i

 

Brasília, v. 19, n. 2, p. 148-166, 2024

https://doi.org/10.33240/rba.v19i2.51055

Como citar: Moura, Rosianne M.A.S. et al. Estudos etnobotânico e fitossociológico de plantas forrageiras no assentamento Lisboa em área de caatinga sedimentar. Revista Brasileira de Agroecologia, v. 19, n. 2, p. 148-, 2024.

Artigo

Estudos etnobotânico e fitossociológico de plantas forrageiras no assentamento Lisboa em área de caatinga sedimentar

Ethnobotanical And Phytosociological Studies of Forage Plants in the Lisboa Settlement in a Sedimentary Caatinga Area

Estudios etnobotánicos y fitosociológicos de plantas forrajeras en el asentamiento Lisboa en una zona de caatinga sedimentaria

 

Rosianne Mendes de Andrade da Silva Moura¹, Maria Elizabete de Oliveira², Roseli Farias Melo de Barros³, Estevam da Silva Neto4, Jandson Vieira da Costa5

¹Docente do Centro Universitário Santo Agostinho; Doutora em Ciência Animal pela Universidade Federal do Piauí, Teresina,PI; Orcid: 0000-0002-7792-4733; E-mail: rosiannem@gmail.com

² Docente aposentada do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Piauí; Doutora em Ecologia pela Universidade de Brasília. Teresina, PI. Orcid: 0000-0002-1867-7912; E-mail: maelizoliv@gmail.com

³Docente do Departamento de Biologia e do Programa de pós graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Piauí; Doutora em Botânica pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. Teresina, PI; Orcid: 0000-0001-9767-5546 E-mail:  rbarros@ufpi.edu.br

4 Analista de Sustentabilidade/Suzano Papel e Celulose; Mestre em Ciência Animal pela Universidade Federal do Piauí. Teresina,PI; Orcid: 0009-0003-0763-9237; E-mail: esneto74@hotmail.com

5 Docente do Centro Universitário Facid Wyden; Doutor em Ciência Animal pela Universidade Federal do Piauí. Teresina, PI; Orcid: 0000-0003-3448-670X; E-mail: jandsonvc@gmail.com

Recebido em: 04 out 2023. Aceito em: 01 abr 2024

Resumo

As pastagens nativas da Caatinga são ecossistemas multifuncionais que contribuem para a conservação de recursos naturais, da biodiversidade, para a produção animal e para a geração de renda. Os caprinos são amplamente distribuídos nessas pastagens, logo a identificação da composição botânica da sua dieta é essencial para a conservação da riqueza e abundância de plantas forrageiras. Objetivou-se neste trabalho descrever a dieta de caprinos e a fitossociologia de plantas forrageiras em pastagem nativa em área de caatinga. A lista de espécies foi elaborada em um levantamento etnobotânico com criadores de caprinos; o estudo fitossociológico foi realizado em pastagem nativa manejada com caprinos há mais de 30 anos. Os criadores citaram 34 espécies forrageiras, com predominância de árvores e arbustos. No levantamento fitossociológico as famílias mais relevantes foram Fabaceae e Euphorbiaceae, nas quais identificaram-se 16 plantas forrageiras. As espécies arbóreas sucedem as arbustivas com aumento da diversidade na comunidade das plantas forrageiras. As espécies dominantes são Senna macranthera, Caesalpinia pyramidalis, Piptadenia moniliformis e Mimosa tenuiflora.

Palavras-chave: Biodiversidade, dieta de caprino, pastagem nativa, saber popular, semiárido.

Abstract

The Caatinga rangeland are multifunctional ecosystems that contribute to the conservation of natural resources, biodiversity, animal production and income generation. Goats are widely distributed in these pastures, and the identification of the botanical composition of its diet is essential for maintaining the richness and abundance of forage plants. The objective of the study was to describe the diet of goats and the phytosociology of forage plants in Caatinga rangeland. The list of species was elaborated in an ethnobotanical survey with goat breeding; the phytosociological study was carried out in rangeland managed with goats for over thirty years. Participants cited thirty-four forage species with a predominance of trees and shrubs. In the phytosociological survey, the most relevant families were Fabaceae and Euphorbiaceae, sixteen forage plants were identified. Tree species succeed shrubs with increased diversity in the forage plant community. The dominant species are Senna macranthera, Caesalpinia pyramidalis, Piptadenia moniliformis and Mimosa tenuiflora.

Keywords: Biodiversity, diet of goats, local knowledge, rangeland, semiarid.

