: Revisão integrativa da literatura. Psicologia Clínica, 32(1), 123-149. https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v0032n01A06
https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v003...
; Valdanha et al., 2013Valdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., Peres, R. S., & Santos, M. A. (2013). Influência familiar na anorexia nervosa: em busca das melhores evidências científicas. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(3), 225-233. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000300007
https://doi.org/10.1590/S0047-2085201300...
). Estudo comprovou que incluir as famílias no tratamento dos TAs traz benefícios não apenas em termos de qualidade de vida e bem-estar dos envolvidos, mas também na redução dos dias de internação e da necessidade de uso de recursos hospitalares por parte dos pacientes, o que faz com que os custos do tratamento sejam menores (Treasure et al., 2020Treasure, J., Parker, S., Oyeleye, O., & Harrison, A. (2020). The value of including families in the treatment of anorexia nervosa. European Eating Disorders Review, 1-9. https://doi.org/ 10.1002/erv.2816
https://doi.org/ 10.1002/erv.2816...
).

Na literatura científica, já se encontram metassínteses que abordam a percepção do tratamento para TAs sob a perspectiva de pacientes (Espíndola & Blay, 2009Espíndola, C. R., & Blay, S. L. (2009). Anorexia nervosa treatment from the patient perspective: A metasynthesis of qualitative studies. Annals of Clinical Psychiatry, 21(1), 38-48.) e de familiares (Sibeoni et al., 2017Sibeoni, J., Orri, M., Valentin, M., Podlipski, M. A., Colin, S., Pradere, J., & Revah-Levy, A. (2017). Metasynthesis of the views about treatment of anorexia nervosa in adolescents: Perspectives of adolescents, parents, and professionals. PLOS ONE, 12(1), 1-21. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0169493
https://doi.org/10.1371/journal.pone.016...
), porém, com escopo limitado ao campo da AN. Também se encontram revisões sistemáticas, como um estudo que inclui os profissionais de saúde (Johns et al., 2019Johns, G., Taylor, B., John, A., & Tan, J. (2019). Current eating disorder healthcare services: the perspectives and experiences of individuals with eating disorders, their families and health professionals: Systematic review and thematic synthesis. BJPsych Open, 5(4), 1-10. https://doi.org/10.1192/bjo.2019.48
https://doi.org/10.1192/bjo.2019.48...
). No entanto, não foram identificados estudos de metassíntese com objetivo de reunir evidências qualitativas acerca da percepção do tratamento para TAs sob a ótica dos familiares dos pacientes acometidos. Com vistas a preencher essa lacuna do conhecimento científico, este estudo teve por objetivo sintetizar e reinterpretar os resultados dos estudos qualitativos primários sobre a percepção de familiares de pessoas com TAs acerca do tratamento.

Método

A metassíntese é uma ferramenta metodológica que busca sistematizar, analisar e reinterpretar os resultados obtidos por outros estudos qualitativos primários, recuperados a partir de revisão sistemática da literatura (Carvalho et al., 2019Carvalho, L. F., Pianowski, G., & Santos, M. A. (2019). Guidelines for conducting and publishing systematic reviews in psychology. Estudos de Psicologia (Campinas), 36, e180144. http://doi.org/10.1590/1982-0275201936e180144
http://doi.org/10.1590/1982-0275201936e1...
; Lopes & Fracolli, 2008Lopes, A. L. M., & Fracolli, L. A. (2008). Revisão sistemática de literatura e metassíntese qualitativa: Considerações sobre sua aplicação na pesquisa em Enfermagem. Texto & Contexto - Enfermagem, 17(4), 771-778. https://doi.org/10.1590/S0104-07072008000400020
https://doi.org/10.1590/S0104-0707200800...
). Por essa razão, é considerada uma estratégia apropriada para alcançar o objetivo proposto por este estudo. É estruturada em torno de um argumento organizador e transcende a mera compilação de pesquisas já realizadas. Propõe-se a operacionalizar uma avaliação crítica dos estudos qualitativos publicados na literatura científica disponível em determinada temática. Essa síntese interpretativa gera um conhecimento original ampliado a partir de uma comparação, tradução e nova interpretação que o pesquisador realiza sobre os resultados dos estudos primários (Sandelowski & Barroso, 2006Sandelowski, M., & Barroso, J. (2006). Handbook for synthesizing qualitative research. Springer Publishing. ).

Procedimento de Coleta de Dados

A metassíntese foi registrada no International Prospective Register of Systematic Reviews - PROSPERO (Davies, 2012Davies, S. (2012). The importance of PROSPERO to the National Institute for Health Research. Systematic Reviews, 1, 5. https://doi.org/10.1186/2046-4053-1-5
https://doi.org/10.1186/2046-4053-1-5 ...
), protocolo número CRD42020211915. O checklist ENTREQ (Enhancing transparency in reporting the synthesis of qualitative research), que estabelece os elementos essenciais que uma revisão qualitativa deve contemplar, foi utilizado para a elaboração deste estudo (Tong et al., 2012Tong, A., Flemming, K., McInnes, E., Oliver, S., & Craig, J. (2012). Enhancing transparency in reporting the synthesis of qualitative research: ENTREQ. BMC Medical Research Methodology, 12(1), 181. https://doi.org/10.1186/1471-2288-12-18
https://doi.org/10.1186/1471-2288-12-18...
).

