Artigo
Estudantes de
Pedagogia em estágio não obrigatório: reflexões para a formação docente
Estudiantes de
Pedagogía en prácticas no obligatorias:
reflexiones para la formación
docente
Pedagogy students in non-mandatory internship: reflections for teacher training
Ludmilla Carneiro Araujo[i]
Centro Universitário Governador Ozanam Coelho
Ubá, MG, Brasil
https://orcid.org/0000-0002-9705-2565
Simone de Almeida Braga[ii]
Centro Universitário Governador Ozanam Coelho
Ubá, MG, Brasil
https://orcid.org/0000-0001-5576-7178
Bruno Venancio[iii]
Universidade Federal Fluminense
Niterói, RJ, Brasil
https://orcid.org/0000-0001-7122-2733
Os
autores contribuíram igualmente na elaboração do manuscrito.
Recebido em: 26/07/2022
Aceito em: 17/10/2022
Publicado
em: 20/10/2022
Linhas
Críticas | Periódico científico
da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, Brasil
ISSN: 1516-4896 |
e-ISSN: 1981-0431
Volume 28, 2022 (jan-dez).
http://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas
Referência
completa (APA):
Araujo, L. C., Braga, S. de A., & Venancio,
B. (2022). Estudantes de Pedagogia em estágio não obrigatório: reflexões para a
formação docente. Linhas Críticas, 28, e44357. https://doi.org/10.26512/lc28202244357
Link alternativo:
https://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas/article/view/44357
Licença Creative Commons CC BY 4.0.
Resumo: Objetivamos investigar os desafios das
estagiárias, estudantes de Pedagogia, que atuaram nas escolas de um município
de uma cidade no interior de Minas Gerais. Realizamos uma pesquisa, por meio de
questionários, com as estudantes que fizeram o estágio não obrigatório neste
mesmo programa. Para este estudo, nos apoiamos em
autoras, tais como: Pimenta, Borssoi, Lima, Rosa, Weigert e Souza. São muitos os desafios e dificuldades
encontrados, como a falta de aporte teórico, uma vez que estão em períodos
iniciais do curso. Apesar disso, percebemos oportunidades de conhecimentos para
a formação profissional.
Palavras-chave: Formação de Professores. Estágio. Experiência.
Resumen: Nuestro objetivo es investigar los desafíos de los pasantes, estudiantes de Pedagogía, que trabajaban en escuelas de la ciudad de una ciudad del interior de Minas
Gerais. Realizamos una encuesta, a través de cuestionarios, a los estudiantes que realizaron la pasantía no obligatoria en este mismo programa. Para este estudio,
nos apoyamos en autoras
como: Pimenta, Borssoi, Lima, Rosa, Weigert y Souza. Son muchos los retos y dificultades encontradas, como la
falta de sustento teórico, ya que se encuentran en los
períodos iniciales de la carrera. A pesar de eso, percibimos oportunidades de conocimiento
para la formación profesional.
Palabras clave:
Formación de profesores. Prácticas. Experiencia.
Abstract: We aim to investigate the challenges of interns, Pedagogy
students, who worked in schools in the city of
a city in the interior of Minas Gerais. We conducted a survey through questionnaires for students who did
the non-mandatory internship in this same program. For this study, we
rely on authors
such as: Pimenta, Borssoi,
Lima, Rosa, Weigert and
Souza. There are many challenges and difficulties encountered, such as the lack
of theoretical support, since they are in the initial periods of the course.
Despite that, we perceive knowledge
opportunities for professional training.
Keywords: Teacher Training. Internship. Experience.
Introdução
O estágio é
fundamental para desenvolver e aprimorar os conhecimentos durante a formação
acadêmica, sendo de extrema importância para a formação de graduandas[4] do
curso de Pedagogia, pois ele possibilita a articulação teórico-prática em
campo, oportunizando a vivência e agregação de conhecimentos à futura professora.
A Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDBEN), no seu artigo 61, parágrafo único,
estabelece que, para a formação de profissionais da educação, será necessária
“II – a associação entre teorias e práticas, mediante estágios supervisionados
e capacitação em serviço” (Brasil, 1996). Diante disso, nota-se a relevância
das experiências vivenciadas no estágio, sendo estas exigências fundamentais à
formação do educador.
O estágio
obrigatório exigido pelo Ministério da Educação (MEC) foi regulamentado pela
Lei n.º 11.788, que, em seu 1º artigo, define o estágio como ato educativo
escolar supervisionado (Brasil, 2008). Ele é apresentado como requisito
fundamental para a formação dos acadêmicos, pois os conhecimentos adquiridos
somente pela teoria não são suficientes para exercer o ofício.