Resumen

Los pastos nativos de la Caatinga son ecosistemas multifuncionales que contribuyen a la conservación de los recursos naturales, la biodiversidad, la producción animal y la generación de ingresos. Las cabras se encuentran ampliamente distribuidas en estos pastizales, por lo que identificar la composición botánica de su dieta es fundamental para conservar la riqueza y abundancia de plantas forrajeras. El objetivo fue describir la dieta de cabras y la fitosociología de plantas forrajeras en pastos nativos en una zona de caatinga. La lista de especies fue elaborada en un estudio etnobotánico con criadores de caprinos; el estudio fitosociológico se realizó en pastos nativos manejados con cabras durante más de 30 años. Los criadores citaron 34 especies forrajeras, con predominio de árboles y arbustos. En el estudio fitosociológico las familias más relevantes fueron Fabaceae y Euphorbiaceae, se identificaron 16 plantas forrajeras. Las especies de árboles siguen a las especies de arbustos con un aumento en la diversidad en la comunidad de plantas forrajeras. Las especies dominantes son Senna macranthera, Caesalpinia Pyramidalis, Piptadenia moniliformis y Mimosa tenuiflora.

Palabras-clave: Biodiversidad, dieta de caprinos, pastos nativos, conocimiento popular, semiárido.

 

INTRODUÇÃO

As pastagens nativas são ecossistemas multifuncionais que contribuem para a conservação de recursos naturais, da biodiversidade, para a produção animal e para a geração de renda. Essa importância aumenta significativamente à medida que o esgotamento de recursos naturais e as mudanças climáticas se intensificam (Holecheck et al., 2020). As pastagens nativas na Caatinga têm sido fonte de alimentos para ruminantes domésticos desde o período de colonização do Brasil, quando estes animais chegaram à região semiárida do Nordeste (Prado Jr., 1962). Localizado nessa região, o estado do Piauí possui aproximadamente 63% da sua área coberta pela fitofisionomia da Caatinga, incluindo 140 municípios (IBGE, 2019), nos quais estão concentrados 67% do efetivo de bovinos, 74% de caprinos e 85% dos ovinos (IBGE, 2021).

Dentre os ruminantes, em áreas da Caatinga do Piauí, os caprinos são manejados predominantemente em pastagens nativas, onde plantas forrageiras fornecem os nutrientes necessários aos animais nas suas diferentes fases produtivas e assim garantem a produção de leite, carne, pele e outros produtos. Eles, notadamente, contribuem como fonte de renda e alimento para os criadores do segmento da agricultura familiar (Monteiro; Brisola;Vieira Filho , 2021).

O manejo destes animais pelos criadores, ao longo do tempo, resultou em um acúmulo de conhecimentos obtidos por intermédio das inter-relações práticas com o ecossistema pastoril. O saber das comunidades tradicionais, repassado de geração a geração, no que diz respeito à flora local, tem se tornado uma valiosa contribuição para a ciência (Albuquerque; Andrade; Silva, 2005), os quais têm sido acessados por levantamentos etnobotânicos (Linstädter et al., 2013; Nampanzira et al., 2015; Nunes et al., 2015).

O conhecimento da dieta de ruminantes pelos criadores inclui, não somente a identificação das espécies forrageiras selecionadas pelos animais, e a classificação destas quanto a sua ordem de preferência, mas também as estruturas das plantas ingeridas e a variabilidade espacial e temporal na disponibilidade destas plantas no ecossistema pastoril (Leal; Vicente; Tabarelli, 2003; Kgosikoma; Mojeremane; Harvie, 2013). Tais conhecimentos podem contribuir tanto para a construção de indicadores da condição da pastagem, quanto para indicar a presença de plantas forrageiras, identificando espécies chaves e a situação atual do ecossistema pastoril (Abusuwar; Ahmed, 2010).

Desse modo, levantamentos etnobotânicos, associados a estudos fitossociológicos, contribuirão para avaliar a situação da pastagem nativa. A riqueza de espécies pode ser definida como o número de espécies em uma determinada área, de modo que a diversidade é uma combinação de riqueza e abundância. Estas duas métricas de biodiversidade são utilizadas como indicadores de ecossistemas de pastagens nativas em estudos fitossociológicos (Smystad et al., 2011). Essas informações contribuem para aumentar a percepção sobre recursos forrageiros, sua dinâmica no ecossistema pastoril e também serve de base para a definição de estratégias de manejo de pastagens nativas (Linstädter et al., 2013).

Nesse trabalho focou-se um ecossistema pastoril em área de Caatinga, manejado com caprinos há mais de três décadas. Objetivou-se identificar e documentar o conhecimento tradicional sobre espécies forrageiras presentes na dieta de caprinos e realizar um levantamento fitossociológico em dois sítios de pastejo em área de Caatinga sedimentar.

METODOLOGIA

O estudo foi conduzido no assentamento Lisboa, localizado à margem sul do rio Piauí, nos municípios de São João do Piauí (08°21’29” S, 42°14’48” W e altitude 222 m), predominantemente, e Pedro Laurentino (08°04’06” S, 42°17’06” W e altitude 200 m), no território de desenvolvimento da Serra da Capivara, região semiárida do estado do Piauí, Brasil. O clima no local é do tipo BSh, definido como Semiárido Quente, com os municípios caracterizando-se pela instabilidade pluviométrica, principalmente no verão (CLIMATE, 2018), a precipitação pluviométrica média anual varia entre 800 a 1000 mm. O município localiza-se na bacia sedimentar, que se caracteriza pela existência de solos profundos e de baixa fertilidade, a vegetação local da caatinga, caracteriza-se pela predominância do estrato arbóreo e arbustivo e pequena ocorrência de vegetação herbácea (Lemos; Rodal, 2002; Farias, 2003; Emperaire, 1989).  

