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Relações entre padrões de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança

Relationship between patterns of father-child activation, family functioning and child behavior

Resumo

As relações estabelecidas na família, como a relação de ativação pai-criança, interferem no comportamento da criança. Para compreender as relações entre padrões de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança, realizou-se um estudo com 12 famílias biparentais heteroafetivas com crianças pré-escolares. Utilizou-se: Questionário Sociodemográfico; Observação da Situação de Risco; Escala de Avaliação da Coesão e Adaptabilidade Familiar; e Questionário de Capacidades e Dificuldades. Constatou-se que: oito crianças foram classificadas como ativadas, três como subativadas e uma como superativada; o funcionamento das famílias está rigidamente coeso e/ou equilibrado; e, no comportamento das crianças, houve elevada pró-sociabilidade e baixos escores em dificuldades. Além da relação de ativação, o funcionamento familiar foi fundamental para a compreensão dos comportamentos da criança.

Palavras-chave:
pai; relações pai-filho; relações familiares; psicologia do desenvolvimento

Abstract

Relationships established in the family, such as the father-child activation relationship, interfere in the child's behavior. To understand the relationships between father-child activation, family functioning and child behavior, a study was conducted with 12 two-parent hetero-affective families with preschool children. It was used: Sociodemographic Questionnaire; Risk Situation; Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scales; and Strengths and Difficulties Questionnaire. It was found that: eight children were classified as activated, three as under-activated and one as over-activated; the functioning of families is balanced and/or rigidly cohesive; and in the child's behavior it was verified high prosocial behavior and low scores in difficulties. Besides the activation relationship, family functioning was fundamental to understand the child's behavior.

Keywords:
fathers; father-child relations; family relations; developmental psychology

A família é considerada o principal contexto de desenvolvimento da criança. Nesse sentido, as relações nela estabelecidas ou o nível de proximidade emocional entre os membros são alguns dos aspectos que irão interferir nos comportamentos da criança.

Dentre as relações familiares, vem ganhando destaque na literatura nacional e internacional a relação pai-criança, que pode ser compreendida pela ‘teoria da relação de ativação’, desenvolvida por Paquette (2004Paquette, D. (2004). Theorizing the father-child relationship: Mechanisms and developmental outcomes. Human Development, 47(4), 193-219. https://doi.org/10.1159/000078723
https://doi.org/10.1159/000078723...
). A relação de ativação é definida como um vínculo afetivo entre pai [ou outro cuidador(a)] e filho(a) que favorece a criança para abertura ao mundo (Dumont & Paquette, 2012Dumont, C., & Paquette, D. (2012). What about the child’s tie to the father? A new insight into fathering, father-child attachment, children’s socio-emotional development and the activation relationship theory. Early Child Development and Care, 1-17. https://doi.org/10.1080/03004430.2012.711592
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). Ela é descrita por meio de duas dimensões diferentes e complementares: estimulação, como o pai encorajar a criança a explorar o ambiente, assumir atividades de risco, perseverar nas adversidades e superar limites; e disciplina, em que o pai estabelece limites para garantir a segurança e a proteção da criança (Dumont & Paquette, 2012Dumont, C., & Paquette, D. (2012). What about the child’s tie to the father? A new insight into fathering, father-child attachment, children’s socio-emotional development and the activation relationship theory. Early Child Development and Care, 1-17. https://doi.org/10.1080/03004430.2012.711592
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).

A relação de ativação acontece principalmente por meio de jogos físicos, os quais se referem às diferentes formas de contato físico entre o pai e a criança, como jogar a criança para o alto, fazer cócegas, brincar de luta, entre outros (Paquette, 2004Paquette, D. (2004). Theorizing the father-child relationship: Mechanisms and developmental outcomes. Human Development, 47(4), 193-219. https://doi.org/10.1159/000078723
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). Como essas atividades geralmente são mais realizadas pelos pais (figura masculina) do que pelas mães (figura feminina), a relação de ativação costuma ser característica da relação pai-criança, o que não significa que a mãe não ative a criança. Essa relação de ativação pai-criança permite classificar as crianças em ativadas (elevados níveis de estimulação e disciplina), subativadas (baixo nível de estimulação e elevado nível de disciplina, ou baixos níveis de estimulação e disciplina) e superativadas (elevado nível de estimulação e baixo nível de disciplina) na relação com o cuidador (Brussoni & Olsen, 2011Brussoni, M., & Olsen, L. (2011). Striking a balance between risk and protection: Fathers’ attitudes and practices toward child injury prevention. Journal of Developmental & Behavioral Pediatrics, 32(7), 491-498. https://doi.org/10.1097/DBP.0b013e31821bd1f5.
https://doi.org/10.1097/DBP.0b013e31821b...
; Paquette & Bigras, 2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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).

Essa relação satisfaz a necessidade da criança de estimulação, desenvolvimento das competências sociais e assimilação de limites (Paquette, 2004Paquette, D. (2004). Theorizing the father-child relationship: Mechanisms and developmental outcomes. Human Development, 47(4), 193-219. https://doi.org/10.1159/000078723
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). Dumont e Paquette (2012Dumont, C., & Paquette, D. (2012). What about the child’s tie to the father? A new insight into fathering, father-child attachment, children’s socio-emotional development and the activation relationship theory. Early Child Development and Care, 1-17. https://doi.org/10.1080/03004430.2012.711592
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) verificaram que crianças ativadas eram menos depressivas, ansiosas e dependentes, menos isoladas de seus pares (amigos), mais autônomas, confiantes e seguras; as crianças subativadas apresentavam mais problemas internalizantes como ansiedade e depressão; e as superativadas tinham mais problemas externalizantes, como agressividade.

A relação pai-criança insere-se no contexto familiar e a dinâmica relacional da família repercutirá nessa relação. O contexto familiar pode ser investigado por meio de seu funcionamento. O funcionamento familiar é definido como os padrões de interação entre os membros da família (Minuchin, 1990Minuchin, S. (1990). Famílias: Funcionamento e tratamento. Artes Médicas.) e pode ser compreendido por meio de três dimensões: coesão, flexibilidade e comunicação (Olson, 2011Olson, D. H. (2011). FACES IV and the Circumplex model: Validation study. Journal Os Farital & Family Therapy, 3(1), 64-80.). A coesão é a proximidade emocional entre os membros da família. A flexibilidade refere-se a qualidade e expressão de liderança e organização, relações entre os papéis, regras de relacionamento e negociações entre os membros da família. E a comunicação trata-se da habilidade positiva em dialogar: ela regula os níveis de coesão e flexibilidade utilizados para definir o padrão de funcionamento da família (Olson et al., 2006Olson, D. H., Gorall, D. M., & Tiesel, J. (2006). Faces IV and the Circumplex model. Minneapolis, MN: Life Innovations, 1752-0606. ; Olson, 2011Olson, D. H. (2011). FACES IV and the Circumplex model: Validation study. Journal Os Farital & Family Therapy, 3(1), 64-80.).