O estágio não
obrigatório, por sua vez, é optativo e pode ser considerado uma atividade
investigativa, a qual abrange a reflexão e a intervenção no âmbito escolar.
Segundo Tiscoski e Bittencourt (2017), ele pode
promover o engrandecimento da percepção cultural escolar, ao conciliar a teoria
à prática docente, tornando possível uma reflexão. Freire (1996) também afirma
que é indispensável para a formação da professora uma reflexão crítica sobre a
prática, possibilitando que a docente analise e aperfeiçoe seus conhecimentos.
Diante disso, nota-se que esse estágio pode trazer muitos benefícios à graduanda,
acrescentando experiências relevantes à sua formação.
Diante disso, este
estudo traz como objetivo geral investigar os desafios das estagiárias, alunas
de Pedagogia de uma Instituição de Ensino Superior no interior de Minas Gerais.
Nesse sentido, propomos analisar como e se foram oferecidas capacitações para a
inserção das alunas no programa de estágio. Buscamos analisar as principais
dificuldades enfrentadas pelas estagiárias nas escolas e relatar a realidade
vivenciada por elas. A prefeitura da cidade possui um programa para a
contratação de estagiárias, que são enviadas para diversas escolas todos os
anos. Para ingressar nesse programa, a estudante deve passar por um processo
seletivo, por meio de uma prova, que a classifica em uma lista de aprovados. É
um estágio remunerado, sendo, portanto, muito atrativo para muitos discentes.
Diante disso, com o intuito de investigar o funcionamento desse programa nas
escolas, apresentamos os seguintes questionamentos: Quais são os desafios
enfrentados pelas estagiárias contratadas? Quais as contribuições desse estágio
para a construção de conhecimentos necessários à formação das futuras
professoras?
O estágio (não) obrigatório e a formação de professoras
O estágio é parte
fundamental dos cursos de licenciatura, considerado uma das etapas
imprescindíveis para a formação da professora. Sem a realização do estágio, a
estudante não consegue concluir sua graduação, pois é apontado como uma
obrigatoriedade pela LDBEN (Brasil, 1996). Segundo Fontana (2013), o estágio
curricular se faz necessário para desenvolver e aprimorar os conhecimentos
sobre a cultura e o funcionamento escolar, sendo uma atividade muito relevante
ao processo de formação da futura professora.
A LDBEN estabelece,
no seu artigo 61, que são considerados aptos a atuar na educação básica “I-
professores habilitados em nível médio ou superior para a docência em educação
infantil e nos ensinos fundamental e médio” (Brasil, 1996). A referida lei
afirma que a habilitação em nível médio na modalidade normal é a formação
mínima exigida para o exercício da função em Educação Infantil e nos quatro
primeiros anos do Ensino Fundamental. Entretanto, pontua que a habilitação para
atuação também se dá pela formação em cursos de licenciatura de graduação
plena. De acordo com o parecer do Conselho Nacional de Educação/Conselho
Pleno (CNE/CP) 21/2001:
A
licenciatura é uma licença, ou seja, trata-se de uma autorização, permissão ou
concessão dada por uma autoridade pública competente para o exercício de uma
atividade profissional, em conformidade com a legislação. A rigor, no âmbito do
ensino público, esta licença só se completa após o resultado bem-sucedido do
estágio. (Brasil, 2001, p. 2)
Ainda de acordo com
o parecer, denota-se que o estágio obrigatório na formação docente é uma norma
de grande importância não apenas na formação das pedagogas, mas em todos os
cursos de licenciatura. A licenciatura traz uma licença para atuação na
docência, ressaltando a importância de se cumprir com excelência o estágio, que
possibilita uma aproximação à realidade encontrada nas escolas.
Conforme Freire (1996) e Pimenta e Ghedin (2006), é notável a relevância da
prática articulada à teoria, pois os dois saberes são indissociáveis, visto que
se complementam e auxiliam no desenvolvimento da criticidade. São saberes
necessários por apresentarem grande valor formativo no processo de graduação.
Assim, como o estabelecido pela LDBEN, o estágio é uma norma, uma atividade
curricular obrigatória, e cabe à instituição de Ensino Superior acompanhar,
avaliar, ressaltar sua relevância e dar aporte para seu cumprimento (Brasil,
1996).
Para validar e efetivar
o estágio, a Lei n.º 11.788 aponta que a graduanda deve cumprir as fases da
observação, regência e a elaboração do relatório final, no qual deve conter os
registros do período vivenciado no estágio (Brasil, 2008). De acordo com Borssoi (2008), é a partir da observação que se consegue
suporte para elaboração da regência e é por ela que a graduanda experiencia a
rotina escolar. Ainda nesse contexto, Silva e Gaspar (2018) afirmam que a
experiência da observação e participação possibilita um olhar mais atento e
crítico aos acontecimentos nesse ambiente, trazendo percepções que, em outros
contextos, não seriam notadas. Nesse sentido, as autoras declaram que a fase da
observação oportuniza um melhor desenvolvimento da regência.