O assentamento Lisboa foi criado a partir de uma área de ocupação de agricultores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em 1983, com uma área estimada em 9.976 ha, sendo reconhecido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Atualmente, 265 famílias residem no assentamento.

As principais atividades praticadas pela maioria dos assentados são o cultivo em sequeiro, milho (Zea mays L.), feijão (Phaseolus spp), mandioca (Manihot esculenta Crantz) e a criação de animais, destacando-se ovinos, caprinos e bovinos, manejados nas áreas de pastagem nativa. Caprinos e ovinos formam os maiores rebanhos e são fontes de renda ao longo do ano.

Inicialmente foram realizados encontros com os criadores de caprinos e visitas aos locais de criação destes animais, buscando uma aproximação com a comunidade. Para a escolha dos participantes no levantamento etnobotânico foram considerados os informantes com idade superior a 18 anos, residentes no assentamento há mais de 15 anos – tempo de residência favorável para vivenciar as transformações ocorridas e absorver conhecimentos da flora local. Dos 21 caprinocultores do assentamento, 17 participaram do estudo, sendo 14 homens e três mulheres, com idade entre 33 e 77 anos. Todos os participantes que aceitaram colaborar voluntariamente com este estudo, assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando a realização do estudo, condição predita pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), que disciplina e fiscaliza todas as pesquisas realizadas com animais e plantas, incluindo as pesquisas que envolvem o conhecimento das comunidades tradicionais, e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) (Resolução 510/16). As entrevistas semiestruturadas foram procedidas individualmente (Phillips; Gentry, 1993). As perguntas também incluíam questionamentos sobre as estruturas das plantas preferencialmente consumidas pelos caprinos (folha, flor, fruto), em qual época do ano são mais consumidas, e ainda, sobre as áreas no assentamento frequentemente pastejadas por esses animais.

As informações coletadas durante as entrevistas serviram como base para a geração de uma lista das espécies forrageiras encontradas no assentamento. Após as entrevistas, foram realizadas turnês-guiadas (Albuquerque; Lucena; Alencar, 2010), técnica adotada com a ajuda de um informante-chave, detentor de elevado conhecimento sobre as plantas locais. Nas turnês-guiadas, foi coletado o material botânico das espécies forrageiras citadas nas entrevistas e encontradas nos sítios estudados.

O estudo fitossociológico foi realizado nos meses de dezembro/2015 e fevereiro, março, abril, maio e de julho/2016. Adotou-se o método de parcelas e subparcelas, proposto por Müeller-Dombois e Ellenberg (1974), em pastagem nativa manejada com caprinos há mais de 30 anos. Nessa área foram selecionados dois sítios ecológicos, considerando que este termo é utilizado para descrever áreas de pastagem nativa com diferenças fitofisionômicas (Stoddart; Smith; Box, 1975). O sítio I, denominado de sítio arbustivo, considerando a ocorrência de vegetação com fisionomia, predominantemente arbustiva; e o sítio II, denominado de sítio arbóreo, em virtude da predominância de vegetação do tipo arbórea. No histórico destas áreas observa-se desmatamento mecânico para plantio de capim-buffel (Cenchrus ciliares L.). No primeiro sítio a vegetação nativa foi desmatada duas vezes, a primeira em 1985 e a segunda em 2004; já no segundo sítio, o desmatamento foi realizado no ano de 1985 também para implantação de pastagem cultivada; em todas essas tentativas o capim não se estabeleceu. Como as pastagens não se estabeleceram, a área foi aberta para o pastejo animal. Para a coleta de amostras, em cada sítio foi dimensionada uma área de 0,76 ha, totalizando 1,52 ha. Em cada sítio estabelecido, três transectos paralelos de 190 m de comprimento, distantes entre si por 20 m. Em cada transecto, foram delimitadas dez parcelas experimentais de 10 x 10 m (100 m2), equidistantes por dez metros. Dessa forma, foram amostradas 30 parcelas, totalizando uma área amostral de 3000 m2 por sítio.

Nas parcelas de 10 x 10 m foram avaliadas as espécies forrageiras arbóreas e, no interior dessas parcelas, delimitada uma subparcela de 4 x 4 m, para avaliação das plantas arbustivas e daquelas de outros hábitos de vida. Em cada parcela e subparcela foram contabilizados os indivíduos forrageiros vivos, citados no levantamento etnobotânico e encontrados no levantamento fitossociológico, durante as turnês-guiadas. Foram considerados, para avaliação como espécimes forrageiros arbóreos, os indivíduos com circunferência à altura do peito (CAP) ≥ 6 cm (Ferraz et al., 2013) e altura superior a 2 m; já para os indivíduos arbustivos, foram considerados aqueles entre 0,5 e 2 m de altura, diâmetro da base do caule inferior a 6 cm e emissão excessiva de galhos a partir da base (Albuquerque; Soares; Araujo Filho, 1982).

