O Ensino de Sociologia se “descola” da escola: o surgimento das graduações e da pós-graduação em
Ciências Sociais no Rio de Janeiro e em São Paulo e seu impacto na Sociologia escolar (1930-1942)
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constituía critério de estratificação social em Salvador e em que medida as raças forma-
vam grupos ocupacionais endogâmicos, ou ainda, o grau de porosidade racial dos estra-
tos sociais, lançando mão do par conceitual “casta” e “classe”, que vinha sendo utilizado
por cientistas sociais em estudos do Sul rural americano sob a orientação de W. Lloyd
Warner. Na conceituação de Pierson, enquanto o conceito de classe social indica a exis-
tência de camadas abertas, permeáveis à mobilidade vertical, a casta é pensada, por
oposição, como camada fechada cujos membros são determinados por nascimento e
sobre os quais necessariamente se impõem fortes sanções ao casamento fora do grupo
[...]. No intuito de verificar estas hipóteses, Pierson lançou mão de diferentes recursos
de pesquisa: levantamento de dados censitários e de fontes arquivísticas em instituições
públicas; elaboração de amostras próprias da composição racial de diferentes ocupa-
ções, associações e bairros da cidade, e aplicação de questionários em instituições de
ensino visando à sondagem das atitudes raciais de jovens estudantes. Seu trabalho de
cunho mais etnográfico envolveu a realização de entrevistas e a observação participante,
por meio das quais buscou avaliar o grau e a forma de participação das raças em diversas
atividades sociais de Salvador. Pierson ainda reuniu “histórias de vida” de personalida-
des negras ocupando distintas posições na sociedade baiana por meio de textos autobi-
ográficos e correspondências [...]. A conclusão a que Pierson chega é a de que a cor do
indivíduo tinha pouco peso na determinação de sua posição social quando comparada a
outros atributos como riqueza, educação e observação de certos padrões de etiqueta, de
modo que critérios raciais não eram decisivos na organização da vida social local. Em-
bora comumente assinalada pelos críticos e estudiosos, tal interpretação sociológica, em
chave “classista”, nem sempre condiz com os elementos que emergem da pesquisa de
Pierson, especialmente de seu trabalho etnográfico, que, por vezes, acabam desestabili-
zando as afirmações de ordem mais geral do sociólogo, ao indicarem as fortes conota-
ções negativas associadas à cor e as tensões daí advindas. Antes, porém, de nos atermos
às interpretações que se cristalizaram em torno da obra de Pierson, que tendem a con-
cebê-la como uma ratificação da tese da democracia racial e a desconsiderar o encontro
transnacional de ideias que está em sua origem, buscaremos ressaltar, a partir de uma
análise atenta de Brancos e pretos na Bahia, o modo como o sociólogo constrói sua
narrativa e as incongruências que surgem entre esta e o material empírico apresentado
(Maio; Lopes, 2017, p. 123-124).
Notadamente, esta busca por integrar material empírico e técnicas de pesquisa nos pa-
rece que influenciou a formação profissional dos egressos da ELSP, que também é um elemento
que a diferencia no campo das Ciências Sociais em evidente oposição ao que fora produzido na
Sociologia brasileira. Devido a sua ligação íntima com os departamentos municipais paulistas
e sua formação voltada para pesquisa, a ELSP contribuiu para a formação e para o aperfeiçoa-
mento dos servidores públicos, preparando especialistas em atuação em áreas específicas, se
distanciando do modelo uspiano na década de 1930, cujo objetivo era formar professores para
as escolas secundárias especializadas nas ciências básicas com alta cultura geral.
No entanto, este comprometimento acadêmico com o campo da pesquisa e do ensino
acabaria por aproximar ELSP e USP, a partir da criação da seção de pós-graduação da ELSP,
em 1941. A inovação institucional representada pela pós-graduação encontrou apoio da unidade
científica em formação que buscava no aprimoramento próprio de sua especialização os recur-
sos para sua autoafirmação (Limongi, 2001). Essa aproximação contribuiu diretamente para