De acordo com Pimenta e Lima (2019), o estágio obrigatório, se bem
aproveitado, pode servir de suporte para a vivência profissional docente,
expandindo e aprofundando os saberes pedagógicos e as práticas. Todavia, as
autoras ressaltam o fato de alguns estudos apontarem que a temática não é vivenciada
com a devida importância e afirmam que, “Os estudos sobre os cursos de
licenciatura têm evidenciado que nem sempre coordenadores, professores e alunos
percebem esse valor formativo como oportunidade de ir além e de superar uma
simples observação, participação e regência na sala de aula” (Pimenta & Lima,
2019, p. 10). Diante disto, nota-se que algumas estagiárias veem o estágio
apenas como uma atividade que é necessária para sua formação, e não como uma
oportunidade de experienciar as diversas possibilidades de abranger os
conhecimentos que a prática como estagiária pode acrescentar a sua formação
profissional.
Ainda de acordo
Pimenta e Lima (2019), percebe-se a existência de um problema em relação ao
estágio que, em alguns casos, é realizado de forma insatisfatória, quando a
estudante o faz apenas por obrigação, sem aproveitar ao máximo as oportunidades
que ele oferece para a sua formação. Segundo afirma Borssoi
(2008, p. 8), para a formação eficaz do profissional da educação, é necessária
uma “busca constante, não apenas do saber, mas também do fazer”. Nesse sentido,
Borssoi (2008) afirma o que foi apontado por Pimenta
e Lima (2019), pois a estudante não deve realizar o estágio apenas para
cumprimento do que é obrigatório, mas ir além, buscando experiências acerca de
sua futura profissão.
Segundo define a
Lei n.º 11.788, o estágio obrigatório é uma exigência para que a graduanda
possa efetivar sua formação, diferente do estágio não obrigatório, cujo
cumprimento é uma opção e a carga horária obtida pode ser computada à carga
horária regular e obrigatória (Brasil, 2008). Assim, durante o percurso
acadêmico, a graduanda deve cumprir o estágio obrigatório e tem a oportunidade
de fazer o estágio não obrigatório, que, segundo Tiscoski
e Bittencourt (2017), pode proporcionar muitos aprendizados e aproximar da
realidade escolar. Os estágios obrigatórios e não obrigatórios são
regulamentados por normas, as quais abordam as definições, obrigações e
funcionamento do estágio como, por exemplo, a Lei n.º 11.788, de 25 de setembro
de 2008.
Art. 1.
Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de
trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que
estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de
educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais
do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e
adultos. (Brasil, 2008, p. 1)
Conforme a
legislação acima define, o estágio deve ser realizado sob a supervisão de um
profissional habilitado e, no cumprimento do estágio curricular obrigatório,
faz-se necessária a comprovação de frequência por meio de vistos nos relatórios
obrigatórios do educando. Tais relatórios são citados pela Lei n.º 11.788 como
exigência ao educando e sua apresentação deve respeitar o prazo de até seis
meses após o início do estágio (Brasil, 2008).
A referida Lei
define também, em seu inciso 2º, que “o estágio visa ao aprendizado de
competências próprias da atividade profissional e à contextualização
curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para
o trabalho” (Brasil, 2008, p. 1). Nesse sentido, nota-se que o estágio deve
possibilitar uma articulação de conhecimentos curriculares teóricos e práticos,
salientando que deve propiciar conhecimentos não apenas para a formação
educacional e profissional da graduanda, mas também para sua formação cidadã
como um todo. Segundo Borssoi (2008), o estágio pode
proporcionar uma visão crítica e reflexiva sobre a sociedade e o mundo que o
cerca.
Se bem executadas,
as duas formas de estágio podem trazer inúmeras contribuições à formação
acadêmica da professora; ambas devem ser bem orientadas e acompanhadas,
conforme apontam as legislações que regulam o estágio (Brasil, 2008). Portanto,
nota-se a relevância das experiências e das oportunidades que os estágios podem
trazer a graduanda, possibilitando uma vivência do cotidiano de sua futura
profissão.
De acordo com Tiscoski e Bittencourt (2017), o estágio não obrigatório
pode proporcionar uma reflexão ampla de todo o cenário escolar, oportunizar uma
melhor compreensão de seu funcionamento e trazer possibilidades de a estagiária
criar vínculos com estudantes e com a professora regente, aprimorando seus
conhecimentos e contribuindo para sua formação docente.