O solo da área é Neossolo quartazerênico com as seguintes características: pH em CaCl2, entre 3,0 e 4,0; Matéria orgânica, 12 – 13g/dm³; P disponível 3,0 –5,0 mg dm3; Al 2,0 – 5,0 mmolc dm3 Ca 2,0 – 4,0 mmolc dm3. Durante os meses de coleta de material botânico (dezembro/2015 e fevereiro, março, abril, maio e de julho/2016), o acumulado de chuvas foi 217.5 mm. As precipitações máximas ocorreram em janeiro e março, com 276,5 e 95,5 mm, respectivamente.

O material botânico foi identificado usando bibliografias usuais e comparação com materiais depositado no Herbário Graziela Barroso (TEPB), da Universidade Federal do Piauí (UFPI). As espécies foram organizadas por famílias, de acordo com Angiosperm Phylogeny Group IV (APG IV, 2016). Para a grafia dos nomes dos táxons e identificação correta, foram realizadas consultas ao banco de dados da Lista de Espécies da Flora do Brasil (FLORA E FUNGA DO BRASIL, 2017).

A análise fitossociológica das espécies forrageiras encontradas nos dois sítios foi realizada mediante avaliação dos parâmetros: DA – densidade absoluta; DR – densidade relativa; FR – frequência relativa; DoR – dominância relativa e IVI – índice de valor de importância, conforme Müeller-Dombois e Ellenberg (1974), e ainda, N – número de indivíduos amostrados; NP – número de parcelas em que a espécies foi amostrada.

Determinou-se a diversidade e similaridade de espécies nos dois sítios. Para determinar a diversidade florística foi adotado o índice de Shannon-Weaver (H’). Ele permite obter a diversidade de plantas levando em consideração a abundância relativa de citações (Begossi, 1996).

Para determinar a similaridade e a equabilidade florística, foram adotados os índices de Jaccard e Pielou. O índice de Similaridade de Jaccard ou Coeficiente de Jaccard (J) foi calculado pela Equação 1.

Equação 1: J = a a + b + c                      

Sendo: J = índice de Similaridade ou Coeficiente de Similaridade de Jaccard; onde: a = número de espécies comuns aos dois sítios; b = número de espécies exclusivas ao sítio I; c = número de espécies exclusivas ao sítio II.

O índice de equabilidade de Pielou (J’) é derivado do índice de diversidade de Shannon e permite representar a uniformidade da distribuição dos indivíduos entre as espécies existentes (Pielou, 1966).

As espécies amostradas foram organizadas em planilha eletrônica Microsoft® Excel, e foi elaborada uma listagem florística com as famílias e espécies ocorrentes nos dois sítios avaliados. Os cálculos dos parâmetros fitossociológicos foram realizados com o auxílio do software Mata Nativa 2 (CIENTEC, 2006).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No rebanho caprino do Assentamento Lisboa predominaram animais sem raça definida e mestiços da raça Anglonubiana, contabilizando 581 animais, divididos entre 21 criadores. Os caprinos alimentam-se em áreas de pastagem nativa, durante todo o ano; ao final de cada dia, são recolhidos, em apriscos. A fonte de água no período chuvoso é um barreiro, e no período seco, um tanque abastecido por poço artesiano. A dieta dos caprinos foi composta por 34 espécies de plantas forrageiras, distribuídas em 10 famílias e 26 gêneros (Tabela 1).

Entre as espécies forrageiras, a algaroba, que no assentamento Lisboa ocorre principalmente em solos de Aluvião, também foi citada pelos criadores e trata-se de uma espécie exótica introduzida na região semiárida do Nordeste em 1946 (Santos; Diodato, 2017).

No período chuvoso a maioria das espécies participa da dieta de caprinos, com exceção da canela-de-velho, da macambira e da jurubeba, cujas folhas são ingeridas apenas no período seco. As folhas, flores e frutos compõem a dieta dos caprinos nos períodos chuvoso e seco. No período chuvoso, quando existe a disponibilidade de forragem verde, os animais acessam as estruturas das plantas até 2,0 m de altura, graças ao hábito de pastejo bipedal.

Tabela 1. Plantas forrageiras presentes na dieta de caprinos conforme conhecimento tradicional de criadores no município de São João do Piauí, PI.

Famílias

Nome Científico

Nome vernacular

Hábito de crescimento

Partes consumidas

Fabaceae

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Albizia inundata (Mart.) Barneby & J.W. Grimes

Muquém

Arbóreo

Folha

Albizia polycephala (Benth.) Killip ex Record

Maracaíba

Arbóreo

Folha

Amburana cearensis (Allemão.) A.C. Smith

Imburana

Arbóreo

Folha

Bauhinia cheilantha (Bong.) Steud.

Mororó

Arbustivo

Folha, Fruto

Caesalpinia pyramidalis Tul.

