Formar e servir”: trajetória histórico-educativa do Instituto de Pastoral Regional – IPAR (1971-1985)

"Formar y servir": trayectoria histórico-educativa del Instituto de Pastoral Regional (1971-1985)

"Form and serve": historical-educational trajectory of the Instituto de Pastoral Regional (1971-1985)

Smile Golobovante Alberto Damasceno Marcus Ribeiro



Destaques


O IPAR teve atuação fundamental na difusão dos ideais da Teologia da Libertação na Amazônia.


A instituição educativa IPAR, voltada à formação de padres, foi palco de disputa hegemônica.


O IPAR formou sacerdotes com ideais voltados à transformação social e a libertação dos oprimidos.


Resumo


Inserido no campo da História da Educação, este artigo aborda o processo de criação e institucionalização do Instituto de Pastoral Regional (IPAR) e tem como objetivo compreender de que maneira se deu esse processo entre as décadas 1970 e 1980. O trabalho é resultado de pesquisa histórico-documental e de um levantamento bibliográfico de obras que o subsidiam teoricamente. Identificamos o contexto socioeconômico amazônico, os acontecimentos eclesiais que influenciaram o Instituto, além do processo de fundação e institucionalização. Inferimos que o IPAR, fundamental para a ação da Igreja Católica na Amazônia, promoveu parte do desenvolvimento cultural e intelectual da região.

Resumen | Abstract


Palavras-chave

Instituto de Pastoral Regional. História da Educação. Amazônia.


Recebido: 13.03.2023

Aceito: 11.05.2023

Publicado: 23.05.2023

DOI: https://doi.org/10.26512/lc29202347551


Introdução


Este artigo está inserido no campo da História da Educação, tendo como tema a História das Instituições Educativas. O objeto aqui é o processo de criação e institucionalização do Instituto de Pastoral Regional1 (IPAR)2 entre os anos 1971 e 1985. Determinamos esse recorte temporal por conta de o IPAR ter sido fundado em 1971, apesar de suas atividades pedagógicas terem iniciado em 1973, enquanto a data final do recorte temporal, em 1985, foi escolhida por coincidir com o fim do regime civil-militar no Brasil. Trazemos a reflexão acerca da trajetória histórico-educativa do IPAR ao âmbito acadêmico por considerá-la fundamental diante da ausência de estudos e produções sobre a temática em Programas de Pós-Graduação em Educação, História e Ciências da Religião na Amazônia, sobretudo, no Pará.

Como problema de pesquisa, buscamos interrogar de que modo se deu o processo de criação e institucionalização do IPAR entre as décadas 1970 e 1980, tendo como questões norteadoras perguntas sobre de que maneira se constituiu a criação do IPAR e quais sujeitos históricos protagonizaram esse processo de criação e institucionalização. Com o intuito de responder ao nosso problema, estabelecemos como objetivo geral compreender o processo de criação e institucionalização do IPAR no recorte escolhido. Quanto aos objetivos específicos, giram em torno de analisar o processo de criação da instituição e identificar os sujeitos históricos protagonistas desse processo.

Buscando atender aos nossos objetivos, estipulamos como próximo passo a definição da metodologia adotada, um passo fundamental em qualquer investigação, pois dela derivam as ferramentas teóricas, conceituais e instrumentais que serão articuladas ao longo do estudo, e que pode ser também entendida como um aspecto que se coaduna a uma concepção de realidade, funcionando como mediador no processo de entendimento, estruturação, desenvolvimento e transformação dos fenômenos sociais em investigação (Colares, 2011).

Portanto o presente trabalho ocupa-se de uma investigação histórica acerca da trajetória educativa do Instituto de Pastoral Regional na Amazônia, provocada pelo estranhamento de nossa práxis docente cotidiana, a qual – longe de ser uma atividade mecânica – é ação consciente e reflexiva que entende a docência como intervenção na sociedade em face dos desafios da educação brasileira. Desse modo, consistindo efetivamente na:

Historicidade do fenômeno educativo cujas origens coincidem com a origem do próprio homem, o debate historiográfico tem profundas implicações para a pesquisa educacional, já que o significado da educação está intimamente entrelaçado ao significado da História. E no âmbito da investigação histórico-educativa essa implicação é duplamente reforçada: do ponto de vista do objeto, em razão da determinação histórica que se exerce sobre o fenômeno educativo; e do ponto de vista do enfoque, uma vez que pesquisar em história da educação é investigar o objeto educação sob a perspectiva histórica. (Saviani, 1998, p. 14)

Em vista disso, realizamos uma pesquisa histórico-documental com o levantamento das fontes referentes ao Instituto no Acervo do IPAR, localizado na Biblioteca da Sede Regional Norte II da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, nas circunscrições eclesiásticas do Pará e Amapá, e nos arquivos pessoais de alunos, ex-alunos, funcionários, professores e diretores do Instituto. Entre os documentos levantados, destacamos: a ata de fundação do IPAR, no ano 1971; o primeiro regimento interno do IPAR; além de fotografias de antigos protagonistas da história do Instituto.

Para constituir a cronologia do IPAR no que se refere à criação, institucionalização e aos sujeitos históricos, utilizamos o livro comemorativo dos 25 anos do IPAR, da teóloga Tea Frigeiro (1996). Fizemos uso também da obra Caminhada da Igreja na Amazônia, do teólogo, historiador e bispo Raimundo Possidônio Carrera da Mata (2002). Do mesmo modo, lançamos mão de fontes documentais do arquivo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e do IPAR, bem como de anuários católicos das regionais da CNBB, das prelazias, dioceses e das arquidioceses católicas brasileiras.

Em paralelo, fizemos uma revisão bibliográfica acerca da História das Instituições Educativas a partir da discussão feita por Justino Magalhães (2007) e Rodríguez (2008), que abordam a temática e a sua contribuição para o campo da História da Educação. Também nos utilizamos de algumas literaturas que trabalham a História das Ideias Pedagógicas, com destaque à obra de Saviani (2007) e à História da Igreja latino-americana de Dussel (1989), procurando entender o contexto histórico da instituição religiosa em nosso continente.