De acordo com a Resolução n.º 2, de 1º de julho de 2015, o estágio não
obrigatório pode ser computado à carga horária obrigatória das atividades
teórico-práticas de aprofundamento, conforme definido em seu artigo 13,
parágrafo IV:
IV- 200
(duzentas) horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas
específicas de interesse dos estudantes, conforme núcleo definido no inciso III
do artigo 12 desta Resolução, por meio da iniciação científica, da iniciação à
docência, da extensão e da monitoria, entre outras, consoante o projeto de
curso da instituição. (Brasil, 2015, p. 11)
O estágio não
obrigatório contribui com horas complementares, requisito exigido pelas
instituições de Ensino Superior. Esse tipo de estágio pode trazer muitas
contribuições para a formação inicial de professoras, desde que a graduanda se
comprometa com sua execução, não apenas pelo atrativo da remuneração (que é o
nosso caso em específico), mas como uma possibilidade de enriquecimento
curricular. “É a opção do estudante em inserir-se no meio escolar através de
trabalho remunerado, articulando a formação em andamento na graduação com a
realidade do seu futuro ambiente de trabalho” (Tiscoski
& Bittencourt, 2017, p. 110).
De acordo com Tiscoski e Bittencourt (2017), é notável que, por vezes, a
supervisão da graduanda no estágio em questão pode ser inexistente em algumas
instituições e suas obrigações não bem delimitadas, resultando em um desvio de
funções. Isso acarreta preocupações sobre a eficácia desse estágio, visto que
ele deveria assumir uma função de consolidação de teorias e práticas,
proporcionando conhecimentos e competências que abrangem a formação da
estagiária.
De acordo com
Fontana (2013), são vários os envolvidos para que o estágio aconteça de forma
responsável e a graduanda consiga desenvolvê-lo de modo a acrescentar em sua formação
profissional, ou seja, a estagiária não é a única responsável por seu
aprimoramento e aproveitamento. No estágio não obrigatório dentro do contexto
escolar, são diversas as possibilidades de construção de conhecimentos para a
graduanda. A professora regente, juntamente com a coordenação escolar, deve
possibilitar a inserção da estagiária na rotina escolar e promover
oportunidades para aprimorar seus conhecimentos prévios e conciliar o que é
aprendido no estágio com sua prática, transformando, assim, a experiência em
uma atividade reflexiva, que possibilita a construção de saberes. Ainda nesse
sentido, Fontana (2013) afirma que o aprendizado de novos conhecimentos, por
vezes, se dá pela troca de saberes, pelo aprendizado recíproco e pelos pontos
de discordância, que levam à reflexão e a tomadas de decisão no âmbito de
trabalho.
É válido ressaltar
que podem existir vários empecilhos para a inserção da graduanda no estágio.
Fontana (2013) afirma que o professor regente deve aceitar essa estagiária e
inseri-la em seu cotidiano, dando a ela autonomia para a prática, abrindo
espaço para uma docência compartilhada, evitando que a aceitação e inclusão da
estagiária seja algo conflituoso. O autor ainda aponta que:
Nessas
relações, nas dificuldades para trabalharem conjuntamente, todos os sujeitos
envolvidos incorporam, a si, valores e práticas da docência, interiorizam
tradições escolares, apropriam-se de modos de ação, de dizer e de valorar a
docência, significando-os como adesão ou recusa, produzindo, nas réplicas
ativas ao vivido, sua experiência. Nesse sentido, pode-se definir o estágio
como uma instância de formação recíproca em que o outro (referindo-me à tríade –
estagiário, formador, professor em atuação) é alguém com quem se vai aprender
algo. Algo sobre o outro - o que faz, quais as especificidades da sua
experiência - e, também, algo sobre si mesmo. (Fontana, 2013, pp. 157-158)
Durante a consolidação
da prática no estágio, a graduanda vivencia diversos desafios, coloca-se à
frente de inúmeras dificuldades, é confrontada por situações ainda não
estudadas e aprende com o cotidiano da escola. Nesse sentido, Tiscoski e Bittencourt (2017) afirmam que a prática
escolar, desenvolvida por meio do estágio não obrigatório, pode trazer
experiências pedagógicas que são vivenciadas no cotidiano escolar e tais
experiências só são adquiridas no âmbito escolar, pois a teoria estudada na
graduação leva a estudante a uma compreensão da futura profissão e de sua
atuação, mas a prática educacional não é apenas isso. Entende-se, então, que o
estágio pode trazer a oportunidade de preparar essa aluna para as dificuldades
e para a sua atuação como professora.