Foram seguidos os seis passos propostos por Sandelowski e Barroso (2003Sandelowski, M., & Barroso, J. (2003). Creating metasummaries of qualitative findings. Nursing Research, 52(4), 226-33. https://doi.org/10.1097/00006199-200307000-00004
https://doi.org/10.1097/00006199-2003070...
) para a elaboração de uma metassíntese, que consistem em: 1) Definição da questão de pesquisa, dos parâmetros e da estratégia de busca; 2) Recuperação das evidências qualitativas: buscas sistemáticas em bases de dados; 3) Seleção dos artigos a serem analisados; 4) Avaliação metodológica dos estudos selecionados; 5) Extração e análise dos dados dos artigos; 6) Elaboração e apresentação de uma síntese qualitativa. O propósito é, ao final do processo, criar uma nova análise a partir da integração dos achados qualitativos selecionados.

Para alcançar o objetivo proposto neste estudo, foi delineada a seguinte questão norteadora: “Quais são as evidências qualitativas da literatura científica sobre a percepção dos familiares de pacientes com TAs acerca do tratamento?”. Para estruturar a estratégia de busca, foi utilizada a ferramenta SPIDER - acrônimo de Sample (Amostra), Phenomenon of Interest (Fenômeno de interesse), Design (Desenho), Evaluation (Avaliação) e Research Type (Tipo de pesquisa), projetada especialmente para identificar estudos qualitativos por meio da combinação dos descritores, incluindo sinônimos e palavras-chave, interligados pelos operadores booleanos AND e OR (Methley et al., 2014Methley, A. M., Campbell, S., Chew-Graham, C., McNally, R., & Cheraghi-Sohi, S. (2014). PICO, PICOS and SPIDER: A comparison study of specificity and sensitivity in three search tools for qualitative systematic reviews. BMC Health Services Research, 14(1), 579. https://doi.org/10.1186/s12913-014-0579-0
https://doi.org/10.1186/s12913-014-0579-...
). A Tabela 1 descreve a estratégia de busca.

Tabela 1.
Descrição da estratégia SPIDER para a busca na literatura

A seleção inicial dos estudos foi realizada por dois revisores independentes (MA; MI), devidamente treinados no uso do método, no mês de abril de 2020, em seis bases de dados: CINAHL, LILACS, PsycINFO, PubMed, Scopus e Web of Science. Essas bases foram escolhidas a partir da leitura de outras revisões da literatura e estudos de metassíntese, e em decorrência do prestígio e da adequação de cada uma ao objetivo do presente estudo.

Os descritores e palavras-chave foram elencados a partir dos CINAHL Subject Headings, Browse Emtree, Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), APA Thesaurus e Medical Subject Headings (MeSH), e com os operadores booleanos (AND, OR), respeitando-se as especificidades de cada base de dados. Como exemplo de uma trilha/conjunto de termos MeSH utilizados para a captura dos artigos: “Feeding and Eating Disorders” AND “Therapeutics” AND “Focus Groups” AND “Perception/psychology” AND “Qualitative Research”. Não houve delimitação do período de busca, sendo considerados elegíveis artigos publicados em quaisquer datas. A busca foi circunscrita aos artigos publicados em português, inglês ou espanhol, devido à fluência dos pesquisadores.

Para a inclusão dos artigos na metassíntese, os seguintes critérios foram delineados: (a) estudos qualitativos primários; (b) estudos que apresentassem a percepção dos próprios familiares acerca do tratamento para TAs. Os critérios de exclusão foram: (a) estudos qualitativos que não incluíram seres humanos (como estudos teóricos e/ou reflexivos); (b) estudos qualitativos, nos quais não houve participação de familiares (como os que continham apenas a percepção de pacientes e/ou profissionais); (c) estudos de métodos mistos, em que os resultados qualitativos não puderam ser separados dos achados quantitativos; (d) pesquisas com método quantitativo; (e) literatura cinzenta, como teses, dissertações, relatórios e preprints; (f) artigos publicados em idiomas diferentes da língua portuguesa, inglesa ou espanhola.

Para organizar os estudos primários e eliminar os duplicados, foi utilizado o gerenciador de referências Rayyan. Os avaliadores revisaram os títulos e resumos de acordo com os critérios de inclusão/exclusão estabelecidos. Em um primeiro momento os estudos duplicados e aqueles que não atendiam aos critérios de inclusão foram removidos. As listas elaboradas pelos revisores foram sistematicamente ordenadas com amparo do software e, posteriormente, comparadas. O resultado da seleção realizada pelos avaliadores foi validado pelo Teste Kappa, obtendo-se um índice de concordância inter-juízes de 0,87, que indica uma concordância quase perfeita entre os avaliadores (Viera & Garrett, 2005Viera, A. J., & Garrett, J. M. (2005). Understanding interobserver agreement: The kappa statistic. Family Medicine, 37(5), 360-363.). Os procedimentos operacionalizados nessa etapa foram representados por meio de um fluxograma, de acordo com o modelo preconizado pela estratégia PRISMA - Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (Moher et al, 2009Moher, D., Liberati, A., Tetzlaff, J., Altman, D. G., & Prisma Group. (2009). Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses: The PRISMA statement. PLoS Medicine, 6(7), e1000097. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1000097
https://doi.org/10.1371/journal.pmed.100...
).