Pode-se identificar seis padrões de funcionamento familiar: Equilibrado, que caracteriza as famílias que costumam lidar bem com os estressores externos, dado sua coesão e flexibilidade equilibrados; Rigidamente Coeso, que diz respeito àquelas que têm alto grau de proximidade, mas podem ter dificuldade em realizar mudanças devido ao seu elevado nível de rigidez; Mediano, que geralmente funciona bem; Flexibilidade Instável, que caracteriza as famílias com escore de baixo a moderado em coesão, o que poderia indicar um funcionamento familiar problemático, mas os altos escores na escala de flexibilidade indicam que estas famílias são capazes de alterar seus níveis problemáticos quando necessário; Desordenadamente Frouxo, aquelas que costumam apresentar muitos problemas familiares em virtude da sua falta de proximidade emocional e elevada flexibilidade; e Desequilibrado, que são hipoteticamente as famílias mais problemáticas em termos de seu funcionamento geral, pois apresentam altas pontuações nas escalas desequilibradas e pontuações baixas nas escalas equilibradas (por exemplo, é possível que a hierarquia não esteja bem delimitada, os papéis familiares e as regras não estejam claramente estabelecidas e as decisões costumam ser tomadas de modo impulsivo) (Olson et al., 2006Olson, D. H., Gorall, D. M., & Tiesel, J. (2006). Faces IV and the Circumplex model. Minneapolis, MN: Life Innovations, 1752-0606. ). Com relação ao funcionamento familiar, Gomes e Pereira (2014Gomes, H. M. dos S., & Pereira, M. G. (2014). Funcionamento familiar e delinquência juvenil: A mediação do autocontrolo. Análise Psicológica, 4(XXXII), 439-451.) constataram que os problemas de comportamento dos jovens reduzem à medida que o funcionamento familiar melhora, ou seja, são famílias que se tornam mais funcionais devido aos escores de coesão e flexibilidade equilibrados.

Nesse sentido, constata-se que tanto a relação de ativação quanto o funcionamento familiar podem apresentar repercussões nos comportamentos da criança ou do adolescente (Bueno, 2018Bueno, R. K. (2018). Associações entre relação de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança pré-escolar em famílias biparentais [Tese doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/190249
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; Bueno et al., 2018Bueno, R. K., Kaszubowski, E., Bossardi, C. N., Souza, C. D. De, Paquette, D., Crepaldi, M. A., & Vieira, M. L. (2018). Relations between openness to the world, family functioning and child behaviour. Early Child Development and Care, 1-15. https://doi.org/10.1080/03004430.2018.1527327
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). O comportamento da criança pode ser compreendido de diferentes maneiras e, neste artigo, será discutido em termos de capacidades e dificuldades, as quais podem ser analisadas por meio das seguintes dimensões: comportamento pró-social (alta sociabilidade); sintomas emocionais (como medo, ansiedade, somatização); problemas de conduta (como comportamento desafiador e agressividade); hiperatividade (desatenção, inquietação e impulsividade); e problemas de relacionamento com colegas (como solidão) (Goodman, 1997Goodman, R. (1997). The strengths and difficulties questionnaire: A research note. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 38(5), 581-586. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.1997.tb01545.x
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).

Assim, para que se entenda como o pai interage com seu filho ou sua filha, é importante compreender o funcionamento familiar, pois esse contexto poderá dificultar ou favorecer a interação do pai com seus filhos. Como há estudos sobre a relação de ativação e os comportamentos da criança (Dumont & Paquette, 2012Paquette, D., Coyl-shepherd, D. D., & Newland, L. A. (2012). Fathers and development: new areas for exploration. Early Child Development and Care, 183(6), 735-745. https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1080/03004430.2012.723438
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; Paquette et al., 2020Paquette, D., Gagnon, C., & Medeiros, J. M. de. (2020). Fathers and the activation relationship. In H. E. Fitzgerald, K. von Klitzing, N. J. Cabrera, J. S. de Mendonça, & T. Skjothaug (Eds.), Handbook of fathers and child development: Prenatal to preschool (pp. 291-313). Springer Press.), entende-se que é necessário avançar o conhecimento nessa área, procurando entender de que forma o funcionamento familiar tem implicação na relação do pai com seus filhos e filhas e no comportamento das crianças. Esse conhecimento poderá auxiliar na elaboração de estratégias mais eficazes para fomentar relacionamentos promotores de saúde e desenvolvimento psicológico humano.

Portanto, considerando o exposto, o objetivo geral deste estudo foi compreender as relações entre os padrões de ativação pai-criança, de funcionamento familiar e de comportamento da criança. Como objetivos específicos, elencaram-se os seguintes: a) Relacionar o padrão de ativação pai-criança e de comportamento da criança; b) Relacionar o padrão de funcionamento familiar e de comportamento da criança; c) Relacionar o padrão de funcionamento familiar e de ativação pai-criança; d) Inferir relações entre os padrões de ativação pai-criança, de funcionamento familiar e de comportamento da criança.

Método

Caracterização da pesquisa

Trata-se de uma pesquisa experimental (Marconi & Lacatos, 2002Marconi, M. A., & Lacatos, E. M. (2002). Técnicas de pesquisa. (5 ed.). Atlas.; Sampieri et. al., 2006Sampieri, R. H., Collado, C. F., & Lucio, P. B. (2006). Metodologia de Pesquisa. (3 ed.). McGraw-Hill.). Essa abordagem metodológica foi escolhida uma vez que, para se obter as classificações de ativação da relação pai-criança, se faz necessário realizar a Observação da Situação de Risco (Paquette & Bigras, 2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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). Ademais, como essa relação está inserida no contexto familiar e tanto a relação pai-criança quanto as relações familiares interferem no desenvolvimento da criança (Bueno, 2018Bueno, R. K. (2018). Associações entre relação de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança pré-escolar em famílias biparentais [Tese doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/190249
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), investigou-se o funcionamento familiar e o comportamento da criança.

Participantes

Participaram deste estudo 12 famílias biparentais heteroafetivas da região Sul do Brasil. Com exceção de um pai (padrasto), os demais eram pais biológicos da criança-alvo. Foram critérios de inclusão deste estudo: ter uma criança de 4 ou 5 anos de idade; ter tido a criança focal após seus 18 anos de idade; os pais coabitarem há pelo menos 6 meses. Essas famílias foram acessadas por meio de instituições de educação infantil, escolhidas por conveniência, bem como por meio do procedimento denominado “bola de neve” (em que um participante indica outro possível participante).