Essa articulação se dá a fim de nos apropriarmos da literatura como ferramenta de apreensão da dinâmica sociocultural e de questões já perscrutadas em diferentes momentos históricos capazes de corroborar novas reflexões e produções. Esse itinerário teórico-metodológico se constitui em um esforço indispensável em face do levantamento documental, uma base importante para o diálogo com as fontes, assim como para a investigação e produção de conhecimento histórico, circulação e apropriação desse conhecimento.

As vicissitudes da trajetória educativa do IPAR


Cremos ser importante ressaltar que o Instituto de Pastoral Regional surgiu na Amazônia para atender às necessidades eclesiais do Pará e Amapá em um contexto no qual ocorria a exploração indiscriminada de recursos naturais e de controle do espaço, igualmente por meio de uma rede de comunicações que compreendia satélites, aeroportos e estradas, como a Belém-Brasília3 e a Transamazônica4. A criação da Superintendência para o Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), em 1953, também foi um primeiro passo institucional para a ampliação da área de execução desse plano, pois possibilitou a criação da Amazônia Legal5, que corresponde a mais da metade do território nacional. A partir de então, foram implantados grandes projetos voltados para a exploração mineral e da cobertura vegetal ― para extração da madeira –, além da construção de hidrelétricas, que garantiriam a geração de energia suficiente para as indústrias extrativistas e agropecuárias, e da garimpagem desordenada (Mata, 2007, p. 25), contribuindo para o surgimento de problemas que se mantêm até o século XXI.

Naquelas circunstâncias, a Igreja Católica assumia papel fundamental que ultrapassava a evangelização e a catequese, pois talvez fosse, de acordo com Becker (2004), a única organização que detinha autoridade e força política suficientes para se opor ao poder do governo, especificamente às forças de repressão. Porém, é válido ressaltar que havia um antagonismo dentro da Igreja entre uma tendência conservadora, representada, por exemplo, por um comunicado oficial da CNBB assinado por 26 bispos que apoiou a instauração da intervenção federal, e uma tendência com ideais progressistas que defendia uma evangelização ligada à luta contra injustiças e desigualdades sociais (Cancian, 2017). Esse papel sociopolítico da Igreja a desafiou e motivou na formação de agentes de pastoral e sacerdotes que tinham no IPAR o meio necessário para tal. No entanto, o Instituto deveria seguir às diretrizes formativas de caráter filosófico, teológico e pedagógico da Igreja Católica oriundas da Santa Sé.

Foi neste cenário que o IPAR percorreu uma trajetória histórico-educativa que considerou agentes pastorais diversos, tais como religiosos, catequistas, seminaristas e padres, para os diversos serviços, organismos e movimentos da Igreja Católica na região. Eventualmente, alcançou outros públicos, adeptos de outras denominações religiosas, ateus ou estudiosos do catolicismo (Frigeiro, 1996). O Instituto formou também gerações de lideranças católicas que se dedicaram à evangelização e à catequização na Amazônia, entre os quais se destacam seis ex-alunos nomeados bispos pelo Vaticano6.

Essa trajetória foi marcada por continuidades, rupturas e disputas que traduzem as concepções pastorais e teológicas da Igreja Católica, bem como sua compreensão da Amazônia como fronteira7 econômica e, principalmente, como área de missão e evangelização. Desse modo, cabe levar em consideração tanto os territórios e as territorialidades8, no tocante às dificuldades de transporte e de meios de comunicação, quanto as desigualdades sociais aprofundadas pela política de desenvolvimento econômico da região implementada pelo governo federal na segunda metade do século XX.

Nessa conjuntura, o IPAR atuava dentro de suas atribuições estabelecidas na ata de fundação, que consistiam em ensino e pesquisa voltados para o serviço da Igreja na Amazônia, especialmente na área do Regional Norte II (Frigeiro, 1996). O objetivo principal era assessorar os bispos da região, com ênfase na formação de agentes pastorais, especialmente os futuros padres. Por isso, tornou-se uma estrutura indispensável da Igreja Católica na Amazônia, já que mobilizava e sensibilizava diversos sujeitos sociais para os fins da formação acadêmica empreendida, na perspectiva de Frigeiro (1996, p. 13), quando:

[…] a realidade desafiou as mulheres e os homens de então. A força que os impulsionou a sonhar e a realizar o que era considerado impossível encontrou eco nos homens e mulheres que lendo a história deram origem a esta casa. Não somente uma casa de pedras, mas uma casa construída pelas pessoas que por ela passaram e acreditaram na sua proposta. Pessoas de fé ativa, ouvidos abertos para ouvir o que a história tinha a falar, olhos alerta para enxergar a realidade, mente ágil na procura dos caminhos a percorrer como resposta aos sinais dos tempos. Pessoas de uma caridade sem fronteiras, testemunhada na solidariedade, na luta, no conflito, na realização dos projetos de formação, no serviço de acolhida, no empenho de tornar o Instituto a casa do Regional. Pessoas imbuídas de esperança teimosa, pois a utopia de uma sociedade diferente foi e é sonho nunca esquecido, mas sempre vivo na certeza de que “sonho que sonha só pode ser pura ilusão, sonho que se sonha juntos é sinal de solução”.

Além de o IPAR representar o meio para viabilizar a formação seminarística, no âmbito filosófico e teológico, necessária para a ação pastoral da Igreja Católica na Amazônia, ele se configurava como o lugar dos que compartilhavam essa tarefa e que, na visão de Frigeiro (1996), estavam alinhados à “utopia de uma sociedade diferente”. Isto posto, o Instituto era depositário de uma teologia latino-americana alinhada ao Concílio Ecumênico Vaticano II, à Encíclica Populorum Progressio do Papa Paulo VI e à Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano de Medellín, que impactaram profundamente na mudança de rumo da pastoral na Amazônia (Arenz & Vasconcelos, 2014), sistematizada nos Encontros Inter-Regionais dos Bispos da Amazônia, especialmente o IV Encontro de Pastoral na Amazônia, realizado em 1972, na cidade de Santarém.