Catingueira

Arbóreo

Folha, Fruto

Cenostigma macrophyllum Tul.

Canela de velho

Arbóreo

Folha

Cratylia mollis Mart. ex Benth.

Camaratuba

Trepadeira

Folha, Fruto

Desmanthus virgatus (L.) Willd.

Jureminha

Arbustivo

Folha, Fruto

Libidibia ferrea (Mart. ex Tul.) L.P. Queiroz

Pau-ferro

Arbóreo

Folha

Mimosa tenuiflora (Willd) Poir

Jurema

Arbóreo

Folha, Fruto

Piptadenia moniliformis Benth.

Angico-de-bezerro

Arbóreo

Folha, Flor, Fruto

Prosopis juliflora (Sw.) DC.

Algaroba

Arbóreo

Fruto

Senna spectabilis var. excelsa (Schrad.) H.S. Irwin & Barneby

Canafístula

 

Arbóreo

Folha, Flor

Senna macranthera var. pudibunda (Mart.) H.S. Irwin & Barneby

Besouro

Arbustivo

Folha, Flor, Fruto

 

Senna obtusifolia (L.) H.S. Irwin & Barneby

Mata-pasto

Arbustivo

Folha

Senegalia bahiensis (Benth.) Seigler & Ebinger

Jurema-branca

Arbóreo

Folha

Euphorbiaceae

 

Croton blanchetianus Baill

Marmeleiro

Arbustivo

Folha

 

Croton grewioides Baill

 

Canelinha

Arbustivo

Folha, Fruto

Rhamnaceae

Sarcomphalus joazeiro

 (Mart.) Hauenschild

Juazeiro

Arbóreo

Folha

Jatropha mollissima (Pohl) Baill.

Pinhão

Arbustivo

Folha

Manihot pseudoglaziovii Pax & K. Hoffm.

Maniçoba

Arbóreo

Folha

Combretaceae

Combretum leprosum Mart.

Mofumbo

Arbustivo

Folha, Fruto

Thiloa glaucocarpa Mart. Eichler

Sipaúba

Arbóreo

Folha, Flor,

Fruto

Bignoniaceae

Arrabidaea ateramnantha Bur. et K. Schm.

Cipó de chapada

Trepadeira

Folha Flor

Anacardiaceae

 

Myracrodruon urundeuva Allemão

Aroeira

Arbóreo

Folha

Spondias tuberosa Arruda

Umbuzeiro

Arbóreo

Folha, Fruto

Apocynaceae

Aspidosperma discolor A.DC.

Pitiá

Arbóreo

Folha

Calotropis procera (Aiton) W.T. Aiton

Botão-de-seda

Arbustivo

Folha, Fruto

Bromeliaceae

Bromelia laciniosa Mart. ex Schult. & Schult.f.

Macambira

Herbáceo

Folha, Flor

Convolvulaceae

 

Ipomoea asarifolia (Desr.) Roem. & Schult.

Salsa

Trepadeira

Folha

Ipomoea cairica (L.) Sweet

Jitirana

Trepadeira

Folha, Fruto

Solanaceae

Solanum paniculatum L.

Jurubeba

Arbustivo

Folha, Fruto

NI

 

Jacurutu

Arbóreo

Folha

NI

 

Triadim

Arbóreo

Folha

NI - Não identificado

Fonte: Autores (2024)

 

Com o final do período chuvoso ocorre a deposição de folhas, galhos finos, cascas, flores e frutos, que compõem a serrapilheira (material depositado no solo, resultante do processo de caducifólia). Os animais manejados em áreas de Caatinga selecionam sua dieta nessa serrapilheira (Lima et al., 2015). Entre as plantas forrageiras, 44% são ingeridas apenas as folhas, e 56%, além das folhas, as flores e os frutos. O cipó de chapada, a canafístula e a camaratuba, são plantas forrageiras das quais os caprinos consomem folhas e flores enquanto o angico-de-bezerro, o besouro e a sipaúba, são consumidos, além das folhas, as flores e os frutos.

As cinco espécies mais citadas mais citadas pelos criadores, entre 65 e 95% destes, foram: jurema, marmeleiro, catingueira, mofumbo e angico-de-bezerro; nove espécies foram citadas pelos criadores, no intervalo entre 20 e 50% e 20 espécies, no intervalo entre 6 e 18 % (Figura 1).

Entre as espécies com menor percentual de citações destacam-se a aroeira, a amburana, o juazeiro, o mororó, o pau-ferro e o muquém, embora estas plantas sejam consideradas de elevado valor forrageiro pelos criadores, têm baixa ocorrência nas áreas de pastagens nativas do Assentamento Lisboa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Autores (2024)

 

Essas espécies foram identificadas em caatinga sedimentar do Piauí, em áreas com menor nível ou com atividades antrópicas ausentes (Lemos; Rodal, 2002; Farias, 2003; Emperaire, 1989; Carvalho, 2014).