Participaram deste estudo seis famílias cuja criança-alvo era uma menina e seis famílias cuja criança-alvo era um menino. Optou-se por “emparelhar” o gênero da criança, pois se constataram diferenças entre meninos e meninas em termos de ativação (Paquette & Dumont, 2013aPaquette, D., & Dumont, C. (2013a). Is father-child rough-and-tumble play associated with attachment or activation relationships? Early Child Development and Care, 183(6), 760-773.). A média de idade dos pais foi de 38,25 anos (DP=6,19) e a média de idade das mães foi de 37,08 anos (DP=8,73). A média de anos de escolaridade dos pais foi de 16,67 anos (DP=4,16), e a média de anos escolaridade das mães foi 19,00 anos (DP=7,14). Todos os pais e mães trabalhavam fora de casa, sendo que a média de horas de trabalho semanal dos pais foi 40,42 (DP=10,10), e a média de horas de trabalho semanal das mães foi 34,08 horas (DP=8,84).

Instrumentos e Técnica de coleta de dados

Para atingir os objetivos propostos, utilizou-se: a Observação da Situação de Risco (Risk Situation - RS); a Escala de Avaliação da Coesão e Adaptabilidade Familiar (Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scales - FACES-IV); e o Questionário de Capacidades e Dificuldades (Strengths and Difficulties Questionnaire - SDQ). Além desses instrumentos, utilizou-se um Questionário Sociodemográfico (QS) para a caracterização das famílias.

A Observação da Situação de Risco foi desenvolvida e validada no Canadá por Paquette e Bigras (2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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) com pais e com mães de crianças de 12 a 18 meses (Paquette & Dumont, 2013bPaquette, D., & Dumont, C. (2013b). The father-child activation relationship, sex differences, and attachment disorganization in toddlerhood. Child Development Research, 1-9. https://doi.org/10.1155/2013/102860
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) e adaptada para crianças pré-escolares (Gaumon, 2013Gaumon, S. (2013). La relation d’activation père-enfant, les problèmes intériorisés et l’anxiété chez les enfants d’âge préscolaire [Thèse de doctorat, Université de Montréal]. https://papyrus.bib.umontreal.ca/xmlui/handle/1866/9876
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). Trata-se de um procedimento observacional estruturado de aproximadamente 20 minutos de duração que avalia a relação de ativação. A Observação da Situação de Risco é dividida em seis episódios de três minutos cada. Nesse procedimento, a criança é encorajada a explorar um ambiente que não lhe é familiar na presença do pai (ou outro cuidador). A situação envolve: um risco social, representado pela presença de uma pessoa do sexo masculino, estranha para a criança (por isso, denominada de “pessoa estranha”), que interage com ela por meio de uma brincadeira intrusiva, fazendo cócegas, por exemplo; um relativo risco físico, através da exploração de uma escada grande e colorida presente na sala (em que a segurança da criança foi garantida por meio da presença do pai e da “pessoa estranha”, que ficava ao lado da escada); e a disciplina, pois a criança deve obedecer ao pai quando este a proíbe de explorar a escada. Esse procedimento permite classificar as crianças em ativadas (exploram o ambiente com cautela e obedecem aos pais), subativadas (exploram menos o ambiente e também obedecem aos pais) e superativadas (exploram de forma imprudente o ambiente, são altamente sociáveis e não obedecem aos pais) (Paquette & Bigras, 2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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). Para ser realizada no contexto brasileiro, esse procedimento observacional passou por algumas adaptações e, para isso, realizou-se um estudo piloto, cujos dados não foram utilizados nesta amostra (Bueno, 2018Bueno, R. K. (2018). Associações entre relação de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança pré-escolar em famílias biparentais [Tese doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/190249
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; Bueno et al., 2017Bueno, R. K., Vieira, M. L., Crepaldi, M. A., & Faraco, A. M. (2017). Father-child activation relationship in the Brazilian context. Early Child Development and Care, 189(5), 1-11. https://doi.org/10.1080/03004430.2017.1345894
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).

A FACES-IV acessa as dimensões de coesão e flexibilidade da família por meio de seis subescalas: três de coesão (desengajada, equilibrada e emaranhada) e três de flexibilidade (rígida, equilibrada e caótica). Elas indicam aspectos do funcionamento familiar saudável (equilibrado) e do funcionamento familiar problemático (desequilibrado). A FACES-IV está em processo de validação no Brasil (Boing, 2014Boing, E. (2014). Relações entre coparentalidade, funcionamento familiar e estilos parentais em uma perspectiva intergeracional [Tese de doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/128737
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) e permite a identificação de seis tipos de Funcionamento Familiar: Equilibrado, Rigidamente Coeso, Mediano, Flexibilidade Instável, Desordenadamente Frouxo e Desequilibrado (Olson et al., 2006Olson, D. H., Gorall, D. M., & Tiesel, J. (2006). Faces IV and the Circumplex model. Minneapolis, MN: Life Innovations, 1752-0606. ). O SDQ foi desenvolvido por Goodman (1997Goodman, R. (1997). The strengths and difficulties questionnaire: A research note. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 38(5), 581-586. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.1997.tb01545.x
https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.1997...
) e validado no Brasil por Fleitlich, Cortázar e Goodman (Stivanin, Scheuer, & Assumpção Jr, 2008Stivanin, L., Scheuer, C. I., & Assumpção Jr, F. B. (2008). SDQ (Strengths and Difficulties Questionnaire): Identificação de características comportamentais de crianças leitoras. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 24(4), 407-413.). Trata-se do instrumento mais utilizado para avaliar as capacidades e dificuldades de crianças e adolescentes dos 4 aos 16 anos. O SDQ está dividido em cinco dimensões: comportamento pró-social, sintomas emocionais, problemas de conduta, hiperatividade, e problemas de relacionamento com colegas. Os resultados de cada uma das dimensões podem ser próximos da média (o que indica comportamentos não-clínicos), limítrofes (ligeiramente acima da média, o que indica que os mesmos podem refletir em problemas clínicos) e substancialmente altos (em que constata-se o risco de problemas clínicos significativos).

Procedimento de coletas de dados e considerações éticas

A pesquisa foi desenvolvida com base em parâmetros éticos, atendendo à Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde. Este estudo insere-se no âmbito de um projeto maior, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), intitulado “Envolvimento paterno no contexto familiar contemporâneo II” e que foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos sob o parecer consubstanciado de nº 1.514.798. Com as 12 primeiras famílias (6 de meninos e 6 de meninas) que se enquadravam nos critérios de inclusão e aceitaram participar da pesquisa, incluindo a observação, agendou-se a coleta de dados. A taxa de recusa foi baixa e, quando acontecia, era justificada pela indisponibilidade de tempo da família devido ao trabalho. A coleta de dados foi realizada em uma universidade pública do Sul do Brasil, após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias (uma para o participante e outra para a pesquisadora). Além do sigilo, garantiu-se aos participantes a possibilidade de desistirem e/ou solicitarem informações a respeito da pesquisa a qualquer momento, receberem escuta/acolhimento e/ou encaminhamento psicológico diante de qualquer desconforto durante a coleta de dados e terem o direito ao acesso aos resultados da pesquisa, entre outros cuidados éticos conforme estabelecido na Resolução nº 466/2012. Ademais, os participantes foram convidados para participar de grupos psicoedutativos, ministrados pela equipe do projeto de pesquisa, em que se discutiam os temas abordados no projeto como uma contrapartida por sua participação.