Assim o IPAR precisa ser compreendido à luz do Encontro de Santarém, que reconheceu a ausência de meios, estruturas e pessoas preparadas na Igreja Católica da Amazônia (Arenz & Vasconcelos, 2014). Essa deficiência reconhecida pelos bispos confere ao Instituto um papel estratégico diante das prioridades pastorais da Igreja Católica na Amazônia no que tange à formação de agentes de pastoral, papel estratégico que se deve aos desafios da evangelização na Amazônia e a sua condição de instituição educativa9. Em face desse cenário, como historiadores da educação, cabe-nos não somente compreender, mas também explicar sua realidade histórica de modo a “integrá-la de forma interactiva no quadro mais amplo do sistema educativo e nos contextos e circunstâncias históricas, implicando-a na evolução de uma comunidade e de uma região, seu território, seus públicos e zonas de influência” (Magalhães, 2007, p. 70, grifo nosso).

Outro aspecto importante nesta trajetória são as alterações por que passou desde sua fundação como uma instituição educativa, movendo-se com os sujeitos, enfrentando a conjuntura, assumindo as atribuições regimentais e defrontando-se com os interesses da hierarquia. A esse respeito, é fundamental a caracterização que Rodríguez (2008) propõe a respeito da instituição educativa como uma organização social constituída em sua totalidade por um plano histórico e pedagógico que recebe influência social e cultural do meio em que está inserido. Essa caracterização traduz a singularidade e a relevância das suas ações e atividades formativas.

Como instituição educativa, ao analisar as características e particularidades do IPAR, compreendemos que faz parte de um conjunto de instituições da sociedade civil denominadas por Gramsci (2004) como “aparelhos privados de hegemonia”. O conceito de "aparelho privado de hegemonia" foi cunhado pelo autor para se referir às instituições da sociedade civil que exercem influência ideológica e cultural na formação da opinião pública e na construção da hegemonia de determinados grupos ou classes sociais. O termo "privado" se refere ao fato dessas instituições não serem diretamente controladas pelo Estado ou pelos governantes, mas sim por setores privados da sociedade. Logo, entendemos que o sistema educacional em diferentes níveis, incluindo instituições formativas desse tipo, tem a intenção de organizar a cultura e promover um determinado tipo de organização da informação, especificamente no que tange à formação de clérigos, mas sem renunciar a sua relação com o Estado e os movimentos sociais.

Nesse contexto de disputa política, ideológica e teológica, é possível considerar dois polos principais, aqui entendidos como o conjunto dos bispos do Pará e Amapá, que vão alterando sua compreensão sobre o conteúdo do curso seminarístico do IPAR, em especial após a eleição do papa João Paulo II, em 1979, e os seus professores, compreendidos em uma perspectiva antagônica, a da Teologia da Libertação latino-americana.

Como exemplo deste tipo de aparelho, o IPAR pode ser entendido como uma instituição particular (privada) que reflete as relações de força e convencimento – dimensões indissociáveis do processo de dominação.

Em seu interior, portanto, configura-se uma disputa entre intelectuais que desempenham sua função de direção e construção de consensos na perspectiva transformadora (“libertadora”), em confronto com aqueles que defendem a manutenção do status quo, de submissão às diretrizes da Igreja tradicional.

Cronologia do IPAR: criação, institucionalização e sujeitos históricos


A trajetória histórico-educativa do IPAR, entre 1971 e 1985, transcorreu em uma conjuntura político-econômica caracterizada internacionalmente pela Guerra Fria10 e pela reverberação do discurso macarthista11 na América do Sul. Nacionalmente, o Brasil e a Amazônia vivenciavam uma ditadura civil-militar que perdurou de 1964 a 1985. Outro elemento conjuntural, na dimensão eclesial, constituiu-se a partir do Concílio Ecumênico Vaticano II (1962 - 1965), da Encíclica Populorum Progressio (1967) do Papa Paulo VI, uma das encíclicas mais importantes da Igreja Católica, dedicada à cooperação entre os povos e ao problema dos países em desenvolvimento com uma denúncia do agravamento do desequilíbrio entre países ricos e pobres, crítica ao neocolonialismo e afirmação do direito de todos os povos ao bem-estar, da Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano em Medellín (1968), convocada pelo Papa Paulo VI para debater a aplicação das diretrizes do Concílio Vaticano II às necessidades da Igreja na América Latina, tendo como temática “A Igreja na presente transformação da América Latina à luz do Concílio Vaticano II”, e, na Amazônia, dos encontros inter-regionais dos bispos que ocorreram desde 1952, mas especialmente em Santarém, em 1972, e em Manaus, em 1974. Além disso, segundo Pessôa (2022), a crítica ao subdesenvolvimento, as denúncias contra a violação dos direitos humanos, a incorporação cada vez maior de leigos nas ações da Igreja e o apoio incondicional à organização camponesa e à Reforma Agrária foram alguns dos desdobramentos das mudanças ocorridas. Tais mudanças acabaram por resultar na perseguição de muitos religiosos pela repressão.

O IPAR foi fundado formalmente no dia 11 de novembro de 1971 com o intuito de promover o ensino e a pesquisa voltados para o serviço da Igreja Católica na Amazônia, tendo como conselho diretor os bispos Dom Alberto Gaudêncio Ramos, Dom Tadeu Henrique Prost e Dom Angelo Frosi, que tinham o encargo de escolher o diretor e o vice-diretor do Instituto (Instituto de Pastoral Regional, 1971). Nascia aí uma instituição educativa que atuaria na formação de agentes de pastoral para o Regional Norte 2 da CNBB, compreendendo os estados do Pará e Amapá, sediado na Arquidiocese de Belém12. No entanto, importa dizer que a fundação do IPAR não foi um acontecimento isolado, pois os bispos do Regional Norte 1 (estados do Amazonas, Roraima, Rondônia e Acre), sediado na Arquidiocese de Manaus, criaram o Centro de Estudos de Comportamento Humano (CENESC) no ano 1970 para atender a fins similares aos do IPAR. O IPAR e o CENESC nasciam de uma visão mais crítica dos bispos amazônicos, com a expectativa de desenvolver suas atividades de ensino e pesquisa, obrigatoriamente, a partir da realidade “dos homens da região” (Arenz & Vasconcelos, 2014).