Assim, como afirma
Silva (2017), o estágio não obrigatório, diferentemente do obrigatório, traz
como exigência para sua realização apenas a comprovação de matrícula e
frequência, podendo a graduanda dar início ao estágio não obrigatório no seu
primeiro período de graduação, cabendo à instituição acolhedora a exigência ou
não de conhecimento prévio para a inserção dessa estagiária. Nota-se, por tudo
isso, que o estágio não obrigatório tem muito a acrescentar ao desenvolvimento
profissional, pois traz possibilidades de investigação, reflexão e intervenção
na vivência escolar, mas é imprescindível evidenciar a relevância do
comprometimento de todos os envolvidos.
Aspectos Metodológicos
Este trabalho tem
como objetivo destacar a importância do estágio não obrigatório e investigar os
desafios e as contribuições nele vivenciados pelas graduandas do curso de
Pedagogia de uma Instituição de Ensino Superior no interior de Minas Gerais
Essa pesquisa,
quanto aos fins, é considerada descritiva, a qual, de acordo com Gil (2008),
tem como intenção descrever fatos e características de um fenômeno realista. Segundo
o autor, algumas pesquisas descritivas propiciam uma diferente visão da
pesquisa em análise. A pesquisa é considerada básica, pois, de acordo com Gerhardt e Silveira (2009), tem por objetivo proporcionar
novos conhecimentos, que serão úteis ao avanço da Ciência, sem previsão de sua
aplicação.
É uma investigação
que envolve a obtenção de dados descritivos, o que deve proporcionar um diálogo
com o sujeito de estudo (Lüdke & André, 2017). Lüdke e André (2017) enfatizam que a pesquisa qualitativa
tem uma preocupação com o processo, no qual são construídas as questões e
hipóteses, o que possibilita um direcionamento para a pesquisa. Portanto, o
fenômeno investigado se caracteriza como qualitativo por relacionar os modos
subjetivos/objetivos de construção da aprendizagem para a docência assim como
do que é subjetivo/objetivo na capacidade de reflexão.
A instituição
pesquisada contava com quatro turmas de Pedagogia: uma turma do 1º período com
29 alunas; uma turma do 3º período com 37 alunas; uma turma do 5º período com
30 alunas e uma turma do 7º período com 47 alunas, perfazendo um total de 143
alunas. Das 143 alunas, 27 realizavam estágio não obrigatório no momento da
pesquisa. Para a coleta de dados, foram aplicados questionários com perguntas
que se alternaram em múltipla escolha e abertas, com o objetivo de obter, das
estudantes do curso de Pedagogia, informações sobre o tema pesquisado. Sobre
isso, Gil (2008, p. 121) estabelece que, “pode-se definir questionário como a
técnica de investigação composta por um conjunto de questões que são submetidas
a pessoas com o propósito de obter informações sobre conhecimentos, crenças,
sentimentos, valores, interesses, expectativas, aspirações, temores,
comportamento presente ou passado etc.”.
Dos 27
questionários aplicados, foram obtidas 22 respostas. O questionário possuía 13
questões fechadas, sendo 6 referentes aos dados demográficos e 7 referentes aos
dados da pesquisa. Além disso, possuía também 7 questões abertas, permitindo que
as estudantes pudessem descrever, de forma mais detalhada, os aspectos da
realização do estágio não obrigatório. As participantes da pesquisa não foram
identificadas para preservar suas identidades.
Para este texto,
destacamos as falas das estudantes sobre as questões referentes ao estágio. Portanto,
selecionamos as falas das quais emergiram os principais elementos aqui
propostos, que pudessem trazer contribuições para o campo. Dessa forma, para
evitar a citação de trechos que se repetiram ao longo das respostas dadas pelas
estagiárias, foram selecionados os que, de certa forma, representavam as
demais. Além disso, trouxemos trechos que se destacaram e nos provocaram a discutir
sobre o estágio não obrigatório e a formação de professoras. A partir dessa
leitura atenta, iniciamos as análises por meio de nossos referenciais e
buscamos traçar reflexões e contribuições para o campo de formação docente.
Principais resultados
Conforme já
descrito por alguns autores citados, o estágio é de grande valia na formação de
futuras professoras, sendo importante que sua realização aconteça de forma
satisfatória, pois, se bem aproveitado, pode agregar muitos conhecimentos à
formação das graduandas. Como relata Silva (2017), o estágio é o período que a
graduanda tem a oportunidade de vivenciar toda a rotina acadêmica, podendo
trazer reflexões sobre o contexto escolar e seu funcionamento, aprimorando sua
prática e desenvolvendo pensamentos críticos e reflexivos. Para tal reflexão, é
preciso que a estagiária tenha e aprofunde seus conhecimentos em torno do
funcionamento da escola, podendo, assim, desenvolver suas funções e atingir
resultados satisfatórios para a sua formação.
Segundo Rosa et al.