A Observação da Situação de Risco foi realizada com a díade pai-criança em uma sala de espelho unilateral, preparada para a referida observação, que foi gravada com o consentimento dos pais. O ambiente observacional e a explicação sobre o experimento aos participantes eram exatamente os mesmos a cada coleta de dados. Não houve interrupções ou ruídos externos durante a observação, que foi realizada apenas uma única vez por família e em dias diferentes para cada família. Enquanto se realizava a observação com o pai e a criança, a mãe respondia os questionários QS e SDQ em uma sala próxima à sala em que a observação acontecia. Após a observação, aplicou-se o questionário FACES-IV com o pai em outra sala próxima à sala de observação. Se a mãe não tivesse finalizado a coleta de dados, a criança ficava com algum membro da equipe que já havia se apresentado a ela e feito vínculo. Os questionários eram lidos com os participantes e quem aplicava os questionários, ou seja, quem realizava o preenchimento, era um membro da equipe treinado para isso, para garantir que o preenchimento fosse realizado de forma correta e sanar as dúvidas que pudessem surgir. Como mencionado, este estudo faz parte de um projeto maior em que se aplicou outros questionários aos pais além dos aqui mencionados e, por esta razão, alguns instrumentos foram respondidos pelos pais e outros pelas mães, a fim de não sobrecarregar nenhuma figura parental. A duração da coleta de dados às famílias que participaram da observação foi em média de duas horas por haver esses outros questionários não abordados neste estudo.

Tratamento e Análise de dados

Embora esses instrumentos e essa técnica sejam utilizados costumeiramente em estudos quantitativos, os dados foram tratados com um cunho exploratório, sem a intenção de realizar inferências estatísticas ou generalizações. Com os dados do QS, realizou-se uma estatística descritiva, já apresentada em ‘participantes’.

Os dados obtidos por meio das observações foram analisados com base no protocolo de registro adaptado (Bueno, 2018Bueno, R. K. (2018). Associações entre relação de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança pré-escolar em famílias biparentais [Tese doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/190249
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). De forma resumida, neste protocolo de registro adaptado preenche-se uma ficha de codificação referente aos comportamentos da criança durante as etapas da observação, para após se preencher uma ficha de classificação; nesta, há três colunas, uma para cada tipo de ativação da criança, e sete linhas referentes às etapas da observação. Ao final, somam-se as assinalações de cada coluna e a que possui maior escore refere-se ao padrão de ativação da criança. Quando há empate no escore, considera-se a criança como “ativada”, pois entende-se que a maioria das crianças apresenta esse padrão de ativação e que há momentos em que ela pode estar mais (superativada) ou menos ativada (subativada) na relação com o cuidador. As observações foram analisadas por dois juízes, cujos resultados passaram pelo cálculo de concordância por meio do teste estatístico Kappa de Cohen, cujo resultado foi de 0,84 (Erro padrão=0,04; Intervalo de Confiança de 95%: 0,76 até 0,92), o que indica uma alta concordância nos resultados. Quando houve diferença no escore desses juízes (considerando a soma de cada coluna da ficha de classificação do protocolo de análise mencionado), discutiu-se a diferença (os escores finais são apresentados nos resultados).

No que se refere à FACES-IV, o modelo circumplexo propicia seis tipologias de famílias, resultantes do cálculo da taxa de Coesão e de Flexibilidade. A Taxa de Coesão resulta da Coesão equilibrada dividida pela média entre as Coesões desequilibradas (Coesão desengajada e Coesão emaranhada). Já a Taxa de Flexibilidade resulta da Flexibilidade equilibrada dividida pela média das Flexibilidades desequilibradas (Flexibilidade rígida e Flexibilidade caótica). A Taxa do Total Circumplexo resulta da média da soma das taxas de Coesão e Flexibilidade. Conforme o resultado dessas taxas, segundo o manual da referida escala e detalhado em Bueno (2018Bueno, R. K., Kaszubowski, E., Bossardi, C. N., Souza, C. D. De, Paquette, D., Crepaldi, M. A., & Vieira, M. L. (2018). Relations between openness to the world, family functioning and child behaviour. Early Child Development and Care, 1-15. https://doi.org/10.1080/03004430.2018.1527327
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), pode-se classificar as famílias em seus padrões de funcionamento já mencionados.

Já para a análise dos dados referentes aos comportamentos da criança, utilizou-se a tabela de referência de escores do manual do SDQ, a qual mostra os valores que indicam comportamentos clínicos, não clínicos e limítrofes. Assim, para discutir o comportamento das crianças, deve-se considerar tanto as dimensões isoladamente quanto o escore total de dificuldades, buscando sempre contextualizar e relativizar os resultados, considerando também que o referido questionário avalia mais dimensões negativas do que positivas, por ser mais utilizado com a finalidade de investigar dificuldades.

Resultados

Apresenta-se a seguir os dados da relação de ativação pai-criança, do funcionamento familiar e do comportamento das crianças. As famílias são apresentadas por ‘FAM’ e as crianças por ‘C’. O número que segue essas siglas corresponde ao número da família em questão.

Relação de ativação pai-criança

Com relação ao padrão de ativação da criança, a Tabela 1 evidencia os escores de cada ativação, que podem variar de 0 a 5 de acordo com a ocorrência do respectivo comportamento da criança durante a observação. Conforme mencionado, o tipo de ativação com maior escore evidencia o padrão de ativação da criança e, quando o escore de ativação deu empatado, considerou-se a criança como ‘ativada’. Das 12 crianças observadas, constatou-se que 8 foram classificadas como ativadas (C1, C2, C3, C4, C6, C7, C8 e C11), 3 como subativadas (C9, C10 e C12) e 1 como superativada (C5) na sua relação com o pai/padrasto.

Tabela 1
Escores do padrão de ativação, de funcionamento familiar e dos comportamentos da criança

Funcionamento familiar

Os escores das famílias e seu padrão de funcionamento familiar podem ser visualizados na Tabela 1. Verificou-se que seis apresentaram um funcionamento familiar rigidamente coeso (FAM1, FAM4, FAM5, FAM6, FAM7 e FAM10), cinco mostraram um funcionamento familiar equilibrado (FAM2, FAM3, FAM 9, FAM11, e FAM12), e uma apresentou um funcionamento familiar equilibrado e rigidamente coeso (FAM8).