Um ano depois da fundação do IPAR, em maio de 1972, realizou-se o Encontro Inter-regional dos bispos da Amazônia na cidade de Santarém-PA, durante o qual se estabeleceram as Linhas Prioritárias da Pastoral na Amazônia (LPPA), orientadas por dois princípios fundamentais, a evangelização libertadora e a encarnação na realidade à luz da evangélica opção preferencial dos pobres, com quatro prioridades pastorais: formação de agentes de pastoral, comunidades cristãs de base, pastoral indígena e estradas e frentes pioneiras (Encontro da Pastoral da Amazônia, 1972). Para Mata (2002), esse encontro:

foi um marco histórico da caminhada da Igreja na região amazônica, que deu à luz um documento que se tornou, como disse um bispo na ocasião, “a certidão de batismo da Igreja na Amazônia”, dado que, a partir desse momento, mudanças substanciais e fundamentais começaram a acontecer na missão evangelizadora da Igreja, e que teria um longo alcance. (Mata, 2002, p. 25)

Considerando os princípios fundamentais das LPPA, as prioridades pastorais estabelecidas pelos bispos reunidos em Santarém e a natureza educativa e de assessoramento do IPAR, foi celebrado, para fins de seu funcionamento, um convênio com a Universidade Federal do Pará (UFPA), particularmente com o então Centro de Filosofia e Ciências Humanas13, para atender à necessidade de uma formação seminarística em caráter filosófico-teológico, como um curso de graduação que, apesar de previsto para iniciar no 2° semestre de 1974, começou no 1° semestre de 1973. Sobre este curso, Frigeiro (1996, p. 71) informa que ficou:

[...] assegurado entre outras cláusulas que: o curso seria da universidade e funcionaria em seus aposentos e sob a sua direção, sendo aberto a clérigos, religiosos e leigos, desde que aprovados em vestibulares; o programa acadêmico seria preparado conjuntamente pela UFPA e a CER-Norte II; os professores da área teológica, bíblica e moral, seriam de responsabilidade da CER-Norte II, ao passo que os demais seriam da Universidade; e além disto, assegurava que o curso deveria receber até o ano de 1977 a aprovação do Ministério da Educação.

O Pará era o primeiro estado a ter um curso universitário de Teologia14 conveniado com uma instituição federal (Frigeiro, 1996). A singularidade devia-se a dois aspectos: primeiro pelo Estado brasileiro, por meio da Universidade Federal do Pará, se propor a colaborar com a formação de agentes de pastoral, sobretudo sacerdotes católicos, desconsiderando aspectos da separação entre o Estado e a Igreja, previstos mormente no Inciso II do Artigo 9° da Constituição de 1967; segundo, pelo fato de que, em 1972, o país estava sob um regime ditatorial. Dessa forma, o IPAR se constituiu como um arranjo eclesial, político e educativo que objetivava atender aos interesses educativos da Igreja Católica, com a colaboração de uma universidade federal, em plena Ditadura. É evidente que o equilíbrio desse arranjo político e educacional era tênue, especialmente, quando se considera a postura crítica da Igreja Católica em relação à realidade amazônica a partir dos elementos eclesiais apontados anteriormente, e o caráter predatório e autoritário da política de desenvolvimento do governo civil-militar para a região.

Durante o período militar a ação do Estado sobre a região tinha como elemento discursivo central a política de integração, desenvolvimento e colonização. O que podemos notar ao longo desse período é a preponderância da ideia de fronteira estabelecida por Oliveira Vianna. A ideia de outro Brasil e de uma unidade nacional enquanto equacionadora dos problemas brasileiros foi a tônica das ações do Estado. Ou seja, o Estado definiu, com base em elementos empíricos, que a Amazônia era uma fronteira aberta para compor a unidade nacional e palco de políticas de integração. (Rabello, 2013, p. 217)

O mote “integração, desenvolvimento e colonização” – que norteou a ação do Estado brasileiro na Amazônia, colocando a região como fronteira aberta – pôs a relação da Igreja com o Estado em situação tênue, em eminente conflito com setores eclesiais mais envolvidos com as lutas sociais. Nessa situação conflituosa, é importante destacar o primeiro diretor do IPAR, frei Alano Pena15, da Ordem dos Pregadores16, e o coordenador do curso seminarístico, Pe. Savino Mombelli, da congregação dos “xaverianos”17 (Frigeiro, 1996): frei Alano e Pe. Savino tiveram e cumpriram papéis fundamentais na Igreja na Amazônia a partir do IPAR. Por esse motivo, compreendemo-los como intelectuais orgânicos da teologia latino-americana, também chamada de Teologia da Libertação, fortalecida especialmente pela Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano em Medellín e pela organização das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)18, pontos significativos de dissonância teológica em relação à intelligentsia romana e ao programa defendido e propagado no papado de João Paulo II:

desde a elevação de Karol Wojtyla à Sé de Pedro notam-se, em vários dos documentos emanados de seu papado, referências contínuas à herança do Vaticano II. Muitas delas apontam, exatamente, para a questão dos problemas em torno da interpretação de suas determinações, sempre chamando atenção para a necessidade de uma leitura “correta” dos documentos a fim de sanar as inúmeras divisões que se delinearam nos anos seguintes à sua conclusão. (Caldeira, 2013, p. 159)

Esse revisionismo empreendido nos documentos papais de João Paulo II, que objetivam colocar a Sé Romana como legítima interpretadora e normatizadora do Vaticano II, encontra grande dileção por parte dos bispos na Amazônia, o que viria a provocar conflitos, disputas e tentativas de disciplinar o IPAR em seu processo educativo de teor “libertador” dos agentes de pastorais, em especial, os futuros padres.

Ainda segundo Frigeiro (1996), o curso de Teologia do IPAR começou a funcionar em março de 1973 nas instalações do Centro Pe. Guido Del Toro19 para, posteriormente, ser transferido para o campus Guamá da UFPA. As primeiras turmas contaram com alunos que iriam se tornar figuras importantes da Igreja Católica na Amazônia, como o bispo coadjutor da Diocese de Bragança-PA, Dom Raimundo Possidônio Carrera da Mata, e o arcebispo de São Luís-MA, Dom Gilberto Pastana de Oliveira.

Além da formação teológica necessária para a formação dos futuros sacerdotes, o IPAR promoveu também cursos catequéticos20 para agentes de pastorais nas dioceses e prelazias de Santarém, Marabá, Ponta de Pedras, Óbidos e em paróquias da Arquidiocese de Belém. Nessas formações, o Instituto empreendia questionamento à catequese tradicional e indicava a viabilidade da adaptação à realidade. Até 1974, o curso catequético na Arquidiocese de Belém acontecia nas instalações do Centro Pe. Guido Del Toro. Ainda em 74, foi realizado o Encontro Inter-regional de Manaus, que acrescentou a juventude nas Linhas Prioritárias da Pastoral na Amazônia (Mata, 2002).