As duas espécies mais citadas, jurema e marmeleiro, são classificadas como plantas pioneiras dominantes em vegetação sucessional de caatinga, submetidas ao desmatamento para cultivo agrícola, retirada de madeira, e ao pastejo (Pereira; Bake, 2010), estas práticas foram registradas no Assentamento Lisboa. Ambas são consideradas espécies de baixo valor forrageiro para ruminantes, tendo em vista os aspectos de composição química e digestibilidade de nutrientes (Santos et al., 2010). Nesse cenário, a elevada citação dessas plantas forrageiras pelos criadores provavelmente está relacionada a sua disponibilidade, uma vez que os caprinos têm plasticidade em sua dieta e a modificam de acordo com, entre outros fatores, a disponibilidade de forrageiras na pastagem (Pisani; Distel; Bontli, 2000; Papacristhou; Dziba; Provenza, 2005).

Em outros levantamentos etnobotânicos, realizados em áreas de caatinga, também foi registrado esse padrão de comportamento ingestivo dos caprinos (Leal; Vicente; Tabarelli , 2003; Nunes et al., 2015), o que revela a necessidade de planejamento no manejo desses animais para minimizar o impacto sobre a conservação de plantas forrageiras. Projetos de desenvolvimento da caprinocultura, em áreas de caatinga, devem ser ancorados no conhecimento do status da pastagem nativa, quanto a sua composição botânica.

No levantamento fitossociológico, foi possível observar a dinâmica populacional das espécies forrageiras presentes na dieta de caprinos. Foram inventariados 923 indivíduos: 436 contabilizados no sítio arbustivo e 487 no sítio arbóreo (Tabela 2).

No sítio arbustivo foram encontradas três famílias botânicas contendo quatro gêneros e quatro espécies; no sítio arbóreo foram encontradas cinco famílias botânicas contendo 12 gêneros e 13 espécies e uma espécie não identificada. Nos dois sítios a família Fabaceae foi a que apresentou maior riqueza, com nove espécies, seguida da Euphorbiaceae com duas espécies, estas duas representaram 84% das espécies forrageiras. As famílias Combretaceae, Bignoniaceae, Apocynaceae, apresentaram apenas uma espécie. Dos 13 gêneros registrados nos dois sítios, 85% foram representados somente com uma espécie; Senna e Croton foram representados por duas espécies cada.

A diferença entre os sítios ecológicos resultou da maior intensidade de desmatamentos: no sítio arbustivo foram realizados dois desmatamentos mecânicos em um intervalo de 19 anos, enquanto no sítio arbóreo ocorreu apenas um desmatamento mecânico. No período deste levantamento florístico, o sítio arbustivo tinha 12 anos e o sítio arbóreo tinha 31 anos desde o último desmatamento, respectivamente.

Essas espécies são classificadas como pioneiras, abundantes em áreas de caatinga com diferentes níveis de degradação (Carvalho et al., 2001; Pereira, 2010). Levantamentos florísticos em áreas de caatinga conservada, localizadas na bacia sedimentar do estado do Piauí, identificaram a família Fabaceae com o maior número de espécies (Mendes, 2003; Lemos; Rodal, 2002), ou seja, na sucessão vegetal com a presença do pastejo, essa família continua sendo a mais representativa.

Tabela 2. Densidade relativa (DR), Frequência relativa (FR), Dominância relativa (DR) e Índice de Valor de Importância (IVI), em dois sítios de pastejo em área de Caatinga, São João do Piauí, PI.

 

 

Sítio Arbustivo

Família

Espécie

N

NP

DR

(%)

FR

(%)

DoR

(%)

IVI

 

Fabaceae

Caesalpinia pyramidalis

38

10

8,72

18,26

12,31

39,29

Senna macranthera

240

24

55,05

41,74

56,80

153,59

Euphorbiaceae

Croton blanchetianus

143

24

32,80

36,52

26,15

95,46

Combretaceae

Combretum. leprosum

15

2

3,44

3,48

4,74

11,66

 

Total

436

 

100,00

100,00

100,00

 

 

 

Sítio Arbóreo

Fabaceae

A. discolor

24

13

4,93

6,84

4,89

16,66

A. polycephala

6

5

1,23

2,63

2,16

6,02

B. cheilantha

11

7

2,26

3,68

1,01

6,96

C. pyramidalis

41

11

8,42

11,05

37,85

57,32

C. macrophyllum

12

3

2,46

1,58

4,07

8,11

M. tenuiflora

36

24

7,39

12,63

12,02

32,04

P. moniliformis

120

25

24,64

13,16

19,39

57,18

S. bahiensis

12

10

2,46

5,26

2,16

9,89

S. spectabilis

50

12

10,27

6,32

7,48

24,06

Euphorbiaceae

C. blanchetianus

80

18

16,43

22,11

5,10

43,64

 

C. grewioides

2

1

0,41

0,53

0,31

1,24

Combretaceae

T. glaucocarpa

9

5

1,85

2,63

2,33

6,81

Bignoniaceae

A. ateramnantha

83

21

17,04

11,05

0,96

29,06

Não identificada

 

1

1

0,21

0,53

0,28

1,01

 