Comportamento das crianças

Os escores do comportamento das crianças e o que esses escores indicam podem ser também visualizados na Tabela 1. Conforme já mencionado, buscou-se evidenciar em cada uma das dimensões se haveria risco de problemas clínicos. Constatou-se que todas as crianças se mostraram pró-sociais e com escores não clínicos em sintomas emocionais. Na dimensão hiperatividade, apenas uma criança (C10) apresentou escores que podem refletir problemas clínicos. Na dimensão problemas de relacionamento com colegas, também apenas uma criança apresentou escores que podem refletir em problemas clínicos (C6). Já em problemas de conduta, duas crianças apresentaram escores que podem refletir problemas clínicos (C5 e C6) e quatro obtiveram risco de problemas clínicos significativos (C1, C3, C10 e C11). Essas dificuldades são relativizadas com o escore total de dificuldades, em que apenas uma criança (C10) apresentou um escore que indica que pode refletir em problemas clínicos.

Discussão

A relação de ativação pai-criança e o funcionamento familiar relacionam-se com o comportamento das crianças (Bueno, 2018Bueno, R. K. (2018). Associações entre relação de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança pré-escolar em famílias biparentais [Tese doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/190249
https://repositorio.ufsc.br/handle/12345...
; Bueno et al., 2018Bueno, R. K., Kaszubowski, E., Bossardi, C. N., Souza, C. D. De, Paquette, D., Crepaldi, M. A., & Vieira, M. L. (2018). Relations between openness to the world, family functioning and child behaviour. Early Child Development and Care, 1-15. https://doi.org/10.1080/03004430.2018.1527327
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), os quais precisam ser contextualizados para serem melhor compreendidos. A presente discussão será apresentada buscando responder aos objetivos específicos propostos.

Padrão de ativação pai-criança e comportamento da criança

Das crianças ativadas, cinco são meninos e três são meninas. As três crianças subativadas são meninas e a criança superativada é um menino. Assim, averiguou-se que, neste estudo, os meninos são mais ativados do que as meninas. Esses resultados vão ao encontro de estudos canadenses que afirmam que os pais estimulam e disciplinam significativamente mais os meninos do que as meninas (Gaumon & Paquette, 2013Gaumon, S., & Paquette, D. (2013). The father-child activation relationship and internalising disorders at preschool age. Early Child Development and Care, 183(3-4), 447-463. https://doi.org/10.1080/03004430.2012.711593
https://doi.org/10.1080/03004430.2012.71...
; Moffete, 2013Moffete, V. (2013). Le lien entre le stress parental du père et le développement de la relation d’activation chez les enfants âgés entre 12 et 18 mois [Dissertação de mestrado, Université de Montréal]. ; Paquette & Bigras, 2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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; Paquette & Dumont, 2013aPaquette, D., & Dumont, C. (2013a). Is father-child rough-and-tumble play associated with attachment or activation relationships? Early Child Development and Care, 183(6), 760-773.). Esses resultados também confirmam estudos brasileiros realizados sobre a temática, que também verificaram que o pai ativa significativamente mais os meninos do que as meninas, como no estudo com pessoas sem filhos sobre a percepção de como os pais de modo geral educam seus filhos (Paraventi et al., 2017Paraventi, L., Bittencourt, I. G., Schulz, M. L. C., Souza, C. D. de, Bueno, R. K., & Vieira, M. L. (2017). A percepção de pessoas sem filhos sobre a função paterna de abertura ao mundo. Revista PSICO, 48(1), 1-11. https://dx.doi.org/10.15448/1980-8623.2017.1.24057
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). É importante mencionar que aspectos como a inibição, mais evidenciado em crianças subativadas, não é necessariamente resultado da subativação com o pai. Ou seja, há fatores como as características da criança, do pai, da família e do contexto que favorecerão alguns aspectos comportamentais para que se sobressaiam ou não, sendo a relação de ativação um desses fatores, mas não o único.

Uma das hipóteses que busca compreender essa diferença entre meninos e meninas resulta de a relação de ativação acontecer principalmente por meio da brincadeira turbulenta (lutar, pular, cair e correr), que é uma forma de jogo físico frequentemente observada nas díades pais-meninos (Paquette, 2004Paquette, D. (2004). Theorizing the father-child relationship: Mechanisms and developmental outcomes. Human Development, 47(4), 193-219. https://doi.org/10.1159/000078723
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; Paquette, Coyl-shepherd, & Newland, 2012Paquette, D., Coyl-shepherd, D. D., & Newland, L. A. (2012). Fathers and development: new areas for exploration. Early Child Development and Care, 183(6), 735-745. https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1080/03004430.2012.723438
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.108...
; Paquette & Dumont, 2013aPaquette, D., & Dumont, C. (2013a). Is father-child rough-and-tumble play associated with attachment or activation relationships? Early Child Development and Care, 183(6), 760-773.). Ademais, segundo Hamel (2014Hamel, S. (2014). Stabilité de la relation d’activation père-enfant entre 12-18 mois et 3-5 ans et les facteurs associés à l’instabilité [Dissertação de mestrado, Université de Montréal]. http://hdl.handle.net/1866/11520
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), a subativação está associada com uma superproteção por parte dos pais, enquanto a superativação, a uma falta de proteção. Assim, outra hipótese é a tendência de os pais protegerem mais as meninas do que os meninos. Também se parte do pressuposto de que, se a observação fosse realizada com uma pessoa estranha do sexo feminino, os comportamentos das crianças se modificariam.

É importante ressaltar que, embora se tenha constatado diferença no tipo de ativação entre meninos e meninas, o fato de serem poucos participantes neste estudo impede maiores generalizações. Além disso, três meninas foram ativadas na relação com os pais. Isso possibilita a inferência de que os pais ativam os meninos e as meninas de uma forma diferente, o que deve ser melhor investigado em estudos futuros.

Relacionando o padrão de ativação com o padrão de comportamento da criança, constata-se que as 12 crianças (independentemente do padrão de ativação) demonstraram escores não clínicos em comportamentos pró-sociais, ou seja, são crianças altamente sociáveis. Além disso, como 8 dessas 12 crianças estão ativadas, pode-se sugerir possível relação entre ativação e pró-sociabilidade, conforme constatam Paquette e Bigras (2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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). Nessa direção, também pode-se mencionar o estudo de Knafo e Plomin (2006Knafo, A., & Plomin, R. (2006). Parental discipline and affection and children’s prosocial behavior: Genetic and environmental links. Journal of Personality and Social Psychology, 90(1), 147-164. https://doi.org/10.1037/0022-3514.90.1.147
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), ao investigarem as repercussões da disciplina e do afeto (oferecido pelos pais às crianças) sobre a pró-sociabilidade da criança, no qual se constatou que a parentalidade positiva (afeto positivo e disciplina) estava correlacionada positivamente com a pró-sociabilidade, enquanto que a parentalidade negativa estava correlacionada negativamente à pró-sociabilidade.