Entre os anos 1975 e 1977, o curso catequético passou a ser realizado no Colégio Nazaré, em cooperação com o Departamento de Catequese da Arquidiocese de Belém (Frigeiro, 1996). Em abril de 1975, frei Alano Pena foi nomeado pelo Papa Paulo VI como bispo-auxiliar de Belém21. Com a sua nomeação episcopal, o Pe. Luís Pinto de Azevedo, da Diocese de Santarém, foi nomeado pelos bispos CER-Norte II como diretor do IPAR em 1976.

Padre Luís Pinto empreendeu um processo de reestruturação profunda no Instituto a partir da reformulação no estatuto, criação da congregação como órgão consultivo e deliberativo, e da diretoria colegiada como órgão executivo. Nesse período, Pe. Savino, diretor do curso de Teologia do IPAR, publica o estudo Valores Religiosos do Círio de Nazaré (Mombelli, 1976), obra célebre do teólogo italiano, que marcou a compreensão crítica sobre parte da religiosidade de uma parcela considerável da Amazônia.

Ainda em 1976, as relações entre a Igreja Católica na Amazônia e o regime militar, conforme Frigeiro (1996), passam por tensionamentos devido às investigações sobre Dom Alano Pena e Dom Estevão Cardoso Avelar22, que denunciavam os abusos da Ditadura Civil-Militar contra posseiros, ribeirinhos e camponeses na região do Araguaia23. No segundo semestre daquele mesmo ano, a relação se deteriorou irremediavelmente entre a UFPA e o IPAR, sobretudo em razão da mudança na reitoria da universidade, que passou a ser conduzida pelo Professor Aracy Amazonas Barreto24, até que no auge da crise, em julho de 1977, a direção do centro decidiu encerrar o convênio com a UFPA (Frigeiro, 1996). Apesar dos problemas, a conclusão da primeira turma do IPAR ocorreu em 1977, entretanto, sem cumprimento do estágio pastoral. Outro fato a destacar foi a elaboração do novo currículo com cinco anos e dez semestres para o Curso Filosófico-Teológico de formação de presbíteros, divididos em 3 blocos: Realidade, Bíblia e Teologia.

Mesmo em 1977, os conflitos persistiam no curso catequético devido ao debate em torno do lugar da doutrina e da vivência comunitária e partilha na catequese, o que indicou a necessidade de mudanças, contexto no qual surgiu o curso, voltado para animadores e líderes de comunidade, o qual voltaria a funcionar nas dependências do Centro Pe. Guido Del Toro em 1978 (Frigeiro, 1996).

O ano 1978 foi muito importante para a história da Igreja Católica, pois foi quando o Cardeal polonês Karol Józef Wojtyla foi eleito Papa, escolhendo o nome João Paulo II. Isso representou uma alteração considerável nas relações de poder e nas concepções teológicas que iriam nortear vários aspectos da vida da Igreja, especialmente da formação de agentes de pastoral (Souza & Dias, 2021). Nesse mesmo ano, o IPAR e o escritório do Regional Norte 2 da CNBB foram instalados na sede do antigo seminário da Arquidiocese de Belém, assim como outros organismos da Igreja, tais como a Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Ainda em 1978, foram criados o curso de animadores e líderes de comunidade e o Departamento de Pastoral (DP) para articulação com as CEBs, tendo o padre François Rubeaux, Missionário Oblato25, como seu diretor. Neste ano, também teve início a segunda turma do curso de Teologia do IPAR, contando com 30 seminaristas da Arquidiocese de Belém e das diversas dioceses e prelazias do Regional (Frigeiro, 1996).

O segundo triênio da gestão de Pe. Luís Pinto no IPAR, entre 1979 e 1981, foi marcado por tensões e conflitos que vinham se acumulando ao longo do tempo. Em 1979, foi criado o diretório acadêmico e eleita a sua primeira diretoria. Em 1979, o superior provincial dos Barnabitas (CRSP)26, Pe. Giovanni Maria Incampo, enviou comunicado explicando a ausência de seminaristas de algumas ordens religiosas, tecendo críticas ao curso seminarístico do IPAR e à linha teológica da formação. Em 1980, alguns dos professores mais identificados com a Teologia da Libertação (TL) foram afastados de suas funções docentes no Instituto, como Pe. Savino Mombelli, Pe. Bernardo Hoyos (salesiano27), além de Pe. Jean Hébette28, Rosa Acevedo Marin e Isa Cunha (Frigeiro, 1996). Também em 1980, o Papa João Paulo II visitou o Brasil e veio a Belém do Pará, fato que despertou animação entre todas as camadas da população, fortalecendo a caminhada cristã (Mata, 2002). Como produto desse período, foi criado o curso de Teologia Pastoral para Leigos e Religiosos, seguindo duas linhas de reflexão e aprofundamento: formação teológica com fundamentação bíblica e o trabalho pastoral (Frigeiro, 1996).

Em 1981, a evasão dos alunos no curso filosófico-teológico do IPAR, anunciada anteriormente por Pe. Geovanni Incampo, foi um duro golpe na trajetória educativa do Instituto. No entanto, em 1981, a prisão dos padres da Sociedade para as Missões Estrangeiras de Paris29, Aristides Camio e Francisco Gouriou, e mais 13 posseiros do Araguaia, conectou o IPAR e sua comunidade acadêmica ao conjunto da sociedade e aos movimentos sociais que surgiam em torno desse acontecimento, como foi o caso do Movimento de Libertação dos Presos do Araguaia30 (Frigeiro, 1996).