Total

487

 

100,00

100,00

100,00

 

 
N = número de indivíduos; NP = número de parcelas em que a espécie foi inventariada

 Fonte: Autores (2024)

 

Comparando a lista de plantas forrageiras deste estudo com as de vegetação identificadas em caatinga de área sedimentar no estado do Piauí, observou-se que 25% das espécies presentes nos dois sítios ecológicos foram comuns com a caatinga, considerando vegetações em diferentes estágios de sucessão (Emperaire, 1989) e em área de transição cerrado-caatinga (Oliveira et al., 2010). Contudo, apenas 13% foram de ocorrência comum, com um levantamento realizado em uma unidade de conservação – Parque Nacional Serra da Capivara (Lemos; Rodal, 2002). A densidade total foi 1453.34 (sítio arbustivo) e 1623.35 índ. ha-1 (sítio arbóreo), o que correspondeu a 24 e 28% do registrado em uma área de Caatinga sedimentar preservada, 5.827 índ./ha (Lemos; Rodal, 2002). Quanto ao Índice de Valor de Importância (IVI), no sítio arbustivo, a família Fabaceae obteve o maior percentual (64,29%), sendo S. macranthera com uma dominância relativa maior que 50%. Para esta espécie também foram registrados os valores mais elevados dos parâmetros relativos de densidade (55,05%), frequência (41,74%) e dominância (56,80%) (Tabela 2). Esses resultados indicam a importância ecológica da espécie quanto à distribuição horizontal de espécies por área, e a sua importância do ponto de vista forrageiro, porque caprinos pastejam folhas e flores desta espécie arbustiva na época chuvosa e início da transição entre esta época e a seca, com base nas informações dos produtores e na observação in loco.

No sítio arbóreo, a família Fabaceae obteve o maior percentual do IVI (67,2%), com dominância relativa de 56% das espécies C. pyramidalis e P. moniliformis.  O segundo maior IVI foi da família Euphorbiaceae (15%), seguido da Bignoniaceae (9,69%), Apocynaceae (5,55%) e Combretaceae (2,27%). O terceiro maior valor de IVI e a quinta maior DOR do sítio arbóreo foi o da espécie C. blanchetianus. As espécies forrageiras mais citadas no levantamento etnobotânico foram as mais de maior IVI nos dois sítios ecológicos.

O pastejo associado a frequência de desmatamento resultou em diferenças na diversidade florística, de modo que os índices de diversidade de Shannon-Weaver (H’) foram 1.02 e 2.16 nats ind- 1, para os sítios arbustivo e arbóreo, respectivamente. Uma vez que os animais tiveram acesso aos dois sítios, no ano seguinte ao desmatamento, a diferença entre estes, foi o tempo pós-desmatamento, cerca de 12 e 31 anos, para os sítios arbustivo e arbóreo, respectivamente. Desse modo pode-se presumir que a maior diversidade florística no sítio arbóreo pode ser associada a redução do impacto de pastejo ao longo do tempo, decorrente de fatores tais como defesa estrutural, química e crescimento compensatório das plantas forrageiras (Sebata, 2013). Estudos realizados em ambientes de caatinga no semiárido piauiense, em locais sem histórico recente de pastejo por ruminantes domésticos ou de desmatamentos, mostram que os índices de diversidade de Shannon-Weaver (H’) variaram entre 2.7 e 3.0 nats ind-1 (Lemos; Rodal, 2002; Souza et al., 2017).

A análise realizada com base no índice de similaridade florística ou coeficiente de Jaccard (J) indicou uma baixa homogeneidade florística entre os dois sítios, com índice de Jaccard igual a 0,13, ainda que os mesmos estivessem localizados próximos um do outro, com distância inferior a 1 km. Para Müeller-Dombois e Ellenberg (1974), duas áreas são consideradas similares quando o índice de Jaccard entre elas é superior a 0,25. A diferença no número de desmatamentos, provavelmente, foi determinante para essa baixa similaridade florística, visto que, em ambos os sítios, a presença do animal é constante.

Os valores do índice de equabilidade de Pielou (J’) foram 0,37 e 0,78, respectivamente, para os sítios arbustivo e arbóreo. O valor mais elevado para esse índice no sítio arbóreo indica a ausência de predomínio acentuado de uma ou de poucas espécies sobre as demais. Em situações nas quais algumas espécies contêm muitos indivíduos, a diversidade é baixa (Pielou,1966). No sítio arbustivo, a baixa equabilidade foi influenciada pela alta densidade de S. macranthera, que se fez presente em 80% das parcelas, apontando baixa heterogeneidade florística, indicando o estágio progressivo de sucessão ecológica nesse sítio. Esse padrão de comportamento também foi também foi observado em áreas de caatinga nos estágios iniciais da sucessão vegetal (Calixto Junior; Drumond, 2014).  Associando as informações dos levantamentos fitossociológico e etnobotânico, foi possível observar que a composição botânica da dieta dos caprinos muda ao longo dos meses, considerando as diferentes épocas do período chuvoso (Figura 2).