No que se refere às dimensões relacionadas às dificuldades da criança, verificou-se que as 12 crianças demonstraram escores não clínicos em sintomas emocionais. Como oito dessas crianças estão ativadas, infere-se uma possível relação entre crianças que recebem estimulação e disciplina adequados e baixos sintomas de origem emocional.

Já em problemas de relacionamento com colegas, com exceção de uma criança ativada que apresentou escores que podem refletir problemas clínicos, todas as demais obtiveram escores não clínicos na referida dimensão. Possivelmente esses resultados estão relacionados ao fato da maioria das crianças estar ativada na relação com o pai, pois isso indica, conforme já mencionado, que são crianças menos isoladas de seus pares e mais confiantes em si mesmas e nos outros, bem como mais seguras e autônomas.

Quanto aos escores de hiperatividade, constatou-se que as oito crianças ativadas e a criança superativada apresentaram escores não clínicos. Ainda sobre essa dimensão, duas crianças subativadas apresentaram escores não clínicos e uma criança subativada apresentou escore que pode refletir problemas clínicos. Ou seja, a única criança que apresentou resultados que podem refletir em problemas clínicos foi classificada como subativada na sua relação com o pai. Uma hipótese para esse resultado pode ser porque, a partir da percepção da mãe que preencheu ao questionário sobre o comportamento da criança, essa criança mostra sinais de desatenção, inquietação e impulsividade, mas na relação com o pai ela apresenta baixa estimulação e alta disciplina e, por isso, foi classificada como subativada; isso reforça que a criança pode apresentar diferentes comportamentos com diferentes cuidadores e pode apresentar um padrão de ativação com um cuidador diferente do padrão de ativação com o outro cuidador. Ademais, a percepção da adequação de um comportamento da criança pode variar entre os cuidadores. Além disso, também é possível que a mãe tenha enfatizado comportamentos de maior ativação da criança ou que a criança, por estar em um ambiente estranho, tenha-se mostrado mais inibida durante a observação.

Com relação aos problemas de conduta, quatro crianças ativadas e duas subativadas apresentaram escores não clínicos, uma criança ativada e uma superativada apresentaram escores que podem refletir problemas clínicos e, por fim, três crianças ativadas e uma subativada obtiveram escores que indicam risco de problemas clínicos significativos. Trata-se da dimensão com mais crianças que apresentaram escores limítrofes ou substancialmente altos. As hipóteses utilizadas para discutir o resultado anterior também podem ser utilizadas para discutir esse achado.

Quanto aos escores relativos ao total de dificuldades, constatou-se que, com exceção de uma criança subativada, cujo escore pode refletir problemas clínicos, as demais indicaram escores não clínicos. Esses resultados corroboram o estudo de Paquette e Bigras (2010Paquette, D., & Bigras, M. (2010). The risky situation: A procedure for assessing the father-child activation relationship. Early Child Development and Care, 180(1-2), 33-50. https://doi.org/10.1080/03004430903414687
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), pois indicam que as crianças estão recebendo, de modo geral, estimulação e disciplina, o que possivelmente diminui as suas “dificuldades” e aumenta as suas “capacidades”, já que grande parte delas apresentou escores não clínicos para todas as dimensões. Ressalta-se que esta afirmação apresenta uma relação de causalidade linear e deve ser relativizada, pois trata-se apenas de um “recorte” para melhor compreensão dos fenômenos, devendo-se considerar a afirmação apenas como uma hipótese que precisa ser contextualizada e que outros fatores interferem nos resultados. Além disso, conforme já mencionado, embora algumas dimensões, em sua maioria problemas de conduta, tenham apresentado escores elevados que indiquem problemas clínicos, com exceção da C10, as demais não apresentaram problemas clínicos quando se avalia o total de dificuldades.

Os resultados do presente estudo indicam que as crianças apresentaram, de modo geral, comportamentos considerados típicos para sua idade, porém algumas evidenciaram o que o instrumento denomina de ‘problemas clínicos’ em dimensões referentes a comportamentos externalizantes. É fundamental relativizar esses achados, tendo em vista a importância de não “patologizar” o comportamento sem a compreensão do contexto. Assim, entende-se que os problemas de conduta, os problemas de relacionamento com colegas e até a hiperatividade, cujos escores de algumas crianças não correspondem aos escores de comportamentos não clínicos, possivelmente estejam relacionados à dificuldade no estabelecimento de limites.

Essa dificuldade é cada vez mais comum nas famílias, na contemporaneidade, principalmente em lares em que ambos os pais trabalham (como é o caso dos pais da pesquisa). Como um exemplo de falta de obediência, pode-se mencionar a observação da FAM 05, em que o menino não só desobedeceu ao pai como também o desafiou. Esse exemplo de indisciplina está cada vez mais frequente nas famílias da sociedade ocidental industrializada. Em situações em que ambos os pais trabalham, é comum a presença de sentimento de culpa nos pais, por ficar longe dos filhos, o que faz com que, quando estão junto aos filhos, tendam a fazer as suas vontades, impondo menos limites (Bueno, Bossardi, & Vieira, 2015Bueno, R. K., Bossardi, C. N., & Vieira, M. L. (2015). Papel do pai no contexto contemporâneo. In E. R. Goetz & M. L. Vieira (Eds.), Novo pai: Percursos, desafios e possibilidades (pp. 109-124). Juruá.). Porém, o estabelecimento e cumprimento de regras claras na família são importantes para que a criança se sinta em ambiente seguro.

Também se deve ressaltar que se compreende a relação de ativação como um contínuo, em que há momentos que as crianças estão mais ativadas ou menos ativadas com seu cuidador, a depender da situação, das pessoas presentes no contexto, entre outros aspectos. Por exemplo, o estudo longitudinal de Hamel (2014Hamel, S. (2014). Stabilité de la relation d’activation père-enfant entre 12-18 mois et 3-5 ans et les facteurs associés à l’instabilité [Dissertação de mestrado, Université de Montréal]. http://hdl.handle.net/1866/11520
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) constatou que apenas 46% das crianças (de 3 a 5 anos) permaneceram com o mesmo tipo de ativação que tinham aos 12-18 meses. Essa dinamicidade da relação de ativação pai-criança também é evidenciada quando a criança geralmente apresenta indícios dos demais padrões de ativação (como na Tabela 1, ao se constatar escores empatados). Além disso, não é unicamente a relação pai-criança que apresenta repercussões no comportamento da criança, fazendo-se necessário uma compreensão do funcionamento da família.