No final de 1981, enquanto em Belém o IPAR se dedicava a cursos breves e à descentralização, foi assinado um convênio com a Diocese de Santarém para a transferência do curso de Teologia que se instalaria nas dependências do Seminário São Pio X naquela cidade, tendo o Instituto o compromisso de fornecer os professores. Segundo Ribeiro (2011), o currículo nesse curso teria três níveis (propedêutico, básico e profissional) e o percurso acadêmico seria dividido a cada semestre, com três meses de estudo intensivo e três meses de prática pastoral:

A presença desse curso na Diocese foi de profunda interação com a caminhada diocesana, pois tanto professores como estudantes mantinham um contato muito próximo da realidade, principalmente nas periferias. Ressalta-se a presença deles junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais e aos movimentos populares, conhecidos como Movimento de Organização Popular (MOP). (Ribeiro, 2011, p. 134)

Essa experiência educativa representou uma intersecção da teologia latino-americana com as ideias pedagógicas formuladas por Paulo Freire, e o método Ver-Julgar-Agir31. Ressalta-se que, entre 1982 e 1985, período em que o curso seminarístico do IPAR funcionou em Santarém, a Diocese era governada por bispos franciscanos (OFM)32, como Dom Tiago Ryan, e seu coadjutor33, Dom Lino Vombommel. As dificuldades de compor uma equipe de formação diocesana adequada, condição indispensável na formação a presbítero, levaram a Diocese a não continuar com o curso de formação presbiteral, que voltou para Belém nas instalações do Seminário São Gaspar, em 1985, por articulação do Redentorista34 (CSSR) Dom Patricio José Hanrahan, bispo de Conceição do Araguaia35.

Esse lapso foi marcado por acontecimentos importantes, tanto no âmbito interno ao Instituto, quanto na conjuntura nacional. No âmbito interno, o sociólogo focolarino36, Emanuel Matos, foi nomeado diretor do IPAR, sendo assim o primeiro leigo37 a dirigir o Instituto, enquanto o departamento pastoral do IPAR passou a ser composto por Pe. François Rubeaux, Pe. Luís Mosconi, Pe. Afonso Floich e pela Irmã Tea Frigeiro, da Congregação das Missionárias de Maria38 (Frigeiro, 1996). No âmbito externo, em termos da conjuntura política brasileira, em 1985, em razão do processo de redemocratização do Brasil, acontecia o fim do Regime Militar.

Nesse período, foram realizados diversos cursos pelo interior do Pará, com notável atuação do Pe. Savino Mombelli, que ministrava formações para professores da Escola Primária, como o que ocorreu em Marituba, com a temática da prevenção contra as drogas, intitulado “Educação por meio de ideais” (Frigeiro, 1996).

Considerações finais


Embora preliminares, nossos estudos nos permitem afirmar que o Instituto de Pastoral Regional se constituiu como uma instituição educativa com um legado educacional e teológico, representando um complexo universo a ser explorado. A organização institucional se equilibrou entre um regime ditatorial civil-militar, que vigorou no Brasil de 1964 a 1985, e uma política de valorização e desenvolvimento econômico da Amazônia que entendia e vislumbrava a região na perspectiva de uma integração inacabada ao resto do país, e por isso, era objeto de proteção das fronteiras e repressão aos que se insubordinassem a esses ditames, sob a justificativa da “segurança nacional”.

Naquela conjuntura, o IPAR veio a configurar um espaço formativo diverso, complexo e fecundo, o qual buscamos compreender a partir da articulação das dimensões política, socioeconômica e educacional. Para tanto, utilizamos elementos da teoria gramsciana, principalmente das categorias aparelho privado de hegemonia e intelectual orgânico, para subsidiar nossa análise. Esse gesto facilitou sua compreensão na perspectiva não de enquadrar o objeto na teoria, mas de perceber que a teoria ajuda a iluminar a análise e o estudo do objeto.

Neste sentido, pode-se argumentar que o IPAR tem exercido uma influência ideológica e cultural significativa na região amazônica ao promover uma teologia comprometida com a defesa dos direitos dos pobres e oprimidos com vistas a formar lideranças pastorais que atuassem junto a comunidades indígenas, ribeirinhas, quilombolas, e nas periferias das cidades, buscando a transformação da sociedade à luz da realização do Reino de Deus na terra, embora, a nosso ver, o IPAR não tivesse como objetivo impor uma visão ideológica ou cultural única, mas promover o diálogo e o debate sobre questões teológicas, sociais e políticas relevantes para aquela região.

Além disso, os padres Savino, Bernardo, Rubeaux, Mosconi, Afonso e Hébette, assim como a freira Frigeiro e as professoras Rosa Acevedo e Isa Cunha, entre outros, constituíram-se como intelectuais orgânicos deste aparelho na perspectiva da teologia latino-americana comprometidos com a síntese amazônica do Concílio Vaticano II e da Conferência de Medellín, cuja prática estava fundada nos princípios fundamentais da encarnação na realidade e da evangelização libertadora que norteou a formação de agentes de pastoral e de lideranças católicas para atuarem na sociedade civil. Eram, portanto, religiosos com ideais progressistas ligados à Teologia da Libertação, engajados em construir uma teologia comprometida com a transformação social e a libertação dos oprimidos, colocando-se a serviço das lutas populares e atuando como mediadores entre as comunidades e as reflexões teológicas.

Nesta medida, podemos concluir que o IPAR foi um ponto de irradiação dessa consciência, enfrentando obstáculos e vivenciando percalços, fosse com o governo militar, fosse com a hierarquia eclesiástica, mas sempre demonstrando sua vitalidade e centralidade como uma instituição educativa que marcou sobremaneira a vivência cristã de muitos homens e mulheres amazônidas, promovendo e contribuindo de forma decisiva para o desenvolvimento cultural e intelectual na região.

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Sobre os autores


Smile Golobovante


Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil

https://orcid.org/0000-0003-3639-6767


Mestre em educação pela Universidade Federal do Pará (2020). Doutorando em educação pela Universidade Federal do Pará. Professor do Serviço Social da Indústria. Assessor Superior da Secretaria Municipal de Coordenação Geral do Planejamento e Gestão de Belém. Membro do Laboratório de Pesquisas em Memória e História da Educação. E-mail: profgolobovante@gmail.com


Alberto Damasceno


Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil

https://orcid.org/0000-0003-1620-6735


Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998). Professor Titular da Universidade Federal do Pará. Docente do Programa de Pós-graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica e do Programa de Pós-graduação em Educação na Amazônia. Coordenador do Laboratório de Pesquisas em Memória e História da Educação. E-mail: albertofdamasceno59@gmail.com


Marcus Ribeiro


Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-5163-4973


Graduado em Licenciatura Plena de Pedagogia na Universidade Federal do Pará. Assessor Superior na Secretaria Municipal de Educação de Belém. Membro do Laboratório de Pesquisas em Memória e História da Educação. E-mail: viniciusribeiroo188@gmail.com


Contribuição na elaboração do texto: os autores contribuíram igualmente na elaboração do manuscrito.