Procedimento de Análise dos Dados

A avaliação da qualidade metodológica dos estudos selecionados foi estabelecida de acordo com a lista de verificação de qualidade do instrumento Critical Appraisal Skills Programme[CASP] (2018Critical Appraisal Skills Programme. (2018). CASP (10 questions to help you make sense of a Qualitative research) Checklist. https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/3.0/
https://creativecommons.org/licenses/by-...
). Esse instrumento é composto por 10 questões com 3 alternativas de respostas: YES (); NO (X) e CAN´T TELL (?), que possibilitam operar uma análise sistematizada da qualidade de um estudo qualitativo. O instrumento agrupa as questões em três grandes temas de análise: validade do estudo (seção A), resultados (seção B) e utilidade (seção C). Nos casos de dúvida sobre a elegibilidade do artigo, a autora (MA) e o revisor (MI) tomaram uma decisão em acordo mútuo. Eventuais discordâncias foram dirimidas após revisão e discussão com o grupo de pesquisa. Os estudos atenderam a maioria dos itens do CASP: oito atenderam a todos os itens (42,1%), cinco contemplaram nove itens (26,3%), quatro atenderam a oito itens (21,1%) e dois estudos a sete itens (10,5%).

Para análise dos dados qualitativos extraídos dos estudos, foi utilizado o procedimento preconizado por Thomas e Harden (2008Thomas, J., & Harden, A. (2008). Methods for the thematic synthesis of qualitative research in systematic reviews. BMC Medical Research Methodology, 8(1), 45. https://doi.org/10.1186/1471-2288-8-45
https://doi.org/10.1186/1471-2288-8-45...
). Esses autores descrevem o processo de extração e análise dos dados por meio do método de síntese temática, de acordo com os seguintes passos: 1) Codificação: leitura na íntegra dos estudos qualitativos primários para a identificação e criação de free-codes relacionados aos objetivos da síntese temática; 2) Geração de temas descritivos: agrupamento sistemático dos free-codes por áreas relacionadas, para a construção de temas descritivos; 3) Desenvolvimento do tema analítico: os temas elaborados a partir dos resultados obtidos foram reorganizados e reapresentados de maneira interpretativa, considerando o objetivo da metassíntese.

Para a análise dos dados, foi utilizado, de forma independente pelos dois revisores da etapa anterior, o software de análise qualitativa QDA MINER LITE® (versão 2.07), que facilitou a visualização dos códigos criados, auxiliou na organização dos códigos em uma estrutura em árvore e permitiu adicionar comentários por todo o projeto codificado. Os dados extraídos dos artigos incluídos na metassíntese foram transferidos para o software. Após leitura integral dos dados, iniciou-se a primeira etapa da codificação segundo a técnica line-by-line, que resultou inicialmente em 8 temas que congregaram 45 códigos distintos. Na segunda etapa da codificação, os códigos foram agrupados por temas em comum, guiada pela questão de pesquisa e levando em consideração aqueles códigos que a respondiam diretamente, o que resultou em 3 temas com um total de 16 códigos.

Os revisores (MA; MI) executaram todas as etapas de análise de forma independente. Nos casos em que foram observadas divergências na apreciação do material, os avaliadores discutiram pontualmente até alcançarem o consenso. Conforme preconizado no método, a análise final foi discutida e validada por um grupo de cinco pesquisadores, que acompanharam o processo completo da produção da metassíntese. A extração dos dados dos estudos e sua caracterização detalhada, bem como seus números de referência utilizados ao longo deste artigo, encontram-se sistematizados na Tabela 2.

Tabela 2.
Caracterização dos estudos incluídos na metassíntese

Resultados e Discussão

A Figura 1 detalha o processo de busca e seleção dos estudos elegíveis para a elaboração da metassíntese. Dos 1115 estudos identificados, 449 foram excluídos por estarem duplicados (presentes em mais de uma base consultada), restando 666 artigos. Na sequência, os títulos e resumos desses estudos foram lidos de maneira independente pela autora e um revisor (MA; MI), seguindo os critérios de inclusão e exclusão previamente estabelecidos. Nessa etapa do processo de refinamento da busca, outras 640 referências foram excluídas. Os 26 artigos restantes foram recuperados e lidos na íntegra, sendo que, desse total, 7 foram excluídos por não atenderem aos critérios de inclusão. Dessa forma, a amostra final ficou constituída por 19 artigos.

Figura 1.
Fluxograma com os passos de seleção dos artigos da metassíntese segundo as diretrizes PRISMA

Foram construídos três temas descritivos que, ao final, originaram o tema analítico.

Tema Descritivo 1: Percepções dos Familiares sobre a Relação com os Agentes de Saúde

Este tema descritivo é composto por sete códigos - falta de especialização em TAs (8), problemas de comunicação (6), exclusão (3), culpabilização (6), aspectos positivos na relação com profissionais (9), universalização (7) e necessidade de informação (9). Esses códigos delineiam a percepção dos familiares acerca dos serviços e profissionais de saúde responsáveis pelo tratamento de seus entes acometidos por TAs, bem como a percepção acerca do modo como se relacionam com esses elementos.