(2012), apoiadas em Behrens (1991), vivenciar a realidade da sala de aula por
meio do estágio proporciona às licenciandas, a partir da prática e de um
exercício de reflexão, a possibilidade de uma visão mais coesa e profunda
acerca da realidade da escola e da educação de um modo geral. Entretanto, Rosa
et. al (2012) salientam que o saber docente (Tardif, 2006) deve estar ancorado também
nas teorias educacionais, e não somente a partir das práticas.
Em conformidade aos dados obtidos, notou-se que mais de 60% das
participantes iniciaram seu estágio na fase introdutória do curso, o que poderia
trazer dificuldades, pois as graduandas, por estarem iniciando os estudos,
possivelmente não estavam preparados psicológica e cognitivamente para o que o
estágio demanda da discente, podendo acarretar diversas situações e
experiências negativas na formação da futura professora.
Diante desse resultado, é de grande valia apresentar os dados informados
pelas pesquisadas quando questionadas se fizeram algum curso de capacitação
para iniciar sua atuação como estagiárias, pois a maioria se encontrava no
início do curso e precisavam de uma preparação. De acordo com as respostas,
90,9% das graduandas informaram que não haviam feito nenhum curso para
capacitação ao inserir-se no meio escolar e apenas 9,1% da população do
questionário respondeu que havia feito. Com o respaldo do resultado anterior,
notou-se que as estudantes iniciam o programa de estágios cedo e quase não se
capacitam para a sua atuação, promovendo, assim, uma dúvida sobre a
qualificação das discentes. Pimenta e Lima (2018) afirmam
que, para que o estágio possa ser válido e sirva de embasamento para o
desempenho da futura profissão, é necessário que ele aconteça como forma de
aprimoramento dos conhecimentos prévios das estudantes e agregação de novos
conhecimentos. Além disso, podemos refletir sobre a entrada muito precoce no
estágio, uma vez que os autores também salientam que o tempo de afastamento do
ambiente escolar é importante para a formação. Nesse sentido, as estudantes dos
períodos iniciais não tiveram esse tempo de se distanciar, se preparar
teoricamente e, a partir disso, iniciar o processo de entrada na escola.
Quando questionadas quanto ao principal objetivo de optarem pelo estágio
ofertado pela Prefeitura, 81,8% informaram que buscavam oportunidade de
consolidar teorias estudadas com a prática vivenciada; 9,1% responderam estar
em busca de novos conhecimentos; 4,5% estavam em busca de conhecer o
funcionamento escolar e 4,5% dos discentes informaram ter como principal
objetivo o ganho financeiro. Com base nisso, pode-se observar que, ao se
inserir no estágio, buscavam a oportunidade de agregar a prática aos conhecimentos
adquiridos em seus estudos, o que é satisfatório, pois, conforme afirmam
Pimenta e Lima (2018), é através da vivência do estágio que se inicia o
processo de formação profissional da futura professora, sendo muito importante
o propósito pelo qual a graduanda busca o estágio. No entanto, é pertinente perceber
que, comumente, o estágio é considerado um lugar para “aplicar” o conhecimento aprendido
anteriormente – ou teoricamente. Corroborando os autores, é importante buscar a
articulação teoria-prática e não reforçar sua dicotomização.
Sabe-se que o estágio não obrigatório pode agregar muitas experiências
importantes à formação, mas também pode proporcionar experiências negativas.
Quando perguntado às graduandas sobre a experiência mais relevante em suas
vivências como estagiárias, muitas responderam que o contato com estudantes,
com o dia a dia da sala de aula e o meio escolar foram aquelas de maior relevância.
Dentre outras respostas, destacou-se, também, o trabalho das estagiárias com a
rotina de acompanhamento de crianças com deficiência, sendo descrito como algo
de grande valia. Identifica-se, assim, que esse estágio pode trazer uma rica
vivência e experiências às graduandas, proporcionando inúmeras oportunidades de
aprendizado.
Outro ponto interessante presente na fala de uma graduanda merece
destaque: “apesar de não ser o certo, há a experiência de poder assumir uma
sala de aula na falta de um professor” (Participante 5, 19 anos). Essa
estudante relatou algo grave, que é a ausência de um professor e uma sala de
aula sob a responsabilidade apenas de uma estagiária. Ela deu ênfase à
preocupação quanto à qualificação de si mesma para tal tarefa. Isso descumpre o
estabelecido pela Lei n.º 11.788, que, em seu
artigo primeiro, estabelece o estágio como um ato educativo escolar
supervisionado (Brasil, 2008, p. 11) por um profissional habilitado. Notou-se,
por sua fala, que é comum estagiárias ficarem sozinhas em salas de aula, apesar
de não ser o correto de acordo com a legislação.