Resumen


Insertado en el campo de la Historia de la Educación, este artículo aborda el proceso de creación e institucionalización del Instituto de Pastoral Regional (IPAR) con el objetivo de comprender cómo se sucedió ese proceso entre las décadas 1970 y 1980. El trabajo es el resultado de una investigación histórico-documental y un relevamiento bibliográfico de obras que lo sustentan teoricamente. Identificamos el contexto socioeconómico amazónico, los acontecimientos eclesiales que influyeron en el Instituto, además del proceso de fundación e institucionalización. Inferimos que el IPAR, fundamental para la acción de la Iglesia en la Amazonía, promovió parte del desarrollo cultural e intelectual de la región.


Palabras clave: Instituto de Pastoral Regional. Historia de la Educación. Amazonia.



Abstract


Inserted in the field of The History of Education, this article addresses the process of creation and institutionalization of the Instituto de Pastoral Regional (IPAR) and aims to understand how this process took place between the 1970s and 1980s. The work is the result of historical-documentary research and a bibliographic survey of works that subsidies it theoretically. We identified the Amazonian socioeconomic context, the ecclesial events that influenced the Institute, in addition to the process of foundation and institutionalization. We infer that the IPAR, fundamental to the church's action in the Amazon, promoted part of the cultural and intellectual development of the region.


Keywords: Instituto de Pastoral Regional. History of Education. Amazon.


Linhas Críticas | Periódico científico da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, BrasilISSN eletrônico: 1981-0431 | ISSN: 1516-4896

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Referência completa (APA): Golobovante, S., Damasceno, A., & Ribeiro, M. (2023). “Formar e servir”: trajetória histórico-educativa do Instituto de Pastoral Regional – IPAR (1971-1985). Linhas Críticas, 29, e47551. https://doi.org/10.26512/lc29202347551


Referência completa (ABNT): GOLOBOVANTE, S.; DAMASCENO, A.; RIBEIRO, M. “Formar e servir”: trajetória histórico-educativa do Instituto de Pastoral Regional – IPAR (1971-1985). Linhas Críticas, v. 29, e47551, 2023. DOI: https://doi.org/10.26512/lc29202347551


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1Originalmente sediado nas Instalações Pe. Guido del Toro, localizado no centro da capital paraense.

2O mote “formar e servir”, que consta no título deste artigo, é justamente o lema do Instituto de Pastoral Regional.

3É um conjunto formado por onze rodovias federais do Brasil que ligam a capital do país, Brasília (DF), à cidade de Belém (PA).

4A BR-230, também conhecida como Rodovia Transamazônica, é uma rodovia federal transversal do Brasil. Planejada para integrar melhor o Norte brasileiro com o resto do país, foi inaugurada em 27 de agosto de 1972, durante o Governo do General Emílio Médici.

5A floresta representa 67% das florestas tropicais do mundo, compreende um terço de todas as florestas do globo e responde por 20% do total de água doce do planeta. Em comparação com um país, a Amazônia Legal ocuparia o 6º lugar no ranking de maior extensão territorial” (Thomas, 2021, s.p.).

6São eles: Gilberto Pastana de Oliveira, de São Luis, Maranhão; José Maria Chaves dos Reis, de Abaetetuba, Pará; Fernando Barbosa dos Santos, de Palmares, Pernambuco; Manoel de Oliveira Soares Filho, de Palmares dos Índios, Alagoas; Evaldo Carvalho dos Santos, de Viana, Maranhão; e Raimundo Possidônio Carrera da Mata, de Bragança, Pará.

7O conceito de fronteira foi a base de análises dos anos 1970 sobre a Amazônia, visando entender as dinâmicas nas novas áreas e os fluxos da migração dirigida e espontânea atraída nas frentes dos programas de colonização. Mas esses programas estavam subordinados ao projeto mais amplo de modernização institucional e econômica do país (Castro & Campos, 2015, p. 26).

8Compreender o território e a educação nos diálogos sobre a Amazônia contribui para desvelar a disputa quando pensamos o processo de formação humana nesse espaço da sociobiodiversidade, pois nos deparamos com diferentes perspectivas sobre usos do território e sobre relações sociais e de poder construídas no espaço amazônico (Vasconcelos & Albarado, 2020, p. 14).

9Magalhães (1999, p. 70) considera que “a história das instituições educativas constitui um processo epistêmico que medeia entre a(as) memórias(s) e o arquivo, não se limitando à memória às dimensões orais, mas incluindo as crônicas e outros textos afins […]. Totalidade em organização e construção, uma instituição educativa não é estática.

10A Guerra Fria teve início após a Segunda Guerra Mundial e se caracterizou pela disputa entre as potências hegemônicas EUA e URSS, principalmente nos âmbitos ideológico e tecnológico-militar.

11Baseado nas ideias e nos projetos de lei anticomunistas do senador estadunidense Joseph McCarthy. Foi a perseguição direta e indireta a funcionários do governo federal dos EUA e acadêmicos que não demonstravam hostilidade à URSS e ao comunismo em seus estudos, somada ao financiamento, tanto privado quanto estatal, daqueles cuja produção rezava a cartilha anticomunista.

12Essa configuração eclesiástica foi alterada em 2019 quando a Diocese de Santarém foi elevada à dignidade de Arquidiocese, tendo como sufragâneas as Dioceses de Óbidos, Xingu-Altamira, e as prelazias de Alto Xingu - Tucumã e Itaituba.

13Atual Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH).

14Dado o caráter da UFPA, o Curso não era destinado para a formação presbiteral, no entanto, é evidente que os aspirantes ao sacerdócio eram os maiores beneficiários da sua criação.

15Frade dominicano e primeiro diretor do IPAR. Foi Bispo-auxiliar de Belém de 1975 a 1976, Bispo de Marabá entre 1976 e 1985, de Itapeva entre 1985 e 1993, de Nova Friburgo em 1993, e Arcebispo de Niterói em 2003. Em 1976, foi interrogado por defender posseiros da região onde ocorreu a Guerrilha do Araguaia, contra violações de direitos humanos.