A falta de especialização e conhecimento sobre TAs, código identificado em oito dos artigos selecionados (estudos de número 1, 2, 3, 11, 14, 17, 18 e 19), reflete a percepção dos familiares participantes dos estudos de que, desde o início de sua busca por ajuda, os profissionais da área da saúde tiveram dificuldades em relacionar os sintomas apresentados a um possível diagnóstico de TA. Também foram encontradas dificuldades e barreiras para encontrar e acessar serviços especializados em TAs. A fala de um participante ilustra essa percepção: “Minha experiência é que o contato inicial com o profissional de atenção primária não é bom, simplesmente porque ele não tem experiência em lidar com muitas pessoas que sofrem de transtornos alimentares” (estudo 1, p. 406).

No que se refere à relação direta entre os familiares e os profissionais de saúde responsáveis pelo tratamento, seis estudos (1, 3, 11, 17, 18 e 19) reportam conflitos e dificuldades na comunicação, seja por parte da equipe com a família, ou dos próprios profissionais entre si. Os familiares lamentaram a falta de devolutiva, por parte dos profissionais, acerca do progresso de seus entes acometidos por TAs. Pais de adolescentes diagnosticados com o transtorno queixaram-se de que os psicólogos e outros profissionais que atendiam seus filhos mantinham boa relação com os pacientes, mas não com os familiares, especialmente no que concerne ao não fornecimento de informações sobre o estado psicológico ou as necessidades do paciente. O relato da mãe de uma paciente com TA ilustra essas lacunas percebidas na comunicação entre familiar e agente de saúde: “Eu já estava surtando nessa fase... encontrei o médico no campo de golfe... ele falou que eu era só uma mãe neurótica e que era para dar o fora e deixar isso para as pessoas que sabem o que estão fazendo” (estudo 18, p. 71).

Sentimentos de culpabilização e exclusão por parte da equipe profissional responsável pelo tratamento estiveram presentes em seis (1, 2, 3, 5, 14 e 18) e três artigos (7, 17 e 18), respectivamente. Pais de adolescentes e jovens com TAs, em especial, referiram perceber que os profissionais atribuíam o diagnóstico do transtorno à falta de habilidades parentais e falhas na relação entre pais e filhos, não conseguindo favorecer com que esses familiares se sentissem acolhidos em suas dificuldades. Isso pode ser ilustrado com o excerto de fala de uma mãe: “Senti que ela estava me culpando, sabe, que minha filha tinha um transtorno alimentar por minha causa” (estudo 1, p. 407).

Os familiares também referiram se sentir isolados e, em alguns casos, explicitamente desencorajados a se envolverem no tratamento de seus entes acometidos por TAs, o que gerou sentimentos de exclusão (estudo 17). Em alguns casos, os pais até mesmo associaram sua exclusão do tratamento à culpabilização, percebendo que ser afastados dos cuidados que a equipe dedicava aos filhos fez com que se sentissem como parte do problema, portanto, responsáveis por ele, estabelecendo assim uma relação dinâmica e interdependente entre esses dois aspectos. Isso pode ser ilustrado com o excerto de fala de uma mãe: “Afastar-me e deixá-la ali foi uma das piores coisas que já tive que fazer. Olhando para trás agora, me pergunto se realmente foi a coisa certa a fazer” (estudo 18, p. 70).

A despeito dos conflitos vivenciados nas relações e das dificuldades de comunicação mencionadas, aspectos positivos dos relacionamentos entre familiares e profissionais de saúde aparecem em nove artigos (1, 6, 8, 9, 13, 14, 15, 17 e 18), ou seja, em metade da amostra da metassíntese. Os participantes se mostram gratos pela postura empática com que alguns profissionais se dirigiram a eles, bem como associam a permanência ou até mesmo o sucesso no tratamento à relação estabelecida com os agentes de saúde e à confiança e apoio inspirados por eles nos direcionamentos e dicas ofertadas. “O ponto mais importante para nós, como pais, era ter alguém a quem recorrer quando as coisas não iam bem. A relação com o profissional de saúde, aquela retaguarda, nos deu a confiança para deixarmos acontecer” (estudo 6, p. 1550).

Sete artigos (2, 10, 11, 12, 14, 16 e 19) contemplam o código referente à universalização, ou seja, à importância atribuída pela família aos espaços de troca e compartilhamento com outras pessoas que passam ou já passaram por situações semelhantes, o que ocorre comumente em grupos de apoio oferecidos pelos serviços de saúde. Os participantes referem que o diálogo com outros familiares de pessoas com TAs ajuda a reduzir os sentimentos de isolamento e culpa, incrementa a esperança, auxilia na melhor compreensão do problema e ainda possibilita aprender com as experiências dos demais, como ilustra a fala de uma mãe: “Eu fui a alguns dos grupos de apoio, que foram fantásticos porque eu não sabia o suficiente sobre isso, e eu dizia ‘ela faz isso e ela faz aquilo’, e eles diziam: ‘sim, sim, eles fazem isso também’, então eles eram fundamentais para superar toda a situação, por eu saber que todos os outros passavam pelo mesmo que eu” (estudo 16, p. 339). Estudo de Souza e Santos (2010Souza, L. V., & Santos, M. A. (2010). A participação da família no tratamento dos transtornos alimentares. Psicologia em Estudo (Maringá), 15(2), 285-294. http://doi.org/10.1590/S1413-73722010000200007
http://doi.org/10.1590/S1413-73722010000...
) evidenciou que, para os familiares de pessoas com TAs, o grupo de apoio funciona como espaço que favorece a produção de sentidos sobre o transtorno, permitindo assim que seus membros possam desconstruir e reconstruir os significados de suas experiências.