Padrão de funcionamento familiar e comportamento da criança

As famílias do presente estudo apresentaram um funcionamento equilibrado e/ou rigidamente coeso. A família com funcionamento equilibrado possibilita aos seus membros um desenvolvimento para autonomia com níveis adequados de proximidade emocional. Já o funcionamento rigidamente coeso permite alta proximidade emocional, mas como já mencionado, a família pode ter dificuldade em realizar alterações exigidas por mudanças situacionais ou de desenvolvimento devido ao seu elevado nível de rigidez (Olson et al., 2006Olson, D. H., Gorall, D. M., & Tiesel, J. (2006). Faces IV and the Circumplex model. Minneapolis, MN: Life Innovations, 1752-0606. ). O fato de as famílias apresentarem funcionamento equilibrado e/ou rigidamente coeso indica um funcionamento relativamente saudável.

Todas as crianças deste estudo, independentemente do funcionamento familiar, obtiveram elevados escores de pró-sociabilidade e apresentaram escores não clínicos de sintomas emocionais. Com relação à hiperatividade, apenas uma criança cujo funcionamento familiar está rigidamente coeso apresentou um escore que pode refletir problemas clínicos; todas as demais crianças apresentaram escores não clínicos. O mesmo acontece com os problemas de relacionamento com colegas, em que apenas uma criança cuja família apresenta funcionamento rigidamente coeso apresentou um escore que pode refletir problemas clínicos.

Quanto aos problemas de conduta, duas crianças com funcionamento familiar rigidamente coeso possuem escores que podem refletir problemas clínicos; outras duas com esse mesmo padrão de funcionamento familiar e duas com funcionamento equilibrado apresentaram escores que indicam risco de problemas clínicos significativos. A criança cujo funcionamento familiar está equilibrado e rigidamente coeso apresentou escore não clínico, bem como outras três com funcionamento familiar equilibrado e duas com funcionamento familiar rigidamente coeso. Por fim, ao se considerar o total de dificuldades, constatou-se que apenas uma criança com funcionamento familiar rigidamente coeso apresentou um escore que pode refletir problemas clínicos, pois as demais apresentam escores não clínicos.

Como as famílias do presente estudo apresentam um desses dois ou esses dois padrões de funcionamento familiar, pode-se afirmar que são famílias que lidam bem com a proximidade emocional de seus membros, ou seja, que são famílias cujos membros cooperam entre si, são envolvidos, afetivos, respeitam a autonomia dos demais e cujos pais facilmente identificam sinais e necessidades nos filhos (Feldman, 2007Feldman, R. (2007). Maternal versus child risk and the development of parent-child and family relationships in five high-risk populations. Development and Psychopathology, 19, 293-312. https://doi.org/10.1017/S0954579407070150
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). Essas famílias (equilibradas ou rigidamente coesas) geralmente conseguem “dar conta” das mudanças presentes em situações do cotidiano, mas podem apresentar dificuldades em adaptar-se a mudanças.

Como essas famílias encontram-se no estágio do ciclo vital de famílias com filhos pequenos (McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). O ciclo vital familiar. In F. Walsh (Ed.), Processos Normativos da Família: Diversidade e Complexidade (pp. 375-397). Artmed.), ajustes nos papéis parentais se fazem necessários à medida que a criança cresce e desenvolve uma maior autonomia. E quanto mais autonomia a criança vai adquirindo com o passar dos anos, novos ajustes se fazem necessários na família. Trata-se de uma influência mútua entre os subsistemas filial, conjugal e parental (Bigras, Sherbrooke, & Paquette, 2000Bigras, M., Sherbrooke, U. De, & Paquette, D. (2000). L’interdépendance entre les sous-systèmes conjugal et parental: Une analyse personne-processus-contexte. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 16(2), 91-102.).

Logo, é possível que o fato de as crianças apresentarem elevados escores de pró-sociabilidade (dimensão capacidade) e, em sua maioria, baixos escores de dificuldades, esteja relacionado aos padrões de funcionamento dessas famílias. Ou seja, a relativização das dificuldades de comportamento apresentadas pelas crianças resulta também pelo fato de acontecerem em crianças cujo contexto familiar possui um funcionamento equilibrado e/ou rigidamente coeso. É importante ressaltar que não se trata de uma causalidade linear (como por exemplo, que um determinado tipo de funcionamento familiar defina o comportamento da criança), mas compreende-se que o funcionamento familiar é um dos fatores que influencia os comportamentos da criança.

Portanto, outras variáveis precisam ser investigadas para melhor compreensão dos fenômenos investigados neste estudo. Dentre essas variáveis, pode-se elencar a comunicação na família (a qual também repercute no padrão de funcionamento familiar), pois, segundo Cia e Barham (2009Cia, F., & Barham, E. J. (2009). O envolvimento paterno e o desenvolvimento social de crianças iniciando as atividades escolares. Psicologia Em Estudo, 14(1), 67-74.), quanto maior a comunicação entre pai e filho e maior o envolvimento paterno, menor é o índice de hiperatividade e de problemas de conduta e maior a pró-sociabilidade da criança.

Padrão de ativação pai-criança e funcionamento familiar

Constata-se que, das oito crianças ativadas, três exibiram funcionamento equilibrado, uma possuiu funcionamento equilibrado e rigidamente coeso e quatro apresentaram funcionamento rigidamente coeso. Duas crianças subativadas apresentaram funcionamento equilibrado e outra obteve um funcionamento rigidamente coeso. Já a criança superativada apresentou funcionamento rigidamente coeso.

Esses resultados podem ser compreendidos a partir da ideia de que o contexto familiar pode ser considerado um sistema composto por subsistemas, ou seja, um todo composto por partes que são interdependentes entre si (Minuchin, 1990Minuchin, S. (1990). Famílias: Funcionamento e tratamento. Artes Médicas.). Os subsistemas possuem fronteiras funcionais que variam em sua permeabilidade e que irão definir o modo de interação entre seus membros. Essa interação insere-se ao longo de um contínuo, no qual, em uma das extremidades, estão as fronteiras difusas (há superenvolvimento e indiferenciação), na outra extremidade, as fronteiras rígidas (relacionamento distante) e, no meio, as fronteiras nítidas (em que estão claros os papéis e as funções de cada um, sem a interferência indevida dos demais membros do subsistema).

Nas famílias que possuem um funcionamento familiar equilibrado, tanto a coesão quanto a flexibilidade possuem escores equilibrados, o que possibilita inferir que são famílias que apresentam fronteiras nítidas em seus subsistemas. Por essa razão, são famílias que apresentam um funcionamento familiar saudável, em que, de modo geral, fica claramente estabelecido o que é esperado de cada membro, há apoio mútuo e proximidade emocional e a família realiza as mudanças e adaptações necessárias devido às situações específicas ou transformações desenvolvimentais.