O estágio, então,
deve ser estabelecido como elemento da articulação teoria-prática, como um
facilitador da aproximação da vivência profissional. Dessa forma, o estágio não
chega a ser a prática em si, mas uma forma de aproximar os licenciandos dela,
para que seja possível realizar algum tipo de trabalho pertinente ao seu
processo de formação – mesmo porque, devemos considerar a limitação de tempo
que as futuras professoras passam nos espaços escolares (Santos, 2004; Rosa et
al., 2012). Pimenta e Lima (2019) apontam que o
estágio é o momento no qual as licenciandas podem apreender a realidade e, de
forma conjunta com os/as professores/as e supervisores/as, fazer uma análise
crítica, fundamentada teoricamente. Assim, a partir desse momento, fazer
intervenções mais coesas, a fim de transformar a realidade (Andrade, 2019).
Em relação às dificuldades no estágio, algumas
participantes da pesquisa destacaram a adaptação e a rotina diária, além do
enfrentamento dos diversos desafios de uma sala de aula, ressaltando o quanto o
conhecimento teórico é importante, pois, por meio dele, tem-se aporte para
lidar com as dificuldades encontradas no cotidiano escolar. A participante 8 (20
anos) afirmou que “um dos meus maiores desafios era aprender a conviver em um
lugar onde eu não me sentia muito bem-vinda, que era na sala onde eu ficava”.
Segundo Fontana (2013), o não acolhimento pela professora regente pode ser um
empecilho para o desenvolvimento eficaz do estágio, pois a docente precisa dar
oportunidades de aprendizado à estagiária, tornando o período de estágio uma
oportunidade de troca mútua de experiências e sabedorias.
Algumas respostas demonstraram que o estágio pode ser muito importante
para a construção dos conhecimentos acerca das funções da futura profissão, mas
pode-se tornar desmotivador e uma experiência ruim, dependendo da forma como
for conduzido, impactando negativamente sobre todo o percurso acadêmico e a
própria atuação docente. A falta de experiência e treinamentos também se
mostrou uma grande preocupação para as estagiárias, como demonstrado nesta
fala:
Eu estava
no segundo período e não tinha muito conhecimento na área de educação especial.
Tive que cuidar de uma criança com Transtorno Opositor Desafiador (TOD) sem nem
saber que ela sofria desse transtorno e não sabia como lidar com ele.
Felizmente sou paciente e observadora (Participante 15, 19 anos).
De acordo com o que
foi afirmado, percebeu-se que a graduanda não possuía conhecimentos necessários
para atuar de forma correta com essa criança, o que poderia acarretar grandes
impactos na vida escolar dela, pois, como afirmou, ela poderia ter deixado de trabalhar
funções primordiais para seu desenvolvimento social, cognitivo e motor. Nesse
sentido, a participante 18 (20 anos) afirmou:
Fui
designada a acompanhar uma criança especial, e nem sempre recebi o suporte
necessário para tal função, tornando meu estágio mais dificultoso. Quando
iniciei meu estágio, estava cursando a matéria de Educação Especial, foi o que
me possibilitou trabalhar com meu aluno de forma mais coerente e eficaz, mas
muitos alunos fazem o estágio antes de realizar essa disciplina.
Percebemos, a
partir das respostas, que grande parte das estudantes que fazem estágio na
Prefeitura acompanham uma criança com alguma deficiência, sem ajuda ou
orientação dos/as professores/as regentes de turma e sem estarem preparadas
para essa função. Conforme aponta a LDBEN, em seu artigo 59, parágrafo III,
para tal função o sistema de educação deve garantir “professores com
especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento
especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a
integração desses educandos nas classes comuns” (Brasil, 1996). Mas, segundo
afirmaram as graduandas, tal função tem sido destinada às estagiárias, que,
como visto anteriormente, não estão aptas a exercê-la.
Nota-se que são
muitos os desafios e dificuldades encontrados pelas alunas ao adentrar no
programa de estágios. Alguns desafios são inerentes à atuação, mas, baseado no
relato das graduandas, destaca-se, também, a falta de capacitação e
treinamento, visto que as graduandas iniciam o estágio completamente
inexperientes e não recebem nenhuma capacitação ou treinamento para a função
que irão exercer, podendo, assim, prejudicar a turma que irá recebê-la, a
professora regente e até mesmo a sua formação. Andrade (2019) compreende o
estágio a partir de uma perspectiva crítica, uma vez que os objetivos estão
relacionados com oportunizar às licenciandas conhecimentos que são importantes
(científicos, filosóficos, pedagógicos e outros) para que seja possível “uma
compreensão do seu papel social da escola e da práxis educativa como
transformadora da realidade social” (Andrade, 2019, p. 19). Se faz importante
destacar o Estágio como um espaço-tempo objetivando um processo de aprendizagem,
de forma a propiciar a reflexão e sistematização do conhecimento. Entendendo a
complexidade dos processos de ensino-aprendizagem, o Estágio requer ações
dinâmicas, que sejam ancoradas pelos currículos das licenciaturas (Santos,
2004; Rosa et al., 2012).