Outro código, presente em nove artigos (1, 2, 3, 7, 8, 15, 16, 18, 19), expressa a necessidade dos familiares de obter mais informações qualificadas a respeito do transtorno, dos pormenores do tratamento e do estado de saúde do paciente acometido, evidenciando suas percepções a respeito de um fornecimento insuficiente de esclarecimentos por parte dos serviços e profissionais envolvidos no tratamento. Apenas alguns participantes referem ter obtido informações suficientes a respeito dos aspectos mencionados, como mostram três estudos incluídos na metassíntese (artigos de número 10, 14 e 19). Nesses casos, os familiares pontuam que lhes foi oferecida quantidade adequada de esclarecimentos, com respostas às suas dúvidas e explicações sobre o tratamento. Uma fala sugere como uma mãe se sentiu satisfeita com as informações recebidas, ao mesmo tempo em que evidencia a importância de também existir por parte dela uma postura ativa em buscar a literatura indicada pelo serviço de saúde em que realizava o tratamento de sua filha.

Tema Descritivo 2: Percepção dos Familiares sobre o Formato e a Estrutura do Tratamento

Este tema descritivo compõe-se de quatro códigos: foco do tratamento (6), estrutura geral do tratamento (5), compreensão dos objetivos (2) e voz de todos (4), que evidenciam a percepção dos familiares acerca do formato, estrutura e conteúdo dos tratamentos oferecidos a seus entes acometidos.

O foco do tratamento, assunto que aparece em seis estudos (2, 3, 5, 14, 17 e 19), coloca em evidência as opiniões dos familiares acerca dos aspectos que eles consideram que são priorizados pelos serviços e profissionais de saúde no cuidado a seus entes com TAs. Diversos relatos dos participantes questionam ou criticam a importância exagerada que as unidades de saúde atribuem ao peso corporal e a sintomas físicos em geral, definindo-os como critérios de admissão para o tratamento ou mesmo como medidas confiáveis de melhora dos pacientes, como pode ser percebido na fala de uma mãe: “O foco parece estar todo nos aspectos alimentares, mas, do meu ponto de vista como mãe, a comida é o produto final de todo o problema. O que está acontecendo por debaixo disso? O que está causando tudo isso?” (estudo 5, p. 9). Quando os familiares criticam o foco de interesse que é colocado na melhora dos sintomas físicos em detrimento, por exemplo, dos progressos emocionais/psicológicos, alguns expressam sua opinião acerca do que poderia ou deveria ter sido considerado relevante no tratamento, tais como: padrões comportamentais e psicológicos, dificuldades subjacentes, conflitos familiares ou mesmo a necessidade de acolhimento por parte da família.

No que diz respeito à estrutura e organização do tratamento, cinco artigos (1, 10, 14, 15 e 17) expõem a perspectiva dos familiares sobre as suas próprias experiências. Um dos atributos considerados é a questão da participação ou não dos pacientes durante as sessões terapêuticas ou de orientação destinadas aos familiares. Familiares que fizeram todas as sessões na presença de seus entes acometidos por TAs expressaram sua frustração com esse modus operandi, relatando que sentiram falta de sessões exclusivas para eles, de modo a abrir espaço para que se sentissem mais confortáveis para compartilhar, com maior autenticidade, suas dificuldades e emoções desagradáveis, como ilustra o excerto: “[Teríamos gostado de] sessões nas quais estivéssemos sozinhos... quando poderíamos ter sido mais honestos na expressão de nossos sentimentos” (estudo 17, p. 374). Por outro lado, alguns familiares que participaram de encontros com e sem o paciente acreditam que seria importante que os entes acometidos por TAs estivessem presentes em mais momentos do que estiveram de fato, de modo que houvesse mais oportunidades de compartilhamento de experiências e diálogo dentro da própria família. “Muito trabalho foi feito sem [que minha filha] estivesse lá e aí ela foi trazida como paciente, para participar... até certo ponto o sentimento dela era que ela estava sendo excluída” (estudo 14, pp. 135-136).

Dois estudos (números 1 e 14) destacam a perspectiva dos familiares acerca dos objetivos e metas do tratamento familiar para os TAs. Os participantes apresentaram compreensões diferentes a respeito dos objetivos de um mesmo modelo de tratamento, evidenciando que esse aspecto não havia sido compreendido adequadamente ou não havia sido exposto com suficiente clareza para os familiares, o que, segundo eles, incrementa sentimentos disfóricos, como ansiedade e medo. Enquanto alguns acreditavam que os principais objetivos eram entender melhor a doença em si e melhorar as estratégias de comunicação, outros alegavam que a meta era identificar problemas e dificuldades em cada família e trabalhá-las de forma específica. Alguns entenderam que o objetivo era criar estratégias para obter ganho de peso do ente acometido pelo TA, e havia ainda quem entendesse que o propósito era aprender técnicas de cuidado utilizadas no serviço de saúde para poder aplicá-las no ambiente doméstico.