Já nas famílias que possuem um funcionamento rigidamente coeso, contata-se que a coesão, por ser elevada, remete a uma fronteira emaranhada. Por outro lado, a flexibilidade está baixa, o que indica uma fronteira rígida. Logo, embora em termos de proximidade emocional, são famílias nas quais não fica claro o que compete a cada membro e qualquer estressor que aconteça aciona os demais (característico de famílias indiferenciadas), o fato de a flexibilidade ser rígida revela que são famílias que podem apresentar dificuldades em lidar com mudanças de modo geral, desde mudanças de organização e regras da família a mudanças desenvolvimentais.

Além disso, os funcionamentos familiares do tipo equilibrado e rigidamente coeso, ao proporcionarem uma relação emocional de proximidade entre seus membros (coesão equilibrada e coesão elevada, respectivamente), possivelmente também propiciam um maior envolvimento dos pais e das mães com seus filhos. Como a relação de ativação pode ser compreendida como parte do envolvimento paterno, essa maior proximidade emocional possivelmente também propicia uma maior relação de ativação. E, quanto mais envolvimento paterno (e mais relação de ativação), mais coesão familiar. Como a coesão familiar está relacionada à flexibilidade familiar, se constata também maior flexibilidade equilibrada na família.

Segundo Feldman (2007Feldman, R. (2007). Maternal versus child risk and the development of parent-child and family relationships in five high-risk populations. Development and Psychopathology, 19, 293-312. https://doi.org/10.1017/S0954579407070150
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), o envolvimento paterno, ao considerar a tríade pai-mãe-criança, aumenta a coesão familiar. Logo, trata-se de uma causalidade circular recursiva [definida por Vasconcellos (2010Vasconcellos, M. J. E. (2010). Pensamento Sistêmico: O novo paradigma da ciência (9 ed.). Papirus.) como influência entre os sistemas], em que o envolvimento do pai (relação de ativação) pode fomentar um funcionamento familiar com coesão equilibrada que, por sua vez, favorece o envolvimento paterno e, consequentemente, uma relação pai-criança de ativação.

Outro aspecto a ser considerado é que tanto a coesão quanto a flexibilidade precisam ser contextualizadas nas famílias deste estudo que estão no estágio do ciclo vital de famílias com filhos pequenos (McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). O ciclo vital familiar. In F. Walsh (Ed.), Processos Normativos da Família: Diversidade e Complexidade (pp. 375-397). Artmed.), em que é esperado que haja uma maior proximidade emocional entre pais (em especial a mãe) e filhos (Minuchin, 1990Minuchin, S. (1990). Famílias: Funcionamento e tratamento. Artes Médicas.). Além disso, como os pais e as mães estão se ajustando em seus papéis enquanto pais e de acordo com as necessidades da criança, isso pode repercutir na flexibilidade da família como um todo.

Padrões de ativação pai-criança, funcionamento familiar e comportamento da criança

Considerando a discussão acima realizada, menciona-se o estudo de Gomes (2015Gomes, L. B. (2015). Envolvimento parental, desenvolvimento social e temperamento de pré-escolares: Um estudo comparativo com famílias residentes em Santa Catarina e em Montreal [Tese de doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/169440
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), que constatou que tanto os pais quanto as mães vêm se destacando em seu papel de fornecer suporte emocional à criança. Embora o suporte emocional não tenha sido explorado no presente estudo, o fato de o funcionamento das famílias ter níveis equilibrados e elevados de coesão sugere que propiciam suporte emocional aos seus membros. Nesse sentido, quanto maior envolvimento parental com os filhos (maior relação de ativação), mais coesão familiar equilibrada (e suporte emocional) e, quanto mais coesão familiar, maior envolvimento parental. Assim, também é possível que os comportamentos das crianças tenham elevados escores em capacidades e, de modo geral, baixos escores na maioria das dimensões de dificuldades, devido a essa proximidade emocional entre os membros, bem como ao fato da maioria das crianças estar ativada na relação com o pai, o que pressupõem elevada estimulação e disciplina. Por sua vez, a maior pró-sociabilidade da criança, por exemplo, pode favorecer o envolvimento paterno e a coesão familiar equilibrada, o que remete à causalidade circular recursiva mencionada anteriormente.

Assim, afirma-se que diversos são os fatores que interferem no comportamento das crianças. No presente estudo, buscou-se explorar dois desses fatores: relação de ativação pai-criança e funcionamento familiar. Trata-se de um recorte da realidade, pois compreende-se que ambos os fatores interferem nos comportamentos da criança e que o funcionamento familiar, por abarcar também a relação pai-criança, apresenta grandes contribuições na compreensão dos comportamentos da criança. Isso indica a necessidade de maior contextualização ao se investigar um fenômeno, para compreender essas diversas influências (Gomes, Bolze, Bueno, & Crepaldi, 2014Gomes, L. B., Bolze, S. D. A., Bueno, R. K., & Crepaldi, M. A. (2014). As origens do pensamento sistêmico: Das partes para o todo. Pensando Famílias, 18(2), 3-16. ).

Nesse sentido, pode-se afirmar que estudar a relação do pai com a criança possibilita compreender apenas parte dos comportamentos da criança e que a forma como a família se envolve emocionalmente com seus membros e organiza seus papéis e regras também interfere nesses comportamentos. Portanto, intervenções no contexto familiar no sentido de promoção de relacionamentos harmônicos (com coesão e flexibilidade equilibrados) podem funcionar como fatores de proteção ao desenvolvimento de todos os envolvidos, sobretudo ao desenvolvimento da criança.

Entretanto, devido ao número reduzido de participantes, o presente estudo deve ser considerado um ponto de partida para novas pesquisas. Logo, como sugestão de estudos futuros, elenca-se investigar os fenômenos abordados neste artigo: com um maior número de participantes; com a díade mãe-criança; com o pai e a mãe juntos, para avaliar a dinâmica relacional de ativação; com a pessoa estranha sendo uma pessoa do sexo feminino; estudo comparativo entre relação de ativação pai-criança e padrasto-criança; considerar características pessoais do pai e da criança ao investigar a relação de ativação; e ainda, em outras configurações familiares.

Agradecimentos

Agradecemos aos alunos de graduação e pós-graduação que auxiliaram na coleta de dados. Financiamento: CNPq e CAPES.

Referências

  • Bigras, M., Sherbrooke, U. De, & Paquette, D. (2000). L’interdépendance entre les sous-systèmes conjugal et parental: Une analyse personne-processus-contexte. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 16(2), 91-102.
  • Boing, E. (2014). Relações entre coparentalidade, funcionamento familiar e estilos parentais em uma perspectiva intergeracional [Tese de doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina]. https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/128737
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2017
  • Aceito
    13 Maio 2021
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