Mesmo diante de
todos os desafios e dificuldades apontadas, quando perguntado às graduandas
sobre os benefícios que o estágio trouxe à sua formação profissional, a maioria
alegou serem inúmeros, pois a experiência de poder estar em campo, atuando lado
a lado com uma professora regente, serviu de aporte para sua própria atuação e
até mesmo a ausência do suporte necessário as preparou para assumir uma sala de
aula. O estágio, portanto, foi considerado de grande valia para a formação
profissional das discentes pesquisadas, social e pessoalmente, pois, conforme
afirmaram, a profissão de professor vai além de ministrar uma aula, é ter a
oportunidade de fazer a diferença no meio social e educacional.
Considerações finais
Este trabalho
buscou analisar as experiências vivenciadas pelas estudantes de Pedagogia, com
o intuito de investigar os desafios enfrentados por essas alunas. A partir desta pesquisa, foi possível
entender que o estágio não obrigatório traz muitas possibilidades às graduandas
no que se refere à aproximação da vivência profissional no contexto escolar.
Foi constatado que as graduandas do curso de Pedagogia, através do estágio da
prefeitura, têm a oportunidade de conviver com os diversos desafios, observar a
docência de perto e refletir criticamente sobre como enfrentar e superar os
desafios.
Foi possível perceber que há ainda uma ideia do estágio como um lugar de aplicação
do que foi aprendido anteriormente, ou seja, a dicotomização de que a teoria
vem antes da prática. Nesse sentido, consideramos importante refletir sobre a
entrada de estudantes de períodos iniciais nos estágios, pois, segundo nossa
análise, percebemos que algumas estagiárias sentem falta de um preparo quanto à
formação antes de iniciarem as atividades em sala. Além disso, como sinalizado,
a prática de assumir a regência da sala de aula na falta da professora supervisora
é um elemento que deve ser analisado de forma cuidadosa, pois a proposta do
estágio é não atuar na substituição de professoras, mas ser um processo
formativo que contribua para a preparação de futuras docentes.
Analisamos que o
estágio não obrigatório é um grande condutor de conhecimentos, especialmente esse
oferecido pela Prefeitura, trazendo muitas possibilidades para aprimorar os
conhecimentos e obter novas experiências, indispensáveis à formação da docente.
No entanto, consideramos que é muito importante haver um maior diálogo entre as
instituições envolvidas, tanto a prefeitura e a escola quanto o curso de
Pedagogia. Essa articulação institucional tende a proporcionar uma melhor
organização da atuação das estagiárias nas escolas, e dar um suporte em
situações como as que foram relatadas, como a falta de conhecimento sobre a Educação
Inclusiva, por exemplo.
Pode-se concluir
que, durante o desenvolvimento do estágio, as graduandas relataram enfrentar
muitas dificuldades e desafios, em grande parte devido à pouca experiência e
pela falta de suporte durante o programa de estágio. Alguns dos desafios
apresentados podem ser considerados inerentes à profissão docente, mas também
se notou ações contrárias ao que se tem discutido no campo de formação docente,
o que traz dificuldades relevantes para a atuação das estagiárias. Apesar dos
desafios e dificuldades encontrados pelas estagiárias, o programa de estágio
oferecido pela Prefeitura trouxe inúmeras oportunidades de conhecimento às
graduandas, apresentando-se como um programa importante para a formação
profissional de futuras professoras da região. Nesse sentido, reafirmamos a
importância do diálogo entre as instituições afim de oferecer às estudantes momentos
formativos enriquecedores e que articulem a reflexão docente. Consideramos que mais
investigações sobre os processos formativos envolvidos nesse programa de estágio
devem ser realizadas para possamos compreender aspectos outros que emergem
nesse caminho.
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[i] Mestre em Educação pela
Universidade Federal de Viçosa (2018). Professora do Centro Universitário
Governador Ozanam Coelho (UNIFAGOC). Professora da Prefeitura Municipal de Ubá.
[ii] Pedagoga pelo UNIFAGOC (2021).
Professora da Prefeitura Municipal de Ubá.
[iii] Mestre em Educação pela
Universidade Federal de São João Del Rei (2017). Doutorando em Educação pela
Universidade Federal Fluminense.
[4] Adotamos a utilização dos termos femininos por se tratar de uma
área de atuação marcada pela feminização e por se tratar de um trabalho que
envolveu somente mulheres, tanto estagiárias quanto professoras supervisoras.