Os familiares relatam que tiveram dificuldades de avaliar se o tratamento estava de fato sendo efetivo e consistente com o que se propunha, justamente porque as metas e os objetivos não eram conhecidos por eles, por não serem apresentados de forma clara e cristalina. Em alguns casos, foram relatados sentimentos de frustração por perceberem que seu entendimento sobre os objetivos não correspondia ao que estava sendo oferecido ou proposto no serviço de saúde.

A despeito das emoções desagradáveis vivenciadas pelos familiares durante o tratamento de seus entes acometidos por TAs, quatro estudos (5, 9, 15 e 17) reportam falas de familiares que evocam percepções positivas do tratamento, em especial associadas a um aspecto específico: a experiência de sentirem que suas vozes e de seus familiares foram ouvidas e validadas durante a terapia familiar. Os participantes dessas pesquisas expressam satisfação e gratidão em relação ao fato de que todos os membros da família puderam, pela primeira vez, se beneficiar de um espaço permissivo para conversarem e “desabafarem” a respeito das repercussões do TA em seu cotidiano.

Tema Descritivo 3: Percepções dos Familiares sobre os Resultados do Tratamento

Esse tema descritivo é composto por cinco códigos: ausência de progresso (4), melhora nos sintomas (6), melhora no estilo parental (8), melhora no autocuidado e enfrentamento (7) e consciência da importância de seu papel (6). Esses códigos expõem as perspectivas dos familiares no que diz respeito aos resultados do tratamento, ou seja, suas consequências, progresso e desfecho, tanto em relação a si próprios, como a seus entes acometidos por TAs.

Quatro artigos (5, 11, 17 e 19) destacam a percepção dos familiares de que não houve progresso nos sintomas do paciente em tratamento. A percepção de ausência de melhora do TA no decorrer do processo esteve relacionada à expectativa prévia sobre o tratamento, os resultados esperados e o tempo necessário para se obter os efeitos desejados, como sugere a fala de um pai: “Eu não estava preparado para o tempo que levou até chegarmos no ponto em que estamos hoje. Tem sido um processo muito gradual” (estudo 17, p. 376). Apesar da perspectiva dominante de que não se alcançou o progresso esperado nesses casos, seis estudos (9, 11, 13, 15, 17 e 19) relatam a percepção de melhoras nas condições gerais e na sintomatologia do ente acometido pelo TA. Alguns participantes mencionaram progressos em termos psicológicos, como estabilização do humor, maior disposição, melhora na resiliência e autoconfiança dos pacientes; outros relatos evidenciaram a percepção de melhora na funcionalidade e nos sintomas observáveis, que comumente são associados aos TAs; foi referido, por exemplo, que o paciente passou a se engajar mais em comportamentos relacionados à alimentação ou a se preocupar menos com essa esfera, abrindo espaço em sua vida para se interessar por atividades que antes eram deixadas de lado.

No que diz respeito aos efeitos do tratamento percebidos pelos familiares em relação a si mesmos, enquanto participantes desse processo, oito artigos (4, 5, 9, 10, 11, 13, 14 e 15) referem melhora no estilo parental. Os familiares identificaram mudanças positivas no relacionamento com os entes acometidos por TAs, conseguindo estabelecer uma comunicação mais assertiva e efetiva com eles. Também perceberam melhora na capacidade de oferecer espaço e encorajar a autonomia e independência do paciente. Afirmaram ter aprendido a se comunicar de forma mais positiva, a expressar seus sentimentos de modo mais autêntico e a ouvir mais o que os pacientes tinham a dizer. Também aprenderam a identificar, discernir e assumir suas responsabilidades na relação, distanciando-se daquilo que desviasse desse escopo.

Ainda em relação aos resultados positivos do tratamento e seus reflexos percebidos em si mesmos, em sete artigos (4, 9, 10, 11, 12, 15, 17) os familiares enfatizam que houve melhora em termos de autocuidado, o que repercutiu positivamente no enfrentamento das situações adversas geradas pelo convívio com os sintomas dos pacientes. Os familiares referem que o tratamento para o TA favoreceu a aquisição de novas habilidades pelo ente adoecido para lidar com a problemática em que estavam envolvidos, o que contribuiu para a mitigação de sentimentos desagradáveis, reduzindo os níveis de estresse e ansiedade. Afirmam que conseguiram se distanciar o suficiente para olhar também para si mesmos com compaixão e não só para a pessoa acometida pela doença e seu sofrimento, podendo assim aumentar sua continência e oferecer apoio mais efetivo ao paciente. Relatam observar, em si próprios, mais comportamentos voltados ao autocuidado em comparação aos momentos anteriores ao tratamento, em que se percebiam completamente absorvidos pelos cuidados direcionados à pessoa adoecida. De modo geral, os relatos convergem ao reconhecerem que se permitiram mudar, adotando uma atitude mais flexível diante dos comportamentos disfuncionais dos filhos, o que possibilitou lidar de forma mais positiva com as situações vivenciadas e aumentar seus níveis de bem-estar.