16Também conhecida por Ordem de São Domingos ou Ordem Dominicana, é uma ordem religiosa católica que tem como objetivo a pregação da palavra e mensagem de Jesus Cristo, e a conversão ao cristianismo.

17Pia Sociedade de São Francisco Xavier para as Missões Estrangeiras é um instituto religioso masculino católico cujos afiliados são chamados popularmente "xaverianos".

18As Comunidades Eclesiais de Base são comunidades ligadas principalmente à Igreja Católica que, incentivadas pela Teologia da Libertação, espalharam-se principalmente nos anos 1970 e 80, no Brasil e na América Latina. Consistem em comunidades reunidas geralmente em função da proximidade territorial e de carências e misérias em comum.

19Localizado no centro histórico de Belém, no Pará, trata-se de um prédio colonial todo erguido em pedras no final do século XVIII e início do século XIX. Pertencia à Diocese de Ponta de Pedras e foi um centro de formação que abrigou em suas dependências diversos cursos, reuniões e encontros pastorais da Igreja Católica na Amazônia.

20Segundo Frigeiro (1996), era um curso com duração de 15 dias em média, com estrutura limitada a lições objetivas, trabalho de grupo e poucas verificações de aprendizagem. Compreendia várias áreas de estudo teológico-pastoral: catequese, bíblia, liturgia, comunidade, acenos à teologia dogmática e moral, realidade amazônica e eclesiologia.

21Dom Alano Pena, que posteriormente foi nomeado Bispo da Prelazia de Marabá, Pará, em 1976; Bispo de Itapeva, São Paulo, em 1985; Bispo de Nova Friburgo, Rio de Janeiro, em 1993; e Arcebispo de Niterói, Rio de Janeiro, em 2003.

22Bispo-coadjutor de Marabá de 1971 a 1976, Bispo de Conceição do Araguaia, de 1976 a 1978, e de Uberlândia, de 1978 a 1992. Em 1976, foi interrogado por defender posseiros da região onde ocorreu a Guerrilha do Araguaia contra violações de direitos humanos, quando denunciou o uso de Napalm contra os camponeses e ribeirinhos da região.

23No Sudeste do Pará, a região do Araguaia foi palco de tensões entre a Igreja Católica e o Governo durante a Ditadura Militar, após o conflito de Perdidos, que envolveu violações dos direitos humanos de líderes católicos. Dom Alano e Dom Estevão foram perseguidos e processados. Essas informações foram descritas no livro "A Justiça do Lobo", de Ricardo Rezende Figueira.

24Foi nomeado reitor da UFPA durante o Governo do General Ernesto Geisel, pelo então Ministro da Educação, Ney Aminthas de Barros Braga, em 1977.

25Os Missionários Oblatos de Maria Imaculada são uma congregação religiosa, um instituto de vida consagrada fundado em 1826 por Santo Eugênio de Mazenod, com o objetivo de dedicar-se por inteiro à educação de crianças e jovens, além das missões de evangelização.

26Os Clérigos Regulares de São Paulo (CRSP) são uma das ordens religiosas de clérigos mais antigas na história da Igreja: fundada em 1530, nasceu nos tempos de muitos movimentos de reforma da vida cristã, inclusive a conhecida como Reforma Católica ou Contrarreforma, que antecedeu o Concílio de Trento (1545-1563).

27Congregação Salesiana ou Salesianos é uma congregação religiosa da Igreja Católica fundada em 1859, por São João Bosco, e aprovada em 1874, pelo Papa Pio IX. Seu nome oficial é Sociedade de São Francisco de Sales, em homenagem a Francisco de Sales, mas os seus membros são popularmente mais conhecidos pelo nome de Salesianos de Dom Bosco.

28Padre Oblato de Maria Imaculada, nascido na Bélgica, foi economista e sociólogo, professor da UFPA.

29Sociedade para as Missões Estrangeiras de Paris (MEP) é uma sociedade de vida apostólica e de direito pontifício, constituída por padres seculares e leigos dedicados à evangelização em terras estrangeiras. Logo, não é uma ordem religiosa.

30O Movimento pela Libertação dos Presos do Araguaia (MLPA) surgiu no ano 1981, no estado do Pará, com o objetivo de reivindicar a libertação dos padres Aristides Camio e Francisco Gouriou e mais 13 posseiros que foram presos em decorrência de conflitos de terras na região do Araguaia (Sudeste do estado).

31A autoria do método é atribuída ao Cardeal Belga Joseph Cardjin. O método passou a ser adotado por movimentos da Igreja na primeira metade do século XX, tais como a Ação Católica, e foi também adotado em documentos pontifícios, como na Encíclica Mater et Magistra do Papa João XXIII, de 1961, e no documento do Concilio Vaticano II Gaudium et Spes, de 1965.

32Ordem dos Frades Menores, também conhecida por Franciscanos, é a ordem religiosa fundada por São Francisco de Assis em 1209.

33É um prelado da Igreja Católica nomeado para ajudar e substituir um bispo, arcebispo ou um prelado no exercício das suas funções com direito a sucessão. Ele deve ser nomeado vigário-geral pelo bispo diocesano. Vagando a Sé episcopal, o bispo coadjutor torna-se imediatamente o bispo diocesano.

34Congregação do Santíssimo Redentor, comumente conhecida como Redentoristas, é uma congregação religiosa católica fundada por Santo Afonso de Ligório, em Scala, perto de Amalfi, Itália, com o propósito de trabalhar entre os camponeses abandonados em torno de Nápoles em 1732.

35Tendo assumido no ano 1979.

36O Movimento dos Focolares ou Obra de Maria é um movimento católico fundado por Chiara Lubich em 1943 na cidade de Trento, norte da Itália. É considerado um movimento conservador. O Movimento se insere na chamada Espiritualidade da Comunhão, que também se faz presente em vários outros movimentos e segmentos da Igreja Católica.

37Que não é um padre ou bispo.

38Congregação das Missionárias de Maria, conhecidas como Missionárias Xaverianas, fundada no ano 1945 pelo padre xaveriano Giacomo Spagnolo e pela professora Celestina Bottego com a finalidade de anunciar Cristo e o seu Evangelho entre os não cristãos. Ramo feminino dos Missionários Xaverianos, fundada em 1895, por Dom Guido Maria Conforti.