As espécies A. ateramnantha, C. grewioides e C. blanchetianus estão presentes, como forragem verde, apenas no período de maior concentração de chuvas. As espécies que estão presentes na dieta em todo o período chuvoso são consumidas desde as folhas verdes e galhos finos, até as folhas maduras e os frutos, e aquelas presentes entre meados e final do período chuvoso são consumidas as folhas maduras, as flores e os frutos. Mesmo no sítio arbustivo, onde foram identificadas apenas cinco espécies, existe a disponibilidade de forragem até o início da seca.

Nas pastagens nativas onde ocorre uma maior riqueza de plantas forrageiras, os caprinos têm uma dieta com mais opções em diferentes épocas do ano, o que se constitui em uma maior seguridade alimentar e garante o desempenho produtivo dos rebanhos. Assim como observado em área de caatinga sedimentar, as espécies catingueira, jurema e marmeleiro, também são as forrageiras dominantes na dieta de caprinos e de outros ruminantes em área de caatinga em região de cristalino (Carvalho et al., 2021). A serrapilheira, fonte de forragem para caprinos no período seco, não foi identificada por espécie forrageira pelos informantes, contudo, pesquisas em outras áreas de caatinga mostram que folhas, talos finos e frutos são os principais componentes da dieta daqueles animais (Pfister et al., 1986; Formiga et al., 2020; Saraiva, 2020).

 

 

Espécie

Jan

Fev

Mar

Abr

Mai

Jun

Jul

Chuva

Transição chuva-seca

 

 

 

A. polycephala

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A. ateramnantha

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A. discolor

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

B. cheilantha

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

C. pyramidalis

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

C. macrophyllum

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

C. leprosum

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

C. grewioides

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

C. blanchetianus

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

M. tenuiflora

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

P. moniliformis

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

S. bahiensis

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

S. macranthera

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

S. spectabilis

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

T. glaucocarpa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Não identificada

 

 

 

 

 

 

 

Figura 2. Distribuição de plantas forrageiras no período chuvoso em área de caatinga, São João do Piauí, PI.

Fonte: Autores (2024)

 

Os resultados deste trabalho indicaram o impacto do desmatamento mecânico associado ao pastejo de caprinos no IVI de espécies forrageiras, neste caso, o desmatamento foi para implantação de pastagem cultivada de capim-buffel (Cenchrus ciliares L.), ou seja, a substituição da pastagem nativa na caatinga, por pastagem cultivada, precisa ser bem planejada, considerando, além de fatores ambientais, fatores culturais dos criadores de caprinos. Estudos sobre forrageiras em região de caatinga sedimentar precisam ser executados, baseados inicialmente na etnobotânica, a fim de identificar as plantas de melhor valor nutritivo, para que estas possam ser conservadas ou reintroduzidas nos ecossistemas de pastagens nativas.

As espécies jureminha, camarautuba, muquem e angico-de-bezerro, citadas no LE são indicadas na literatura como forrageiras promissoras para alimentação de caprinos e outros ruminantes domésticos (Nascimento et al., 1996; Riestra; Valencia ; Carias, 2005; Castro-Montoya; Dickhoefer, 2020). A menor frequência de ocorrências dessas espécies, ou mesmo sua ausência, nos sítios arbustivos e arbóreos, pode ser associada ao pastejo, pois são espécies de elevada aceitabilidade pelos caprinos. De acordo com Lins (2022), o maior impacto do pastejo de caprinos em áreas de caatinga se deve ao aumento da mortalidade de plântulas, o que modifica a conservação da composição botânica, em ecossistemas pastoris nesta fitofisionomia.

CONCLUSÕES

Os criadores de caprinos em área de caatinga sedimentar identificaram 34 espécies forrageiras, com predominância de árvores e arbustos. Folhas, flores e frutos compõem a dieta dos caprinos, no período de chuvoso e na transição chuva e seca.

Plantas forrageiras arbóreas sucedem as arbustivas ao longo do tempo, com um aumento da diversidade na comunidade de plantas forrageiras de pastagens nativas em caatinga sedimentar. A espécie dominante no sítio arbustivo é a S. machrantera e no sítio arbóreo as espécies C. pyramidalis, P. moniliformis e M. tenuiflora.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos criadores de caprinos do Assentamento Lisboa, à Associação Comunitária de Pequenos Agricultores Assentados em Lisboa (ACOPAAL) e aos jovens técnicos do Centro de Estudos e Formação Educacional de Capacitação e Formação Agenor da Silva (CEFCAS).

Copyright (©) 2024 Rosianne Mendes de Andrade da Silva Moura, Maria Elizabete de Oliveira, Roseli Farias Melo de Barros, Estevam da Silva Neto, Jandson Vieira da Costa.

 

 

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Revista Brasileira de Agroecologia
ISSN 1980-9735

Publicação da Associação Brasileira de Agroecologia - ABA-Agroecologia em cooperação com o Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural - PPG-Mader, da Universidade de Brasília – UnB

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