Por fim, o último desfecho percebido pelos familiares como ganho advindo do tratamento é o fato de passarem a reconhecer a importância de seu papel tanto na vida da pessoa em sofrimento, quanto no próprio curso do tratamento, tema presente em seis dos estudos que constituem esta metassíntese (artigos 3, 4, 5, 7, 9 e 13). Diversos pais de adolescentes com TAs referem ter percebido, no decorrer do tratamento, o modo como seu comportamento influenciava no recrudescimento ou agravamento dos sintomas, assim como na possibilidade de sua atenuação. Os pais contam que passaram a se auto-observar com maior frequência, percebendo-se como agentes ativos e essenciais na busca de recursos para melhorar o estado de saúde de suas filhas e filhos, dando maior atenção a seus próprios comportamentos e modos de interação, engajando-se mais no trabalho familiar conjunto em busca da recuperação. Alguns pais relatam ter se dado conta de que sua responsabilidade no tratamento era pelo menos tão relevante quanto o papel que atribuíam aos profissionais, como exemplifica o excerto a seguir: “Acho que agora estamos muito conscientes de que o hospital dá uma mãozinha, mas que as coisas principais realmente acontecem na família” (estudo 4, p. 963).

Tema Analítico: De Cuidador a Ser (de) Cuidado

Esse tema analítico foi construído a partir da interpretação de uma constância identificada nos três temas descritivos sobre as percepções dos familiares acerca do tratamento para TAs de seus entes acometidos. Essa construção reflete a percepção da necessidade de alterar os papéis desempenhados como atores sociais do tratamento, assumindo gradualmente uma função de maior relevo e protagonismo em um efetivo engajamento pela melhora.

Na compreensão que a família tem sobre o tratamento, o foco do processo terapêutico e o eixo de atuação dos profissionais de saúde ainda parecem recair predominantemente sobre os sintomas dos pacientes. Essa centralidade na dimensão psicopatológica favorece atitudes defensivas. Os participantes dos estudos analisados referiram sentimentos de exclusão e culpabilização por parte da equipe de saúde responsável pelo tratamento (estudos 1, 2, 3, 5, 7, 14, 17 e 18) e pontuaram a falta de especialização e conhecimentos específicos sobre TAs como barreiras que dificultam o acesso ao tratamento (estudos de número 1, 2, 3, 11, 14, 17, 18 e 19). Teceram críticas e questionamentos a respeito do foco das intervenções voltadas exclusivamente para o paciente (estudos 2, 3, 5, 14, 17 e 19), demonstraram desconhecimento dos objetivos do processo de recuperação (estudos 1 e 14) e pontuaram ter percepções confusas sobre como identificar o progresso, ou a falta dele, na evolução do quadro de TA (estudos 5, 9, 11, 13, 15, 17 e 19).

No entanto, quando o familiar volta a atenção para si e para suas percepções acerca de sua própria implicação no processo de tratamento, aparecem relatos sobre a relevância de manter uma boa relação com os profissionais de saúde (estudos 1, 6, 8, 9, 13, 14, 15, 17 e 18), a importância dos grupos de apoio e do contato com outras famílias que lidam com a mesma problemática (estudos 2, 10, 11, 12, 14, 16 e 19), o aproveitamento do tratamento para benefício próprio como espaço de escuta (estudos 5, 9, 15 e 17) e, por fim, a percepção de bons resultados apenas no que se refere ao próprio progresso dentro do processo de tratamento (estudos 4, 5, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15 e 17), além de maior compreensão acerca da real dimensão e da potência de seu papel enquanto familiar da pessoa acometida por TA (estudos 3, 4, 5, 7, 9 e 13).

Levando esses aspectos em consideração, observa-se a importância de que o familiar seja posicionado no tratamento como cuidador do paciente, mas que também possa ser apoiado a evoluir, ao longo do processo, para ocupar uma posição de ser (de) cuidado, ou seja, alguém que admite ter necessidade de receber cuidados para si e aceite o desafio de experimentar mudanças em seu próprio funcionamento (Souza & Santos, 2012Souza, L. V., & Santos, M. A. (2012). Familiares de pessoas diagnosticadas com transtornos alimentares: Participação em atendimento grupal.Psicologia: Teoria e Pesquisa,28(3), 325-334.http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v28n3.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v2...
). Nos TAs, a hipótese etiológica repousa, em parte, na contribuição de fatores relacionados à dinâmica familiar, que também exerce influência na manutenção dos sintomas (Siqueira et al., 2020Siqueira, A. B. R., Santos, M. A., & Leonidas, C. (2020). Confluências das relações familiares e transtornos alimentares: Revisão integrativa da literatura. Psicologia Clínica, 32(1), 123-149. https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v0032n01A06
https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v003...
). Por essa razão é relevante que o familiar se entenda como um agente ativo do cuidado, mais do que meramente um acompanhante no tratamento, e que compreenda gradualmente que o processo de se apropriar de seu papel implica assumir que a ação terapêutica também faz dele destinatário e beneficiário de cuidados. Congruente com o presente estudo, a pesquisa empírica desenvolvida por Treasure et al. (2020Treasure, J., Parker, S., Oyeleye, O., & Harrison, A. (2020). The value of including families in the treatment of anorexia nervosa. European Eating Disorders Review, 1-9. https://doi.org/ 10.1002/erv.2816
https://doi.org/ 10.1002/erv.2816...
) e a literatura revisada por Valdanha et al. (2013Valdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., Peres, R. S., & Santos, M. A. (2013). Influência familiar na anorexia nervosa: em busca das melhores evidências científicas. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(3), 225-233. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000300007
https://doi.org/10.1590/S0047-2085201300...
) corroboram a necessidade de ampliação do foco de atenção do tratamento, de forma a incluir a família no plano terapêutico desde o início. Não foram encontradas, na literatura científica, pesquisas que contrariem esse posicionamento.

Essa compreensão, que passa por uma mudança na posição inicialmente assumida em relação ao tratamento, não pode ser vista como responsabilidade apenas da família, uma vez que também depende de intervenções facilitadoras implementadas pela equipe de saúde. Os profissionais precisam posicionar os familiares como agentes da cura, percebendo-os como potenciais aliados e oferecendo dispositivos de cuidado para que eles possam desenvolver seus recursos (Souza & Santos, 2012Souza, L. V., & Santos, M. A. (2012). Familiares de pessoas diagnosticadas com transtornos alimentares: Participação em atendimento grupal.Psicologia: Teoria e Pesquisa,28(3), 325-334.http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v28n3.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n3/a08v2...
). Isso pode favorecer sua implicação no tratamento e facilitar a aceitação do fato de se tornarem alvo das ações de cuidado (Leonidas & Santos, 2020Leonidas, C., & Santos, M. A. (2020). Percepção do apoio social e configuração sintomática na Anorexia Nervosa. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, 1-14. https://doi.org/10.1590/1982-3703003207693
https://doi.org/10.1590/1982-37030032076...
).

Assim, pode haver uma rotação de perspectiva quando o familiar-cuidador entende que o tratamento não é um espaço oferecido apenas ao membro adoecido, mas também a ele próprio, que assim poderá experimentar mudanças à medida que se implicar ativamente no processo de mudança do outro.

Considerações finais

Os resultados desta metassíntese evidenciaram os diversos vértices pelos quais os familiares de pessoas com TAs percebem o tratamento da pessoa acometida. Restou claro que os eventuais benefícios obtidos com a intervenção terapêutica não se restringem apenas a abrandar a sintomatologia dos pacientes, mas também têm efeitos positivos sobre os sentimentos, atitudes e comportamentos dos familiares que acompanham o tratamento.

O tema analítico desenvolvido neste estudo demarca a necessidade de reconhecer as necessidades emocionais do familiar-cuidador ao longo do percurso de cuidado, enquanto ele se desloca de uma posição de mero coadjuvante do tratamento da pessoa que recebeu um diagnóstico de TA para um lugar de destinatário de cuidados. Essa proposição se dá em consonância com as evidências científicas de que a dinâmica familiar tem uma contribuição relevante na etiopatogenia, formação e manutenção dos sintomas de TAs. Assim, em famílias nas quais se desenvolvem esses transtornos, é necessário investir na transformação da dinâmica das relações familiares para que se possam obter ganhos mais efetivos e duradouros com o tratamento.

Esta metassíntese apresenta algumas limitações. Só foram identificados estudos realizados no cenário internacional, e nenhum deles oriundo de países latino-americanos, que são culturalmente mais próximos da realidade brasileira. Este aspecto limita a comparabilidade dos resultados obtidos por diferentes estudos. Além disso, nem todos os estudos selecionados contribuíram igualmente para a elaboração dos temas destacados; alguns contribuíram mais do que outros para a construção de determinadas categorias, o que faz com que a representatividade de cada tema descritivo seja diferente.

O predomínio de artigos estrangeiros é um obstáculo para se avaliar a variabilidade cultural do fenômeno e dificulta a generalização dos resultados encontrados para a população brasileira e da América Latina e do Caribe em geral. Ainda assim, pensando nos achados obtidos à luz da prática clínica e da experiência acumulada ao longo de quase quatro décadas ininterruptas em um serviço de referência no atendimento de pacientes com anorexia e bulimia, pode-se apostar em possíveis similaridades com o contexto nacional.

Os resultados desta metassíntese fornecem subsídios para o planejamento da assistência no âmbito do SUS, de modo que os casos de TAs possam ser acolhidos pela RAPS. A tomada de consciência da potencialidade do papel dos familiares na resposta ao tratamento deve ser um empreendimento conjunto e envolver todos os atores no processo de mudança: pacientes, familiares e equipe de saúde. Espera-se que, com essa compreensão por parte dos profissionais de saúde, haja mais espaço para o fortalecimento da família como protagonista do cuidado, favorecendo a apropriação de seu lugar junto ao tratamento.

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  • *
    Agradecimentos: CNPq, Bolsa de Produtividade em Pesquisa (PQ-1A) e CNPq, Bolsa de Mestrado.
  • **
    Este artigo foi baseado na Dissertação de Mestrado do primeiro autor.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    30 Dez 2020
  • Aceito
    19 Abr 2021
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